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terça-feira, 26 de agosto de 2008

EDUCAÇÃO ATRAVÉS DO DESPORTO (XIII)

Dou hoje continuidade a um conjunto de textos que interrompi no passado mês de Junho, subordinados ao tema A Educação Através do Desporto. Retomo, porque entendo que a nossa participação olímpica nunca será visível enquanto o País não mudar a sua atitude relativamente à Educação Física.

A propósito trago à colação as eras de C. Handy: a da irracionalidade, a da incerteza, e a do paradoxo. Três palavras que o guru irlandês utilizou para caracterizar a sociedade actual. Irracionalidade porque, diz Handy:
“a mudança já não é o que era. Cada vez há menos continuidade, o futuro será menos confortável mas mais interessante”.
Torna-se, portanto, necessário compreender a mudança, a descontinuidade dos processos e dos modos de vida; necessário compreender que está a emergir uma nova inteligência, da qual o êxito das organizações dependerá da capacidade técnica, científica e de adaptabilidade dos quadros o que, por extensão, pressupõe novos e sobretudo melhores investimentos na Educação.
1.3. Constituição de turmas
Ao iniciar o segundo ciclo do Ensino Básico não fazem sentido as turmas mistas nas aulas de Educação Desportiva nem a manutenção de uma actividade generalista e, por razões várias, normalmente repetitiva ao longo dos anos. Os interesses e motivações dos alunos (e dos professores, obviamente) são diferentes, tendencialmente os estádios de maturação dos sexos não é igual e, no plano da prática desportiva competitiva formal, não existem modalidades desportivas mistas. De resto, o que actualmente se passa não favorece a coeducação
[1].
Num sentido lato a coeducação tem múltiplas vertentes. Não está em causa o indiscutível direito do Homem e da Mulher crescerem juntos, em igualdade e liberdade. Não se trata da defesa de uma segregação de sexos. O que está em causa é uma questão específica no campo da aprendizagem, isto é, de respeito pelo factor heterogéneo, daí resultando:
a) a defesa do princípio que o processo educacional deve ser igual para todos;
b) o pluralismo no sentido do reconhecimento que a população escolar é diferenciada e valorizada por cada sexo e cultura;
c) finalmente, um problema de justiça, que assume que todos os rapazes e raparigas são parecidos e diferentes. As diferenças devem ser identificadas e consideradas.
De resto estas dimensões não são novas. Knoppers (1988), in «Equity for excellence in physical education» defende precisamente estas interfaces do problema, ao argumentar que de uma forma genérica a injustiça existe nos programas de Educação Física muito embora, aparentemente, defendam a igualdade.
Deve assim caber à escola a definição da oferta desportiva curricular de carácter obrigatório e, aos alunos, a opção da modalidade que desejam praticar com rigor educativo e, obviamente, qualidade técnica
[2]. Aliás, é confrangedor o nível médio das aprendizagens básicas demonstrado pelos alunos do Secundário em qualquer modalidade desportiva. Destacam-se aqueles que, fora da escola, no clube, praticam a sua modalidade de eleição. Isto significa que a escola, ao longo de doze anos de formação, não tem sido capaz de educar, de promover o enriquecimento motor e de consolidar, inclusive, as aprendizagens técnicas fundamentais.
Por outro lado, as turmas não devem ultrapassar os dezoito alunos, mesmo nos casos das designadas turmas de interesses generalistas, isto é, formadas por alunos que não desejem a opção específica por uma qualquer modalidade ou, por razões de saúde, deficiência e outras
[3], devidamente diagnosticadas e avaliadas, tenham de cumprir programas especiais. A Escola tem o dever, também, de ir ao encontro desses alunos e das múltiplas situações que só uma triagem pode concretizar e que, hoje, são genericamente ignoradas pela instituição escola e pelos próprios docentes por ausência de uma organização interna de suporte.
Continua.
[1] Um crescente número de países, depois de alguns anos de experiência, acabaram por regressar ao modelo inicial, como foi o caso da Austrália, narrado por MacDonald (1989), sobretudo «para acabar com as desvantagens das raparigas nas classes mistas». Um outro exemplo, vem de Berlim, onde um recente estudo empreendido por Ide Krausse demonstrou que, em 598 alunos interrogados, a esmagadora maioria rejeitou a coeducação nas aulas de Educação Física. Penso também que, tal como afirma J. Evans (1989) no seu livro “Equality and opportunity in the physical education curriculum”, que só a mudança de organização no interior das escolas poderá dar «acesso a actividades comuns. Mas essa mudança para ter êxito terá de ser suportada por uma profunda alteração curricular e pedagógica».
[2] Após nove anos de formação motora básica (da educação motora à iniciação desportiva – pré-escolar ao 2º ciclo), a nossa proposta é que os alunos, entre o 7º e o 9º ano, optem por uma prática desportiva que se coadune com os seus interesses e motivações. Ao longo do actual terceiro ciclo deveriam, no máximo, viver a experiência de duas modalidades, sendo certo que, em três anos, deveriam somar dois de uma data modalidade desportiva. Os anos lectivos do Secundário (10º, 11º e 12º) tenderiam para a especialização.
[3] O excesso de peso, por exemplo, segundo um estudo da IOT (Internacional Obesity Task-Force) “é a doença infantil mais comum na Europa com uma prevalência assustadora em crianças com idades próximas dos dez anos”. Em Portugal “uma em cada três crianças já sofre de obesidade, o que coloca Portugal entre os primeiros lugares da lista de países europeus com maior incidência da doença”. Jornal Público, 16.10.03. Mas o problema não se coloca apenas ao nível do 1º ciclo do Ensino Básico. Um estudo de investigadores dinamarqueses, que abrangeu perto de 30 mil jovens de 15 países, revelou (05.01.04) que os Estados Unidos são o país com mais adolescentes com excesso de peso. Portugal, Grécia e Irlanda estão logo a seguir dos valores norte-americanos, nos jovens entre 13 e 15 anos. A obesidade foi declarada uma ameaça global pela Organização Mundial de Saúde, podendo originar doenças cardiovasculares e diabetes, entre outras. Entre 50 a 80 por cento dos adolescentes obesos tornam-se adultos obesos. Daqui se pode inferir que a saúde não pode ficar à margem da escola. Só que, neste momento, salvo raras excepções, os projectos educativos não contemplam preocupações daquela natureza, não fomentam estilos de vida activos saudáveis, nem vinculam os alunos a práticas regulares de actividades físicas durante o crescimento. Isto mesmo salienta o Dr. Rui Neves da Universidade de Aveiro relativamente às primeiras idades: “(…) A escola do 1º ciclo do Ensino Básico está excessivamente centrada no currículo formal e revela dificuldades em responder às características das rotinas diárias das crianças e respectivas famílias”. Jornal A Página da Educação, Nov. 2003, pg. 9.

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