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terça-feira, 28 de novembro de 2023

Neste Natal... a certos, sugiro a oferta de um espelho

 

Escrevo este texto desde logo separando dois âmbitos diferentes de análise: o da amizade, estima e consideração que nutro pelo Dr. Carlos Pereira, Deputado na Assembleia da República; dos posicionamentos e subterrâneos político-partidários. Não os misturo, de todo. Ser  um verdadeiro Amigo tem uma expressiva e abrangente dimensão, por isso, embora eu comungue dos princípios e valores que ele segue, quando, em algum momento, discordamos, preferível tem sido, frontalmente, assumirmos a dissonância. O debate entre o cidadão e o político deve ser assim.

 


Ora, vou ao assunto que aqui me traz. O Dr. Carlos Pereira, com o devido respeito por todos os eleitos da Madeira no parlamento nacional, independentemente do partido que representa, da minha análise resulta que tem sido uma figura distintiva entre os demais. Não me parece existir comparação possível. A leitura que faço é que se trata de um Deputado que não se perde em assuntos menores e na velha e gasta tecla de gritar a plenos pulmões a Madeira. É, politicamente, frontal e profundo.

Às vezes ouço sons em exagerados decibéis de lengalengas do tipo "timex", que não adiantam nem atrasam. Sobretudo, desusadas réplicas frágeis e primárias, quando o que está em causa são os temas que marcam e que se repercutem na vida das pessoas. Ele, não. Porque estudou e domina, como muito poucos políticos, os dossiês da Economia, sabe do que fala e por que fala! Aliás, o seu livro A Herança, publicado em 2015, devia ser de leitura obrigatória por qualquer político ou candidato ao exercício da política. Presumo que muitos não o tenham lido e muitos também não o tenham compreendido para melhor carregarem a essência da Região. Li-o três vezes para poder perceber a engrenagem económica e financeira desta região autónoma.

Portanto, quando li um recente artigo de opinião de um camarada do seu partido, falando não falando de Carlos Pereira, mas desancando-o e abrindo caminho aos interesses pessoais ou de grupo, talvez porque se aproximam eleições legislativas nacionais, pois bem, todo aquele arrazoado não transportava outra coisa que não a propaganda que se afasta das tais e prioritárias preocupações de quem é Deputado da Nação. Ficou-me a ideia de uma desesperada tentativa de chegar-se à frente (eu estou aqui) ou a colagem a um qualquer senhor que se segue no topo da hierarquia partidária. No essencial, trata-se de uma acção, useira e vezeira, para obter um resultado pessoal através do afastamento de figuras credíveis. É triste, feio e de consequências negativas.

Sempre defendi a qualidade e, por isso mesmo, sempre parti do pressuposto da existência de pessoas indiscutivelmente melhores do que eu. Essa a razão que me levou a nunca ter sido candidato à Assembleia da República (nem como suplente), muito menos ao Parlamento Europeu. Mas há figuras que se sentem indiscutíveis, com uma surpreendente leitura de si próprias. Conheço vários casos, um que trago em memória, de Machico, que nem para uma Junta devia ser convidado, porém é deputado e, pasmo, presidente de uma das principais Comissões Especializadas da Assembleia. São os tortuosos caminhos do poder. 

Espero que o Dr. Carlos Pereira, pela dimensão que tem, se mantenha na República e que, mais cedo que tarde, em função da sua qualidade, atinja o patamar da governação nacional. Sei do que falo porque com ele trabalhei vários anos.

Ilustração: Google Imagens.

sábado, 25 de novembro de 2023

Interessante



Quando fico a pensar no que se está a passar em Portugal, não vou mais longe, nas recentes e sucessivas trapalhadas do Ministério Público, nas declarações da Senhora Procuradora Geral da República, no "golpe judicial" que fez derrubar um governo de maioria absoluta, no alegado envolvimento de Belém, de forma directa ou indirecta no caso das gémeas brasileiras (ainda bem que foram tratadas porque se trata de seres humanos, porém não é isso que está em causa, mas sim a transparência), trago sempre em memória estas declarações do Dr. Paulo Portas. A história da Vichyssoise!

Nunca votei neste Presidente da República, mas reconheço que o Professor Doutor Marcelo Rebelo de Sousa foi uma lufada de ar fresco (também não era difícil) relativamente ao anterior presidente Cavaco Silva. Porém os seus "pecados" são muitos e esta caracterização de Paulo Portas ao programa de Herman José, ajuda a perceber muita coisa no tempo que estamos a viver. Como me transmitiu o meu Amigo Engº Arlindo Oliveira: "o vídeo já é antigo, mas vale a pena recordar o Marcelo cidadão".

 

segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Ministério Público: como chegámos aqui?


Por
Maria José Fernandes, 
Procuradora Geral Adjunta, 
in Público, 
20/11/2023





(Afinal ainda há gente com bom senso na corporação que é o Ministério Público. E não digam agora que a senhora não sabe do que fala. Sabe, e depreende-se que não pôde dizer tudo o que gostaria. 20 valores para esta senhora Procuradora. E, não precisando de valores, à Estátua só lhe competia publicá-la, e não falhámos. - Estátua de Sal, 20/11/2023)


Por estes dias, tenho sido abordada para me pronunciar em televisões sobre as adjacências processuais, jurídicas e políticas do caso que vem preenchendo os espaços da comunicação social e que deixou os cidadãos perplexos. Não aceito, pois não posso falar com total liberdade. Já os sindicalistas desfrutam desse privilégio e temos-lhes escutado afirmações controversas, cínicas no dizer de alguém.

Como foi possível acontecer tudo aquilo a que assistimos há duas semanas? Como se chegou até à tomada de decisões que provocaram uma monumental crise política e cujas consequências vão ainda no adro?

Uma coisa é certa: ver um certo político populista de extrema-direita monopolizar a defesa da atuação do MP, dá muito que pensar! Outros haverá que resguardaram o regozijo da crise por entre dentes e aguardam a sua oportunidade num silêncio de marketing.

O meu colega António Cluny escreveu um interessante artigo de opinião, onde destaca a atuação individual de cada procurador no despacho de inquéritos criminais, pelo que considera errado que o jornalismo se refira coletivamente ao MP como “autor” das decisões agora controvertidas. Conclui que a sua experiência na Eurojust lhe permitiu confirmar a necessidade de uma coordenação forte e ágil, por procuradores com legitimidade e experiência, sem o que não haverá sucesso na luta contra a criminalidade atual.

Originalmente, o MP foi concebido como um corpo hierarquizado piramidal, para representar o Estado nos tribunais, tendo no topo o procurador-geral da República, que dirigia, coordenava, determinava e dava instruções, plasmadas em diretivas. De permeio, entre o procurador-geral da República e os procuradores da base, a organização hierárquica é regionalista, coincidindo com os quatro tribunais da Relação. Desde há décadas, paulatina e persistentemente, o sindicato (SMMP) lançou e insistiu numa reivindicação de maior autonomia individual dos procuradores nas decisões que tomassem, em todas as áreas de intervenção, mas e sobretudo na investigação criminal. O que se pretendia era que cada procurador conduzisse os processos-crime sem interferências, ao seu grado, exigência que tem subjacente e camuflada uma desconfiança relativamente às hierarquias intermédias e superiores, a meu ver injusta e infundada. Porque há-de ser mais “autónomo” e idóneo um procurador da base do que um de topo? Desde logo, como em todas as profissões, há a excelência, a mediania e o sofrível, pelo que se impunha a supervisão do que fosse mais relevante.

Noutros estados europeus avançados, vigoram modelos interventivos diferentes. A gama é variada.

Na Itália dos anos 1980/90, como os leitores recordarão, a atuação autónoma dos procuradores era de tal ordem que começou a criar graves problemas de desestabilização e até de oportunismo político, com os resultados que se conhecem. Foi necessário introduzir normas de equilíbrio, ali por via de regulamentação interna.

Não há muito tempo, no processo do caso Tancos, quem investigava (DCIAP) pretendia inquirir como testemunhas o Presidente da República e o primeiro-ministro. O então diretor daquele departamento opôs-se e impediu tal diligência, por entendê-la inútil, tendo fundamentado a sua decisão num despacho próprio que entendeu dever ficar arquivado à parte. Gerou-se grande sururu dentro da corporação; sindicalistas clamavam que esse despacho tinha de ficar visível no próprio inquérito, outros que não, que podia ficar guardado no que chamamos “dossier de acompanhamento”, como acabou por acontecer. No fim, o desfecho do processo demonstrou que o hierarca tinha razão quanto à inutilidade de inquirir as duas altas figuras do Estado.

Acontece haver quem entenda a investigação criminal como uma extensão de poder sobre outros poderes, sobretudo os de natureza política. Daí que sejamos surpreendidos, de vez em quando, com buscas cuja utilidade e necessidade é nenhuma, pese embora quem as promove sempre se escude no argumento de opacidade: “Eu é que sei o que está no processo, eu é que sei se são necessárias ou não!” E a sorte é que até há pouco tempo o DCIAP dispunha de um tribunal de instrução privativo, com um juiz de instrução igualmente privativo por ser o único durante largos anos. O perfil decisório desse JIC era conhecido, não há constância de contrariedade ao MP. Maus hábitos.

Já noutra frente, a frase que não saía da boca de sindicalistas e de certas responsáveis máximas do MP era o “​​reforçar da autonomia interna”​ dos procuradores, empenho bem-sucedido, pois a autonomia não só foi reforçada, como até calafetada!

As personagens aludidas granjearam assim a simpatia e até quase camaradagem (em congressos) de certo jornalismo que segue as peripécias da corrupção atribuída a políticos e que tem a militância de deixar Portugal bem colocado nos rankings internacionais da percepção desse flagelo.

Desta sorte, procuradores que não hesitem em meios de recolha de prova intrusivos, humilhantes, necessários ou não, são o top da competência! Outros magistrados de elevado escalão que seguem esta linha argumentativa e a verbalizando no discurso público também têm o elogio garantido. Pelo contrário, quem se opõe à estridência processual é rotulado protetor dos corruptos! Neste enquadramento e sendo a nossa dimensão quase paroquial, poucos têm pulso para impor o que deve ser a sensatez, a escorreita interpretação jurídica dos factos, o respeito pelos direitos fundamentais dos cidadãos suspeitos, a investigação célere.

Em todos os departamentos de investigação e ação penal, mas mormente no DCIAP, deveria privilegiar-se o pensamento crítico, a discussão interdisciplinar, nomeadamente com colegas de outras jurisdições tocantes ou conexas; temo que se tornem cabines herméticas, onde pontuam algumas prima donnas intocáveis e inamovíveis e onde a “falta de meios”, de peritos disto e daquilo é sempre a velha razão para os passos de tartaruga a que se movem as investigações.

Permitiu-se a criação de uma bruma de auto-suficiência totalmente nefasta e contrária ao que deve ser a qualidade e a excelência desta profissão; os desfechos de vários casos já julgados permitem extrair que há aspectos do trabalho dos procuradores de investigação a carecer revisão e aprimoramento pelo exercício da autocrítica.

Uma investigação bem feita e fundada em provas irrefutáveis conduz a uma acusação de boa síntese factual e melhor incriminação nos tipos de ilícito aplicáveis ao caso. Um julgamento com esta base acusatória corre rápido e permite a quem julga uma decisão célere e bem fundamentada.

Não resisto e exemplificar, por curiosidade, o que deve ser a ponderação de conceitos no crime de recebimento indevido de vantagem, que tem como elemento objetivo nuclear o recebimento de uma vantagem patrimonial ou não patrimonial indevida.

O conceito de ​“vantagem patrimonial” não oferece qualquer dúvida interpretativa: é um acréscimo de património. Já a vantagem “não patrimonial”​ é de mais difícil recorte, podendo ser uma vantagem social. Assim, a oferta de um almoço num restaurante caro será uma vantagem? Em que se traduz essa vantagem? No prazer da degustação? E se o agente não apreciou a refeição, quid iuris?

terça-feira, 14 de novembro de 2023

Órgãos de Soberania sem sentido de Estado

 

Nota prévia
Estive fora do país, não acompanhei os recentes acontecimentos, portanto, o que aqui deixo enquanto breve reflexão, pode assentar em alguns aspectos que não consegui juntar ou compreender. De qualquer forma, o essencial da denominada "crise política" está na frente dos olhos de qualquer cidadão. 

Posto isto, parece-me óbvio que a situação que estamos a viver constitui uma consequência de muitas causas não equacionadas ao longo de muitos anos. Eu diria décadas. No nosso país falta-nos consciência cultural, rigor, disciplina conquistada pela compreensão das pessoas, brio, ambição, responsabilidade e noção de vergonha. Falta-nos escola séria que trave os oportunismos, a partidarite aguda, o dinheiro conquistado de forma fácil, os jogos subtilmente feitos nos bastidores, a ausência de uma mentalidade para aceitar lugares de gestão e administração sem que para eles as figuras estejam preparadas, política, científica e tecnicamente. As sucessivas gerações foram embrulhadas em definições dos manuais escolares, em testes e exames e o principal foi adiado, exactamente, a exigente formação do ser que não se coaduna com o ter a qualquer preço. Resvalámos sem sentido de responsabilidade e, muito menos, de Estado. Os princípios e os valores foram secundarizados e, portanto, desde os Órgãos de Soberania à comunicação social com a qual estamos confrontados, é evidente uma arrepiante "pobreza". Ninguém se safa neste processo que tem contornos dramáticos. Já lá vou ao cerne da questão. Nada que a Democracia não atenue, é certo, mas que é preocupante, obviamente que é.



Na decorrência deste estado de coisas é comum ouvir-se: "à política o que é da política e à Justiça o que é da Justiça". O drama é que se assiste a uma subversão dos dois espaços de intervenção que conduz a que ambos funcionem quase em roda livre. No exercício da política são evidentes os traços do poder pelo poder e, na Justiça, as costelas partidárias parecem levianamente claras. Na política há muitos erros de casting, prevalecendo as afinidades e as cumplicidades dos vários corredores, do que propriamente a preocupação na busca de cidadãos de notória qualidade e respeitabilidade social; na Justiça, pergunto, o que dela dizer, quando Procuradores e Juízes se envolvem em situações condenáveis; quando, entre outros aspectos (muito graves) investigações em "segredo de Justiça" circulam na comunicação social desde transcrições integrais de escutas, até os próprios interrogatórios dos juízes aos eventuais arguidos. Chega-se ao ponto de prender para investigar! A Justiça, em qualquer patamar, desejável seria que fosse discreta, profunda e célere, mas não, o cidadão confronta-se, sim, com o espectáculo mediático, com as estações de tv sorrateiramente "convidadas" a acompanhar as buscas, por exemplo! 

Ora bem, em meia-dúzia de dias, pasme-se, o Ministério Público fez cair um governo, levou o Presidente da República a marcar eleições legislativas e manchou, profundamente, a imagem de figuras que, até prova em contrário, devia ser protegida. Entretanto, caiu por terra uma investigação megalómana, baseada em supostos indícios, o que constituiu, segundo um advogado comentador, a uma "derrota profunda" do Ministério Público. Que não foi a primeira. Tenho presente o que, recentemente, fizeram ao Dr. Rui Rio! E agora, é lícito que se pergunte: que consequências resultam para os "investigadores" a consequente responsabilidade de vários meses de instabilidade e de um acto eleitoral (que tem os seus custos) do qual pode, eventualmente, redundar numa composição da Assembleia da República que torne o país ingovernável durante meses? A Senhora Embaixadora Ana Gomes assumiu que parte da opinião pública "desconfia que isto pode (configurar) ser um golpe de estado judicial". Não deixa de ser interessante esta posição, pois aquilo que alegadamente pode traduzir é uma alegada instrumentalização partidária do Ministério Público que coloca em causa a estabilidade do País e a própria credibilidade externa. E perante tantos e tantos casos, estranhamente, a Senhora Procuradora Geral da República continua a passar entre os pingos da chuva! Que raio de poder este ao qual ninguém põe um travão. E isto nada tem a ver com um quadro de Órgãos de Soberania. Tem a ver com os pressupostos de um regime democrático.

No meio disto, também o Senhor Presidente da República, pela sua postura hiperactiva, não soube esperar e zás, procurou o caminho mais fácil sem ter em conta as consequências. Teria sido, presumo, muito mais sensata a indigitação de um novo primeiro-ministro. Uma nova figura que, certamente, a partir do cansaço da população relativamente a tantos casos embaraçosos, nomearia um governo formado por pessoas respeitáveis, credíveis e impolutas. Evitaria eleições, respeitaria os eleitores que votaram na actual maioria absoluta e evitaria, também, uma certa paralisação do país nos próximos meses. Por uma questão de bom-senso numa altura que a esmagadora maioria dos indicadores económicos são muito favoráveis. Um futuro governo pode, até, vir a governar com um Orçamento que não foi da sua responsabilidade!

Mas há fome de poder. Há uma necessidade de dar gás a um jornalismo pouco cuidado, ávido de sangue e sôfrego pela anormalidade, de tal forma que as suas audiências se mantenham no topo. E os Órgãos de Soberania, espantosamente, vão nisto. O estado a que isto chegou merece uma profunda reflexão.  

Ilustração: Google Imagens - Público.

segunda-feira, 13 de novembro de 2023

Primeira cimeira mundial sobre Inteligência Artificial


Por

Apesar da necessidade de regulamentação acolhida na Cimeira, a sua elaboração deve ser rodeada de muita perspicácia, inteligência e de alguma facilidade de adaptação e aplicação.



1. A primeira cimeira mundial dedicada aos riscos e regulação da Inteligência Artificial (IA) realizou-se, por iniciativa do Reino Unido, nos dias 1 e 2 de Novembro de 2023, em Bletchley Park, a norte de Londres, sem Joe Biden mas com Elon Musk. Esta cimeira reuniu 28 países e cerca de 100 empresas com negócios na área da ou para a IA.

Tratou-se de uma cimeira importante, em que participaram os três maiores países investidores em capital de risco IA (Jovens empresas/Start-ups). Segundo informação da OCDE, o investimento em capital-risco atingiu, em 2022, 100 mil milhões de dólares, somando os EUA 56,7 mil milhões, a China 21,5 mil milhões e o Reino Unido 7,1 mil milhões.

A China em segundo lugar e ainda a distância considerável dos EUA afirma que está em disputa pelo topo, pensando atingi-lo em 2030. Os EUA tudo fazem para dificultar o sucesso desta competição, designadamente proibindo a transferência da sua tecnologia para a China que algumas empresas exportadoras de chips, como a Nvídia, gigante americano das placas gráficas, têm sabido contornar.

Segundo a OCDE, os 27 países da UE apenas investiram 15,8 mil milhões de dólares, participando a Alemanha com 3,7 e a França com 2,8 mil milhões de dólares. Alemanha e França posicionam-se atrás da Coreia do Sul e Israel e muito próximas do Canadá, Índia, Singapura…

Esta informação permite olhar, com muito desânimo, para o quadro das grandes fragilidades da União Europeia (UE), em contraste com a sua ambição de pretender desempenhar um papel central na regulação da IA. Para Bruno Le Maire, ministro da economia de França, a regulação é importante, mas só será eficaz se, antes, os actores europeus dominarem a IA. E nisto transparece uma certa clivagem com a pressa de regulação por parte da Comissão Europeia, correndo-se o risco de com o processo em curso de regulamentação na UE se estabelecerem normas “pesadas”, difíceis de ajustamento futuro aos rápidos avanços na IA.

É isto que pensam e com razão as poucas empresas europeias que marcam posição na Inteligência Artificial.

Apesar da necessidade de regulamentação acolhida na Cimeira, a sua elaboração deve ser rodeada de muita perspicácia, inteligência e de alguma facilidade de adaptação e aplicação e não de uma legislação pesada como é timbre das regulamentações da União Europeia.

O debate


2. O debate foi longo, enriquecedor e vivo e nele foi posto em evidência a necessidade da regulação, como instrumento para acalmar os muitos receios gerados.

Durante dois dias, dirigentes políticos, peritos de IA e gigantes das tecnologias reunidos por iniciativa do Reino Unido – que pretende carimbar a liderança deste processo de cooperação mundial nesta tecnologia – debateram a IA, apresentando diferentes visões e apontando diversos sectores onde a sua aplicação terá maior impacto como a medicina, a educação, a economia, sem deixar, contudo, de realçar que poderá contribuir para a desestabilização das sociedades, por exemplo, se for permitida a sua incorporação no fabrico de armamento, sem controlo do ser humano.

Também se abordou o seu potencial impacto na distorção de resultados eleitorais pelos falsos conteúdos “perfeitos” que são possíveis de produzir com a sua utilização indevida.

Elon Musk, o controverso patrão de K, da Tesla e da Space X, bateu-se por uma arbitragem independente da IA (despolitizando-a!!), tendo declarado à comunicação social durante a cimeira que a IA constitui “uma das grandes ameaças que pesa sobre a Humanidade”.

A vice-presidente dos EUA, Kamala Haris em perfeita sintonia com Musk, também realçou “as ameaças existenciais da IA que poderão pôr em perigo a própria existência da Humanidade” e anunciou que os EUA vão criar em Washington um Instituto sobre a Segurança da IA, imitando aliás o que o Reino Unido anunciara vir a fazer.

Dois dias de reuniões bem positivas, porque, além de se colocarem na mesa os diversos ângulos de visão sobre a IA, houve uma declaração histórica sobre o assunto. Os pontos-chave dessa declaração são transcritos da UNITE AI/ETICA.

Pontos-chave da Declaração


3. A Declaração de Bletchley, que emergiu do consenso coletivo de 28 países, estabelece uma visão comum para promover a segurança e considerações éticas no desenvolvimento e implantação da IA. Os princípios básicos resumidos na declaração são os seguintes:

Cooperação internacional: É dada forte ênfase à promoção da cooperação internacional para navegar no complexo cenário de segurança da IA. A declaração enfatiza a necessidade de uma frente unida para enfrentar os desafios e aproveitar as oportunidades que a IA apresenta no cenário mundial.

Padrões de segurança: A declaração exige o estabelecimento e a conformidade de altos padrões de segurança no projeto, desenvolvimento e implantação de sistemas de IA. Isso inclui um compromisso comum para reduzir os riscos associados à IA e garantir que essas tecnologias sejam desenvolvidas usando uma abordagem baseada em segurança.

AI ética: Uma forte bússola moral orienta a declaração, destacando a importância das considerações éticas na IA. Isso significa garantir que as tecnologias de IA respeitem os direitos humanos, a privacidade e os valores democráticos, promovendo uma abordagem centrada nas pessoas para a IA.

Transparência e responsabilização: A declaração também sublinha a importância crucial da transparência e da responsabilização nos sistemas de IA. Isso é visto como a pedra angular da construção de confiança e da compreensão pública, que é essencial para a integração bem-sucedida das tecnologias de IA na sociedade.

Partilha de conhecimento: Incentivar a partilha de conhecimento e a pesquisa colaborativa entre as nações é um aspecto fundamental da declaração. Isso visa acelerar a compreensão global e a mitigação dos riscos relacionados com a IA, promovendo uma cultura de aprendizagem compartilhada e melhoria contínua das práticas de segurança da IA.

O Reino Unido a marcar posição


4. O primeiro-ministro britânico saudou no X (ex-Twitter) a Cimeira, designando-a de histórica e referindo que marca o início de um novo esforço mundial com o fim de reforçar a confiança das pessoas na IA, na expectativa da sua “segurança”.

O ministro da Tecnologia britânico, Michelle Donaton, que coordenou os trabalhos, afirmou em declarações à France Press que esta cimeira “não tem por objectivo elaborar as bases duma legislação mundial, mas acordar num caminho a seguir”.

O que se segue


5. Duas cimeiras internacionais ficaram previstas. Uma na Coreia do Sul dentro de seis meses (virtual) e outra em França e o Reino Unido a comprometer todo o seu empenhamento na criação de um Grupo de Peritos em IA com base no modelo que existe e funciona para o clima, o IPCC (sigla em inglês) ou GIEC (sigla francesa).

Nota final: O grupo intergovernamental de peritos para o Clima tem por missão a produção de relatórios anuais sobre os riscos decorrentes das alterações climática e a elaboração de propostas de medidas para minorar os efeitos dessas alterações. De igual modo, o Grupo de peritos em IA quando funcionar terá a seu cargo a produção de relatórios sobre a situação, a problemática das “fake news” e a temática do emprego.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.