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sexta-feira, 3 de junho de 2011

FOME DE PODER NAS COSTAS DOS ELEITORES


(...) quando a televisão mostra o excepcional, diferente, estranho, curioso, insólito, rompe a estabilidade psíquica do telespectador e ameaça a sua consciência feliz". E mais adiante, Aor da Cunha volta a ser citado: eles "cumprem uma finalidade não incomodante, não provocadora de tensão, ao mesmo tempo que  conseguem fazer a industrialização da cabeça".


Ainda o povo não votou, ainda tudo pode acontecer, e nos bastidores já se assiste a uma luta de galos para saber quem fica com as pastas da governação. Há uma espécie de leilão: dou três ministérios, é pegar ou largar. Não, exijo quatro, é pegar ou largar. Ora, quando o exercício da política chega a este ponto, de total desrespeito pelo veredicto dos eleitores, quando dois partidos denunciam uma clara fome de poder, o povo tem razões de sobra para desconfiar. Aliás, não me lembro, desde 1976, de um tamanho descaramento. Primeiro, deveria estar o respeito pelo acto eleitoral democrático; depois, vença quem vencer, então sim, após o Presidente da República estudar as circunstâncias e convidar um partido a formar governo, nessa altura é que devem decorrer os contactos e os necessários acordos. Antes de cumprido todo o processo eleitoral é ridículo o espectáculo público das cadeiras do poder. Com alguma tolerância, aceito a existência de consultas de bastidores, tão aceitáveis entre o PS e a esquerda como entre o PSD e a restante direita. Trazê-las para a praça pública, directa ou indirectamente, constitui um acto desrespeitoso para com os eleitores a quem compete decidir naquele momento solitário de colocação de um X no boletim de voto.
Esta pouca-vergonha diz bem do estado da nossa vida política, dos grandes interesses que se movem para além das palavras ditas. Não suporto aquele e outros comportamentos com os quais me confronto todos os dias. Não suporto, por exemplo, a pouca-vergonha de um governo regional da Madeira (ou de outros) que, em plena campanha eleitoral, todos os dias inaugura qualquer coisa: uns metros de estrada, uma obra privada, uma praceta, aproveitando o momento para o discurso que serve de palco de campanha. Tudo é aproveitado para formatar a opinião pública.
Li, há já alguns anos, o livro de Jorge Campos, A Caixa Negra - Discurso de um jornalista sobre o discurso da televisão. Na página 30, o autor cita Aor da Cunha, onde sublinha que, a título de exemplo, o Telejornal não cumpre  a função de noticiar ou divulgar factos respeitantonde sublinhas à sociedade, reflectindo-a. Pelo contrário, a função do Telejornal é a de "moldar, esticar ou comprimir imagens com textos que reproduzam a vida política, social, cultural e económica à sua maneira, conforme critérios ideológicos e particulares do momento, não só dos jornalistas, mas segundo os proprietários de emissores (...) quando a televisão mostra o excepcional, diferente, estranho, curioso, insólito, rompe a estabilidade psíquica do telespectador e ameaça a sua consciência feliz". E mais adiante, Aor da Cunha volta a ser citado: eles "cumprem uma finalidade não incomodante, não provocadora de tensão, ao mesmo tempo que  conseguem fazer a industrialização da cabeça". Tudo isto corresponde ao que W. Schramm (The Process of Effects of Mass Comunication) define como a "teoria da propaganda e sobre a propaganda". Na verdade, salienta Jorge Campos, "desde sempre as comunicações estiveram ligadas às estratégias de poder". Um pouco por tudo isto, li em Umberto Eco que "a civilização democrática salvar-se-á unicamente se da linguagem da imagem se fizer um estímulo à reflexão crítica e não um convite à hipnose".
Umberto Eco tem razão, mas essa reflexão crítica só será possível se a ESCOLA for escola, se a ESCOLA constituir-se em um instrumento de libertação e não de condicionamento. Até lá, os gestores dos media continuarão a ser os gestores das mentes, pois eles, como adverte H. Schiller (The Mind Managers): "criam, processam, refinam e presidem à circulação de imagens e informações que determinam as nossas crenças e atitudes e, em última instância, o nosso comportamento". Entre outros, saliento eu, em quem votar. 
Volto ao princípio, à distribuição ou leilão dos lugares, para dizer que esse facto não mereceu "que eu tenha dado por isso), uma veemente análise e condenação pelos tais "gestores das mentes". Tudo parece normal nesta anormalidade política. Até o comentador da TVI, Professor Marcelo Rebelo de Sousa apareceu num comício do PSD. Como se poderá levar a sério um comentador que se presta a este serviço partidário?
Ilustração: Google Imagens.

5 comentários:

Carlos disse...

Que pruridos os seus. Se o CDS e o PSD vão distribuir ministérios, ainda bem. Veja lá o que fazem Sócrates e os amigos para manterem os tachos (os mesmos a que você se refere) depois do descalabro que foi a sua desgovernação que nos colocou de joelhos a precisar de 78 mil milhões para não cair na bancarrota.

André Escórcio disse...

Obrigado pelo seu comentário.
Por favor, não me confunda com situações que não aceito. O meu comentário teve e tem outro alcance. Deve ter, certamente, percebido.
Quanto à desgovernação... meu Caro, terá tido o mesmo sentimento, quando os socialistas passaram o défice de 6,83% para menos de 3%, isto é, antes de "rebentar" uma crise que devastou todo o Mundo?
Sabe, eu não gosto de ver só para um lado. Olho de forma abrangente e faço um juízo. A vida política, não a partidária, ensinou-me isso.

André Escórcio disse...

Obrigado pelo seu comentário.
Por favor, não me confunda com situações que não aceito. O meu comentário teve e tem outro alcance. Deve ter, certamente, percebido.
Quanto à desgovernação... meu Caro, terá tido o mesmo sentimento, quando os socialistas passaram o défice de 6,83% para menos de 3%, isto é, antes de "rebentar" uma crise que devastou todo o Mundo?
Sabe, eu não gosto de ver só para um lado. Olho de forma abrangente e faço um juízo. A vida política, não a partidária, ensinou-me isso.

Espaço do João disse...

Meu Caro André.
Não venho advogar defesa, mas dar crédito ao comentário anterior é a mesma coisa que chover no molhado.
Não reparou que o indivíduo deve ser "ciclope"? Lembra-se quando Durão Barroso quis empurrar Guterres para a E.U.? Esse de Carlos deve pertencer à antiga FNAT( Famintos Nacionais Agarrados ao Tacho ) . Esqueceu-se quem destruiu as pescas, a pecuária, a Agricultura,a indústria siderúrgica, a indústria Naval, s texteis entre tantos, trocando pelo betão.
Dar resposta a mentacapos , é o mesmo que dar pérolas a porcos.
Portugal governado por espantalhos e imberbes irá longe.
Digo espantalhos para não ofender os palhaços.
Um abraço solidário.
João

André Escórcio disse...

Obrigado pelo seu comentário.
Caríssimo João... a sua saúde?
Recomposto?
Um abraço.