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quarta-feira, 22 de março de 2023

Rui Nabeiro

 

Partiu o Senhor Comendador Rui Nabeiro. Tal como a esmagadora maioria dos portugueses, apenas o conhecia pela sua imagem, pelo sorriso doce e contagiante, pelo seu indisfarçável mas sempre discreto amor aos outros. Confesso que me comovi e as lágrimas caíram ao escutar tantos testemunhos das humildes gentes que, carinhosamente, o consideravam o Pai de Rio Maior. E morreu no "Dia do Pai". Há coincidências que não passam disso mesmo, mas que nos tocam. 



O Senhor Comendador Rui Nabeiro era uma personagem invulgar. Muito maior que um qualquer percurso académico, que uma qualquer cátedra, ele era um doutorado nessa arte de ser humilde, construindo, multiplicando e valorizando os outros. A sua oratória era a do Povo. A palavra espezinhar não fez parte do seu léxico. Tanto que um dia disse: "(...) Podíamos ter as coisas mais automatizadas, mas eu prefiro dar mais empregos". E não deixou de gerar um império comercial, sobretudo porque as pessoas estavam sempre em primeiro lugar: "(...) Uma coisa que nunca dispenso é o olhar para as pessoas. Gosto de saber qual é a origem, quem é a família, de quem é filho, de quem é neto, com quem está casado... a pessoa nunca é pessoa só por ela". No essencial, o Senhor Comendador Rui Nabeiro contrariou e bem aquilo que li em Peter Drucker: nesta sociedade doravante só haverá lugar "para os rápidos e os mortos". 

"Ele não foi por aí...", por aproximação a José Régio no Cântigo Negro, quando todo o mundo corria e corre, de forma egoísta, gananciosa, exploradora, de cada um por si e sem qualquer sentido moral, ético e de responsabilidade social. Ele não foi nas palavras mansas de um mundo que empurra para o fanatismo sem dó nem piedade. Ele procurou o seu caminho desde aquele distante ano que fez a sua quarta classe, como um dia sublinhou, "com audácia e atitude". Sentia-se, por isso, um "privilegiado" por ter uma atitude diferente dos outros. E construiu o seu comportamento ditado por disposições interiores, a sua atitude perante a vida, no pressuposto que o êxito e a felicidade dos outros constituiria o seu próprio êxito. No essencial, como costumo resumir perante este mundo de fanáticos, aldrabões, mentirosos, intolerantes e obsessivos, "se sou feliz, por que razão os outros não o são".

Até no momento da morte de um Homem que não foi de Rio Maior, mas de todo o País, o nosso País não conseguiu ir além das palavras elogiosas de circunstância. Esperava que a esta singular e incontornável figura portuguesa fosse declarado, pelo menos um dia de luto nacional. Mas nem isso. Ficou, apenas, ao nível das autarquias da região onde desenvolveu a sua actividade. Parece que o luto nacional só está reservado às mais altas figuras do Estado em exercício ou quando morrem. Mesmo que tenham deixado um rasto de pessoa pouco querida. E aquelas e os factos por elas protagonizados ao longo da vida, questiono, pouco contam? Mas as gentes, o verdadeiro povo, não o esqueceu.

Ilustração: Google Imagens.

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