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quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

Fusão nuclear, uma grande pedrada nos inimigos do futuro


Por
26 Dezembro 2022

2022 foi o ano de maior consumo de carvão no mundo, com maior emissão de CO2. O Mundo andou para trás com a descarbonização ou, para ser mais benigno, fez compasso de espera.



Esta semana havia um bom lote de assuntos de elevado interesse político, económico e social para artigos de opinião:
O Catargate e a União Europeia, por exemplo, numa vertente da muita regulamentação existente e da pouca monitorização;
O porquê do mercado negro do petróleo estar tão próspero e dinâmico com o embargo e a fixação (60 dólares/barril) do preço de aquisição do petróleo russo;
As cheias e em especial as de Lisboa comparadas com as de Tóquio e outras cidades, onde as condições atmosféricas são de um modo geral mais desfavoráveis;
As falências em curso de um número significativo de empresas nos países europeus devido à crise energética numa Europa em perda de competitividade;
A ONU e a multiplicação de COPs (a COP27 no Egipto e a COP15, poucos dias depois, no Canadá). Encontro de lóbis? Coordenação de interesses? Ocupação de pessoas que vivem destes eventos…?

Uma mão-cheia de temas. Era só optar.

A fusão nuclear

1. Bem ou mal, aderi ao tema da fusão nuclear que até nem consta dos elencados antes.

Caiu-nos uma excelente notícia sobre esta vasta temática. Pela primeira vez na História, uma experiência de fusão nuclear dos cientistas do Laboratório Nacional Lawrence Livermore da Califórnia (LNLL) “conseguiu produzir mais energia do que a consumida no uso da produção”.

Não sendo um especialista na matéria, bem longe disso, estou convicto de há algum tempo que a energia nuclear civil desempenhará um papel estruturante no progresso da Humanidade, seja sob a forma de fissão, a energia hoje existente com todos os seus avanços dinâmicos recentes, seja sob a forma de fusão que, quando passar à industrialização, não emite CO2 – aliás como a fissão –, mas acrescentará a não geração de resíduos radioactivos, ou quaisquer riscos de acidentes graves como Fukushima ou Chernobyl. Efetivamente, não resisti a partilhar e comentar esta boa notícia que nos abre mais futuro.

Projectos experimentais de fusão nuclear estão em andamento, designadamente nos EUA, China e Reino Unido, para não falar do ITER, instalado em Cadarache, no sul de França, uma iniciativa internacional de vários países (China, Coreia do Sul, EUA, Índia, Japão, Rússia e União Europeia), mas infelizmente com atrasos sucessivos. Tido como muito importante na implementação da fusão, não está a cumprir os fins para que foi desenhado.

E, assim, ainda bem que surge a concorrência e com resultados expressivos. Aliás, experiências anteriores na China e EUA que estão no sucesso desta, anunciada a 13 de Dezembro, já tinham sido mais consistentes que o desempenho do ITER. Até parece que a localização (europeia) e a sua gestão não acomodam uma dinâmica adequada!

2. A fusão nuclear deu agora um grande passo, embora haja quem queira denegrir esse avanço, alegando que se trata de um acontecimento menor ou então que muitos séculos hão de vir até aparecer a electricidade via fusão.

Segundo li em jornais estrangeiros, o LNLL “causou fusão nuclear controlada libertando 2,5 Megajoules de calor com apenas 2,1 Megajoules de energia fornecida”. É evidente que ainda se está distante da consolidação industrial desta experiência. Bastantes mais serão necessárias e certamente vários Laboratórios irão continuar este trabalho de investigação.

As previsões para a aplicação industrial, ou seja, o seu uso na produção de electricidade continuada é uma incógnita, embora cientistas, certamente com algum grau de voluntarismo e optimismo, apontem para 15/20 anos.

O laboratório da Califórnia, ao dar este passo decisivo, está ciente do muito caminho a percorrer. O seu anúncio tem um propósito claro: consolidar o financiamento por parte da Administração americana. Para a mentalidade americana, a apresentação de resultados concretos, independentemente do grau de inovação em que se encontre, abre caminho à concessão de mais financiamentos e, nesta fase, é fundamental afastar escolhos dessa natureza.

3. Quanto às opiniões “cépticas”, sobretudo de origem europeia, permito-me registar algumas interrogações.

Não terão os descréditos apontados em artigos de opinião e comentários origem nos defensores das energias renováveis? É um dado adquirido que alguns tipos de renováveis, como a eólica, atravessam incertezas devido a irregularidade do vento, antevendo-se situações de futuro, menos boas. E da produção das terras raras usadas estar muito concentrada na Ásia não poderá nascer uma linha de dependência nestas energias…?

Por outro lado, as energias renováveis, como se sabe, não resolvem per si a descarbonização devido à sua intermitência, precisando sempre de energia compensadora e, neste caso, para os antinucleares, de energia fóssil.

A velha questão que divide a União Europeia

4. Infelizmente, existe uma velha questão, no âmbito da União Europeia, que muito tem contribuído para a profunda divisão na União Europeia (UE) E entre os defensores das renováveis e os da nuclear. Esta realidade é a base de efeitos nefastos profundos como os que estão a ocorrer agora com os elevados preços da energia e o seu contributo para a inflação que nos domina.

Vejo na abordagem por certas forças desta experiência no processo de fusão nuclear uma reedição dessa herança, designadamente por parte da Alemanha e de algumas ONG, que temem avanços porque têm interesses muito fortes em jogo.

Não nos podemos esquecer que há lóbis alemães poderosíssimos sobretudo do lado dos fabricantes de equipamento que com o avanço da nuclear e agora com a Fusão perdem a argumentação da nuclear como energia perigosa. O medo da desgraça ficaria enterrado. Mas atenção, há que olhar para o futuro com os pés assentes no chão. A energia de fusão é futuro, embora esta situação não corresponda a abandonar a fissão.

2022 foi o ano de maior consumo de carvão no mundo, com maior emissão de CO2. O Mundo andou para trás com a descarbonização ou, para ser mais benigno, fez compasso de espera. A Europa foi uma das zonas mais poluidoras, exactamente porque accionou várias centrais a carvão para escapar a eventuais roturas de energia neste Inverno, apesar de haver quem considere que a situação no ano de 2023 possa ser pior (Agência Internacional de Energia).

Por outro lado, a UE continua a ser parcial pois trata a energia nuclear em plano de secundariedade face às renováveis, contrariando os avanços da ciência cada vez mais favoráveis para esta, e quanto às renováveis os problemas avolumam-se.

As dúvidas sobram sobre as influências de muitos dirigentes da UE. Destas más políticas e estratégias enviesadas já conhecemos bem os efeitos. Perda de poder de compra e de competitividade. A Europa está em perda e cada vez mais tenderá, por este caminho, a ser uma potência de segundo nível, pelos erros que acumula e divisões internas não superadas. Um entendimento na energia é fundamental a uma Europa forte.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.

Nota complementar

O Joule é uma unidade de medida tradicionalmente usada para medir a energia mecânica ou a energia térmica; numa outra aproximação: 1 Joule corresponde a 1W¨*s (Watt-segundo); o Megajoule corresponde a um milhão de Joules.


domingo, 18 de dezembro de 2022

NATAL - A minha mensagem, o meu desabafo!


Gostaria que fosse diferente, mas é o que é. Por isso, mantenho a utopia no seu significado mais profundo, essa utopia, na esteira do escritor Eduardo Galeano e do cineasta Fernando Birri, aquela que está no horizonte e que se distancia à medida que para ele avançamos, o que significa que ela serve, exactamente para isso, para que não deixemos de caminhar. Caminhar com sentido, com objectivos e convicções claras e não vendáveis. 


Por isso, o Natal, aquele que eu gostaria que fosse, não é. Ficamos pela boa azáfama, embora rotineira, que ignora o lado dos verdadeiros e intrínsecos princípios e valores da Humanidade. Não sou pelo Natal rico, mas muito menos pelo Natal pobre. Em todos os sentidos. Sou pelo significado do Nascimento e pela semente deixada entre os Homens. Essa semente que tornaria esbatidos o mundo dos ódios e de perversidades, religiosos, políticos e outros, um mundo de equilíbrios, de liberdade, tolerância, de paz, de amor, de fraternidade e irmandade entre os Homens e as nações. Um mundo onde não fosse necessário pregar a fé e apregoar a caridade, porque implícita nos nossos valores humanos. 


Este, não é, portanto, o Natal que desejaria viver. Nunca foi. Vivo as tradições culturais, sinto-as e esforço-me por transmiti-las, arrebata-me a tão deliciosa proximidade da família, mas, questiono-me, isso bastará quando inalamos o cheiro da pobreza que passa ao nosso lado, o desespero do suicídio (na Madeira são três por mês), o som da guerra que se espalha, a destruição sem dó nem piedade, os povos em fuga, as mortes no mediterrâneo, o sofrimento de milhões de refugiados, o tráfico e exploração de seres humanos, a fome, o desespero, a emigração forçada, a magreza dos salários e das pensões, o desencanto relativamente a políticos que roubam e que nos esbulham, a corrupção tornada modo de vida, o desemprego, as várias violências, a hipocrisia, a mentira, a fortuna de uns à custa da maioria, mais, ainda, a própria destruição do planeta? Há, convenhamos, um certo amargo, quando passamos em revista o que nos rodeia, reflectindo sobre a realidade local e global. 

Não é este o Nascimento que ambiciono e que, estou certo, a esmagadora maioria dos povos deseja. Prevalece a existência de mais direitos do que justiça. E o que não faltam são textos aprovados pelos Homens que servem para emoldurar e a eles se referirem sempre que dá jeito e a necessidade apela. O que não faltam são Constituições de países com artigos e alíneas repletos de direitos sociais. Mas falta-nos o essencial: repudiarmos o egoísmo, a maldade, a ganância, a mentira servida de forma sorridente e convincente, a ostentação, o falso altruísmo, políticos sem visão e especialistas em mediatismo, os ditadores, os que fazem da política uma profissão, a globalização da indiferença, os fraudulentos negócios da banca, entre tantos outros, a punição exemplar de quem se serve de mão-de-obra escrava, os crimes de colarinho branco, os que carregam nos impostos por obediência a essa desorientada União Europeia dos "mercados" e dos favorecimentos, os que se servem de países pobres para sugarem as suas riquezas, enfim, tudo aquilo que ofende a dignidade do Homem que por aqui passa umas escassas dezenas de anos. 

O Nascimento aponta nesse sentido, penso eu. Não passa por matar a fome, por exemplo, aos sem-abrigo na noite de Natal, mas em devolver-lhes a vida. Não passa, apenas, pelo espectáculo das festas de Natal nos hospitais, mas em garantir o pleno direito à saúde, sem milhares nas várias listas de espera. Não passa, apenas, por visitas de circunstância a instituições de crianças, distribuindo-lhes brinquedos, mas em garantir-lhes futuro. Não passa por um sistema educativo caduco que mata o direito ao sonho, à felicidade e que, ao contrário de constituir-se um meio de combate à pobreza, continua a atirar milhares para as margens. Não passa, apenas, por almoços e jantares entre colaboradores de empresas, por momentos de alegria e de esquecimento de tropelias, pressões e angústias. Não passa, apenas, por uma noite do mercado, uns copos e umas sandes de vinho-e-alhos. Não passa, apenas, pelas visitas de cortesia, entre governantes e instituições, onde, amistosa e de sorriso largo, declaram Bom Natal uns aos outros. Porque o Nascimento deveria residir em nós, nos outros onze meses do ano. Utopia? Não. Fraqueza dos Homens, sim.

No coração citadino cruzamo-nos com milhares de pessoas, cada uma na sua vida, correndo de um lado para outro, adquirindo isto e aquilo, mas quantos, questiono-me, nessa azáfama, sofrem em silêncio as vicissitudes da vida? Tudo ou quase tudo aparências, quando Janeiro aí estará com a vida a voltar à doentia normal anormalidade, segundo dizem, um ano de 2023 que só será fácil para uma minoria. Os outros carregarão o fardo das extremas dificuldades. Gostaria que fosse diferente, mas é o que é! Tomemos consciência. E se digo isto é porque acredito no Pai-Natal! A utopia, enquanto caminho, não morrerá em mim.

Para todos um Bom Natal.

Ilustração: Arquivo pessoal

Nota
1. Texto reescrito de um outro que publiquei em 2015 
2. Só voltarei à escrita em Janeiro de 2023

quarta-feira, 14 de dezembro de 2022

A propósito de uma "algália"


Eram cerca das 17:00 horas. Saí do supermercado e liguei o rádio. Escutei não mais de três, quatro minutos. Desliguei. Na Assembleia Legislativa da Madeira, falava o Senhor Presidente do Governo no debate do Orçamento da Região para 2023. Eu sei que uma cópia não passa de uma cópia. O original é de difícil imitação. Não suportei o fraseado, neste caso dirigido ao representante do PCP, onde até falou da função de "algália" que este partido teve durante o acordo de incidência parlamentar entre o PS, PCP e BE. Palavra sem sentido e se tem, é tão pejorativo que não atingi.



"Algália" foi o mínimo, porque todos os da oposição foram presenteados. O anterior presidente batia forte e feio, "contava anedotas", distraía do assunto sério e, infelizmente, ainda animava. No meio daquilo dizia coisas com algum grau de assertividade. Este não, a cópia sai esborratada. Não gosto. Detesto. 

O debate do Orçamento deve ter elevação, deve ser um momento solene de exercício da democracia, de contraposição com argumentos consistentes e de demonstração da verdadeira face de um projecto político. O debate não deve permitir a desconversa, o bate-papo de mesa de café entre uma "milhada" e outra a ver quem paga a rodada.

O debate sério dispensa o pensamento pacóvio, a animosidade sem sentido e a gritaria insolente. A Assembleia é o primeiro órgão de governo próprio desta Autonomia e, desde logo, mesmo perante um povo desligado da coisa pública, deve ser educadora e séria. Mas não, parece que naquele metro quadrado de espaço de cada um, a soberba toma conta do racional e aquilo torna-se repelente, o que conduz ao afastamento, não sei se intencional, do ambiente político por parte dos cidadãos.

Azar meu, talvez como prova do dia anterior, hoje, quase nas mesmas circunstâncias, voltei a ligar e zás, dou com um secretário do Turismo e, imagine-se, da Cultura, a atirar-se, não percebi a quem, mas onde falava da escola primária e de reguadas, mas certamente não as podendo dar, ficava pelo seu discurso de contraponto. Voltei a mudar de estação.

Sinceramente, é que já não há pachorra para aturar vilipêndios seja lá de quem for. Aprendi ao longo da vida que o melhor improviso é o que está escrito. Isto é, parecendo improviso, sobre as diversas matérias, os tópicos dos raciocínios estão escritos e fundamentados. E sobretudo a consciencialização do que não deve ser dito. 

A Assembleia é um espaço nobre, pressupostamente, ali deveriam estar os melhores da sociedade (infantilidade a minha), debatendo os assuntos que a todos diz respeito. Não é um espaço de discussão (diferente de debate), de marginalidades, de generalidades, de banalidades e de infantilidades. A Assembleia não tem de ser, necessariamente, uma arena de gladiadores, de ofensa e "sangue". É preciso erudição, ironia cáustica, ponderação e maioridade nas atitudes e comportamentos.

Finalmente, regresso à "algália", apenas para questionar se a palavra e o seu significado também se aplica ao parceiro (legítimo) da sua coligação?

Ilustração: Google Imagens.

terça-feira, 13 de dezembro de 2022

Dra. Sofia Escórcio - Abordagem ao Doente Crítico Num Prisma Internacional


Um orgulho.

Ucrânia: Preparar o saque


Por
Carlos Matos Gomes, 
in Medium.com 
12/12/2022)
 A Estátua de Sal

“Botín de guerra” — um termo antigo para um procedimento sempre atual — é a designação dos bens de uma nação ou exército que devem constituir um troféu e recompensar os vencedores. A palavra parece ser de origem alemã e significava “presa”. A divisão do botín de guerra é geralmente acordada antes do início do assaltos.





Os senhores da guerra vão realizando análises de custos e benefícios ao longo das campanhas até chegar ao momento em que decidem terem mais a perder do que a ganhar com a manutenção das hostilidades, que chegou o tempo de negociar o saque. No caso da Ucrânia, estão em jogo os milhares de milhões de euros de “ajuda à reconstrução”! Os franceses deram sinal de vida e já estão em campo, de dente afiado, informa do Le Monde: “Guerre en Ukraine, en direct : 500 entreprises françaises réunies mardi à Paris pour reconstruire l’Ukraine.” Estas sociedades participarão na segunda gonferência que terá lugar em 13 de Dezembro e leiam-se os bondosos propósitos: “ responder às necessidades criticas da Ucrânia, contribuir para a reconstrução do país e investir a longo prazo no potencial da economia ucraniana” — segundo o Eliseu. (Do jornal da União Europeia).

Após a reunião do Conselho Europeu de 20 e 21 de outubro de 2022, a Comissão propôs hoje (9/Dec) um pacote de apoio sem precedentes para a Ucrânia de até 18 mil milhões de euros para 2023. Isso será feito na forma de empréstimos altamente concessionais, desembolsados ​​em parcelas regulares a partir de 2023. Esta assistência financeira estável, regular e previsível — com uma média de € 1,5 mil milhões por mês — ajudará a cobrir uma parte significativa das necessidades de financiamento de curto prazo da Ucrânia para 2023, que as autoridades ucranianas e o Fundo Monetário Internacional estimam em € 3 a € 4 mil milhões por mês. O apoio apresentado pela UE necessita de ser acompanhado por esforços semelhantes de outros grandes doadores, a fim de cobrir todas as necessidades de financiamento da Ucrânia para 2023. Graças a este pacote, a Ucrânia poderá continuar a pagar salários e pensões e manter em funcionamento serviços públicos essenciais. Também permitirá à Ucrânia garantir a estabilidade macroeconómica e restaurar as infraestruturas críticas destruídas pela Rússia. O apoio europeu será acompanhado de reformas para “reforçar ainda mais o Estado de direito”, a boa governação e as medidas antifraude e anticorrupção na Ucrânia.

O aprofundamento do Estado de Direito na Ucrânia está mesmo no comunicado da Comissão Europeia, não é piada. (https://ec.europa.eu/commission/presscorner).

Da parte dos Estados Unidos, Joe Biden propôs um reforço de 275 milhões de dólares para a defesa aérea da Ucrânia. Mais 53 milhões para a recuperação de infraestruturas e felicitou o discurso de Zelenski de abertura para uma paz justa baseada nos princípios fundamentais da Carta das Nações Unidas. (The Guardian 12/12/2022). Vários líderes europeus e o secretário-geral da NATO introduziram os riscos da escalada da guerra nos seus discursos.

Em resumo, o “Ocidente” está a preparar o futuro e a anunciar o fim das ações militares na Ucrânia. O plano parece claro: estabilizar a situação no terreno, não permitindo mais avanços da Rússia, através do reforço da defesa aérea que limita novas conquistas e tratar dos negócios da reconstrução. Os Estados Unidos atingiram o seu objetivo principal: subordinar a União Europeia e bloqueá-la na sua órbita, separando-a da Rússia e destruindo a sua coesão e veleidades de autonomia.

Contudo os estados ocidentais irão para o saque do futuro da Ucrânia em ordem dispersa, cada um por si e contra os outros para abocanhar o que puderem dos fundos atribuídos à “reconstrução” da Ucrânia: os franceses estão a preparar-se, assim como os alemães. A Polónia deverá ser recompensada do seu apoio como base logística com uma parcela da Ucrânia, o Reino Unido servirá de sócio principal dos EUA, e a Turquia venderá caro os seus bons ofícios de intermediação e na manutenção de pontes entre as partes, que deverão ser pagos pelo Ocidente e pelos curdos. Os Estados Unidos através das suas empresas serão os grandes “reconstrutores”, como já foram no Iraque!

A dúvida é o comportamento da Rússia. O que consideram os russos “atingir os seus objetivos”? O fornecimento pelo Ocidente de grandes quantidades de armamento à Ucrânia tem por finalidade limitar as suas pretensões.

À Ucrânia de Zelenski resta o papel de carne para canhão e de tesouro de guerra.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2022

Narendra Modi na presidência do G20


Por
12 Dezembro 2022


Esperemos que esta presidência do G20 consiga ir além dos sentimentos e plante algumas sementes, no sentido de uma distribuição mais equilibrada de poderes entre os países.



No dia 1 deste mês de Dezembro, a Índia assumiu a presidência do G20 pelo período de um ano, sucedendo assim à Indonésia, cuja última cimeira se deu em Bali (14-16 Novembro).

1. Narendra Modi, primeiro-ministro da Índia, no discurso proferido em Bali, já na antevisão de futuro timoneiro do G20, pintou um quadro negro do Planeta (mudanças climáticas, Covid19, acontecimentos na Ucrânia, mau funcionamento das cadeias de distribuição…), atribuindo a instituições multilaterais como a ONU e seus diferentes Órgãos (Banco Mundial, FMI, PNUD, OMC…) falhas graves nas decisões de índole política e económica, que muito contribuíram para esta realidade.

Para Modi, as instituições multilaterais continuam a agir e a privilegiar os interesses do Ocidente em desfavor das economias emergentes.

O Ocidente continua, de facto, a tentar perpetuar-se, ou seja, a determinar o rumo do Mundo de acordo com o seu pensamento e interesses, quando, na realidade, desde há muito, deixou de reunir as condições para essa preponderância mundial.

2. A ordem mundial, constituída no pós – 2ª. Guerra, encontra-se perfeitamente desfasada dos temas e problemas de hoje. Tudo tem vindo a mudar nas mais diversas frentes, na economia, no social, no político, na demografia e até no campo das tecnologias do futuro. O Mundo transformou-se, mas continua manietado pelo poder do Ocidente que, no limite, não hesita no recurso à força militar para manter os privilégios.

Narendra Modi falou, assim, da necessidade firme de reconstruir a ordem mundial vigente. Neste contexto, disse, vai usar a presidência do G20 para desafiar o Ocidente e lançar de modo concertado e pacífico as alterações de fundo conducentes a uma distribuição mais equilibrada do poder político e a um novo figurino de governação do Planeta, de forma que as economias emergentes venham a ocupar, no xadrez político mundial, a posição que lhes compete e até ao presente nunca reconhecida.

Ninguém gosta de perder poder. E esta é a situação real. O Ocidente está em perda continuada de influência em várias frentes e resiste a isso por todos os meios (legítimos e ilegítimos).

3. A Índia, a China, o Brasil, a Arábia Saudita, a Indonésia e outros países emergentes do G20 opuseram-se, na Cimeira de Bali, à decisão dos países ocidentais de incluir na declaração final a condenação da Rússia a respeito da guerra da Ucrânia. O presidente da Indonésia, anfitrião da Cimeira, solicitou aos dirigentes ocidentais moderação na sua retórica contra a Rússia.

O primeiro-ministro da Índia considera que “o G20 é um fórum destinado a construir consensos em torno do desenvolvimento, do crescimento e das questões financeiras” e “a questão da guerra e dos conflitos deve ser discutida no Conselho de Segurança da ONU” tema, no entanto, dominante em Bali.

Narendra Modi e o G20

4. Modi tem referido várias prioridades para a presidência do G20. A segurança energética, a segurança alimentar, o financiamento pelas economias mais ricas (Norte) da transição ecológica das economias emergentes, bem como a transição digital têm merecido acentuado destaque.

No dia 1 de Dezembro, Narendra Modi fez publicar no jornal “L’Opinion”, em França, a título exclusivo, um documento enquadrador da presidência da Índia do G20, com o desígnio de “Uma Terra, Uma Família, Um Futuro”, em que afirma: “Os maiores desafios que enfrentamos – mudanças climáticas, terrorismo e pandemias – podem ser resolvidos não lutando uns contra os outros, mas apenas agindo conjuntamente”.

Fazendo uma curta referência às 17 presidências anteriores do G20, em que salienta o seu contributo para a estabilidade macroeconómica, a racionalização da tributação internacional e a redução dos encargos da dívida dos países, entre muitos outros resultados, questiona-se se o G20 não poderá ir mais longe, catalisando uma mudança fundamental de mentalidade, em benefício da humanidade como um todo.

Modi é afirmativo, mas refere que, por enquanto, a norma ainda é o confronto. “Vemos isso quando os países competem por territórios ou recursos. Vemos isso quando bens essenciais são transformados em armas. Vemos isso quando as vacinas são monopolizadas, enquanto milhões de pessoas permanecem vulneráveis”.

Modi aponta no documento que a Índia é um microcosmo pois para além de representar mais de 1/6 da população mundial é um país com uma diversidade de línguas, religiões, costumes e crenças vivendo numa certa harmonia, e daí poder projectar as suas experiências de forma a fornecer pistas de eventuais soluções mundiais.

“No decurso da nossa presidência do G20, apresentaremos as experiências, os ensinamentos e os modelos da Índia como modelos possíveis para outros países, em particular os países em desenvolvimento”.

O documento termina com um apelo de futuro.

“Para dar esperança às gerações futuras, encorajaremos negociações honestas entre os países mais poderosos, sobre a atenuação dos riscos colocados pelas armas de destruição massiva e o reforço da segurança mundial. A agenda indiana para o G20 será inclusiva, ambiciosa e orientada para a acção e será decisiva. Unamos os nossos esforços para fazer da Presidência Indiana do G20 uma presidência de transformação, harmonia e esperança. Trabalhemos em conjunto para moldar um novo paradigma, o de uma globalização centrada no Humano”.

Excelentes sentimentos e ideias!

Esperemos que esta presidência do G20 consiga ir além dos sentimentos e plante algumas sementes, no sentido de uma distribuição mais equilibrada de poderes entre os países, que alguns passos aconteçam e as presidências seguintes, a cargo também de economias emergentes, consolidem alguns degraus. É determinante para a pacificação mundial que algum progresso concreto aconteça nestes domínios.

Notas de complemento

i) Os países do G20 em número de 19 a que se junta a União Europeia incluem a África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, EUA, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia.

Destes 19 países, Alemanha, Canadá, Coreia do Sul, EUA, França, Itália, Reino Unido e Rússia são considerados desenvolvidos. Os restantes são economias emergentes.

ii) O conjunto dos países BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) são todos membros do G20 e como se referiu em artigo sobre este tema, os BRICS contestam o funcionamento das Instituições Multilaterais por não respeitarem os interesses das economias emergentes. A Índia traz para a presidência do G20 algumas dessas ideias, o que é natural dado pertencer aos dois agrupamentos.

iii) Após a Índia seguir-se-ão na presidência do G20, o Brasil, seguido da África do Sul os dois, países BRICS.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.

sábado, 3 de dezembro de 2022

O pecado - Foi quiçá o maior «negócio» da história


Por
José Luís Rodrigues 
Padre
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Foi quiçá o maior «negócio» da história.
Serviu para sacar enormes fortunas. Serviu para enfeitar altares com peças requintadamente douradas e prateadas. Serviu para vender pedaços de céu com indulgências e outras «graças» que consolavam as almas malévolas, sanguinárias, cruéis e profundamente injustas para os seus semelhantes, mas depois do «milagre» do vil metal, estavam concertadas para entrar no bem bom dos céus.



O pecado tal como nós o concebemos não existe. Muito menos existe aquela ideia tão comum entre as pessoas de que quase tudo é pecado. E muito do que comumente designamos de pecado não interessa nada ao Menino Jesus. A consciência perante as injustiças, a corrupção praticada e a indiferença da maioria perante os praticantes dela, os ódios pessoais e coletivos que levam à morte, o abandono dos frágeis e etc… São talvez os verdadeiros pecados que ninguém se importa e muito menos confessa.

Nas Vinhas da Ira, John Steinbeck, colocou na boca de um dos seus personagens esta frase: «pecado é ter fome e frio» (pag. 386). Nesta fase do livro a reflexão sobre o pecado é magnífica e devia ser afixada nas portas das igrejas.

O «negócio» do pecado levantou basílicas sumptuosas, catedrais requintadamente faustosas, vestes clericais bordadas a ouro e prata, imagens de santos riquíssimas contrastando com a pobreza real enquanto viveram historicamente e objetos para guardar o Senhor Jesus - que foi um pobre de Nazaré. Os bens mais ricos que alguma vez a humanidade criou, serviram para luxos e para voluptuosidades do clericalismo - essa casta privilegiada e autorreferencial que se intitula de os chamados e eleitos Deus para O servirem esplendidamente.


Mas par deste «negócio» astronómico, cujo produto era o pecado e todos os medos e ameaças de condenações eternas às penas do inferno a ele inerentes, o povo na sua larga maioria morria de fome e de frio, e tudo, exatamente, como ainda hoje acontece. Uma larguíssima maioria de pessoas humanas morre de frio. Este pecado, ninguém confessa.

O pecado nos nossos dias tem um sentido mais lato, porque mais social e comunitário, porque é a esse nível que situamos a verdadeira desgraça da humanidade e do planeta. Por exemplo, o pecado dos atentados contra ecologia e o meio ambiente, são graves e afetam todos.

Se concebemos Deus dentro de determinados parâmetros, mais de acordo com o Evangelho do amor e da misericórdia, também devemos encarar de modo distinto a forma como nos relacionamos com o transcendente.

Nunca pode o pecado ser encarado como um negócio, uma arma para meter medos com vista a domesticar e dominar as pessoas. O pecado existe, é um mal corrosivo das sociedades, das famílias e das relações interpessoais. Porém, a ninguém é legítimo servir-se das quedas humanas para enriquecer, incutir medos, tecer condenações e fazer de Deus um justiceiro ou merceeiro que concede dons e graças como moeda de troca.

Muito menos a forma de reconciliação e remedeio do pecado pode ter por uma única via e por uma única entidade. Porque tal seria ilegítimo e pior seria que aceitássemos que pecadores andavam a salvar pecadores, como cegos a conduzir cegos ou cambados a carregar à costas outros cambados.
O pecado para ser remediado, implica arrependimento e o propósito de emenda, depois Deus e a consciência de cada pessoa ditarão e farão o que é preciso fazer. Quanto ao caminho e a forma de lá chegar, cada um procure a melhor forma de se reconstruir interiormente. Não há uma única via e o reino de Deus tem muitas portas.

Por isso, pecados verdadeiros, que devem inquietar o Deus da misericórdia, da paz e do amor, devem ser todas as atitudes desta vida que violentem tais qualidades. Neste sentido, só temos para «confessar» a gravidade que assola este mundo onde tantos ainda morrem de frio e de fome. Por causa da guerra, do negócio das armas e todas as estupidezes que a humanidade teima em fazer valer contra o bom senso e a razão autêntica das coisas.

Ter fé não é ter sossego, é viver desassossegado. Quando há sossego é sinal que deixamos de nos considerar responsáveis do frio e da fome que ainda existe no mundo. O pecado não é mais importante que a fé, a esperança e a caridade.

Um grande pecado é ser escravo de medos. E estragar a felicidade própria e a dos outros, é o caminho certo para cair no inferno. E a Deus só pode interessar que não violentemos a vida de forma nenhuma. JLR