Adsense

sexta-feira, 8 de abril de 2011

TRABALHOS PARA CASA (TPC)


Ora, Senhores  Professores é caso para dizer que numa família há mais vida para além da escola. Desculpem, mas pedir às crianças e aos pais para fazerem trabalhos entre o jantar, a higiene pessoal e a hora de ir para a cama, depois de terem passado dez horas e meia na escola, apetece perguntar o que fizeram durante todas aquelas horas. Se não é tempo suficiente ou há algo de errado no sistema (...)


Acabo de ler um importante artigo de opinião, na edição de hoje do DN-M, da autoria do Dr. Paulo Santos. Colocou, enquanto pai, o dedo na ferida. Uma questão, aliás, que tem merecido a minha preocupação, inclusive, no plano legislativo, mas que tem esbarrado com a incompreensão dos decisores políticos. Deixo, para já, um excerto desse artigo que aconselho a sua leitura:
"Vêm aí as férias da Páscoa e claro as crianças vão trazer para casa uma montanha de trabalhos escolares para fazer. Esta questão é cada vez menos consensual sobretudo na medida que escola foi passando a ser a tempo inteiro. Pergunto-me se as mais de dez horas e meia diárias, durante 5 dias por semana que as crianças passam na escola, não são suficientes para esta cumprir o seu papel educativo? A minha filha mais velha teve a sorte de encontrar uma professora que durante 4 anos não sentiu necessidade de mandar trabalhos para casa e as vezes que o fez contam-se pelos dedos das mãos. Hoje, já no 2º ciclo, é uma boa aluna cujas notas variam entre o 5 e o 4.
Com a minha filha mais nova já a história tem sido muito diferente. Os TPC foram até ao 3º ano às carradas, diariamente. Este ano conseguimos que os trabalhos fossem reduzidos apenas para os fins-de-semana mas mesmo assim é de fugir. E agora chegam as férias e se acontecer como nas férias do Natal será um verdadeiro carregamento de trabalhos para fazer em casa. Ora Senhores  Professores é caso para dizer que numa família há mais vida para além da escola. Desculpem mas pedir às crianças e aos pais para fazerem trabalhos entre o jantar, a higiene pessoal e a hora de ir para a cama depois de terem passado dez horas e meia na escola, apetece perguntar o que fizeram durante todas aquelas horas. Se não é tempo suficiente ou há algo de errado no sistema, ou os professores são incompetentes ou estão erradamente convencidos que as crianças não precisam de brincar, de estar com a família e os amigos noutras circunstâncias e noutros ambientes diferentes do escolar. Ainda ontem um especialista na matéria dizia numa acção de formação, aqui no Funchal, que as crianças devem brincar pelo menos 4 horas por dia… Por outro lado transformar os dias, os fins-de-semana e as férias num inferno devido à tensão que se gera entre filhos e pais por causa desses malditos trabalhos de casa é algo que não é moralmente legítimo aos professores. Então as horas da biblioteca ou do estudo não deveriam servir para complementar a acção do professor? Que fazem as crianças neste tempos previstos nos horários escolares?"
Acontece que apresentei, em 2009, salvo erro, um projecto de Decreto Legislativo Regional subordinado ao título: "Regime Jurídico do Sistema Educativo Regional". Foi literalmente chumbado pela maioria PSD na Assembleia Legislativa da Madeira. Nessa altura e a este propósito, cruzei toda a legislação existente em vários países europeus e li muitos autores que se debruçaram sobre esta questão. E para não atormentar consciências políticas adormecidas por anos a fio de rotinas, no Artigo 13º, ponto 14, não indo tão longe quanto desejaria, desenvolvi:
"1. No 1º e 2º ciclo do ensino básico estabelecem-se, globalmente, os seguintes tempos relativamente aos designados trabalhos para casa (TPC):
a) No 1º e 2º ano do 1º ciclo não são permitidos;
b) No 3º ano do 1º ciclo as tarefas não podem exceder os 20 minutos;
c) No 4º ano do 1º ciclo as tarefas não podem exceder os 30 minutos;
d) No 5º e 6º ano do 2º ciclo as tarefas não podem exceder os 45 minutos;
2. No 3º ciclo do Ensino Básico, o estabelecimento dos critérios transversais de todo o currículo é da responsabilidade do Conselho Pedagógico e a da execução é dos Conselhos de Turma, considerando sempre as necessidades de consolidação da aprendizagem e o tempo disponível para outras actividades complementares, de lazer, de natureza cultural e desportiva desenvolvidas pela sociedade".
Ora, o problema dos TPC é extremamente complexo. Está em causa, desde logo, a organização social onde se insere o mundo do trabalho. É essa organização social que tem de ser reequacionada. Não é por estarmos durante mais horas envolvidos no trabalho profissional que teremos uma maior produção, como não é pelo facto de um aluno estar mais horas na Escola que acrescentará valor à aprendizagem. E se a organização social (familiar, inclusive) está em causa, também está a organização escolar e esse mundo de coisas inúteis que preenchem os programas. Há muita tralha, isto é, muito acessório em detrimento do essencial.
Ao lado deste aspecto corre a Escola a Tempo Inteiro, esse derivado da desorganização social. A ETI surge para remediar um problema de ocupação dos pais. Esse "armazém" de crianças como lhe chamou o Dr. Daniel Sampaio. E como se isto não chegasse, temos os docentes, preocupados com a sua avaliação de desempenho, não com uma CULTURA DE DESEMPENHO, onde os resultados são importantes através do cumprimento dos programas. Escreveu o notável Rubem Alves: "para a burocracia, o importante é o que vem no relatório, não as crianças". 
Mas há tanto a dizer sobre isto. Para já, obrigado, Dr. Paulo Santos pelo seu testemunho.
Ilustração: Google Imagens.

Sem comentários: