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segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

Como qualificar a matriz da economia portuguesa


Por
20 Fevereiro 2023


Que tem faltado uma visão estratégica de suporte na qual estejam enunciados desígnios claros e uma articulação e coordenação entre os interesses públicos e privados, penso que estaremos de acordo.



Nos dias 6 e 8 deste mês, saíram no jornal “Público” dois documentos interessantes: “Há política industrial em Portugal?” do economista/Professor do ISCTE, Ricardo Paes Mamede, e a entrevista do ministro da Economia, António Costa Silva.

Estes dois documentos, bem diferentes em dimensão, conteúdo e visão estratégica, são interessantes porque podem ser lidos um pouco no sentido de captar elementos de reflexão para o tema crucial da economia portuguesa: Por que se gasta tanto dinheiro no país, há tanto tempo, sobretudo fundos comunitários, e a economia não arranca, não se consolida dinamicamente, não muda de matriz?.

Aproximo-me da opinião analítica de Ricardo Paes Mamede, na sua visão global de que não há uma política industrial em Portugal, tão necessária à mudança de perfil de especialização da economia, o que explica, em grande parte, a dificuldade de arranque do País para a mudança de matriz.

Concordo que não é com uma longa lista de medidas de política pública, avulsas, descoordenadas e, tantas vezes prejudicadas na sua eficácia por descontinuidades, que se irão produzir as transformações de fundo, apesar do uso de expressões como clusters, fileiras, apoio a marcas e patentes, internacionalização, protótipos, digitalização, etc., que caem bem no ouvido.

Que tem faltado uma visão estratégica de suporte na qual estejam enunciados desígnios claros e uma articulação e coordenação entre os interesses públicos e privados, penso que estaremos de acordo.

Já não sei se de acordo numa análise mais fina sobre a identificação do que serão actividades “mais promissoras ou sofisticadas”, pois aí há muita relatividade na forma de agarrar esta questão. Só a título de exemplo: será o calçado um sector sofisticado? O têxtil, um sector promissor?

Isto porquê? A política industrial deve, em minha opinião, contemplar várias camadas de medidas de política articuladas numa perspectiva dinâmica (que olhe para os elementos críticos do que existe), no sentido de ir consolidando e melhorando a sua competitividade e uma outra (ou outras) para sectores novos ou sofisticados, tipo fileiras do lítio ou do hidrogénio, que espero venham a ser bem sucedidas, apesar do mau arranque no que toca ao lítio, por uma manifesta falta de diálogo com as populações sobre estes investimentos.

Todas contribuirão para a mudança de matriz, porque evoluindo trazem apports de qualidade, modificando-a.

Já não estou de acordo na forma como está formulada a questão do turismo.

O turismo tem um papel significativo a desempenhar na mudança estrutural da economia. O turismo precisa de evoluir em múltiplas áreas, mas até há segmentos a explorar com forte inter-relação com outras actividades produtivas ou de serviços avançados, como o turismo da descoberta económica, a digitalização, a transição energética e porque não a dessalinização, um domínio atrasado no seu equacionamento em Portugal e que urge ponderar, requerendo uma revisão profunda de posicionamento do Governo no domínio da energia e ambiente. Porque não equacionar a eventualidade de um SMR (reactor) para fornecimento de energia a uma actividade tão consumidora?!

Quanto à entrevista do ministro da Economia, no meu entender, sofre de vários “pecadilhos” e algumas contradições, mas é informativa, embora não responda à questão levantada pela UTAO da (in)capacidade do PRR para grandes transformações.

Centrando-nos na parte do PRR, o ministro não se assume como “pai” do programa, mas como autor de um documento de visão estratégica, preparado em 2020 a pedido do primeiro-ministro, sobre o que fazer até 2030, com vista à transformação estrutural da economia portuguesa.

Como então referi num debate onde esteve presente António Costa Silva (ainda não ministro), continuo a pensar que eram muitos os temas equacionados num documento bem explanado a que faltava um segundo passo para a estratégia, exactamente o estabelecimento de prioridades.

Continuo a defender uma estratégia com uma linha condutora, apontando desígnios claros e uma mecânica de relacionamento eficaz entre os actores intervenientes no processo.

Uma estratégia de desenvolvimento requer focos de incidência precisos e em número reduzido. Esta a pecha do PRR, em que se apontam 53 agendas mobilizadoras, quando o próprio ministro, de algum modo, reconhece que são demais. O ideal seriam dez ou até menos, cinco/seis temas, admite.

Depois tenta justificar (quando confrontado com Espanha, que estabeleceu apenas 11 temas) que as 53 agendas decorreram de propostas das empresas e, por outro lado, já entrou no comboio em andamento. No entanto, com entusiasmo vai avançando, aqui e ali, com algumas imprecisões como quando diz “vamos ter a nossa fábrica de baterias eléctricas para carros, a nossa gigafactory“, a Northvolt sueca, que já tem a fábrica montada e espera o lítio refinado de Portugal (in “Público”, 13Fev2023).

Mostra um grande foco na mobilidade eléctrica, envolvendo a indústria de componentes, e diz estar em negociações com a VW para a fabricação de carros eléctricos em Portugal, para além da Stellantis que vai produzir um carro eléctrico em Viseu. Nada escapa ao senhor ministro. Até o fabrico de aeronaves tem no seu pensamento para localização em Ponte de Sor.

Bem, não vou enumerar todos os projectos de que falou, e muitos são ligados ao hidrogénio sobretudo no grande polígono industrial de Sines. Mas não deixou de referir outros polígonos como Braga-Guimarães-Barcelos- Famalicão e ainda a zona centro Coimbra/Covilhã. Muito boas intenções! A realidade, porém, apresenta-se um pouco mais complexa.

Quanto a condicionantes que emperram os trabalhos de transformação da economia nacional, aponta debilidades na Administração Pública que não contesto.

Simplesmente, nunca se refere à terceirização que tem sido feita, dando ao exterior muitas das funções técnicas, ficando com as funções mais burocráticas. Por exemplo, será que concentrar 60% ou 70% dos recursos humanos do IAPMEI em tarefas de verificação de facturas (como refere) não é colocar os quadros bem qualificados em subrendimento? Não haverá mesmo outra solução? Claro que há. E quem diz IAPMEI pode estender a outros Institutos.

Concordo com a constatação “Portugal tem um problema que é uma espécie de incapacidade de acção colectiva”, estendendo-a justamente não só ao Governo, mas a todo o país.

Não posso concordar, no entanto, com a afirmação do senhor ministro de que só as empresas criam riqueza e nenhuma hostilidade tenho contra elas. Mas então o trabalho do Estado em áreas tão fundamentais como a investigação, a saúde, a educação, etc., não cria riqueza?!

Penso mesmo que nesta visão reduzida e dominante do papel do Estado reside o grande bloqueio do salto da transformação estrutural da economia. Para concluir, uma mudança de mentalidade impõe-se. A questão é como fazê-la sem a renovação de conceitos anquilosantes, como o do papel do Estado.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2023

Como a desonra entrou no Altar


Por
06 Fevereiro 2023


Afinal, houve ou não houve imposição de requisitos pela Igreja, como afirma Carlos Moedas? Vaticano, Igreja Portuguesa, ou os dois? E qual o custo do cumprimento desses requisitos?



Ainda o altar não está erguido e figuras graúdas, civis e religiosas, deste país, já “nele” tropeçaram, algumas sem jeito, mas com tombos a deixar marca bem visível. A começar pelo Presidente da República (PR). Um tombo por culpa própria.

Há sempre os devotos, os que não têm dúvidas. Para os que não o são, a dúvida persiste. Marcelo Rebelo de Sousa conhecia e disfarçou o gasto previsto de cerca de 5,4 milhões de euros no altar-palco principal do Parque Tejo? A dúvida impregnou-se porque o Patriarcado de Lisboa começou por afirmar que o PR sabia os números, como a SIC bem noticiou.

Só no dia seguinte, numa conferência de imprensa (quinta-feira, dia 26/01), o bispo auxiliar de Lisboa, Américo Aguiar, (comenta-se, muito pressionado!) veio desdizer o Patriarcado e dizer que o PR e ele próprio (presidente da Fundação Jornada Mundial da Juventude) não sabiam e, à boa maneira ambígua da Igreja, de semblante “comovido”, afirma: “o valor magoou-nos a todos”, certamente inspirando um dos muitos motes dos professores na manifestação da Avenida dois dias depois: “Para os altares há milhões, para nós só uns tostões”.

Desculpem-me, mas o altar-palco (não incluo o recinto) não é um investimento de futuro. É um gasto absurdo de pompa e ambição. Bem sei que vai acolher muitos jovens de tenra idade, os 1000 cardeais que vão estar em cima do palco, mais 300 concelebrantes, certamente a maioria tão jovem como muitos dos cardeais, e ainda os convidados (que não se sabe quantos serão), onde se presume que o mentor do novo altar-palco, Carlos Moedas, vá figurar em destaque.

Li algures que, em todos os tempos, sempre houve, em Portugal, figuras políticas que uma vez nos cargos gostam de muita pompa e circunstância, sentem-se senhores de um País muito rico! Os inscritos na Jornada Mundial da Juventude (JMJ), pelo que se vai lendo, vão estar pouco em destaque no altar. Certamente, subirão depois para umas selfies com o PR. Senão, não é festa.

A Igreja

A Igreja, com a sua “velha e requintada sabedoria”, tentou “branquear” o escândalo dos milhões, mas não se saiu bem. O bispo auxiliar ao dizer que vai sentar à mesa as equipas ligadas ao projecto para reapreciação dos valores de custo da obra (sentou-os dia 2 de fevereiro, mas sem conclusões), foi pouco convincente e, sobretudo, não deixou de ir repetindo que a responsabilidade era/é da SRU – Sociedade de Reabilitação Urbana.


Depois, há ainda quatro altares (?) cujos custos de construção são uma incógnita. O do Parque Eduardo VII aponta para um custo de 1,5/2 milhões de euros. Assim, só em altares-palco a JMJ deverá reunir gastos na ordem de uma dezena de milhões de euros. Neste quatro, pelo menos, não houve a desvergonha de se dizer que são investimentos de futuro.

Custa ouvir o experiente e conceituado técnico, Engenheiro Segadães Tavares, o responsável da construção da pala da Expo 98, da autoria de Siza Vieira, dizer na TSF que não acredita que “a obra esteja pronta a tempo da realização da Jornada Mundial da Juventude” e na CNN: “Porquê esta solução? Há soluções muito mais económicas que não obrigam a estas intervenções”. E ainda os valores de que se fala “são um escândalo”.

Mas afinal houve ou não houve imposição de requisitos pela Igreja, como afirma Carlos Moedas? Vaticano, Igreja Portuguesa, ou os dois? E qual o custo do cumprimento desses requisitos? Foram esses requisitos que fizeram mudar o projecto inicial bem mais económico, que tinha sido apresentado ao Governo no Verão passado, pelo actual que, tudo indica, poderá ser ainda revisto, por efeito da opinião pública discordante?

Carlos Moedas insiste, o altar Tejo tem “este modelo” para responder aos requisitos impostos pela Igreja. Afinal, em que ficamos? Quem dará o tombo maior?

Carlos Moedas

Já não estamos no tempo em que a defesa da honra se resolvia através de duelo. Aqui, alguém tem a honra manchada. O bispo Américo Aguiar e o presidente Carlos Moedas têm de defender, na praça pública, a sua honra. O melhor é voltarmos aos tempos antigos e baterem-se mesmo em duelo.

O local ideal existe. Começa assim a justificar por antecipação outras utilizações do recinto altar Tejo. Mas continua a grande incerteza: afinal quem mudou o desenho do projecto que fez duplicar o custo? Alguém quis uma pala a imitar a de Siza Vieira. Estarei equivocado? Admito, mas tamanha ostentação é ambição de rico fácil.

E a terminar as culpas, uma referência ao Governo e ao Presidente da Assembleia da República (AR). O Governo também não escapa, sobretudo por não ter dinamizado o processo e deixar as obras se arrastarem, o que em nada dignifica o País.

Finalmente, um elogio ao senhor presidente da AR, que se aprestou a visitar em tempo oportuno a sede da Fundação da JMJ e a dar o ombro a quem ficou mal ou muito mal na fotografia.

O custo da JMJ na globalidade

Os gastos com a Jornada Mundial da Juventude, numa estimativa por defeito, já andam pelos 160 milhões de euros. Mais uns pozinhos e arredonda para as duas centenas.

Destes milhões, cerca de 80 são dinheiros públicos e uma grossa maquia destinou-se a recuperar espaços de zonas degradadas nos concelhos de Lisboa e de Loures e à implantação de infra-estruturas. Se de Loures se ficou a saber que entre 9 e 10 milhões vão ser aplicados para que o Concelho obtenha uma frente Tejo infra-estruturada, permitindo o usufruto futuro da sua população, de Lisboa, em termos de números, resta-nos uma verdadeira nebulosa.

Poucos questionam o evento

Poucos serão os que põem em causa a realização deste evento, sendo ou não católicos, apostólicos, romanos. Mas há questões relevantes.

A Igreja tem neste evento uma parte significativa de publicitação e prática dos seus valores. Primeiro, os custos desta componente material deviam ser assumidos na íntegra pela Igreja. Qual a razão dos dinheiros públicos terem de cobrir esses custos?! Segundo, o tempo de arranque das obras. Como disse Segadães Tavares, quatro anos “a pensar” e menos de seis meses para executar a obra, onde até os desenhos finais não estão definidos. E, terceiro, por que razão só agora se fala do assunto?!


Portugal não saiu prestigiado neste processo. Arrancou tarde e mal. Em alguns jornais, nomeadamente do país vizinho, vi este problema ser tratado com alguma ironia. Só espero que o evento se realize e com sucesso.

Consultar Camões foi-me inspirado numa conversa com uma amiga sobre o altar-palco. Deixo, assim, uma citação do canto VIII, reflexões sobre o poder do dinheiro, de onde retiro a estância 99:

Este interpreta mais que sutilmente
Os textos; este faz e desfaz leis;
Este causa os perjúrios entre a gente
E mil vezes tiranos torna os Reis.
Até os que só a Deus omnipotente
Se dedicam, mil vezes ouvireis
Que corrompe este encantador, e ilude;
Mas não sem cor, contudo, de virtude!

In, “Os Lusíadas”, de Luís de Camões

domingo, 5 de fevereiro de 2023

Valeu a pena - "Ribeira Seca, terra de luta da alegria e da canção!"

 

Estou ausente da Região e, por isso, não poderei estar presente na homenagem e passagem de testemunho ao novo pároco da Ribeira Seca/Machico. Tampouco na sua última Missa a solo, esta manhã, no preciso momento que publico este texto. Penitencio-me por isso. Gostaria de lá estar, pela Amizade que me une ao Padre José Martins Júnior, mas mais do que isso, pelo que ele representa para a Madeira no campo de uma Igreja aberta ao Mundo, pela cultura que transporta e que disseminou, pelo seu exemplo de vida com os olhos sempre colocados nos outros. Estou longe, mas estou tão perto, creia meu Amigo.



Hoje, tal como no dia 12 de Fevereiro, não será necessário produzir qualquer balanço. A sua vida está inscrita na memória do Povo que o acompanhou ao longo de 54 anos, está nas homilias que produziu, está escrita nas intervenções que concebeu nos espaços políticos, está nos exímios e profundos textos que ofereceu através do seu blogue, está na poesia que semeou e está na música que compôs e ensinou. Mas mais do que isso, está na sua luta contra donos e pseudo-donos das consciências que nasceram livres e assim deveriam permanecer. 

Ser incompreendido e até perseguido, estou certo, que nunca o afectou. Um Homem culto sabe gerir como ninguém as mentes menores, aquelas que se entretêm na pequenez dos comentários, alguns subliminares, outros descarados. Um Homem culto não vende a sua dignidade e este Padre não a vendeu. Provou, sim, a indignidade de alguns outros, matreiramente construída nos corredores dos vários poderes. Ao longo da vida ele preferiu dizer não ao universo de sombras, antes assumiu as lutas, denunciando e incomodando. Nem na própria Igreja a que pertence se acomodou. Estudou, reflectiu e traçou caminhos dissonantes relativamente a uma hierarquia comodamente estática, muitas vezes dogmática e sentenciosa. A Palavra de Cristo sempre teve um sinal mais na contextualização com a vida real das pessoas. É por isso que elas, estou certo, pelo respeito que por ele nutrem, reconhecem essa força da Palavra transformadora que não se esgota nas Leituras tantas vezes indecifráveis. 


Tenho o prazer e a felicidade de, quando em vez, almoçar e conversar sem ponto de partida nem de chegada. Conversas ao jeito de cerejas! Aprendo e trago sempre um saco cheio de palavras que me reconfortam e me fazem expandir a consciência. A caminho do Funchal, depois do nosso último convívio, trouxe em permanente reboliço na mente, a pergunta: por que raio esta figura de proa da Igreja e da Cultura da Madeira, ao invés de a ele se juntarem e até aprenderem, tivessem preferido juntar-se ao coro vilipendioso. Até o mantiveram, mais de meio século, em lume brando, numa espécie de fogueira inquisitorial. Espantosa maldade e que triste exemplo deram ao Povo, praticando a antítese do que Jesus deixou como Mensagem. Enquanto Cristão, assumo: que vergonha!

Não se vergou. Antes deixou que o tempo, enquanto grande Mestre, ditasse a sua sentença. E ditou-a, implacavelmente. É uma vitória sua, de, como agora se diz, uma vitória da resiliência. O Povo da Madeira sabe-o de cor e tem consciência do conluio entre a Igreja e o poder para abafar uma voz inadequada aos valores e interesses que defendem. Uns e outros devem-lhe um pedido de desculpas, olhos nos olhos. Como recentemente escreveu no seu blogue "senso&consenso", sobre "Confissões, Confessores e Confissionários": "(...) O perdão digno desse nome só acontece entre o pedido de ressarcimento do criminoso e a sua vítima (...) E aí, mediante o pedido prévio do agressor, esteja o lesado pronto a dar-lhe o abraço da concórdia". Façam-no, se têm respeito por si próprios.


Meu querido Amigo Padre José Martins Júnior, não estarei, mas considere que, virtual e antecipadamente, já assinei a presença. E continue porque precisamos da sua Palavra. O Povo não o esquecerá. O resto... o resto fica para a História.

Ilustração: Arquivo próprio

O que os clássicos nos dizem sobre os que andam à caça dos outros


Por
José Pacheco Pereira
Articulista do Público
Excerto do artigo publicado na edição de hoje


"(...) Aqui vai uma fábula de Esopo sobre um “falcão” e um “rouxinol” dedicada aos predadores que por aí andam muito contentes a distribuir gasolina, e aos irresponsáveis que os ajudam “a gastar” a democracia e atacar a liberdade: 

0 falcão e o rouxinol.

Um dia, um falcão voou até um ramo para espreitar uns coelhos lá em baixo, mas encontrou um ninho de rouxinóis na árvore. Estava prestes a comê-los, quando a mãe rouxinol regressou e lhe pediu que lhes poupasse a vida.

“Muito bem”, disse o falcão. “Canta-me uma canção e, se for boa, eu poupo-lhes a vida.” Estremecendo, o rouxinol cantou para o falcão, mas, quando acabou, este tornou a agarrar nos passarinhos.

“Não foi lá muito boa”, disse ele, e preparou-se para devorar os rouxinóis. Neste momento, uma seta voou e trespassou o coração do falcão, que caiu morto no chão.

Moral

Os que andam à caça dos outros devem lembrar-se de que também podem ser caçados.
Não são precisas muitas palavras, toda a gente percebe do que é que se trata menos os falcões.

Ilustração
O Falcão e o Rouxinol de Ernest Henry Griset (1844-1907)

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2023

Natação sem mergulho


Por
Eduardo Freitas
Jornal da Madeira
01/02/2023 

A natação na Madeira é um tema sobre o qual nunca escrevi ou falo, apesar de ser, digamos, a minha modalidade. Faz este ano 20 anos que deixei de entrar numa piscina para competir. Não fui um atleta de destaque, apesar do empenho que sempre coloquei, à exceção da última época, não interessa os motivos, fez-me desmotivar e desinteressar pela modalidade enquanto atleta.




A razão que me leva a evocar esse tempo é que o mês passado começou o desaparecimento da última piscina que teve um nadador olímpico na Madeira, a piscina da Escola Ângelo Augusto da Silva, vulgo Escola da Levada.

Primeiro foi a piscina da Matur, de seguida a piscina da Quinta Magnólia e depois foi a piscina da Francisco Franco, isto na história recente. É certo que nenhuma tinha as condições que têm as mais recentes piscinas ou as várias piscinas espalhadas por toda a região. Eu treinei vários anos, pelo Marítimo, na piscina da Francisco Franco em que certos dias vinha uma rabanada de vento e lá ia o toldo que a cobria.

Felizmente tudo melhorou… Com exceção dos resultados dos atletas. Tudo cristalizou e já passaram 20 anos desde que deixei a natação. Não temos um nadador olímpico, nem próximo de tal, apesar de todas as condições atualmente existentes.

Lembro que, no início, quando comecei a prática, havia a necessidade de uma associação, já que os clubes não se entendiam e dependiam da ADM, lá se criou a associação, pelo meio havia sempre a necessidade da piscina de 50 metros e as desejadas condições. Já existem! A piscina de 50 metros, faz para o ano 20 anos desde a sua inauguração!

Mas o rol de desculpas continuam de há 20 anos, são as mesmas das de agora, bastou ver a reportagem da RTP/Madeira para se perceber: “os miúdos vão para a faculdade e depois deixam isto…”, ou “as escolas não facilitam aos miúdos a prática de natação”. E o que se fez para mudar isso? O que se fez para fixar e motivar os jovens a treinar?

É preciso ver… A Madeira só teve 1 atleta olímpico em 1988, vão quase 40 anos! O Governo Regional investiu tudo o que foi possível para criar as condições para a prática da modalidade. Desse lado não há nada a dizer, então o que nos falta?

A Madeira não tem uma equipa de saltos para água, apesar da criação de uma piscina para tal, já não tem uma única equipa de Polo Aquático, modalidade que tem história nesta ilha, a última deve ter 20 anos. Mas tem centenas de eventos financiados, até pela Assembleia Legislativa Regional, sem impacto nacional e ou internacional, numa assinalável atitude de incentivo ao progresso a partir do amadorismo.

Sabem… No futebol é exagerado, é verdade, mas quando não existem resultados, os treinadores, diretores, presidentes são postos à andar, infelizmente na natação temos sempre os mesmos, sem desdouro da sua entrega à modalidade!

Recentemente, tivemos nesta modalidade amadora, uma equipa que foi a uma prova nacional, isto é, a 2ª divisão nacional constituída pela maioria dos atletas continentais, isto é, não treinam, não vivem na Madeira, simplesmente contratados para representar essa equipa num fim de semana. Tudo certo! Se isto não fosse sustentado pelo erário público regional, isto é, por todos os contribuintes não haveria problema, mas pior é que depois se esquece que há jovens atletas madeirenses que deixam a modalidade por falta de apoios financeiros… Ainda alguém tem desconchavo de falar no futebol? Que é um desporto profissional e os jovens atletas recebem bolsas e etc...

A natação afundou há muito, podem fazer todos os floreados, podem pintar todos os quadros fantásticos. Mas não existe, o quadro é dantesco! Investimento em condições, que penso que não aconteceu em mais parte nenhuma do nosso país, e os piores resultados de há 30 anos para cá. Existem recordes regionais com mais de 20 anos!

À Associação que tem por missão defender os atletas, vou ter a ousadia de deixar algumas ideias: Criar o atleta regional, já que a maioria não consegue entrar na alta competição, nomeadamente os que têm menos potencial, já que os com maior potencial não praticam natação sozinhos e necessitam de amigos, apesar de ser uma modalidade individual. Turmas, como em tempos a Jaime Moniz fez, só com nadadores, facilidade em alocar, compatibilizar as disciplinas e as matérias, sensibilizar os professores e escolas para a prática desta modalidade tão difícil e exigente de treinos bidiários, criação de bolsas de estudo e etc...

Antes de trazer eventos inúteis e sem qualquer tipo de interesse para a natação na região, deviam ver que a modalidade morre de dia para dia, enquanto modalidade olímpica e qualquer dia teremos a Associação Lúdica e de Eventos de Natação da Madeira, já que é cada vez mais o que parece ser.

É necessário profissionalizar, a fazer jus aos ordenados profissionais que muitos recebem numa modalidade tão cada vez mais amadora!