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terça-feira, 23 de março de 2010

A CONTA DA TRAGÉDIA GOVERNATIVA

É um crime o endividamento descontrolado que coloca em risco a comunidade no seu todo, maior crime social é, quando a atitude claramente despesista atira para as margens da pobreza e da exclusão milhares que, se outras fossem as opções, provavelmente, viveriam numa situação próxima do óptimo social.

Esta manhã esteve em debate a Conta da Região de 2008. No período destinado ao encerramento do debate, proferi a seguinte intervenção política.
Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhor Secretário Regional,
É evidente que damos muita importância ao debate do orçamento. Mas, à Conta muito mais. É aqui que se analisa a verdade do orçamento e a capacidade do governo em executá-lo. É por isso, Senhor Presidente, que voltamos a sublinhar a indelicadeza e mesmo uma inexplicável falta de respeito por V. Exa. e pelos senhoras e senhores deputados, a ausência da totalidade dos membros do governo nesta importante sessão.
Do nosso ponto de vista este debate foi esclarecedor. Por um lado, desenvolvemos aqui uma análise séria, baseada em dados de uma instituição independente, o Tribunal de Contas, e, por outro, assistimos a um governo e a uma maioria a tentar, ingloriamente, disfarçar e até contrariar esses mesmos dados. Só que os números, tal como a experiência do algodão televisivo, não enganam. São aqueles que o Tribunal apresenta no seu relatório, com total independência e transparência, e são esses números que continuam a deixar em todos os políticos conscientes da situação, um rasto de grande preocupação relativamente ao futuro. Fugir a esta realidade, fazendo o possível por ignorá-la, fugir a esta realidade construída ao longo de anos, que negligenciou os alertas, fez ouvidos de mercador a tantas vozes que se fizeram ouvir, fugir desta realidade económica e financeira sufocante e perturbadora, construída de forma auto-suficiente e com laivos ditatoriais, Senhor Secretário Regional das Finanças, esteja V. Exa. certo, que irá custar a todos os madeirenses e porto-santenses, uma pesadíssima factura para as gerações vindouras. Os mandatos de V. Exa. não serviram para corrigir processos, antes contribuíram para um desastroso agravamento que a História recordará, onde o culpado, sublinhamos, não é apenas V. Exa., mas uma equipa à qual V. Exa. pertence. Se, do ponto de vista técnico, a Conta de 2008, foi escalpelizada nos seus elementos fundamentais, interessa agora retirar ilações e prognosticar, no plano social, as consequências políticas das opções assumidas pelo governo e que têm uma irresponsável continuidade política.
A Conta apresenta e reflecte um quadro dramático e todos nós sabemos que assim é. Não vale a pena disfarçar senhores deputados, porque ao disfarçar estão a enganar-se e, pior que isso, a enganar um povo madeirense. É de uma monumental irresponsabilidade querer passar ao lado e ignorar os problemas que estão e irão afectar, já a curto prazo, a estabilidade da Região nos planos económico, social e cultural.
De resto, o exercício da política, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, por maiores que sejam os interesses do poder partidário, envolve responsabilidades, neste caso, perante 253 mil habitantes que têm direito ao bem-estar de acordo com os índices de desenvolvimento humano. A responsabilidade governativa impõe limites na ambição, tal como a responsabilidade individual impõe limites na ambição e na aventura. Quer isto dizer que uma lógica de funcionamento das instituições governativas baseada no despesismo, no descontrolo, na sistemática confusão entre crescimento e desenvolvimento, essa lógica baseada no princípio que a História não fala de dívidas mas de obras, nos tempos que correm, está absolutamente errada.
É um crime o endividamento descontrolado que coloca em risco a comunidade no seu todo, maior crime social é, quando a atitude claramente despesista atira para as margens da pobreza e da exclusão milhares que, se outras fossem as opções, provavelmente, viveriam numa situação próxima do óptimo social.
Este modelo governativo que a Conta de 2008 evidenciou e que se manteve em 2009 e continuará em 2010, constitui um modelo que não é gerador de riqueza, antes retira ao povo a sua já depauperada capacidade de resposta às necessidades da vida. É um modelo que, provam os números, multiplica o desemprego, provoca mal-estar, pobreza, exclusão, fome, miséria e faz disparar a pequena ou grande criminalidade e, daí, colocar em causa a segurança dos residentes e a imagem tão necessária numa terra que, historicamente, vende um destino de tranquilidade e segurança. O apuramento dos resultados da Conta de 2008, compaginada com outros importantes indicadores, provam, que este modelo não está orientado para as pessoas, antes conjuga-se, infelizmente, com os interesses económicos instalados que protegem uns em detrimento de todos.
É por isso, por Contas como estas que hoje foram sumariamente debatidas que, no sistema de saúde, os seus profissionais trabalham no limite, face aos milhões em dívida, têm de aceitar o drama das altas problemáticas por ausência de políticas sociais e, particularmente, de família, políticas estas que deveriam ter um investimento prioritário; é por contas como esta que a Educação apresenta indicadores frustrantes, de fundo da tabela nacional na comparação dos resultados dos exames de 9º e 12º ano. Ao contrário de uma Escola conceptualmente diferente que conduza ao rigor, à disciplina e ao sucesso, a mensagem que o governo, hoje, subtilmente, passa aos docentes é a de que tenham cuidado com as reprovações, numa atitude facilitista que só trará mais caos ao caótico sistema educativo e social. Não procuram a mudança dos comportamentos no sentido de um ensino de excelência, que promova a prazo a empregabilidade, da qual precisamos como de pão para a boca, antes se prefere conjugar o verbo esconder e manipular a estatística, ignorando que 40% do desemprego é estrutural, por clara ausência de qualificações em função das exigências do mercado. É por isso que a Madeira regista, por ausência de investimento prioritário, a pior taxa de abandono escolar, a segunda pior taxa de escolaridade no 12º ano, a pior taxa de aprendizagem ao longo da vida, a segunda pior taxa de escolaridade do ensino superior. E diz o Senhor Secretário das Finanças que é significativo o investimento na Educação.
Senhor Presidente, senhoras e senhores deputados, falámos de saúde e de educação, mas o que dizer do sector primário onde a política de agricultura resume-se a ilusórios discursos de milhões para os “senhores agricultores” na mais descarada ausência de projecto credível e portador de futuro. Mais. É por isso, por um discurso falacioso, esta política e que esta Conta de 2008 uma vez mais globalmente demonstra, na principal actividade económica, constata-se uma queda abrupta para 52% de ocupação relativamente à oferta disponível no turismo. Há sérios desconfortos por todo o lado. São os empresários se queixam da concorrência desleal, fomentada pelo próprio governo, imagine-se, até ao nível da restauração; são os empresários que desesperam quando a média de pagamento das facturas é de 202 dias com tendência para aumentar, facto gerador de perturbação na equilibrada gestão empresarial. É por isso e muito mais que esta Conta reflecte, que é nesta Região que se verifica a maior percentagem de trabalhadores que levam para casa menos de 310,00 euros mensais. E, no entanto, Senhoras e Senhores Deputados, badala-se por aí que temos um PIB que ascende a 97%, o segundo mais alto entre regiões que deveria, a ser verdadeiro, equivaler a altos índices de conforto, o que, como sabem, não acontece. Basta consultar as estatísticas do Instituto Nacional de Estatística e basta ter presente o que a nu veio deixar a tragédia de 20 de Fevereiro.
Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados,
Senhor Secretário Regional das Finanças,
A verdade dói, ora se dói. Já houve tempo que daqui, governo e maioria, saiam, no final do debate, com a consciência porventura abalada pela factualidade dos argumentos. Mas a dor passava, rapidamente, pela sobranceria que o poder gera. Hoje, temos a certeza que, apesar dos discursos de circunstância, politicamente correctos, V. Exas. sabem tão bem quanto nós que este navio afunda-se dia-a-dia, com um comandante desesperado e uma tripulação que não sabe como salvar os passageiros. Já nem correm de um lado para o outro, nem ajudas proporcionam. O comandante já não lidera, a tripulação anda aflita e os passageiros tentam, desesperadamente, safar-se como podem à custa do bote da Segurança Social de Lisboa. Tenham a coragem de o assumir.
A Região Autónoma da Madeira, Senhoras e Senhores Deputados, Senhor Secretário, é muito mais que um grupo partidário e uma equipa de governo. A Madeira são as pessoas e essas têm deveres para cumprir enquanto cidadãos, mas também têm direitos que não podem ser escamoteados pela leviandade governativa: o direito à educação de qualidade, à saúde com qualidade, a uma organização societal definidora do tempo trabalho e da justa remuneração, à protecção da juventude e dos idosos, têm direito a patamares mínimos mas de dignidade na habitação, na cultura e no bem-estar geral.
A Conta de 2008 prova que a Madeira prossegue um caminho errado. Talvez, melhor dizendo: o governo não sabendo para onde vai demonstra que qualquer caminho lhe serve. É o jardim da Alice no país das maravilhas!
Ilustração: Google Imagens.

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