Por
Edgar Silva*
13/06/2025
7Margens
Quer com o povo de Machico ou com o povo do Porto Santo, para onde foi nomeado para ser pároco; quer com o povo maconde, na província de Cabo Delgado, a norte de Moçambique, onde esteve como capelão militar, onde aprendeu a língua e as tradições, para aí mergulhar nos cantares, naquela cultura de África; ou na forma como se inseriu na Ribeira Seca, e resistiu a tantas investidas por parte dos senhorios desta terra; nessas e em tantas outras etapas históricas, o padre Martins deixou-se nortear pelos “rubros clamores de amanhã”.
Multiplicaram-se, desde ontem, dia da sua passagem, as reações da parte de tanta gente que reconhecia no padre José Martins Júnior aquele que apressa a caminhada para o Homem de amanhã, para a cidade outra. E foi esse compromisso que formou o seu rosto, a sua identidade, a sua opção fundamental. Com o povo. Com cada povo.
Quer com o povo de Machico ou com o povo do Porto Santo, para onde foi nomeado para ser pároco; quer com o povo maconde, na província de Cabo Delgado, a norte de Moçambique, onde esteve como capelão militar, onde aprendeu a língua e as tradições, para aí mergulhar nos cantares, naquela cultura de África; ou na forma como se inseriu na Ribeira Seca, e resistiu a tantas investidas por parte dos senhorios desta terra; nessas e em tantas outras etapas históricas, o padre Martins deixou-se nortear pelos “rubros clamores de amanhã”.
O padre Martins Júnior marcou a História pela forma como desenvolveu a trajetória da Igreja que nasce do povo. Mais do que para o povo, o padre Martins faz parte dessa memória viva da Igreja a partir do povo. A Igreja – Povo, no que comporta de compromisso com o mundo e com a História. A Igreja – Povo, que aprende a conviver diariamente com seus problemas, com suas lutas, com suas dores e sofrimentos.
O padre Martins assumiu “o povo” como princípio hermenêutico determinante da compreensão da sociedade e da História. Povo: com uma história comum; um estilo de vida; uma cultura; e um projeto de bem comum compartilhado. E em cada lugar da sua itinerância, o padre Martins exerceu uma invulgar capacidade de encontro com o povo. Com cada povo semeou a palavra, disponibilizou os seus saberes, a poesia, a música, as suas competências. Participou nas lutas dos povos e na promoção de sua integridade humana.
Talvez por isso, mas não só, o padre Martins fez parte de sectores do catolicismo que poderemos classificar como de um “catolicismo atuante”. Esses católicos teimavam em querer a transformação da sociedade, a resolução das desigualdades, a edificação do ‘Homem Novo’. Daquela intervenção militante resultavam exigências de natureza política, ou de alteração do regime político.
O padre Martins fez parte de uma memória acerca do modo de viver consequentemente a fé cristã e de um tempo em que no cristianismo uma teologia política exigia uma teologia da revolução. Fez parte de um contexto histórico contemporâneo em que fé e revolução confluíam na vida de diversos sectores do catolicismo.
Através do crescente entendimento de que os católicos deveriam tomar partido pela humanidade dos oprimidos, pela justiça social, pela paz, pela democracia, o padre Martins Júnior esteve na vanguarda de tantas iniciativas e desenvolveu uma linguagem da espiritualidade de presença e compromisso social e político na sociedade.
Em cada um desses processos em que esteve envolvido, o padre Martins Júnior dá-nos conta de uma linha de compromisso social e político dos católicos e, na revolução portuguesa nascida a 25 de Abril de 1974, evidencia um marcante contributo dos católicos nos processos de transformação do país ao longo das últimas décadas.
Essa memória nunca se apagará!
*Edgar Silva é madeirense, doutorado em História, com a tese Vendaval de utopias. Do catolicismo social ao compromisso político em Portugal (1965-1976). Os católicos da Revolução e o PCP e é coordenador do Partido Comunista Português – Madeira.


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