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segunda-feira, 29 de maio de 2023

“O G7 não é bem-vindo”


Por
João Abel de Freitas, 
Economista

O verdadeiro motor dos últimos G7 pode sintetizar-se numa simples frase: como impedir a China de avançar como pólo dominante, a prazo, no Mundo.



1. Este o título de um cartaz que algumas centenas de japoneses empunharam numa manifestação no dia 14 deste mês de Maio, em Hiroshima, contra a realização da Cimeira do G7 naquela cidade, no fim de semana de 19 a 21 de maio.

As cidades de Hiroxima e Nagasáqui foram alvos de uma bomba atómica, cada uma e em dias diferentes, por parte dos EUA, nos finais da Segunda Guerra Mundial (6 e 9 de Agosto de 1945), sem qualquer justificação, que provocaram instantaneamente centenas de milhares de mortos. Um crime que ficou impune. Uma pura barbaridade, uma demonstração de dono e senhor do Mundo.

As centenas de pessoas presentes parecem um número reduzido, mas para o Japão, segundo a comunicação social europeia, é bem simbólico, pois não é país dado a grandes manifestações.

Os participantes condenavam a cimeira imperialista que se iria realizar ali, a guerra na Ucrânia e defendiam a abolição das armas nucleares. Presentes alguns dos poucos sobreviventes dos bombardeamentos (os hibakushas – termo japonês para designar quem sobreviveu à bomba atómica) e, sobretudo, descendentes e pacifistas que se pronunciavam contra o G7, porque vêem nele um agente promotor do armamento nuclear.

2. O G7 é constituído pelos sete países mais desenvolvidos, Canadá, França, Alemanha, Itália, Japão, Reino Unido e EUA e a União Europeia que não conta (diz alguma comunicação social, não sei se com alguma ironia!!), representada nesta Cimeira pelos Presidentes do Conselho Europeu Charles Michel e da Comissão Ursula von der Leyen.

O G7 convidou ainda uns quantos países como o Brasil, Índia, Indonésia. Os dois primeiros fizeram-se representar por Lula da Silva e Narendra Modi. É de pensar-se nas razões de um convite, sobretudo no caso do Brasil com Lula da Silva, distante em quase tudo das orientações e actuação do G7.

Houve ainda uma presença “star” com Zelensky. Mas, para este, a maior curiosidade é ter-se deslocado num avião oficial de França (pelo menos, era esta a pergunta que alguns jornais franceses faziam no domingo, dia 21/05), embora a sua presença seja bem o símbolo da perigosa escalada de guerra do Ocidente, tanto mais com a decisão de entrega do F-16. Onde irá parar esta escalada?!

Aprofundando um pouco a verdadeira agenda deste G7, em que a inteligência artificial era tema para “compor”, a guerra da Ucrânia também, embora com toda a encenação em torno da presença de Zelensky, o que se releva nesta Cimeira é a procura de um entendimento no G7 para enfrentar e deter a China na sua estratégia de influenciar, de forma persistente, a construção em andamento do Mundo.
A China não esconde os seus objectivos políticos de conquistar papel determinante, nas diferentes frentes e, definiu claramente essa estratégia em documentos aprovados pelos órgãos de governação. Este é o verdadeiro motor dos últimos G7, que se pode sintetizar numa simples frase: como impedir a China de avançar como pólo dominante, a prazo, no Mundo.

Sendo a China a segunda economia mundial, tendo o domínio de muitas cadeias de produção como se viu nos tempos de Covid-19 em que países tão desenvolvidos como os EUA e a Europa até para uma simples máscara tinham de recorrer à China, sendo detentora de terras raras, ou talvez mais correcto, de minérios críticos para a transição energética sobretudo nas energias renováveis, estando na vanguarda tecnológica de vários sectores, o entendimento EUA/Europa não anda fácil, pois a Europa tem um grau de dependência maior e os EUA estão apressados e pouco sensíveis aos interesses europeus.

Não duvido. Mais uma vez, os EUA vão impor os seus pontos de vista, como sempre acontece. Recordemos as sanções económicas à Rússia e os efeitos de ricochete sobre a própria Europa.


E com que Europa se desenrola “este negócio”?! Há cada vez mais dois blocos na UE. Ainda recentemente, o “clube dos países da energia nuclear”, por esta não estar a ser tida em plano de igualdade com as renováveis, bloqueou no Conselho Europeu uma decisão, aprovada antes em vários patamares. E este clube de países é menos dependente das terras raras que o das energias renováveis, comandado pela Alemanha.

3. Interessante referir que, neste mesmo fim de semana, também se realizou a Cimeira China-Ásia central, com uma agenda diferente: revitalização da economia e defesa dos países dessa zona. Uma agenda de cooperação entre países para o desenvolvimento e não de bloqueio ao desenvolvimento de países terceiros. E muitos serão os temas comuns de cooperação possível, onde certamente do lado da China não faltará a sua grande aposta na Nova Rota da Seda.

Interessante, também, referir que os cinco países participantes nesta primeira Cimeira China-Ásia central – que teve como anfitrião Xi Jinping – são antigas Repúblicas da ex-URSS (Cazaquistão, Quirguízia, Tajiquistão, Turquemenistão e Uzbequistão). E, neste contexto, esta iniciativa lá terá a sua leitura.

4. Bem longe da Ásia, aqui em Portugal, o mesmo fim de semana sediou uma Conferência do clube BILDERBERG de cujo teor pouco se sabe, dado o seu carácter secreto, mas que se cruza muito com os interesses do G7, onde também a Inteligência Artificial admito que, de forma mais aprofundada, foi tema, pois é fundamental no domínio do Mundo.

E os objectivos do clube Bilderberg, onde participaram os senhores da NATO, CIA e de grandes Tecnológicas, bem como ex- e Governantes de peso mundial, são bem rigorosos, pois debatem entre si os instrumentos de como aceder ao domínio das instituições mundiais de peso (ONU, FMI, Banco Mundial, etc. etc.) para gerir, a seu modo, os grandes problemas do Planeta.

Para escrever umas linhas mais sobre Bilderberg não resisti a reler algumas passagens do livro “O clube secreto dos PODEROSOS – os planos ocultos de Bilderberg” de Cristina Martín Jiménez (edição em português de 2015), um trabalho de investigação de muitos anos, de onde retirei duas, para mim muito definidoras, que cito: “Bilderberg é uma entidade que une o poder político e o poder económico, formada por pessoas com a capacidade suficiente para influenciar os acontecimentos históricos e converter a sua ideologia em leis parlamentares que mudam o destino da humanidade”.


“O que querem os bilderberg? O poder absoluto. Acabar com todas as liberdades e converter-nos em escravos do império Bilderberg. Os Senhores do poder reúnem-se às escondidas do mundo para alcançar três objectivos: a instauração de um único governo mundial, uma única moeda para um único mercado e uma só religião”. Conseguirão? Como diz a jornalista/autora do livro, há tanta coisa, de início, utopia como a criação da União Europeia (com influência Bilderberg) e ela aí está para o bem e para o mal. Estas cimeiras em simultâneo que todos defenderam um mero acaso devem-nos fazer pensar. Alguém está acossado!

Termino com a declaração de Narendra Modi que referiu ter vindo ao G7 para “amplificar as vozes e as preocupações dos países do Sul” e com uma informação: o peso económico dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul) ultrapassou em Abril o do G7 – 31,5% do PIB mundial contra 30%.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.

sexta-feira, 26 de maio de 2023

Bilderberg: A Câmara Corporativa global


Por
Hugo Dionísio, 
in Facebook
A Estátua de Sal
25/05/2023




As contradições entre o discurso proferido e a prática são tão presentes e monstruosas que, como uma qualquer mobília caseira, por elas passa o povo sem as ver, seguro que está de que, mesmo não as olhando, elas, inamovíveis, inexoráveis, incontornáveis, se encontram lá, intocadas, ocultadas pela indiferença de uns, pela cobardia de muitos e pela ignorância, de outros. É assim! É pelo peso excessivo da sua presença, que as ameaçadoras contradições, que tão árdua e crescentemente moldam as nossas vidas, são mantidas secretas.


Olhar para estas contradições é penoso, revoltante e tortuoso. O olhar deixa-nos revoltados, primeiro, para depois vir a amargura, a frustração, a depressão e, por fim, a indiferença causada pela sensação de impotência. Esta sensação de impotência também pode, no ignorante – sem culpa assim tornado -, ser transformada em ódio, regra geral, contra os menos culpados, contra os elos mais fracos de uma realidade que oprime de forma directa, mas também subliminar… Uma opressão que tantas vezes deixa escondida a sua origem real, a sua natureza e a sua causa. As consequências esmagam-nos com a sua realidade concreta, mas são as causas que oprimem.

É assim que sinto o que se passou em Lisboa, por estes dias, com a realização da 69ª sessão do Bilderberg. Antes totalmente secreto, não foi sem ameaça e vítimas que se tornou visível. Mas, uma vez mais, “visível”, não significa “reconhecível” ou “identificável” em relação ao que realmente é. Uma vez mais, o Bilderberg é uma das causas da contradição que nos esmaga.

O Bilderberg, assim chamado porque nasceu no Hotel Bilderberg nos Países Baixos, por iniciativa das pessoas mais ricas e influentes do mundo. À data, desse mundo constavam gente importante como a coroa britânica, neerlandesa, gente do clube de Roma e muitos outros, tratando-se de um clube restrito que constitui, na prática, a Câmara Corporativa do Império anglo-saxónico, conjugando os mais importantes interesses políticos dos partidos da governação (ministros presentes e futuros), os mais relevantes interesses económicos, comunicação social e defesa. A Indústria, hoje, ocupa um lugar pouco importante, tendo sido trocada pelas tecnológicas da internet.

Gente eleita pelo poder que o dinheiro compra dedica-se, durante alguns dias, a discutir o domínio do mundo e a sua repartição pelos interessados aí representados. Qualquer sinal de democracia é uma mera miragem ou utopia irrealizável. A democracia liberal, na sua forma milenar, garante a eleição dos mais fidedignos governantes que o dinheiro consegue comprar e a comunicação social promover, não mais sendo do que o instrumento histórico que garante um reinado sem convulsões, estabilizadas e desarmadas que ficam nas mentes e nas massas.


Para se ter uma ideia do “peso” real destas coisas da “democracia”, de Mário Soares para cá, apenas Passos Coelho não foi pré-aprovado pelo Bilderberg! Nada que não se tenha resolvido com uma presença após a eleição. Mas este facto marca tanto que, Passos não tem poiso nas mais importantes estruturas do poder ocidental. Para além dos Primeiros-ministros, já lá foram receber a bênção imperial e a cassette ideológica muitas outras figuras, de Medina a Rio, passando por Portas e muitos outros possíveis governadores. Apenas contam os dispostos a prosseguir o reinado neoliberal. Ninguém mais. Os identitários, que também os cá temos, disfarçados de “esquerda radical” fazendo o trabalho do Império, ficam na Open Society de George Soros. A Iniciativa Liberal está hoje representada também, através dos CEO’s do costume.

Passar pelo Bilderberg significa a iniciação nas coisas dos Deuses, significa sair da maralha que constitui o comum dos mortais, o acesso aos segredos divinos. E não se pense que é porta aberta a qualquer um que o consiga. Implica passar por determinados locais, principalmente durante a fase de estudo, pois são esses locais que garantem a formação (ou formatação) de ouro, platina ou diamante. Não acreditem quando vos disserem que um determinado “jovem” levantou (raise) milhões em investimento para uma start-up. Esse “jovem” teve de passar por determinados locais, ou não lhe colocam o dinheiro nas mãos. Desculpem revelar-vos que as portas do Olimpo não são igualitárias!

Para se ter uma ideia da importância destas coisas, este ano discute-se a Ucrânia, claro, a desdolarização, como não poderia deixar de ser, a “liderança” dos EUA no Mundo (não lhes chega o Ocidente), inteligência artificial para nos invadir as mentes, a China, India e Rússia, como factores dissonantes…

Se há guerra mundial; se o regime neonazi do comediante louco continua a receber armas, mercenários africanos e árabes a quem prometem dinheiro e cidadania europeia; se o regime que ocupa a Ucrânia continua a receber biliões dos nossos impostos; se o tik-tok é proibido - e com ele o acesso da China às coisas das mentes, do conhecimento e do dinheiro; se os nossos dados pessoais continuam ao dispor da CIA e FBI; se a soberania dos Estados-membros da EU se continua a degradar; se a EU continua a comportar-se como uma região administrativa do estado de Washington DC; se a inteligência artificial é colocada ao serviço da Humanidade ou dos interesses económicos… Entre outras decisões importantes, é ali que encontram a resposta que lhe trilha o caminho subsequente, mais tarde constatável nos “actos” de Úrsula, nas prioridades de Costa, nos ataques de Montenegro, nas efabulações da IL, na propaganda de Portas ou nos achaques de Costa. Nada sai fora da caixa, nem um milímetro...

O site noticioso http://www.epoch.com divulgou a lista de presentes. Entre as gentes da NATO, Comissão Europeia, Casa Branca e muitos ministros, é só escolherem entre banqueiros, CEO’s de tecnológicas, barões da comunicação social e jornalistas (os futuros directores de redacção é aqui que recebem a confirmação de um estrelato programado e recebem a medalha da ordem da propaganda do império), dissidentes russos, chineses e turcos, grandes firmas de advogados, todos, todos, mas mesmos todos, apenas do Ocidente. De Portugal a lista é a seguinte:

• Pinto Balsemão (o pólo de contacto para o país)
• Durão Barroso (não há maior servidor que este!!!)
• José Luis Arnaut
• Duarte Moreira da “Zero Partners” (consultoria financeira)
• Nuno Sebastião da Feedzai (start-up’s tecnológicas, unicórnios e outras formas de exploração)
• Miguel Stilwell de Andrade da EDP
• Filipe Silva da Galp

O quê? Acham que se chega a “CEO” de uma coisas destas, a “partner” de uma coisa daquelas, a ministeriável de um país da NATO, sem a devida bênção de quem realmente detém o poder de criar e destruir, com sanções, embargos, guerras e bloqueios tudo o que vive, nasce, cresce e morre? Acordem, que o processo é muito “democrático”. É esta a “eleição” que realmente conta! Quem ganhar esta “eleição”, passa a poder ganhar as outras todas!

Como? Sim… É esta verdadeira “eleição original”, uma primária a sério, que conta. Ganhando esta, um servidor fica capacitado para receber os milionários apoios financeiros, humanos e logísticos que compram tempo de antena nas TV’s, horas de comentário em hora nobre, convites para conferências e seminários televisionados, avenças em programas de encher chouriços e boa imprensa… Todo um exército a louvar as suas qualidades enquanto “eleito”. Esta “eleição”, a par de outras, como a da ida a Davos, funciona como um sinal apenas reconhecível pelos da mesma espécie. Todos os membros da matilha recebem o sinal, reconhecem-no e sabem como se comportar face ao mesmo. A partir daí, nasce um novo génio da lâmpada que nos passa a ofuscar a vida. Em vez de concretizar desejos, impede-os de se concretizarem. E o facto é que, a cada eleição, o povão afaga a lâmpada e sai sempre a mesma magia: o fim dos seus desejos e a constatação da terrível realidade.

Eis o que significa a “democracia” liberal. Lamento desiludir-vos… Mas, se pensavam que aquelas directivas comunitárias que se discutem no Parlamento Europeu, aquelas iniciativas da Comissão Europeia de que Úrsula tanto se orgulha e tantas agendas para isto e para aquilo que são aplicadas, as “recomendações” do semestre europeu, vinham mesmo do povo, como numa democracia, ou dos representantes do povo, como numa democracia representativa…. Lamento desiludir-vos, uma vez mais. Perante vós apenas tendes servidores e todos os “valores” europeus, não passam de buracos negros vazios de vida que nos sugam para a morte e a desgraça. A governação não passa de um processo de aplicação de regras estandardizadas que têm de ser seguidas, sob pena de punição severa.

Para terem uma ideia da forma como esta gente olha para o mundo e para os seres humanos que têm o “azar” de não pertencerem a esta meia dúzia de brancos iluminados, aqui ficam dois exemplos:

• Na Inglaterra os migrantes passaram a ser monitorizados 24/7 com pulseiras electrónicas como um qualquer cão que leva o chip. A gravidade assume proporções olímpicas quando o Primeiro-Ministro deste país, de ascendência indiana, permite a privatização das políticas de migração, o que levou cinco empresas do sector a afirmarem esta bela coisa: Multimilionário não é sinónimo de “livre”, muito pelo contrário;

• Na Florida (EUA) os cidadãos chineses foram proibidos, por lei, de comprarem propriedade (imobiliária, participações sociais em empresas, por exemplo), apenas e só por serem chineses. Isto acontece num estado governado por um descendente de migrantes Italianos. Se és chinês, levas com um carimbo da foice e martelo e… A ver vamos onde chega. Se não chegará onde tantas vezes já se chegou na história humana.

Isto são apenas dois exemplos do nível de traição de que esta gente é capaz. Depois falam do “crédito social” experimental na China. Mas poderíamos ir mais longe, nomeadamente a tudo o que é feito que nos trama as vidas (privatizações, PPP’s, perdões e isenções fiscais, concessões de exploração, reformas laborais, reformas dos serviços públicos, etc…), tudo sob a bandeira da “democracia” e “liberdade”, para acabarmos, todos os dias, mais prisioneiros da indigência.

Todos os dias acordamos um pouco mais pobres, todos os dias, pelo menos de há 20 anos a esta parte! Podem agradecê-lo também ao Bilderberg e aos vossos milionários preferidos! Tudo é negociado na Câmara Corporativa Global.

quinta-feira, 25 de maio de 2023

Estou farto e cansado


Por
Eduardo Marçal Grilo
25 de Maio de 2023

Nota
Esta manhã predispus-me escrever sobre a comunicação social e a política. Escrever que estou cansado de um ambiente verdadeiramente constrangedor. Antes passei os olhos pela imprensa diária e eis que dei com um artigo do Professor Eduardo Marçal Grilo, publicado na edição do PÚBLICO. Concluí que não valia a pena repetir o meu pensamento, porque ali estava e está tudo o que me apetecia desabafar. Convido-vos a lerem. 



Estou cansado e triste quando vejo os militantes dos partidos abdicarem de dizer o que pensam.
Sim, estou farto de quase tudo o que ouço e vejo à minha volta.

Mas também estou cansado de ouvir e ler sempre os mesmos a dizerem as mesmas coisas, como se conhecessem as soluções para todos os problemas, mas que nunca nos apresentaram uma única ideia ou proposta para a solução dos problemas com que o país se confronta.

Sim, estou farto de ver os políticos a criar conflitos inúteis, como estou farto de ver as televisões a massacrar os telespectadores com programas de futebol intermináveis e em que para entreter se criam conflitos sobre penalties, expulsões e foras-de-jogo.

Estou cansado de ler as notícias da corrupção que corrói a democracia e alimenta os populismos.

Estou cansado de ver os moderados sem voz e sem presença nos media.

Estou cansado e triste por ver pessoas “queimadas” na praça pública com notícias falsas ou com acusações infundadas.

Estou farto de ver títulos de jornais que não correspondem à notícia a que se referem.

Estou farto de conferências, colóquios e seminários em que os que falam e os que ouvem são sempre os mesmos.

Estou farto dos debates em que nós todos já sabemos o que cada um vai dizer.

Estou cansado e triste quando vejo os militantes dos partidos abdicarem de dizer o que pensam.

Estou farto de ver gente em lugares de responsabilidade comportarem-se como membros de uma associação de estudantes do ensino secundário.

Estou cansado e triste por ver deitados para o lixo trabalhos que foram feitos por organizações credíveis que só querem contribuir para melhores soluções para os problemas do país.

Estou farto da arrogância de alguns que nos querem impor as agendas das minorias.

Como também estou cansado dos excessos em torno da cultura de género.

Estou farto da arrogância de alguns que nos querem impor as agendas das minorias. 

Estou cansado das notícias que justificam que os processos judiciais se tornem intermináveis.

Estou farto dos que lucram com todo este emaranhado jurídico dos processos lançados pelo Ministério Público.

Estou também indignado com os processos lançados contra pessoas que, quando julgadas, se provou nada terem feito de mal.

Estou farto de ver incompetentes a exercer cargos para os quais não têm qualquer qualificação.

Estou cansado e farto de ver nas televisões o rigor substituído pelo espetáculo.

Estou farto de ver muita gente mais interessada em estar do lado do problema do que do lado das soluções.

E também estou cansado de ver que em certos casos são eles mesmos o problema.

Como também estou cansado dos que gostam mais de destruir do que construir.

Estou cansado de ver tanta inveja e tanta vontade de deitar abaixo os que fazem qualquer coisa que se veja.

Confesso igualmente que estou cansado das notícias sensacionais que duram menos de 24 horas, porque foram forjadas com objetivos inconfessáveis.

Estou cansado de não ver enaltecido o que de muito bom se faz em Portugal, seja nas empresas, nas universidades, nas escolas ou nos hospitais.

Como estou farto de ver aqueles que, como portugueses, gostam de se autoflagelar.

Estou cansado de ver televisão e até de ler jornais.

Sim, estou cansado de viver num país que adoro, mas que me traz grandes frustrações quase todos os dias.

Tanta frustração deve talvez ser da idade e da falta de paciência que tenho para aturar tantos disparates.

Nota final: estou triste, cansado e farto de muitas coisas, mas não sou um desistente.

Estarei sempre disponível para lutar contra os populismos e contra os inimigos da democracia, procurando que não nos toquem na liberdade e que, sem complexos ideológicos, se encontrem, com moderação, equilíbrio e bom senso, as soluções para os problemas que enfrentamos.

O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico

segunda-feira, 22 de maio de 2023

DE UM EX-PRESIDENTE E ACTUAL CONSELHEIRO DE ESTADO ESPERA(VA)-SE MELHOR


Regressei à base e estou a tentar acompanhar os acontecimentos. Alguns pouco me interessam porque são histórias repetidas até à exaustão; outros, merecem uma reflexão mais séria, quando os protagonistas são figuras de Estado. Neste quadro de preocupações, detive-me na recente intervenção partidária do ex-Presidente da República Doutor Cavaco Silva. Afinal, nada de novo saiu daquela boca. De um Conselheiro de Estado e que pelo exercício da política esteve mais de trinta anos, ressaltou, uma vez mais, um discurso desadequado e de certa forma odiento, aliás, na linha que constitui a sua marca. Respeito quem assim não o caracterize, mas para uma figura de Estado, pelo menos esta é a minha opinião, espera(va)-se visão, sensatez e distanciamento, sem perda de acutilância com palavras e expressões ponderadas. Não foi isso que li. O ex-Presidente foi de gosto amargo! Lamentável.




Entre vários documentos publicados, li um texto no site Estátua de Sal (Cavaco Silva - uma assombração) que aqui deixo para reflexão. E deixo-o simplesmente porque o ex-Presidente não é aquilo que alguns tentam vender. Ele está, no plano político, ao nível de outros que por aí andam a infernizar a vida de todos nós. De um político que foi o mais alto Magistrado da Nação espera(va)-se melhor. Mas é o que temos.

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"Ontem, para fazer esquecer a melhoria da perspetiva da notação da dívida soberana pela agência americana Moody’s, surgida na véspera, apareceu a liderar a oposição de direita o rancoroso Professor Aníbal.
Substituiu Marcelo, convicto de que, à semelhança das águas residuais, que podem ser recicladas, os ativos tóxicos podem ser branqueados.
Aníbal Cavaco Silva, catedrático de Literatura pela Universidade de Goa, Grande Colar da Ordem da Liberdade por desvario de Marcelo, não se livrará do passado onde teve a sorte de as intrigas de Marcelo e as assinaturas falsas o fazerem, na Figueira da Foz, presidente do PSD contra o democrata João Salgueiro.
Marcelo, Júdice e Santana Lopes fizeram-no PM; Marcelo, Durão Barroso e Ricardo Salgado, ingratamente abandonado, prepararam na vivenda do último a sua candidatura vitoriosa a PR.
Mas não se julgue que o político videirinho foi apenas um salazarista beneficiado com a democracia, a que pretendeu abolir, conluiado com Passos Coelho, os feriados identitários do País, 5 de Outubro e 1.º de Dezembro.
Com o reiterado absentismo na Universidade Nova, para dar aulas na Católica, obrigou o reitor, Alfredo de Sousa, que o fizera catedrático, a levantar-lhe o processo disciplinar que o despediria por faltas injustificadas. Teve a sorte de ter como ministro da Educação João de Deus Pinheiro que lhe relevou as faltas e receberia em recompensa o Min. dos Negócios Estrangeiros.
O ressentido salazarista não foi apenas venal na docência, “mísero professor” no léxico cavaquista, foi igualmente no negócio das ações da SLN, para ele e filha, e no suspeito negócio da Vivenda Gaivota Azul, na Praia da Coelha.
Apesar de exigir que se nasça duas vezes para alguém ser tão sério como ele, há boas razões para pensar que sobra uma. Os seus negócios foram tão nebulosos como as razões do preenchimento da ficha na Pide, com erros de ortografia.
Ontem, o Professor Aníbal veio bolçar o ódio que o devora, depois de ter sido obrigado a dar posse ao primeiro Governo de António Costa, de ter então esbracejado e denunciado à União Europeia o perigo de um PM apoiado pelo PCP e BE. Exigiu que António Costa pedisse a demissão, apareceu nas televisões, rádios e cassetes piratas, e regressou aos sais de fruto enquanto a oposição de direita continuará a ser liderada por Marcelo.
O homem é assim, o salazarista inculto e primário que o marcelista culto, empático e igualmente perverso está a substituir com mais êxito."

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Como complemento, disponibilizo um texto do Engenheiro e Professor Universitário Carlos Paz, publicado em 2014, a que deu o título de "Uma Carta ao Presidente da República". AQUI

segunda-feira, 15 de maio de 2023

Em movimento para as Europeias 2024


Por
João Abel de Freitas, 
Economista

Um entendimento para a tomada de poder com repartição de benesses por todos move a união das direitas portuguesas. É a sua mira.



Direita tradicional em namoro com a extrema-direita

As grandes corporações partidárias em Bruxelas já estão em aquecimento, visando a preparação das Europeias 2024, cujos resultados serão um instrumento privilegiado no “assalto” às instituições da União Europeia.

As estratégias ao longo do tempo que nos separa das eleições, cerca de um ano, vão sendo ajustadas e dinamizadas segundo os dados do momento. Quem arrancou pela calada com alguma sobriedade foi o PPE, a maior coligação no Parlamento Europeu (PE), onde se encaixam os deputados portugueses eleitos no PE, do PSD e do defunto CDS. Mas, no xadrez político global, subsistem incertezas porque, em Espanha e Polónia, dois países importantes, há eleições em finais de 2023.

Incertezas também decorrem das candidaturas aos cargos de topo da União Europeia – Conselho Europeu, Comissão, Presidência do PE e Alto Representante das Relações Externas – e, ainda, se Ursula von der Leyen reúne apoios para se candidatar ou não a um segundo mandato. O Banco Central Europeu não está em causa, agora, porque o mandato é de oito anos.

Muitas incertezas!

A máquina do PPE arrancou sem grande ruído e já fez obra em articulação com a extrema-direita. O grande objectivo parece ser cortar as amarras mais ou menos informais de algum equilíbrio na distribuição de poder com socialistas e democratas nas estruturas da União.

Manfred Weber, Presidente do PPE, reuniu a 5 de Janeiro último, em Itália, com Georgia Meloni, presidente dos Fratelli d’Italia, partido da extrema-direita no poder e, segundo a comunicação social europeia, estão a procurar estabelecer pontes de cooperação no futuro pós-eleições. Aliás, o pedido de namoro do PPE a Meloni é apelativo, porque Itália é não só o terceiro país mais importante e fundador da UE, como uma colaboração concertada faz pender o poder em favor das direitas.

A extrema-direita também não vai perder a oportunidade na conquista de terreno por uma posição mais folgada, por país e no seio da UE. A primeira aproximação concretadeu-se com o aproveitamento do escândalo do “Qatargate”, que levou à prisão de uma vice-presidente grega do PE, socialista, destituída do cargo.
Nas eleições para a sua substituição, muitos deputados europeus do PPE votaram numa candidatura da extrema-direita em sinal de simpatia pela estratégia em negociação. Nos países europeus, está em marcha uma aproximação entre as duas forças e vários acordos (direita/extrema-direita) têm sido celebrados no sentido de segurar ou levar ao poder governos de direita ou de extrema-direita, como na Itália, uma forma de ir asfixiando a democracia.

A extrema-direita nos países da UE

A situação actual apresenta o seguinte figurino. Países governados pela extrema-direita: Itália (Fratelli d’Italia), Polónia (PiS), Hungria (Orban), sendo a Itália um dos fundadores da União; Países com participação da extrema-direita nos governos (Eslováquia, Letónia e Finlândia ainda em acerto de pormenores); Países com governos de direita apoiados no Parlamento nacional pela extrema-direita: Suécia.

A extrema-direita tem vindo a subir nos países da Europa, pelo menos desde 2015, com a crise dos refugiados, aproveitando o ambiente de grande instabilidade económica e social, um terreno ideal para o seu florescimento e, infelizmente, sem resposta consequente das forças democráticas no bloqueio a esta situação.

A pandemia, a inflação, a guerra da Ucrânia, trouxeram dificuldades acrescidas, mas foi essencialmente a falha de soluções para os problemas concretos dos povos que influenciou a implantação das forças de extrema-direita no terreno.

Em alguns países, como em França, a situação é crítica, com Marine Le Pen (terceira força política actual) à frente nas sondagens, com margens esmagadoras, e a esquerda em desagregação.

As pontes em negociação

A nível do PPE, a grande questão é o estabelecimento das pontes com a extrema-direita. A economia é um tema adquirido. A imigração tende a ser outro. A limitação de liberdades em certos domínios também, embora mais complexa.

Tendo em conta a campanha da extrema-direita italiana nas eleições, com o lema “Deus, Pátria e Família” e temas dominantes como as políticas anti-imigração, a diluição da separação de poderes entre os órgãos de soberania, a restrição de direitos de certas comunidades e minorias como a comunidade LGBTQ+ e as medidas recentes que, no governo italiano, estão a ser tomadas no domínio do Estado Social, a flexibilização dos contratos (aumento da precariedade do emprego), o corte de prestações sociais, facilmente se identificam os contornos dos temas que a extrema-direita oferece para as negociações com a direita tradicional.

A situação portuguesa neste contexto

Muitas têm sido as “declarações de afastamento” entre o PSD e a extrema-direita, recentemente proferidas por Luís Montenegro, que até já inventou umas linhas vermelhas para corresponder a Marcelo Rebelo de Sousa. Torna-se pouco crível que, vindo a tornar-se dominante esta linha de tendência na União Europeia, de tudo fazer para um entendimento com a extrema-direita, direita radical,
direita nacionalista, os partidos portugueses do PPE se afastem dela, tanto mais que, sem entendimentos entre si, a direita portuguesa tradicional dificilmente chegará ao poder, apesar da crise política latente em que o País se encontra mergulhado.

Aliás, o governo PSD nos Açores é bem a marca de que, quando cheira a poder, abatem- se as linhas vermelhas. O governo açoriano é um excelente ícone do entendimento entre as direitas portuguesas e até onde desejam ir.

Poderá dizer-se que o namoro agora é só com a Iniciativa Liberal IL). Até houve um almoço muito apresentado às televisões para mostrar, pelos sorrisos, que estão em franca harmonia para formar governo. Foi um almoço para mostrar a Marcelo que estão a trabalhar. Mas a IL, um tanto quanto abalada pelos abandonos, diferencia-se do Chega sobretudo na área dos costumes, mas bem mais radical quanto ao papel do Estado. Saúde e educação privatizadas, impostos iguais para todos. Estado Mínimo
numa palavra.

E se o lençol for curto? O Chega, que está na reserva (encoberto), será chamado à equipa principal? Sem dúvida. Um entendimento para a tomada de poder com repartição de benesses por todos move a união das direitas portuguesas. É a sua mira. Na crise política existente, Montenegro só não solicitou a dissolução da Assembleia da República porque sente que o PSD perderia de novo as eleições. O PR não dissolveu pelas mesmas razões. E entra numa estratégia de desgaste, o que não é difícil face à péssima gestão que este governo vem a fazer do seu mandato. Os dois protagonistas saíram-se mal, apesar da atitude positiva de rebeldia inesperada de Costa, que pôs a claro a tibieza e as frustrações de Marcelo, que andava abusivamente a pisar o campo dos poderes do Governo. O problema de António Costa é que a sua rebeldia não se apresenta escudada num programa convincente e com equipa capaz para a mudança de gestão que o País precisa. E ninguém me diz que esta falha de perspectivas não vá resultar, a prazo, numa dinâmica de esgotamento dos partidos tradicionais de todas as matrizes, como aliás vem
se estendendo na Europa. Uma nova composição partidária a termo com algum pântano de permeio.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.

quarta-feira, 3 de maio de 2023

A mosca


Há quem entenda que o exercício da política tem de assumir os contornos da maledicência, da ofensa gratuita e do rebaixamento dos adversários. Não entendo assim. Quem por esses caminhos envereda demonstra alguma soberba, alguns tons antidemocráticos e, sobretudo, uma clara falta de respeito pelos outros.



Esta semana escutei um desses momentos. O líder da bancada parlamentar do CDS, olhando para um deputado da oposição perguntou-lhe sobre a sua formação (académica, naturalmente) e, na ausência de resposta, terminou dizendo que talvez não tivesse sequer o 12º ano. Quando escutei tamanha deselegância, lembrei-me do poeta popular António Aleixo, falecido no ano que eu nasci:

(...)
Uma mosca sem valor
poisa c’o a mesma alegria
na careca de um doutor
como em qualquer porcaria.

Para não fazeres ofensas
E teres dias felizes,
Não digas tudo o que pensas,
Mas pensa tudo o que dizes.
(...)

Que grande António Aleixo, Homem "simples, humilde e semi-analfabeto", em discurso directo a todos quantos rebaixam os outros movidos pelos interesses pessoais ou de circunstancial grupo. Ora, na Assembleia estão os representantes do Povo, eleitos em sufrágio universal. A presença dos que lá estão não pode ser colocada em causa. Essa leitura pertence ao Povo e é, constitucionalmente, realizada de quatro em quatro anos. Portanto, o debate nunca pode ser sobre eventuais percursos académicos, mas sobre os conteúdos das propostas ali debatidas. Há deputados com uma auréola de doutor que pouco ou nada adiantam, enquanto outros, sem esse percurso, demonstram estudo, conhecimento e invulgar capacidade de argumentação. No próprio partido do deputado em questão.

Ilustração: Google Imagens.

terça-feira, 2 de maio de 2023

Chanceler Scholz, chefe de governo desentendido

 

Por
01 Maio 2023


Cada Estado-membro da UE é livre e soberano de escolher as fontes de energia e a exploração dos recursos como bem entende. Não deve, contudo, tentar manipular, como tem acontecido, para excluir o nuclear do Plano Europeu.



Em 15 de Abril de 2023, a Alemanha desligou da rede as três últimas centrais nucleares. Esta operação, prevista inicialmente para 31 de Dezembro do ano anterior, foi adiada, na sequência da guerra da Ucrânia, com receio do inverno, mas não se deu de forma concertada no seio do Governo, por oposição dos liberais cujo fecho consideraram um erro estratégico. Scholz caiu para o lado dos verdes com maior peso político no governo e que, desde há muito, se batiam por este desfecho.

Os activistas anti-nuclear saudaram o acontecimento, embora sem alardear grandes entusiasmos.

As reacções contrárias foram bem mais expressivas e diversificadas:

Uma carta aberta ao chanceler Scholz, subscrita por físicos, climatologistas e economistas especializados na matéria, incluindo dois prémios Nobel, onde se lia: “solicitamos que as centrais nucleares ainda existentes sejam usadas para alívio da crise energética e contributo das metas climáticas da Alemanha”. Assinale-se que, com a guerra da Ucrânia, devido à escassez de gás natural russo, a Alemanha accionou 26 centrais a carvão para prover necessidades energéticas, com impacto negativo devido ao acréscimo de gás com efeito de estufa (GEE) lançado na atmosfera, sendo a Alemanha, hoje, o país europeu mais poluidor;

O ministro-presidente do estado da Baviera, Markus Soder, mostrou a sua profunda indignação, afirmando que esta decisão de Scholz constituiu um perigo real para a Alemanha, porque perde, a longo prazo, a segurança de aprovisionamento de energia, sem qualquer fundamento científico e contraria a vontade do povo alemão, apenas por uma razão “de pura ideologia ambientalista”;

O líder da oposição Frederich Merz (presidente da CDU) em várias entrevistas à comunicação social afirmou que a saída da energia nuclear faz parte de uma política energética enviesada, quase fanática. “São reservas ideológicas e o mito fundador dos verdes que triunfam sobre toda a razão”.

A fechar este panorama, é de referir uma sondagem específica que mostra uma maioria qualificada do povo alemão contra o fecho dos reactores nucleares. Apenas 26% dos alemães dizem concordar com o seu desligamento.

Fatih Birol e a energia nuclear

Fatih Birol é o director executivo da Agência Internacional de Energia (AIE), um organismo autónomo ligado à OCDE, criado em 1974. Birol é um economista turco, especialista em energia e considerado, numa lista da Time de 2021, uma das 100 personalidades mundiais mais influentes na matéria.

Há menos de um mês, numa conferência em Paris na Science Po (5 de Abril 2023), Birol apelou aos países da União Europeia (EU) que se opõem ao nuclear a fazer “uma autocrítica séria das suas políticas energéticas” pois entende que, para além da envolvente externa (subentende-se a guerra na Ucrânia), a situação na Europa (atropelos profundos na política energética) se deve a “dois erros estratégicos maiores”, cometidos por alguns Países-Membros e pelas Instituições da União Europeia.

Para Birol, o erro de Bruxelas deve-se à desvalorização da energia nuclear, a que acrescento a sujeição das instituições da UE à posição da Alemanha que se nega a ter em conta os avanços da tecnologia nestes últimos tempos que certificam que a energia nuclear reúne as condições para participar na transição energética e no combate à crise climática e até, em certos domínios, com vantagens sobre as renováveis.

Quanto aos estados-membros, onde a Alemanha pontifica, diz que manteve “inúmeras discussões com o governo alemão e numerosas pessoas interessadas no tema que diziam que, mesmo durante a guerra-fria, a Rússia nunca cortou o gás”, mostrando os poderes públicos, desta forma, uma indiferença, uma posição naif nas questões de soberania energética e de segurança de aprovisionamento. Em seu entender, países houve, como a Alemanha, que puseram “os ovos todos no mesmo cesto a saber na Rússia”.

Cada Estado-membro, no quadro do Tratado de funcionamento da UE, é livre e soberano de escolher as fontes de energia e a exploração dos recursos como bem entende. Não deve, contudo, tentar manipular, como tem acontecido, para excluir o nuclear do Plano Europeu, impedindo o desenvolvimento de toda uma fileira industrial, tão determinante ao desenvolvimento, designadamente através do impedimento de financiamentos europeus e tentar que, por exemplo, não se integre o hidrogénio de origem nuclear na directiva sobre energias renováveis (RED III), no que contou com o apoio de Portugal, entre outros países.

Para a Agência Internacional de Energia, o cenário de neutralidade do carbono prevê que a capacidade da energia nuclear a instalar no mundo duplicará até 2050 e terá “um papel importante para o objectivo zero de emissão” de carbono. A AIE reconhece, assim, um papel importante à energia nuclear na descarbonização da sociedade, ao lado das energias renováveis.

O G7 e a energia nuclear

O G7 inclui a Alemanha, Canadá, EUA, França, Itália, Japão e Reino Unido, os sete países, tidos como os mais industrializados do Planeta – um conceito algo discutível.

Reunido em Sapporo no norte do Japão, nos dias 15 e 16 de Abril último, o G7 analisou vários temas relativos à energia, não se comprometendo, por exemplo, com uma data para a eliminação gradual do carvão no sector da electricidade, apesar da grande pressão do Reino Unido, que apoiado pela França, avançou uma proposta para o ano de 2030, mas sem sucesso.

No campo da energia nuclear “formou-se”, quase diria, um G6, pois todos os países, com excepção da Alemanha, mostraram-se empenhados no desenvolvimento da energia nuclear, sendo o Japão, o país que mais tem defendido a mudança de política sobre a nuclear, uma vez que após Fukushima (2011) tinha decidido desligar paulatinamente os reactores. O Japão criou um programa de relançamento da nuclear, porque concluiu não conseguir fazer a transição energética sem o seu recurso.

Fatih Birol esteve presente nos debates deste G7.

De tudo quanto se disse, algumas ilações podem ser esboçadas.

A energia nuclear está a ganhar um papel de maior relevo na transição energética, embora, a nível da UE, esse reconhecimento esteja a enfrentar dificuldades acrescidas;

A União Europeia está cada vez mais dividida nesta matéria, tendo-se constituído o clube da nuclear que, neste momento, agrega 14 países;

A Alemanha continua na sua posição destrutiva e unilateral, a tentar boicotar a energia nuclear no “mix energético europeu”, agindo, desta forma, capturada por grupos económicos com grandes interesses nas energias renováveis que dominam e sabendo que, na nuclear, a sua tecnologia não é de primeiro nível.

Pensamos que este não é o caminho certo para uma política de energia sustentada na União Europeia. Pelo contrário, insistir nele pode levar a um cenário algo assustador para o Futuro da União Europeia.

Uma política energética concertada no seio da União, em que a energia nuclear faça parte da equação, em plano de igualdade com as renováveis, é futuro, independente das opções que cada país fizer.