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terça-feira, 15 de junho de 2010

DEBATE SOBRE O ESTADO DA EDUCAÇÃO NA REGIÃO



O Estado a que a Educação chegou na Madeira necessita de um Pacto Educativo que, desde logo, envolva o governo, os partidos políticos, os parceiros sociais, investigadores, enfim, pessoas que tenham alguma ou muita coisa para dar ao sistema. Não há outra forma de corrigir um longo percurso de enganos e de ausência de uma política estratégica.


Foi muito mau o que hoje se passou na Assembleia Legislativa. Tratou-se de um pseudodebate realizado em 83 minutos. Oitenta e três minutos, com a ausência do Secretário Regional da Educação e sem tempo para colocar perguntas ou reformular as mesmas.
Na oportunidade, produzi a seguinte intervenção:
Senhor Presidente
Senhoras e Senhores Deputados,
Educação na Região não vale mais de 83 minutos. É o tempo destinado a debater um sector de enorme relevância para o futuro da Região. Oitenta e três minutos que correspondem a um minuto e quarenta e cinco segundos por deputado. Isto significa, senhoras e senhores deputados que não vamos debater a Educação, estamos a fazer de conta que a Educação será debatida.
E isto acontece em um momento particularmente complexo em que as velhas formas de actuar, os velhos formatos não conseguem dar resposta aos desafios do futuro; num momento de conflito entre o governo, os parceiros sociais, os professores e o Senhor Representante da República, agora, por um iníquo Estatuto da Carreira que, há cinco anos, bloqueia os direitos à progressão; num momento em que o PSD se negou a discutir de forma séria, aberta e profunda um Regime Jurídico do Sistema Educativo para a Madeira, com total falta de respeito pelas entidades que elaboraram pareceres; num momento em que se encerram estabelecimentos de educação sem uma justificação convincente; num momento de falência financeira dos estabelecimentos de educação e ensino, com facturas por pagar, algumas há mais de dez meses e que colocam em causa os próprios projectos educativos; num momento de ambiente social muito complexo em que há sinais de um agravamento nos direitos da acção social educativa; num momento de resultados escolares que colocam a Madeira em posições muito desagradáveis nos “ranking´s nacionais; num momento de insucesso e de abandono; num momento que crescem os sinais de indisciplina e de violência no espaço escolar, enfim, num momento que necessário se tornaria debater, com alma, o estado da Educação na Madeira, o PSD determina, por força da sua maioria, que a Educação não vale mais de 83 minutos de debate.
Esta Assembleia Legislativa, este primeiro órgão de governo próprio da Madeira Autónoma, demite-se, assim, da sua função de conjugador das diferentes opiniões, de estabelecedor de uma plataforma válida entre o seu corpo eleito, o governo e a sociedade, para aqui estarmos num pseudodebate de resultado nulo.
Senhor Presidente, a Educação vale muito mais do que 83’. Hoje já estamos a pagar a ausência de projecto, estamos a pagar a ausência de qualificação profissional, estamos a pagar o desacerto entre a frágil formação dos nossos jovens e as necessidades deste tempo novo, exigente, onde tudo tem de ser construído com qualidade, com rigor, com disciplina e com projecto de cunho humanista. Estamos a pagar a factura da incompreensão, das teimosias político-partidárias, do modelo absoluto, da verdade absoluta, da arrogância absoluta que deriva de uma maioria auto-suficiente, compaginada com uma Secretaria Regional da Educação, incapaz de perceber que um sistema quando se fecha sobre si próprio é gerador de galopante entropia. Este sistema não comunica, é avesso a dar e a receber, não permite adaptações conceptuais e, por isso mesmo, está a morrer como prova a incapacidade para resolver os problemas do dia-a-dia. E se perante as tarefas diárias mostra-se incapaz, o que dizer das tarefas de projecto para o futuro?
O Estado da Educação na Região é de falência. Entristece-nos ter de o afirmar, depois de 36 anos ininterruptos de um só partido com essa responsabilidade. O estado de falência está aos olhos de qualquer pessoa, basta que se atente nas palavras dos professores e nos alertas dos parceiros sociais. Seria bom que tomassem em consideração uma intervenção aqui feita, a semana passada, por um deputado da bancada da maioria, completamente desalinhado com a voz oficial; ou, então, das palavras de um intitulado “delfim”: a Educação não é marginal ou residual do desenvolvimento. Para o desenvolvimento é fundamental actuar no âmbito da cultura e do conhecimento. Quis com isto o autarca dizer que o caminho que está a ser seguido tem de ser revisto. Porque não há cultura, nem conhecimento, nem aquisição de competências se o sistema educativo não souber regenerar-se, adaptar-se através de novos processos organizacionais, de uma nova cultura, de uma nova mentalidade e de uma nova humildade que predisponha para o diálogo e para a concertação de esforços.
O Estado a que a Educação chegou na Madeira necessita de um Pacto Educativo que, desde logo, envolva o governo, os partidos políticos, os parceiros sociais, investigadores, enfim, pessoas que tenham alguma ou muita coisa para dar ao sistema. Não há outra forma de corrigir um longo percurso de enganos e de ausência de uma política estratégica. O que se sabe é que o actual quadro não interessa ao futuro da Região, aos professores, aos pais e encarregados de educação. Todos vamos perder com este rumo.
É urgente que se faça um Pacto, pois, em Educação, os resultados demoram muitos anos a aparecer. Qualquer mudança exige tempo e quanto mais tempo a Madeira perder mais distante estará dos patamares de sucesso. Está em causa, entre outros, o sentido organizacional do sistema aos níveis central, local e de estabelecimento de educação e ensino; está em causa a definição entre o que é essencial e o que é acessório; está em causa a definição de um sentido de missão e a definição da vocação da escola; está em causa o estabelecimento de princípios e valores, o rigor e a disciplina; está em causa a formação inicial dos docentes e o seu acompanhamento nos primeiros anos de leccionação; está em causa a ligação da escola à família o que implica uma actuação integrada a montante do sistema; está em causa, pela enésima vez, aceitar que o investimento na Educação se reveste de natureza prioritária.
O Pacto Educativo é importante, porque é sensível o esgotamento político das equipas que, há anos, repetitivamente, laboram sobre os mesmos erros.
O Pacto é determinante porque se assiste a existência de uma cristalização nos comportamentos, nas atitudes, na capacidade de gerar o novo. Esta mentalidade dominante, que faz ouvidos de mercador a todos quantos se pronunciam sobre a educação, é a causadora de bloqueio, de atraso, de uma escola virada para ontem e não para o futuro. O governo sempre esteve mais interessado em controlar a Escola, controlar os Conselhos Executivos do que propriamente lhes proporcionar a liberdade e a autonomia na criação de identidades próprias.
Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, é caso para questionar, afinal, perante a teimosia e tantas certezas, o que faz a Secretaria Regional de Educação, o que fazem os Directores Regionais, os Directores de Serviço, os Chefes de Divisão, os juristas, os adjuntos e os assessores? O que fazem em benefício do sistema, não apenas na solução dos problemas de enquadramento profissional da classe docente, mas também para que o sistema se torne numa alavanca de melhoria das competências das crianças e jovens da Região, no sentido de as tornar capazes de enfrentarem os desafios do futuro?
Senhores Deputados, mal vai um governo que aparece aos olhos do Povo a solucionar problemas da bola e descura, completamente, os problemas da outra “bola”, a cabeça. Da aspiração, legítima, em “exportar inteligência”, confrontamo-nos, hoje, com a necessidade de importar inteligência, deixando cada vez mais a um canto os madeirenses e porto-santenses a quem o governo deveria gerar as condições, a montante, na sociedade, e a jusante, na escola, susceptíveis de combaterem o atraso no conhecimento, nas competências e na cultura que os vários indicadores disponíveis apresentam.
O governo está a descurar o problema da Educação. Confunde escolarização com trabalho educativo, secundariza o professor enquanto elemento fundamental do processo ensino/aprendizagem e olha para a escola com os olhos virados para ontem quando deveria colocá-los no amanhã. E tão grave quanto isto, este governo, esta Secretaria da Educação mata a nossa Autonomia, essa capacidade de aqui procurar definir um pensamento acerca do futuro, de aqui estruturar, com inteligência negocial, um quadro de referências estratégicas que, paulatinamente, assegurem um futuro melhor.
Senhores Deputados, é muito complexa esta tarefa. Não contem connosco para facilitismos, pois continuaremos apostados em defender uma Escola pública moderna e de qualidade que constitua referência na Região e no País.
NOTA:
Leio no Jornal da Madeira, no dia que se "debateu" o Estado da Educação na Região, uma peça jornalística (nada de propósito, credo!!!) com o título "Governo Regional abriu 83 escolas em 15 anos", fora o redimensionamento e modernização de outras. Ora, uma política educativa séria não se esgota na construção das infra-estruturas. Para isso a Madeira dispôs de muitos e muitos milhões de financiamento europeu, entre outros. Obrigatoriamente, tinham de surgir novas instalações. É óbvio. O problema que se coloca é o de saber que tipo de instalações e sobretudo, quais as características deste sistema aos níveis organizacional, curricular e programático. No fundo, o que se está a fazer no interior das escolas. Porque construir infra-estruturas constitui a parte mais fácil do processo. O que não faltam é empreiteiros desde que haja dinheiro.
E aquilo que se está a fazer não garante futuro. Os resultados falam por si. E cai por terra essa peregrina defesa que há 30 anos tínhamos mais analfabetismo! Hoje, o analfabetismo é outro, meus senhores. Tentem perceber isso. Falem com os professores, falem com os parceiros sociais, falem com os investigadores e analistas. Falem e vão perceber o que se passa.
Ilustração: Google Imagens.

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