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quinta-feira, 28 de dezembro de 2023

Nuclear e energias fósseis


Por
João Abel de Freitas,
Economista

A energia nuclear é reconhecida, pela primeira vez, como fazendo parte da solução na luta contra o aquecimento global num documento final de uma COP. Um marco importante e um resultado merecido pelas diplomacias dos EUA e França.



A COP28 aprovou por unanimidade uma declaração final que aponta para a “transição dos combustíveis fosseis nos sistemas energéticos, de forma justa, ordenada e equitativa, acelerando a acção nesta década crucial, de forma a alcançar a neutralidade carbónica, em linha com as recomendações científicas” e, pela primeira vez, o papel da energia nuclear no clima é reconhecido oficialmente nesse mesmo documento.

A COP28 e as suas falácias

1. O abandono dos combustíveis fosseis…! Palavras a tilintarem agradavelmente e com a aparência de boas medidas, só que não passam de meras falácias, direi mesmo, de um embuste, pois se situam em contradição perfeita com as práticas em curso, em que somas enormes de dinheiro estão a ser investidas no gás natural, petróleo e carvão, mesmo nos países signatários.

O presente de Natal chegou, num belo embrulho, mas oco por dentro! Repito, sem radicalismos. Estamos perante um documento aprovado na COP 28 que semeia ilusões, um verdadeiro logro no que toca às energias de origem fóssil.

Dois ou três exemplos entre muitos. A Chevron, um dos grandes grupos mundiais de energia, especialmente petróleo, com sede nos EUA, avança com 53 mil milhões de dólares na aquisição de uma empresa especializada em fracking. O fracking, como se sabe, é uma técnica de perfuração para exploração de gás de xisto que contamina os lençóis freáticos, consome elevada quantidade de água, produz elevada quantidade de gás de estufa e está provado que, em certas circunstâncias, pode desencadear efeitos sísmicos e doenças graves como o cancro.

A ExxonMobil [1] também está a perfurar os subsolos do Canadá e Austrália na procura de gás e petróleo de xisto, prevendo investir, só na Austrália, a quantia de 50.000 milhões de dólares e não nos podemos esquecer que o governo do Reino Unido já manifestou por várias vezes, recentemente, a intenção de reiniciar as perfurações no Mar do Norte para a exploração de petróleo.

A tudo isto há a juntar os milhões e milhões de subsídios que, no Mundo, são concedidos, sob todas as formas, para que estes grandes grupos energéticos continuem a explorar os combustíveis fósseis e ainda que esses grupos pensam o petróleo e o gás com futuro a muito longo prazo.

Nada disto é compatível com a declaração subscrita apesar do pouco que diz.

2. Os combustíveis fósseis continuam a representar 82% do consumo mundial de energia primária e, em 2023, segundo a Agência Internacional de Energia (AIE), foi atingido o pico máximo de consumo de carvão no Mundo e para 2024 antevê-se um recorde na produção de petróleo.

O aumento do consumo de carvão está centrado na Ásia onde a Índia e a Indonésia apresentam crescimentos acima de 8% e a China, o maior consumidor mundial com taxas de crescimento da ordem dos 4,9%, embora com um programa a prazo entre renováveis e nuclear para ir substituindo as centrais a carvão. A Índia, pelo contrário, tem grandes projectos para continuar a implantar centrais a carvão.

Acrescente-se que este ramalhete fica perfeito quando o ministro alemão das finanças tem vindo a solicitar, a nível da UE, o abandono da meta de eliminação gradual do carvão até 2030, porque a Alemanha não consegue desligar as suas centrais a carvão, entre elas as 26 que accionou, aquando da crise do gás russo, usando linhite, em muitas delas, um tipo de carvão de fraca qualidade, mais nocivo em termos de gás com efeito de estufa.

3. Há quem tenha uma visão mais suave e se dê por muito satisfeito porque o acordo acrescentou ao carvão que já vinha de antes, o petróleo e o gás natural, apesar de tudo ter ficado no vago e sem qualquer carácter de obrigatoriedade.

E o mais grave é que embora alguns, eventualmente bem-intencionados em avançar, não tinham argumentos porque faltavam as medidas sustentadas para implementar essa substituição.

O que é que significa anunciar o triplicar das energias renováveis até 2050, como se afirmou? Como se faz no terreno? Nada esboçado. Portugal também alinhou nessa onda. Imagino algumas autoestradas portuguesas ocupadas por painéis fotovoltaicos!

O papel da energia nuclear contra o aquecimento global finalmente reconhecido

4. Pela primeira vez, a energia nuclear é reconhecida como fazendo parte da solução na luta contra o aquecimento global num documento final de uma COP.

Em minha opinião, é um dos poucos passos positivos a realçar na COP28. Um marco importante e um resultado merecido pelas diplomacias dos EUA e França, que há anos trabalham para passar esta ideia nos grandes eventos internacionais e, finalmente, conseguiram o registo.

Macron (presidente de França) e John Kerry (representante americano à conferência) tiveram intervenções frontais na COP28 sobre a nuclear, afirmando este último: “a realidade é que não podemos alcançar a neutralidade de carbono até 2050 sem a nuclear”.

Também 22 países na COP 28 se pronunciaram pela nuclear, mas caíram na armadilha de imitar os defensores das renováveis afirmando que vão triplicar a capacidade existente até 2050, também sem projectos.

Este registo sobre a energia nuclear é importante, mas não podemos deixar de anotar que nos documentos oficiais continua a ser secundarizada na linguagem e por ausência face às renováveis. Ainda não lhe é concedida a maioridade nem o lugar que deve, no mínimo, situar-se em plano de igualdade.

Sabemos bem o porquê desta discriminação. Ainda continua desmedida a influência das grandes organizações ambientalistas tradicionais (tipo multinacionais do poder!) que não levam em conta os avanços da ciência

As dúvidas/desconfiança nas COP

5. Mais de uma vez tenho colocado dúvidas sobre estas Cimeiras que duram duas semanas quando não mais, reúnem uma variedade de pessoas e organizações de interesses muito antagónicos (autoridades governamentais, cientistas, representantes da sociedade civil dos países membros da Convenção – Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima) com o fim mítico de debater causas e efeitos das mudanças climáticas e encontrar soluções para as mesmas.

As diferentes dúvidas persistem. Desde as que apontam estarmos perante um “teatro enganador”, “um palco de vaidades”, pouca “fundamentação” técnica e cada um com a sua, e sobretudo uma dúvida de fundo tremenda: Não será que as COP são mais uma “plataforma de cartelização” de interesses a nível mundial e não propriamente um encontro para os fins nobres que dizem defender?

Infelizmente, à medida que vou fazendo leituras sobre as COP aprofunda-se esta minha dúvida. Isto é válido também para as grandes organizações ambientalistas. Felizmente nesta COP28 participou um grupo de 70 jovens de forma organizada que iam às mesas questionar as “sumidades” e algumas até merecem esta designação sobre certas matérias entre elas a energia nuclear.

Esta forma de participar merece uma elevada nota positiva. Talvez com participações deste tipo se revolucione o funcionamento e se rompa a plataforma de cartelização dos interesses reinantes nas COP e se promova o objectivo que uma das jovens organizadoras referiu que é as pessoas se interrogarem. Será que “eu sei o suficiente para me posicionar em relação à energia nuclear e seu papel no clima?”. Ora, esta mesma questão deve ser colocada para as energias renováveis.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.

[1] Anuncia perfuração na bacia do Namibe (fronteira Angola/Namíbia) para o último trimestre de 2024 para ensaio de exploração petrolífera de médio e longo prazo (Expansão 18-12-2023).


A vingança serve-se fria, a coerência prova-se quente


Por
Miguel Sousa Tavares, 
in Expresso, 
15/12/2023


Em pouco mais de uma hora de entrevista televisiva, António Costa mostrou por que razão todos os outros parecem terceiras escolhas ao pé dele: os candidatos a substituírem-no à frente do PS já este fim-de-semana e os candidatos a substituírem-no à frente do Governo em 10 de Março. Nenhum está tão preparado como ele, nenhum está tão à-vontade em qualquer assunto, nenhum deixa transparecer idêntica segurança discursiva. Se estivesse minimamente bem aconselhado, Luís Montenegro não se deixaria arrastar para a tradicio­nal armadilha do comentário imediato à entrevista de Costa, onde apenas pode largar meia dúzia de frases feitas, sem conteúdo que o justifique e numa presença fugidia que desqualifica o estatuto de um candidato a primeiro-ministro. E, porque a vingança se serve fria, um homem “magoado” não perdoou. 

A Lucília Gago retirou-lhe o argumento de que não foi o seu célebre parágrafo que o levou à demissão: foi, sim, garantiu ele, e da próxima vez a sra. procuradora-geral que investigue bem primeiro antes de disparar para matar. Para Marcelo ficou reservado o recado fatal: já que o Presidente sobrepôs a sua vontade à vontade do partido maioritário, à opinião de constitucionalistas, ao aval do Conselho de Estado e, claramente, ao entendimento da generalidade dos portugueses, espera-se então que tenha para apresentar ao país, em 11 de Março, uma solução mais estável do que aquela que derrubou. Sem ironia, disse ele. Ficou claro que António Costa vai andar por aí nos próximos meses, a assombrar a campanha eleitoral do PSD, se não mesmo a humilhar a do candidato do PS.

2 Em tempos houve um presidente de um clube de futebol, o Vitória de Guimarães, que cunhou uma frase para a História: disse ele que, no futebol, o que hoje é verdade amanhã pode ser mentira. Faltava quem a aplicasse à política, mas João Costa, o ainda ministro da Educação, acaba de o fazer implicitamente. Depois de dois penosos anos a resistir à reivindicação dos sindicatos dos professores no que resta da recuperação do tempo congelado para progressões durante o período da troika, embora tenha cedido em muitas outras coisas, ei-lo que veio agora dizer que, afinal, será possível atender a isso num futuro Governo PS. Justificação: uma coisa é o João Costa ministro do Governo de António Costa; coisa bem diferente é o João Costa cidadão socialista e apoian­te de Pedro Nuno Santos à frente de um futuro novo Governo PS. Como já aqui escrevi, o que mais me impressiona nesta história nem sequer é o encargo financeiro, que, tornado extensível a toda a Função Pública, representará um encargo extra permanente cujo valor ninguém conseguiu estimar ainda. O que mais me impressiona é pensar que quem foi à falência em 2008 foi o Estado, mas todos pagámos duramente essa falência. E, enquanto se reclama a justiça de restituir o que os trabalhadores do Estado perderam então, não há uma palavra, por comparação, para todos os outros que não trabalhavam para o Estado, que não tiveram responsabilidade alguma na falência deste, mas que a pagaram com o “brutal aumento de impostos”, os cortes salariais, o despedimento ou a emigração forçada.

3 E, entretanto, os resultados do PISA vieram revelar o inevitável. Se todos os países da OCDE recuaram nas aprendizagens dos anos considerados devido à pandemia, Portugal recuou mais do que todos, e esse recuo começou antes dos anos covid. Razões: a abolição de exames e a ausência de aulas. Reagindo, incomodado, Mário Nogueira veio questionar “para que serve o PISA e o que avalia?”, para depois fornecer a resposta: “O PISA não avalia a qualidade da educação, mas o desempenho dos alunos em provas de Matemática, Leitura e Ciências.” Ou seja, avalia o essencial: o que aprenderam os alunos na escola, coisa que para Mário Nogueira é “limitar o papel da escola ao domínio do conhecimento”. Pois, como ouvimos gritar abundantemente, “os professores a lutar também estão a ensinar”. Mas não, pelos vistos, a ensinar Português, Matemática ou Ciências, disciplinas em que a escola pública entrega mais tarde às universidades verdadeiros analfabetos funcionais, oportunamente dispensados dessa coisa discriminatória que são os exames, em benefício então da tal “qualidade da educação” — onde, aí sim, parece que somos campeões.

4 Para o “grupo de trabalho” do PSD que vai estudar o que a Comissão Técnica Independente (CTI) estudou durante um ano para a localização do possível futuro aeroporto de Lisboa, Luís Montenegro escolheu para o presidir Miguel Pinto Luz, um indisfarçado adversário da solução Alcochete — assim se garantindo a “isenção” que, tarde e a más horas, o PSD descobriu que faltaria à CTI. Mas escolheu também para o integrar um advogado do partido que, se bem percebi, tem um mandato claro: “descobrir” se a solução Alcochete tem o apoio da concessionária ANA/Vinci — isto é, se ela está disposta a pagá-la. Mas se, como já se tornou bem claro, a Vinci apenas quiser gastar 700 mil euros num aeroporto no Montijo, fazendo um centro comercial a que chamará terminal na pista que já lá está, então o PSD alinhará com a Vinci e passará também a defender o Montijo, não obstante todos os contras apontados no relatório da Comissão Técnica Independente. Entre o interesse público e o interesse do concessionário, o PSD tratou já de deixar claro de que lado está. Se percebi bem, se é mesmo disto que se trata, só não percebo porque vão perder mais tempo a camuflar uma opção já feita com um suposto grupo de trabalho.

5 As sondagens dizem que a Iniciativa Liberal vai subir nas urnas, o que explica a vontade do partido em não alinhar em coligações prévias. Tenho dificuldade em entender essa subida eleitoral, à luz da prestação da IL sob a direcção de Rui Rocha. Internamente, ele tem espalhado dissidências e abandonos, acumulando fama de uma liderança fechada na figura do presidente. O mesmo sucede no Chega, mas o Chega é partido de um só homem, que topa-a-tudo, ao contrário da IL, que nasceu como um partido de quadros. E, quanto ao líder, ele é uma sombra do seu antecessor. Onde João Cotrim de Figueiredo transmitia uma imagem de desprendimento, mundo, sentido de humor e imaginação, Rui Rocha é um rosto permanentemente fechado e crispado, agressivo, de mal com todos, disparando para todos os lados, sem sentido nem oportunidade: a imagem oposta de um liberal, na vida e na política. João Cotrim tinha um discurso claro e fluido: sabíamos o que pensava, mesmo quando o que pensava era abertamente injusto ou absurdo. De Rui Rocha não conhecemos o pensamento, mas pior do que isso: fica-se com a sensação de que ele esconde o essencial.

6 A COP28 terminou com um acordo que dizem “histórico”: atingir a neutralidade carbónica até 2050. Depois de grandes discussões em busca das palavras que a todos contentassem, não ficou expressamente escrita a proibição da exploração de combustíveis fósseis até 2050, mas sim “uma transição para o seu abandono”, o que não é a mesma coisa. Um leitor do “Observador” comentou imediatamente que “aposto que vai pesar no nosso bolso”. Pois vai, tal como a cura de uma doença terminal não se faz sem custos. Na verdade, não são só os produtores de petróleo os maus da fita: quantos de nós, nas nossas vidas de todos os dias, estamos preparados para abdicar já de um modo de vida fundado numa energia que nos habituámos a ter facilmente disponível há um século? E em Portugal, onde, por exemplo, uma cegueira irresponsável apostou no desmantelamento do transporte ferroviário em benefício do rodoviário e muitos querem ainda apostar num aeroporto para o futuro vocacionado para voos de médio curso, estes 26 anos que restam, se levados a sério, vão ser brutais.

Miguel Sousa Tavares escreve de acordo com a antiga ortografia

sábado, 16 de dezembro de 2023

Natal

 

Mais um ano! Ou menos um no conta-quilómetros da vida. E lá vêm os choradinhos da solidariedade, da tolerância, do amor, da fraternidade, as missas do parto, os adros cheios de vida, de "parideiras" e vinho-e-alhos, a azáfama dos bolos de mel, licores e doçaria, o presépio e a árvore de Natal, as limpezas e a decoração das habitações, a iluminação dos espaços públicos, as canções e melodias da época, os almoços e jantares, a noite do mercado, a família, as crianças, as prendas, a placa central e tantas outras, o circo e as animações estonteantes, até ao ribombar dos foguetes que tornam o céu multicolor de esperanças mil, as passas, o champanhe e as promessas de sermos diferentes e melhores. O habitual. 



Ano após ano o mesmo de sempre. Oiço falar da magia do Natal, mas não percebo bem se falam de puros rituais assentes em crenças ou de um período que, podendo ser aquilo que é, devia consubstanciar-se, sobretudo, nessa magia das palavras portadoras de futuro que traduzem a Mensagem de quem, naquele dia, nasceu (não me interessa a veracidade da data). 

Passo bem sem passas e promessas vãs, sem rezas públicas de Avé-Marias e Padres-Nossos, sem Missas não interiorizadas, mas não passo sem uma reflexão diária sobre a missão do ser humano, a contínua leitura do Homem no Mundo tendo por base a Palavra contextualizada com a vida. 

De que valem tantos, de cabisbaixo, talvez envergonhados, obrigados pela função, em "acção de graças" (!), baterem no peito, andarem por aí a desejar uns aos outros os votos de Bom Natal se eles próprios não conseguem renascer da sua prática muitas vezes egoísta e dolosa para com os semelhantes! Dispenso essa hipocrisia pública de salão e tapete vermelho num ritual que não acrescenta; prescindo e assobio para o lado, aquando da gritaria, muitas vezes ofensiva, do palavreado de meias-verdades escutadas nos hemiciclos; recuso a mentira que dá jeito, em todos os sectores, áreas e domínios, quando para isso se torna necessário violentar a consciência, dobrando a cerviz ao ponto do nariz aproximar-se dos joelhos; furto-me às aparências quando facilmente se percebe o oco que são e porque são; mando para longe a cultura do ter distante do ser e, facilmente, confesso, expludo para comigo próprio, perante a insensibilidade, os desequilíbrios sociais, todas as pobrezas e explorações que correm frente aos nossos olhos de espectadores. Condói-me a brutalidade das guerras, os imperialismos e a incapacidade para o diálogo dos seres dotados de inteligência; magoa-me a desenfreada corrupção através de uma louca corrida pelo dinheiro fácil, a falência dos princípios e valores, a miséria de milhares de milhões num planeta rico, em contraponto com o facto de, só na última década, 1% ter arrecadado quase metade de toda a nova riqueza gerada; revolta-me a substantiva indiferença e hipocrisia perante quem não tem tecto, oferecendo-lhes, como se essa fosse a solução, a caridade de uma refeição de Natal e uns quantos agasalhos. Para o ano, cá estaremos!

O Natal é assim. Acaba por ser um ponto de chegada e jamais um ponto de partida para uma vida renovada e alicerçada na dignidade de um projecto, individual e colectivo, com futuro. Se, finalmente, despertássemos para o seu significado mais profundo, outro galo cantaria nas Missas e outro nascimento aconteceria nas sociedades. Porém, a sofisticada engrenagem política, económica, financeira, religiosa e cultural não o permite. Vive-se numa permanente ilusão que faz adoecer e mata. Mas a plebe lá vai aguentando, esticando o magro salário, porque o biscate e a economia paralela equilibram e, lá para diante, na reforma, logo se verá; o trabalho deixou de significar resposta às necessidades básicas e, por isso, as juntas, casas do povo, associações e paróquias colmatam o sentimento depressivo da vida onde tantas famílias agonizam. Um terço da população é pobre ou está em risco de pobreza! E o círculo vicioso mantém-se porque a pobreza tendencial e paulatinamente eterniza-se.

Inclusão e esbatimento das assimetrias? Uma ova! Iludem-se os que julgam que a escola constitui o tal "elevador social" e a fuga aos constrangimentos da vida imposta. Se esta escola servisse a mudança, reflictamos, passados quase 50 anos de Abril, em que patamar a população devia estar? Que melhorou, obviamente que sim. Pelo menos para meia-dúzia! Que não resolveu a panóplia de direitos humanos, obviamente que não. A escola é aquilo que é, desrespeitosa para os talentos, vocações, interesses pessoais e para a cultura, simplesmente porque interessa que assim seja. Uma população culta, aquela que rejeita amestramentos, sabe muito mais do que as respostas às questões do manual. Os políticos reconhecem, obviamente que sim, que ela se torna potencialmente perigosa, porque pode transportar os elementos fundamentais da liberdade de pensamento e acção. Por mais perverso que possa parecer há que alimentar a nata e, subtilmente, deixar os restantes na dependência, discursando e enaltecendo, sempre, qual paradoxo, o sentido da inclusão! É o que temos na frente dos nossos olhos.

Seja como for, porque os rituais também fazem parte da vida, sendo tão bom vivê-los, neste Natal estou a repeti-los todos, sem deixar absorver-me pelas situações convencionais e superficiais. Trago em memória o Filósofo Ortega y Gasset "Eu sou eu e a minha circunstância, e se não a salvo a ela, não me salvo a mim"

FELIZ NATAL para todos e desculpem-me o desabafo arrancado das entranhas e onde tanto ficou por dizer.

Ilustração: Arquivo próprio, em casa.

segunda-feira, 11 de dezembro de 2023

No Funchal, uma cabeleireira quer escrever um livro


Por
João Abel de Freitas
Economista


Da Madeira para Portugal, à boleia do nuclear. Neste momento, a maioria na Europa é pró-energia nuclear. Em 27 estados-membros, há 16 países que constituíram no início deste ano a chamada Aliança Nuclear Europeia.



Estive na Madeira para o lançamento do livro A Energia na União Europeia/Política Errática e de Conflito e a comunicação social andou por perto.

1. No dia do lançamento, segunda-feira 27 de novembro, aproximei-me da tabacaria junto ao café Apolo, em frente à Sé, para comprar um jornal da Região.

Uma senhora em amena conversa com a vendedora dos jornais olha para mim e diz: Este senhor que é madeirense, mas não vive cá, vai lançar hoje um livro na Reitoria da Universidade. Ouvi e perguntei como sabe. E ela, vi-o no telejornal e até sei o seu nome. Uns segundos de conversa e digo mas pode lá ir. Ai, não posso, sou cabeleireira e tenho de estar no salão. E logo a seguir… também quero fazer um livro.

Sabe, dizia-me ela, sei muito da vida do Funchal. Dos amores e desamores, das doenças complicadas, das depressões das pessoas, das pessoas que pelas razões mais absurdas da vida a que por vezes não vão ligando nenhuma, mas que as mudam tanto que desaparecem e quando voltam são outras, de feições, de humor, até na forma de pensar. Muitas perderam as suas posses, o seu dinheiro… e, depois, as dificuldades de vida… e, quando têm filhos é de facto uma não vida.

Ainda perguntei, mas não vai identificar nenhuma cliente, pois não. Muito pronta, não, isso nunca. É só a vida das pessoas que conta, muito pesada, mesmo para aquelas que andam aparentemente sempre bem, que disfarçam, mas lá no fundo, sente-se…

A conversa mudou, entretanto, e começou a dizer que gostava imenso da Madeira, do mar, que ia nadar quase todos os dias e que já tinha ido naquele dia. Até fiquei surpreendido pois era tão cedo. Pensei para mim. Gosta mesmo. E não há dúvida estava ali toda morena!

Ainda lhe disse avance com o livro. E ela diz-me, vou pedir apoio a um amigo. Espero que não desista. Pareceu-me uma pessoa decidida e com garra. Simpatizei naturalmente com a senhora e fiquei com muita curiosidade à espera do livro. Sem dúvida, temas sociais em aberto, escondidos, de grande impacto e muita dor.

A energia na União Europeia – política errática e de conflito

2. O livro foi lançado nessa tarde na Reitoria e, para além da muito boa e clara intervenção do apresentador do livro, o meu colega de Liceu, Eng. Bruno Brazão, um técnico que, nos seus inícios de carreira, trabalhou na Junta de Energia Nuclear (JEN) mais concretamente no LFEN em Sacavém, onde havia um reactor de investigação, o debate alargou-se aos participantes e de forma bem viva.

É preciso dizer que havia uns certos ingredientes e curiosidade sobre o tema da Energia, suscitados por uma chamada de primeira página no Diário de Notícias: “Madeira deve apostar na energia nuclear”.

O livro não aborda a problemática da energia na Madeira, mas na entrevista a jornalista Tânia Cova chamou a questão da energia nuclear à nossa troca de ideias da seguinte maneira: “De que forma esta política errática e de conflito está a afectar Portugal? E a Madeira, sabendo que é objectivo do Governo Regional atingir 50% de energia a partir de fontes renováveis a partir de 2025”.

E a resposta foi fluindo: “Esta situação na Madeira tem de ser bem pensada, na medida em que não acredito muito que as renováveis sejam a solução. Vai depender dos projectos que houver para a Madeira [entenda-se, em termos de procura de energia].

Coloco mais a hipótese, mas isto teria de ser muito bem trabalhado, com alguma fundamentação, de uma aposta na [energia] nuclear. Portugal não tem essa posição, mas pode vir a ter. Porque não pensar num reactor de pequena dimensão? Até porque na questão das renováveis há muitas variáveis. Vejamos o exemplo da energia hídrica em que cada vez chove menos e torna-se uma energia muito intermitente.

Não me refiro a um projecto para amanhã. Sugeria que fosse pensado com equipas especializadas. Equipas que não existem neste momento em Portugal. Já existiram. Lembro que, antes do 25 de Abril, Portugal chegou a ter um reactor experimental, mas após o 25 de Abril este foi mais ou menos abandonado. Foi um erro no meu entender.

Não é fácil captar pessoas especializadas para esta área. É preciso experiência. O programa francês a dez anos vai precisar de 100.000 técnicos. A Suécia que também tem um dos maiores programas de energia nuclear da Europa tem vindo a apostar na formação.

Neste momento, a maioria na Europa é pró-energia nuclear. Em 27 estados-membros, há 16 países que constituíram no início deste ano a chamada Aliança Nuclear Europeia. Mais recentemente, [dia 7 de Novembro], a Comissão Europeia anunciou que estabelecerá uma Aliança Industrial dedicada aos pequenos reactores modulares (SMR) que arrancará em inícios de 2024. O anúncio foi feito pela Comissária Europeia para a Energia, Kadri Simson”.

A que se destina a Aliança Industrial dedicada aos SMR?

3. Esta iniciativa da Comissão Europeia dedicada aos pequenos reactores (SMR) visa três objectivos: centrar-se na aceleração destas tecnologias de carbono zero, na montagem de uma cadeia de abastecimentos da UE e na formação de mão de obra especializada com o fim de numa década implantar SMR.

No seu discurso de abertura no evento onde anuncia a criação da Aliança Industrial [Small Modular Reactor Partnership], Kadri Simson afirma: “as apostas da concorrência mundial são elevadas e é importante que mantenhamos a liderança tecnológica e industrial europeia no domínio nuclear”.

Para além de algumas dúvidas/certezas de que a UE não esteja na liderança da energia nuclear civil, esta decisão da Comissão é muito importante e pode, finalmente, ser o princípio de uma futura política energética na União.

Esta iniciativa não agradou o grupo de países antinuclear e, temos a certeza de que, na medida do possível, a Alemanha embora “em perda de terreno” não deixará de tentar barrar ao nível da UE alguns avanços nesta matéria ou pelo menos atrasá-los o mais possível.

A COP28
Finalmente, uma boa notícia desta COP.

A energia nuclear, pela primeira vez numa COP, rompe a “clandestinidade” e é tratada, em alto e bom som, quer pelo presidente Macron, quer pelo enviado especial do governo dos EUA, John Kerry, como tendo um lugar próprio e decisivo nas tecnologias de carbono zero e sem a qual os objectivos de combate às alterações climáticas jamais serão atingidos. Tudo isto afirmado na COP28 é de uma importância extrema, para além de 22 países terem manifestado a ideia (um tanto quanto irrealista, por dificuldades técnicas e de recursos humanos), de triplicar a capacidade nuclear instalada até 2050. Mas, atenção, nada de grandes entusiasmos. Foi apenas um pequeno passo.

Finalmente, é de assinalar que John Biden e Xi Jinping não estão presentes nesta Cimeira do Clima que termina amanhã, dia 12 de dezembro, no Dubai.  No entanto, pouco antes, encontraram-se em Nova Iorque onde acordaram um protocolo de cooperação onde o clima é contemplado. E, a terminar, fico na incerteza de quem vai tomar a dianteira, se a energia nuclear se o livro.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.

terça-feira, 5 de dezembro de 2023

Ganância

 


Ricardo Salgado, o ex-patrão do BES! Vi-o ontem na televisão. Pelo braço de sua mulher arrastando os pés até à viatura. Agora de cabelo desalinhado e sem gel, de sapatilhas, sem fato e gravata, longe dos corredores do poder, enfim, um homem presente mas ausente, uma pálida sombra do banqueiro de tez austera que foi. Há dois anos foi o João Rendeiro, outro banqueiro que viveu no pântano da aldrabice. Engenhosas trapalhadas marcaram a vida de ambos, deixando milhares na lista de lesados. Histórias que todos conhecemos nos seus traços gerais. 

Interrogo-me sobre a ascensão e queda destes dois (mas há outros certamente cúmplices), motivada por uma ambição descontrolada com um previsível e trágico fim. É simples mas de uma extensa complexidade a pergunta que me assalta: para quê? Porque a VIDA é muito mais que milhares de milhões de "riqueza" acumulada, muitas vezes de forma nada transparente. Milhões quando apenas temos um estômago. Conclusão das duas histórias de vida: a ganância, tarde ou cedo, conduz à destruição do ser humano.

Ilustração: Google Imagens.

sábado, 2 de dezembro de 2023

Desculpem-me insistir


Por
Miguel Sousa Tavares, 
in Expresso, 
01/12/2023
 A Estátua de Sal




Talvez pudéssemos mesmo encenar uma peça de teatro sobre esta história, chamada “Os Salvados do 7 de Novembro”, tendo como protagonistas principais Marcelo Rebelo de Sousa, Pedro Nuno Santos, Luís Montenegro e André Ventura.



Desculpem-me insistir nisto, mas isto é o essencial: é o Estado de direito, o fundamento da democracia. Começa nas fronteiras de um país, onde a forma como as autoridades nos tratam dizem logo ao que vamos. E continua depois na forma como a Justiça do país nos trata a todos, nacionais ou não nacionais. À polícia e às Forças Armadas concedemos o direito de andarem armados para defenderem a nossa segurança, a nossa soberania e a nossa Constituição. À Justiça e aos seus magistrados concedemos o poder de decidirem sobre os nossos deveres e a nossa liberdade para resolverem os nossos conflitos e garantirem os nossos direitos. 

No dia em que cada uma destas entidades, como cada um dos poderes institucionais, não for controlada por outro ou por ninguém — no dia em que um só dos poderes estiver fora de controlo —, não tenham dúvidas de que o Estado de direito e a democracia estão ameaçados. Entre nós só há um poder que, na lei e na prática, ninguém controla a não ser ele mesmo: o Ministério Público (MP).


Há democracias onde o MP é controlado directamente pelo Governo, através do ministro da Justiça, com o fundamento teórico de que, não sendo assim, não pode haver uma política de justiça assumida pelo Governo. Há países onde o MP é controlado pelos eleitores, que elegem regularmente os procuradores em função do seu histórico no desempenho da função. E há países onde o MP é controlado hierarquicamente dentro da estrutura, no topo da qual está alguém que responde ou perante o Governo ou perante o Parlamento. Mas nós somos um caso original e de “sucesso”: os nossos procuradores, além de serem independentes e irresponsáveis pelas suas decisões ou não decisões, são ainda inamovíveis e hierarquicamente autónomos, podendo apenas e em casos extremos ser disciplinarmente responsabilizados perante um Conselho Superior onde, ao contrário do que sucede com os juízes, os seus pares estão em maioria. Nenhum outro órgão de soberania, nenhuma outra actividade de serviço público, nenhuma outra profissão goza entre nós de semelhante estatuto de impunidade funcional. Os políticos têm medo de a contestar, os ignorantes acham que pô-la em causa equivale a defender a corrupção e os “poderosos”, os jornalistas apressados não querem perder as suas notícias e os populistas alimentam-se disto como de pão para a boca. Mas aqueles que sabem do que falo têm razões para não dormirem descansados: “Primeiro, vieram buscar o meu vizinho...”

O caso Casa Pia deveria ter sido um toque a rebate sobre o funcionamento do MP. Quando ficámos a saber que na investigação do processo andavam a mostrar aos miúdos traumatizados um catálogo com 30 fotografias de figuras públicas, do cardeal-patriarca a Mário Soares, escolhidas ao gosto aleatório ou não de um qualquer procurador (e onde, obviamente, não constava o retrato de nenhum magistrado), para ver se eles, confundindo figuras conhecidas dos ecrãs com figuras dos seus abusos, identificavam “suspeitos”, e nada aconteceu a estes “investigadores” e aos seus superiores, a partir daí ficou aberta a porta à intimidação processual. Que se seguiu, por diversas vezes e sempre impunemente, arrasando reputações, carreiras e vidas pessoais, afastando do serviço público gente de valor para o país, compreensivelmente aterrorizada pela madrasta justiceira do DCIAP de Lisboa. Até chegarmos ao 7 de Novembro e à escolha política que nos resta depois do raide da PGR e do MP: os salvados do incêndio, a mediocridade partidária e populista. E querem que não falemos disso, que nos conformemos, que “deixemos a Justiça seguir o seu curso”? Mas qual curso? Qual Justiça?


Entendamo-nos: não convém confundir a percepção popular da corrupção existente (que é o que aparece nos índices oficiais como o nível de corrupção de cada país) com a verdadeira corrupção existente. E também não convém confundir o crime de corrupção com todo o tipo de crime económico, fazendo do direito penal uma extensão do “direito de café”. Dito o que é evidente que temos problemas criminais deste tipo, não sei se mais ou menos abundantes do que outros, mas a todos os níveis da sociedade onde existem seres humanos permeáveis ao desejo de enriquecer rapidamente e de qualquer forma, de saltarem por cima das leis e de obterem tratamentos de favor: militares que roubam nas cantinas ou na compra de armas, médicos que aldrabam receitas, autarcas que adjudicam empreitadas à margem da lei, laboratórios contratados pelo Estado que simulam análises, consulados que vendem documentos a traficantes de droga, etc. Não há pano de linho nem peça de seda que não possa ser manchada com as mais abjectas nódoas. E todos os dias, felizmente, o MP persegue, investiga e leva a julgamento os que consegue. Mas esta criminalidade inorgânica e abstracta, que anda algures por aí, sem rostos apetecíveis para os cafés e tablóides, não seduz nem sacia o desejo de justiça popular da sociedade — que, não raras vezes até, desculpabiliza-a, vendo nela uma tentativa falhada de os “pobres” ascenderem ao mundo dos “ricos”. Eles querem verdadeiro sangue, o sangue dos “poderosos”, que são sobretudo “os políticos” — os do Governo da nação, bem entendido, porque os outros, os dos governos locais, muitas vezes são seus familiares, amigos, conhecidos, próximos, da terra. E o problema está quando este desejo de justiça popular encontra na organização do MP um departamento central de investigação, o DCIAP, que, sob a capa de chamar a si os casos mais complicados, acabou por assumir com o tempo a vocação de investigar “poderosos” e gente “mediática”, desde logo dando a ideia de que há casos e casos e, afinal, nem todos devem ser tratados por igual.

Peguemos no caso MP vs. António Costa, que finalmente mereceu uma curta explicação da procuradora-geral da República, Lucília Gago. Na esteira dos argumentos que lhe foram sugeridos pelo sindicato dos magistrados do Ministério Público, “esclareceu” ela que “havendo notícia de um crime”, o MP é “obrigado por lei a abrir um inquérito” e, depois, por um “dever de transparência”, a dar-lhe publicidade. Nenhuma das razões colhe. Primeiro, não havia notícia de qualquer crime contra António Costa. O facto de em duas ou três escutas telefónicas os intervenientes dizerem que queriam falar com o primeiro-ministro ou que iriam falar com ele não indicia: a) que o tenham feito; b) que o primeiro-ministro os tenha ouvido e concordado com a sua pretensão; e c) que esta fosse ilegítima ou criminosa. Pelo que não havia razão alguma para a abertura de um inquérito à actuação do primeiro-ministro; quanto muito, o MP prosseguiria a investigação em relação aos restantes suspeitos e se, no decurso desta, surgissem indícios sérios contra o primeiro-ministro, então, sim, abriria o tal inquérito. Mas mesmo que tenha entendido o contrário, nada, nenhum “dever de transparência”, obrigava o MP a tornar isso público: todos os dias o MP recebe dezenas de participações criminais e abre inquéritos contra denunciados ou suspeitos sem que, até por razões de eficácia, vá participar ao denunciado, particular ou publicamente, que está a investigá-lo. É óbvio e indesmentível que quando Lucília Gago escreve o tal “parágrafo assassino” sabia ao que ia. E, se não sabia, é porque não entende português — o que é muito grave nas funções que desempenha.

Durante toda a semana assisti a um impressionante blitz de defensores da PGR e da actuação do MP, insistindo, nomeadamente, que António Costa não se demitiu por causa do tal parágrafo, mas de tudo o resto: as suspeitas sobre o seu chefe de gabinete, o “melhor amigo”, dois ministros, os €75 mil no gabinete de Vítor Escária. Concedo que muito provavelmente ele demitir-se-ia depois de saber tudo isso. O problema é que demitiu-se não depois mas antes de saber tudo isso: o comunicado da PGR é ao meio-dia, Costa demite-se às 13h, o gabinete de Escária só é buscado da parte da tarde e os fundamentos das suspeitas do MP sobre os implicados só são conhecidos ao final do dia, já as agências de notícias internacionais titulavam: “PM de Portugal demite-se sob suspeitas de corrupção”. O resto da história conhecemo-lo. Talvez pudéssemos mesmo encenar uma peça de teatro sobre ela, chamada “Os Salvados do 7 de Novembro”, tendo como protagonistas principais Marcelo Rebelo de Sousa, Pedro Nuno Santos, Luís Montenegro e André Ventura.

Há dias, numa entrevista televisiva, a ex-directora do DCIAP, Cândida Almeida, queixava-se das “pressões” que se fazem sobre o MP, entendendo como pressões, e abusivas, as críticas feitas à sua actuação, neste ou noutros casos. E falava, condoída, da “amargura” que tais pressões traziam à “vida pessoal, familiar e profissional” dos procuradores do MP. Fiquei a pensar se ela seria capaz de imaginar a amargura do outro lado. Por exemplo, do lado do presidente da Câmara de Sines, acordado em casa às 7h da manhã, junto da família, com a casa vasculhada como um vulgar criminoso e logo, presumo, como é da praxe, espoliado do computador e telemóvel pessoal, depois transportado ao seu gabinete de trabalho na Câmara, onde as buscas prosseguiram à vista dos funcionários que chefia e dos munícipes que o elegeram, e daí transportado para os calabouços da PSP em Lisboa, onde — ao abrigo de uma interpretação, essa sim abusiva, da norma processual — permaneceu seis dias e seis noites em silêncio e isolamento, enquanto cá fora o seu estatuto público passou a ser o de um corrupto, até finalmente ser ouvido por um juiz que o mandou libertar, sem qualquer medida de coação, pois que nada, absolutamente nada, viu nos autos que justificasse tudo aquilo por que ele passara. Consegue imaginar, senhora procuradora? É disso que deveríamos falar.

2 Ao longo dos anos assisti a muitas cambalhotas políticas, que levei à conta da inerência da própria actividade. Mas algumas espantam mais do que outras e às vezes quase que doem, como é o caso do apoio à candidatura de Pedro Nuno Santos por parte de Álvaro Beleza e Francisco Assis, dois socialistas cuja lucidez e sensatez em nada se podem rever nas apregoadas qualidades do seu apoiado candidato. Sentindo-se justamente interpelado na sua coerência, Francisco Assis tem-se desdobrado em explicações, mas debalde: cada uma é mais incompreensível e contraditória do que a outra. E para quem também recusa aceitar a tese de um simples trade-off negociado à mesa de um restaurante, resta a única explicação lógica: que a vida partidária está cheia de intimidades não frequentáveis.

Miguel Sousa Tavares escreve de acordo com a antiga ortografia

sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

Quando não se tem noção do tempo

 

Na esteira do Filósofo Gaston Bachellard, tudo tem o seu tempo e ele já teve o seu. O Professor Cavaco Silva, com 84 anos de idade, politicamente, assim ainda não entendeu. O jornalista Manuel Carvalho, na edição de ontem do Público, a propósito da sua "aparição" no último congresso social-democrata, sublinhou: "O enlevo com Cavaco Silva é a descrença no futuro. (...) A nostalgia do cavaquismo pareceu valer mais do que uma visão, um programa, uma ideia (...). Nada de novo: a anestesia conformista do Estado Novo sempre procurou estimular o ânimo nacional com o passado. Antes, o Infante D. Henrique, agora, Cavaco Silva. Ficamos a perder". É isso. 



Apesar dos resultados eleitorais do Professor Cavaco Silva, duas maiorias absolutas e duas vitórias na corrida à presidência da República, passado esse tempo, a leitura política que uma grande parte do povo português faz é que se tratou de um tempo de graves erros estratégicos na condução do País. 

Está tudo ou quase tudo documentado, não valendo a pena desenterrar um tempo, pleno de fluxos financeiros europeus, que bem podiam ter servido para uma nova e promissora dinâmica geradora de crescimento, desenvolvimento e, por extensão, bem-estar do povo. A "aparição" do Professor Cavaco naquela reunião magna, talvez se justifique pela sua necessidade de dizer, ao jeito de Cristiano Ronaldo, "eu estou aqui". Só que, ao contrário de Ronaldo, não marca golos e não empolga, pelo contrário, afasta. 

O Professor Cavaco devia refugiar-se, quanto muito, em defesa própria, à condição de senador partidário, jamais à posição de, talvez mal comparadamente, a um velhinho galo de crista empinada sempre pronto para uma qualquer bicada de circunstância. São livros de memórias distorcidas, plenos de auto-elogio, artigos de opinião e até um livrinho fraco, dizem os comentadores, com o título: "O Primeiro-Ministro e a Arte de Governar". A pedagogia da governação como se a sua experiência tivesse sido marcante para o futuro. O "galinheiro" é outro, Senhor Professor! As bicadas só o desprestigiam. Se pensa que a sua dimensão política é intocável, devia admitir que, hoje, para milhares, talvez milhões de portugueses, as suas posições são de um sentimento negativo inenarrável. Devia olhar, como referência, para o Senhor General Ramalho Eanes.  

Aliás, porque tudo tem o seu tempo, não vejo com bons olhos, perdoem-me o excesso de linguagem, o desfile de uma espécie de "parque jurássico político", quando o que está em causa é a renovação com personalidades socialmente credíveis, técnica e politicamente robustas em matérias decisivas para a crescente melhoria da produtividade e consequente felicidade do povo. Enganam-se os que julgam que o povo tem memória curta. Não sendo possuidor de uma elevada cultura política, ele sabe, no entanto, na síntese, pelo menos os que votam, formular leituras de tudo aquilo que se passa debaixo dos seus olhos de actor/espectador. Enganam-se e estampam-se os que alguns julgam que o povo vai na promessa fácil. Já são muitos anos de experiências vividas. Por outro lado, consequentemente, por ausência de uma nova ideia para o país, infelizmente, não é de estranhar que a extrema-direita cresça no quadro de uma certa desesperança. O que lhe resta? - pergunta o jornalista Manuel Carvalho sobre Montenegro: "Carisma fraco. Currículo, pouco. Capacidade de mobilizar, escassa". Só por aí se justifica o apelo àquilo que é comum por aí se ouvir: "a brigada do reumático".

Da sua presença no Congresso fica: "A minha mulher está à minha espera para jantar". É isso. Porque há um tempo para estar e um tempo para sair de cena. E há tanto para fazer na aposentação!

Ilustração: Google Imagens / Expresso

terça-feira, 28 de novembro de 2023

Neste Natal... a certos, sugiro a oferta de um espelho

 

Escrevo este texto desde logo separando dois âmbitos diferentes de análise: o da amizade, estima e consideração que nutro pelo Dr. Carlos Pereira, Deputado na Assembleia da República; dos posicionamentos e subterrâneos político-partidários. Não os misturo, de todo. Ser  um verdadeiro Amigo tem uma expressiva e abrangente dimensão, por isso, embora eu comungue dos princípios e valores que ele segue, quando, em algum momento, discordamos, preferível tem sido, frontalmente, assumirmos a dissonância. O debate entre o cidadão e o político deve ser assim.

 


Ora, vou ao assunto que aqui me traz. O Dr. Carlos Pereira, com o devido respeito por todos os eleitos da Madeira no parlamento nacional, independentemente do partido que representa, da minha análise resulta que tem sido uma figura distintiva entre os demais. Não me parece existir comparação possível. A leitura que faço é que se trata de um Deputado que não se perde em assuntos menores e na velha e gasta tecla de gritar a plenos pulmões a Madeira. É, politicamente, frontal e profundo.

Às vezes ouço sons em exagerados decibéis de lengalengas do tipo "timex", que não adiantam nem atrasam. Sobretudo, desusadas réplicas frágeis e primárias, quando o que está em causa são os temas que marcam e que se repercutem na vida das pessoas. Ele, não. Porque estudou e domina, como muito poucos políticos, os dossiês da Economia, sabe do que fala e por que fala! Aliás, o seu livro A Herança, publicado em 2015, devia ser de leitura obrigatória por qualquer político ou candidato ao exercício da política. Presumo que muitos não o tenham lido e muitos também não o tenham compreendido para melhor carregarem a essência da Região. Li-o três vezes para poder perceber a engrenagem económica e financeira desta região autónoma.

Portanto, quando li um recente artigo de opinião de um camarada do seu partido, falando não falando de Carlos Pereira, mas desancando-o e abrindo caminho aos interesses pessoais ou de grupo, talvez porque se aproximam eleições legislativas nacionais, pois bem, todo aquele arrazoado não transportava outra coisa que não a propaganda que se afasta das tais e prioritárias preocupações de quem é Deputado da Nação. Ficou-me a ideia de uma desesperada tentativa de chegar-se à frente (eu estou aqui) ou a colagem a um qualquer senhor que se segue no topo da hierarquia partidária. No essencial, trata-se de uma acção, useira e vezeira, para obter um resultado pessoal através do afastamento de figuras credíveis. É triste, feio e de consequências negativas.

Sempre defendi a qualidade e, por isso mesmo, sempre parti do pressuposto da existência de pessoas indiscutivelmente melhores do que eu. Essa a razão que me levou a nunca ter sido candidato à Assembleia da República (nem como suplente), muito menos ao Parlamento Europeu. Mas há figuras que se sentem indiscutíveis, com uma surpreendente leitura de si próprias. Conheço vários casos, um que trago em memória, de Machico, que nem para uma Junta devia ser convidado, porém é deputado e, pasmo, presidente de uma das principais Comissões Especializadas da Assembleia. São os tortuosos caminhos do poder. 

Espero que o Dr. Carlos Pereira, pela dimensão que tem, se mantenha na República e que, mais cedo que tarde, em função da sua qualidade, atinja o patamar da governação nacional. Sei do que falo porque com ele trabalhei vários anos.

Ilustração: Google Imagens.

sábado, 25 de novembro de 2023

Interessante



Quando fico a pensar no que se está a passar em Portugal, não vou mais longe, nas recentes e sucessivas trapalhadas do Ministério Público, nas declarações da Senhora Procuradora Geral da República, no "golpe judicial" que fez derrubar um governo de maioria absoluta, no alegado envolvimento de Belém, de forma directa ou indirecta no caso das gémeas brasileiras (ainda bem que foram tratadas porque se trata de seres humanos, porém não é isso que está em causa, mas sim a transparência), trago sempre em memória estas declarações do Dr. Paulo Portas. A história da Vichyssoise!

Nunca votei neste Presidente da República, mas reconheço que o Professor Doutor Marcelo Rebelo de Sousa foi uma lufada de ar fresco (também não era difícil) relativamente ao anterior presidente Cavaco Silva. Porém os seus "pecados" são muitos e esta caracterização de Paulo Portas ao programa de Herman José, ajuda a perceber muita coisa no tempo que estamos a viver. Como me transmitiu o meu Amigo Engº Arlindo Oliveira: "o vídeo já é antigo, mas vale a pena recordar o Marcelo cidadão".

 

segunda-feira, 20 de novembro de 2023

Ministério Público: como chegámos aqui?


Por
Maria José Fernandes, 
Procuradora Geral Adjunta, 
in Público, 
20/11/2023





(Afinal ainda há gente com bom senso na corporação que é o Ministério Público. E não digam agora que a senhora não sabe do que fala. Sabe, e depreende-se que não pôde dizer tudo o que gostaria. 20 valores para esta senhora Procuradora. E, não precisando de valores, à Estátua só lhe competia publicá-la, e não falhámos. - Estátua de Sal, 20/11/2023)


Por estes dias, tenho sido abordada para me pronunciar em televisões sobre as adjacências processuais, jurídicas e políticas do caso que vem preenchendo os espaços da comunicação social e que deixou os cidadãos perplexos. Não aceito, pois não posso falar com total liberdade. Já os sindicalistas desfrutam desse privilégio e temos-lhes escutado afirmações controversas, cínicas no dizer de alguém.

Como foi possível acontecer tudo aquilo a que assistimos há duas semanas? Como se chegou até à tomada de decisões que provocaram uma monumental crise política e cujas consequências vão ainda no adro?

Uma coisa é certa: ver um certo político populista de extrema-direita monopolizar a defesa da atuação do MP, dá muito que pensar! Outros haverá que resguardaram o regozijo da crise por entre dentes e aguardam a sua oportunidade num silêncio de marketing.

O meu colega António Cluny escreveu um interessante artigo de opinião, onde destaca a atuação individual de cada procurador no despacho de inquéritos criminais, pelo que considera errado que o jornalismo se refira coletivamente ao MP como “autor” das decisões agora controvertidas. Conclui que a sua experiência na Eurojust lhe permitiu confirmar a necessidade de uma coordenação forte e ágil, por procuradores com legitimidade e experiência, sem o que não haverá sucesso na luta contra a criminalidade atual.

Originalmente, o MP foi concebido como um corpo hierarquizado piramidal, para representar o Estado nos tribunais, tendo no topo o procurador-geral da República, que dirigia, coordenava, determinava e dava instruções, plasmadas em diretivas. De permeio, entre o procurador-geral da República e os procuradores da base, a organização hierárquica é regionalista, coincidindo com os quatro tribunais da Relação. Desde há décadas, paulatina e persistentemente, o sindicato (SMMP) lançou e insistiu numa reivindicação de maior autonomia individual dos procuradores nas decisões que tomassem, em todas as áreas de intervenção, mas e sobretudo na investigação criminal. O que se pretendia era que cada procurador conduzisse os processos-crime sem interferências, ao seu grado, exigência que tem subjacente e camuflada uma desconfiança relativamente às hierarquias intermédias e superiores, a meu ver injusta e infundada. Porque há-de ser mais “autónomo” e idóneo um procurador da base do que um de topo? Desde logo, como em todas as profissões, há a excelência, a mediania e o sofrível, pelo que se impunha a supervisão do que fosse mais relevante.

Noutros estados europeus avançados, vigoram modelos interventivos diferentes. A gama é variada.

Na Itália dos anos 1980/90, como os leitores recordarão, a atuação autónoma dos procuradores era de tal ordem que começou a criar graves problemas de desestabilização e até de oportunismo político, com os resultados que se conhecem. Foi necessário introduzir normas de equilíbrio, ali por via de regulamentação interna.

Não há muito tempo, no processo do caso Tancos, quem investigava (DCIAP) pretendia inquirir como testemunhas o Presidente da República e o primeiro-ministro. O então diretor daquele departamento opôs-se e impediu tal diligência, por entendê-la inútil, tendo fundamentado a sua decisão num despacho próprio que entendeu dever ficar arquivado à parte. Gerou-se grande sururu dentro da corporação; sindicalistas clamavam que esse despacho tinha de ficar visível no próprio inquérito, outros que não, que podia ficar guardado no que chamamos “dossier de acompanhamento”, como acabou por acontecer. No fim, o desfecho do processo demonstrou que o hierarca tinha razão quanto à inutilidade de inquirir as duas altas figuras do Estado.

Acontece haver quem entenda a investigação criminal como uma extensão de poder sobre outros poderes, sobretudo os de natureza política. Daí que sejamos surpreendidos, de vez em quando, com buscas cuja utilidade e necessidade é nenhuma, pese embora quem as promove sempre se escude no argumento de opacidade: “Eu é que sei o que está no processo, eu é que sei se são necessárias ou não!” E a sorte é que até há pouco tempo o DCIAP dispunha de um tribunal de instrução privativo, com um juiz de instrução igualmente privativo por ser o único durante largos anos. O perfil decisório desse JIC era conhecido, não há constância de contrariedade ao MP. Maus hábitos.

Já noutra frente, a frase que não saía da boca de sindicalistas e de certas responsáveis máximas do MP era o “​​reforçar da autonomia interna”​ dos procuradores, empenho bem-sucedido, pois a autonomia não só foi reforçada, como até calafetada!

As personagens aludidas granjearam assim a simpatia e até quase camaradagem (em congressos) de certo jornalismo que segue as peripécias da corrupção atribuída a políticos e que tem a militância de deixar Portugal bem colocado nos rankings internacionais da percepção desse flagelo.

Desta sorte, procuradores que não hesitem em meios de recolha de prova intrusivos, humilhantes, necessários ou não, são o top da competência! Outros magistrados de elevado escalão que seguem esta linha argumentativa e a verbalizando no discurso público também têm o elogio garantido. Pelo contrário, quem se opõe à estridência processual é rotulado protetor dos corruptos! Neste enquadramento e sendo a nossa dimensão quase paroquial, poucos têm pulso para impor o que deve ser a sensatez, a escorreita interpretação jurídica dos factos, o respeito pelos direitos fundamentais dos cidadãos suspeitos, a investigação célere.

Em todos os departamentos de investigação e ação penal, mas mormente no DCIAP, deveria privilegiar-se o pensamento crítico, a discussão interdisciplinar, nomeadamente com colegas de outras jurisdições tocantes ou conexas; temo que se tornem cabines herméticas, onde pontuam algumas prima donnas intocáveis e inamovíveis e onde a “falta de meios”, de peritos disto e daquilo é sempre a velha razão para os passos de tartaruga a que se movem as investigações.

Permitiu-se a criação de uma bruma de auto-suficiência totalmente nefasta e contrária ao que deve ser a qualidade e a excelência desta profissão; os desfechos de vários casos já julgados permitem extrair que há aspectos do trabalho dos procuradores de investigação a carecer revisão e aprimoramento pelo exercício da autocrítica.

Uma investigação bem feita e fundada em provas irrefutáveis conduz a uma acusação de boa síntese factual e melhor incriminação nos tipos de ilícito aplicáveis ao caso. Um julgamento com esta base acusatória corre rápido e permite a quem julga uma decisão célere e bem fundamentada.

Não resisto e exemplificar, por curiosidade, o que deve ser a ponderação de conceitos no crime de recebimento indevido de vantagem, que tem como elemento objetivo nuclear o recebimento de uma vantagem patrimonial ou não patrimonial indevida.

O conceito de ​“vantagem patrimonial” não oferece qualquer dúvida interpretativa: é um acréscimo de património. Já a vantagem “não patrimonial”​ é de mais difícil recorte, podendo ser uma vantagem social. Assim, a oferta de um almoço num restaurante caro será uma vantagem? Em que se traduz essa vantagem? No prazer da degustação? E se o agente não apreciou a refeição, quid iuris?

terça-feira, 14 de novembro de 2023

Órgãos de Soberania sem sentido de Estado

 

Nota prévia
Estive fora do país, não acompanhei os recentes acontecimentos, portanto, o que aqui deixo enquanto breve reflexão, pode assentar em alguns aspectos que não consegui juntar ou compreender. De qualquer forma, o essencial da denominada "crise política" está na frente dos olhos de qualquer cidadão. 

Posto isto, parece-me óbvio que a situação que estamos a viver constitui uma consequência de muitas causas não equacionadas ao longo de muitos anos. Eu diria décadas. No nosso país falta-nos consciência cultural, rigor, disciplina conquistada pela compreensão das pessoas, brio, ambição, responsabilidade e noção de vergonha. Falta-nos escola séria que trave os oportunismos, a partidarite aguda, o dinheiro conquistado de forma fácil, os jogos subtilmente feitos nos bastidores, a ausência de uma mentalidade para aceitar lugares de gestão e administração sem que para eles as figuras estejam preparadas, política, científica e tecnicamente. As sucessivas gerações foram embrulhadas em definições dos manuais escolares, em testes e exames e o principal foi adiado, exactamente, a exigente formação do ser que não se coaduna com o ter a qualquer preço. Resvalámos sem sentido de responsabilidade e, muito menos, de Estado. Os princípios e os valores foram secundarizados e, portanto, desde os Órgãos de Soberania à comunicação social com a qual estamos confrontados, é evidente uma arrepiante "pobreza". Ninguém se safa neste processo que tem contornos dramáticos. Já lá vou ao cerne da questão. Nada que a Democracia não atenue, é certo, mas que é preocupante, obviamente que é.



Na decorrência deste estado de coisas é comum ouvir-se: "à política o que é da política e à Justiça o que é da Justiça". O drama é que se assiste a uma subversão dos dois espaços de intervenção que conduz a que ambos funcionem quase em roda livre. No exercício da política são evidentes os traços do poder pelo poder e, na Justiça, as costelas partidárias parecem levianamente claras. Na política há muitos erros de casting, prevalecendo as afinidades e as cumplicidades dos vários corredores, do que propriamente a preocupação na busca de cidadãos de notória qualidade e respeitabilidade social; na Justiça, pergunto, o que dela dizer, quando Procuradores e Juízes se envolvem em situações condenáveis; quando, entre outros aspectos (muito graves) investigações em "segredo de Justiça" circulam na comunicação social desde transcrições integrais de escutas, até os próprios interrogatórios dos juízes aos eventuais arguidos. Chega-se ao ponto de prender para investigar! A Justiça, em qualquer patamar, desejável seria que fosse discreta, profunda e célere, mas não, o cidadão confronta-se, sim, com o espectáculo mediático, com as estações de tv sorrateiramente "convidadas" a acompanhar as buscas, por exemplo! 

Ora bem, em meia-dúzia de dias, pasme-se, o Ministério Público fez cair um governo, levou o Presidente da República a marcar eleições legislativas e manchou, profundamente, a imagem de figuras que, até prova em contrário, devia ser protegida. Entretanto, caiu por terra uma investigação megalómana, baseada em supostos indícios, o que constituiu, segundo um advogado comentador, a uma "derrota profunda" do Ministério Público. Que não foi a primeira. Tenho presente o que, recentemente, fizeram ao Dr. Rui Rio! E agora, é lícito que se pergunte: que consequências resultam para os "investigadores" a consequente responsabilidade de vários meses de instabilidade e de um acto eleitoral (que tem os seus custos) do qual pode, eventualmente, redundar numa composição da Assembleia da República que torne o país ingovernável durante meses? A Senhora Embaixadora Ana Gomes assumiu que parte da opinião pública "desconfia que isto pode (configurar) ser um golpe de estado judicial". Não deixa de ser interessante esta posição, pois aquilo que alegadamente pode traduzir é uma alegada instrumentalização partidária do Ministério Público que coloca em causa a estabilidade do País e a própria credibilidade externa. E perante tantos e tantos casos, estranhamente, a Senhora Procuradora Geral da República continua a passar entre os pingos da chuva! Que raio de poder este ao qual ninguém põe um travão. E isto nada tem a ver com um quadro de Órgãos de Soberania. Tem a ver com os pressupostos de um regime democrático.

No meio disto, também o Senhor Presidente da República, pela sua postura hiperactiva, não soube esperar e zás, procurou o caminho mais fácil sem ter em conta as consequências. Teria sido, presumo, muito mais sensata a indigitação de um novo primeiro-ministro. Uma nova figura que, certamente, a partir do cansaço da população relativamente a tantos casos embaraçosos, nomearia um governo formado por pessoas respeitáveis, credíveis e impolutas. Evitaria eleições, respeitaria os eleitores que votaram na actual maioria absoluta e evitaria, também, uma certa paralisação do país nos próximos meses. Por uma questão de bom-senso numa altura que a esmagadora maioria dos indicadores económicos são muito favoráveis. Um futuro governo pode, até, vir a governar com um Orçamento que não foi da sua responsabilidade!

Mas há fome de poder. Há uma necessidade de dar gás a um jornalismo pouco cuidado, ávido de sangue e sôfrego pela anormalidade, de tal forma que as suas audiências se mantenham no topo. E os Órgãos de Soberania, espantosamente, vão nisto. O estado a que isto chegou merece uma profunda reflexão.  

Ilustração: Google Imagens - Público.

segunda-feira, 13 de novembro de 2023

Primeira cimeira mundial sobre Inteligência Artificial


Por

Apesar da necessidade de regulamentação acolhida na Cimeira, a sua elaboração deve ser rodeada de muita perspicácia, inteligência e de alguma facilidade de adaptação e aplicação.



1. A primeira cimeira mundial dedicada aos riscos e regulação da Inteligência Artificial (IA) realizou-se, por iniciativa do Reino Unido, nos dias 1 e 2 de Novembro de 2023, em Bletchley Park, a norte de Londres, sem Joe Biden mas com Elon Musk. Esta cimeira reuniu 28 países e cerca de 100 empresas com negócios na área da ou para a IA.

Tratou-se de uma cimeira importante, em que participaram os três maiores países investidores em capital de risco IA (Jovens empresas/Start-ups). Segundo informação da OCDE, o investimento em capital-risco atingiu, em 2022, 100 mil milhões de dólares, somando os EUA 56,7 mil milhões, a China 21,5 mil milhões e o Reino Unido 7,1 mil milhões.

A China em segundo lugar e ainda a distância considerável dos EUA afirma que está em disputa pelo topo, pensando atingi-lo em 2030. Os EUA tudo fazem para dificultar o sucesso desta competição, designadamente proibindo a transferência da sua tecnologia para a China que algumas empresas exportadoras de chips, como a Nvídia, gigante americano das placas gráficas, têm sabido contornar.

Segundo a OCDE, os 27 países da UE apenas investiram 15,8 mil milhões de dólares, participando a Alemanha com 3,7 e a França com 2,8 mil milhões de dólares. Alemanha e França posicionam-se atrás da Coreia do Sul e Israel e muito próximas do Canadá, Índia, Singapura…

Esta informação permite olhar, com muito desânimo, para o quadro das grandes fragilidades da União Europeia (UE), em contraste com a sua ambição de pretender desempenhar um papel central na regulação da IA. Para Bruno Le Maire, ministro da economia de França, a regulação é importante, mas só será eficaz se, antes, os actores europeus dominarem a IA. E nisto transparece uma certa clivagem com a pressa de regulação por parte da Comissão Europeia, correndo-se o risco de com o processo em curso de regulamentação na UE se estabelecerem normas “pesadas”, difíceis de ajustamento futuro aos rápidos avanços na IA.

É isto que pensam e com razão as poucas empresas europeias que marcam posição na Inteligência Artificial.

Apesar da necessidade de regulamentação acolhida na Cimeira, a sua elaboração deve ser rodeada de muita perspicácia, inteligência e de alguma facilidade de adaptação e aplicação e não de uma legislação pesada como é timbre das regulamentações da União Europeia.

O debate


2. O debate foi longo, enriquecedor e vivo e nele foi posto em evidência a necessidade da regulação, como instrumento para acalmar os muitos receios gerados.

Durante dois dias, dirigentes políticos, peritos de IA e gigantes das tecnologias reunidos por iniciativa do Reino Unido – que pretende carimbar a liderança deste processo de cooperação mundial nesta tecnologia – debateram a IA, apresentando diferentes visões e apontando diversos sectores onde a sua aplicação terá maior impacto como a medicina, a educação, a economia, sem deixar, contudo, de realçar que poderá contribuir para a desestabilização das sociedades, por exemplo, se for permitida a sua incorporação no fabrico de armamento, sem controlo do ser humano.

Também se abordou o seu potencial impacto na distorção de resultados eleitorais pelos falsos conteúdos “perfeitos” que são possíveis de produzir com a sua utilização indevida.

Elon Musk, o controverso patrão de K, da Tesla e da Space X, bateu-se por uma arbitragem independente da IA (despolitizando-a!!), tendo declarado à comunicação social durante a cimeira que a IA constitui “uma das grandes ameaças que pesa sobre a Humanidade”.

A vice-presidente dos EUA, Kamala Haris em perfeita sintonia com Musk, também realçou “as ameaças existenciais da IA que poderão pôr em perigo a própria existência da Humanidade” e anunciou que os EUA vão criar em Washington um Instituto sobre a Segurança da IA, imitando aliás o que o Reino Unido anunciara vir a fazer.

Dois dias de reuniões bem positivas, porque, além de se colocarem na mesa os diversos ângulos de visão sobre a IA, houve uma declaração histórica sobre o assunto. Os pontos-chave dessa declaração são transcritos da UNITE AI/ETICA.

Pontos-chave da Declaração


3. A Declaração de Bletchley, que emergiu do consenso coletivo de 28 países, estabelece uma visão comum para promover a segurança e considerações éticas no desenvolvimento e implantação da IA. Os princípios básicos resumidos na declaração são os seguintes:

Cooperação internacional: É dada forte ênfase à promoção da cooperação internacional para navegar no complexo cenário de segurança da IA. A declaração enfatiza a necessidade de uma frente unida para enfrentar os desafios e aproveitar as oportunidades que a IA apresenta no cenário mundial.

Padrões de segurança: A declaração exige o estabelecimento e a conformidade de altos padrões de segurança no projeto, desenvolvimento e implantação de sistemas de IA. Isso inclui um compromisso comum para reduzir os riscos associados à IA e garantir que essas tecnologias sejam desenvolvidas usando uma abordagem baseada em segurança.

AI ética: Uma forte bússola moral orienta a declaração, destacando a importância das considerações éticas na IA. Isso significa garantir que as tecnologias de IA respeitem os direitos humanos, a privacidade e os valores democráticos, promovendo uma abordagem centrada nas pessoas para a IA.

Transparência e responsabilização: A declaração também sublinha a importância crucial da transparência e da responsabilização nos sistemas de IA. Isso é visto como a pedra angular da construção de confiança e da compreensão pública, que é essencial para a integração bem-sucedida das tecnologias de IA na sociedade.

Partilha de conhecimento: Incentivar a partilha de conhecimento e a pesquisa colaborativa entre as nações é um aspecto fundamental da declaração. Isso visa acelerar a compreensão global e a mitigação dos riscos relacionados com a IA, promovendo uma cultura de aprendizagem compartilhada e melhoria contínua das práticas de segurança da IA.

O Reino Unido a marcar posição


4. O primeiro-ministro britânico saudou no X (ex-Twitter) a Cimeira, designando-a de histórica e referindo que marca o início de um novo esforço mundial com o fim de reforçar a confiança das pessoas na IA, na expectativa da sua “segurança”.

O ministro da Tecnologia britânico, Michelle Donaton, que coordenou os trabalhos, afirmou em declarações à France Press que esta cimeira “não tem por objectivo elaborar as bases duma legislação mundial, mas acordar num caminho a seguir”.

O que se segue


5. Duas cimeiras internacionais ficaram previstas. Uma na Coreia do Sul dentro de seis meses (virtual) e outra em França e o Reino Unido a comprometer todo o seu empenhamento na criação de um Grupo de Peritos em IA com base no modelo que existe e funciona para o clima, o IPCC (sigla em inglês) ou GIEC (sigla francesa).

Nota final: O grupo intergovernamental de peritos para o Clima tem por missão a produção de relatórios anuais sobre os riscos decorrentes das alterações climática e a elaboração de propostas de medidas para minorar os efeitos dessas alterações. De igual modo, o Grupo de peritos em IA quando funcionar terá a seu cargo a produção de relatórios sobre a situação, a problemática das “fake news” e a temática do emprego.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.

segunda-feira, 30 de outubro de 2023

Energia nuclear e Inteligência Artificial


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Para além dos elevados consumos de energia, a Inteligência Artificial também é uma forte consumidora de água para manter os seus supercomputadores refrigerados.



Um namoro de bom augúrio, ainda a desabrochar e a acomodar-se. A energia nuclear anda numa caminhada de novos desafios. A sua ligação à Inteligência Artificial (IA) não deixa de ser um deles e a oferecer múltiplas saídas. Para já, um duplo relacionamento está a antever-se num horizonte próximo.

Um, onde a IA está a ser chamada a intervir, situa-se no domínio da fusão nuclear. E, se houver sucesso, poderá desempenhar um papel crucial. Esta intervenção consiste em criar “um algoritmo”, ou seja, um instrumento de apoio IA, para o controlo da estabilização do plasma a altas temperaturas, no interior do reactor de fusão. Estes desenvolvimentos estão a decorrer desde algum tempo e, segundo li, levaram à constituição de equipas específicas no sentido de gerar instrumentos IA que respondam segundo a capacidade e a função requeridas.

Outra linha bem diferente é a nuclear como fonte de alimentação de energia no próprio processo de desenvolvimento da IA.

Debruçando-nos um pouco sobre esta última vertente, pois a disponibilidade de informação é maior, o problema no essencial resume-se no seguinte: as grandes tecnológicas e, nomeadamente, os cinco maiores grupos de origem americana, conhecidos pela sigla GAFAM (Google, Apple, Facebook, Amazon e Microsoft), precisam, para entrar, a fundo, na Inteligência Artificial nas suas áreas específicas, de lançar grandes Centros de Dados (Data Centers), pois, como se sabe, quanto maior for a quantidade e qualidade de dados do sistema, de melhor qualidade serão os seus produtos finais apurados.

Os Centros de Dados são actividades de consumo muito intensivo em energia e água. E, pelo menos, a Microsoft já está no terreno com a intenção declarada de constituir uma equipa para planear o uso da energia nuclear no grupo e, nesse sentido, tem avançado com o processo de recrutamento de especialistas e manifestou a intenção de recorrer a SMR, pequenos reactores modulares, como solução para o problema do elevado consumo energético.

Os EUA, através da Lei de Redução da Inflação (IRA), um programa para a redinamização da indústria americana no contexto de competição com a China, criaram condições favoráveis de financiamento (incentivos) a este tipo de projectos, tanto mais quanto a IA entra, para os EUA, nos domínios da geoestratégia global, política, económica e tecnológica.

Na base desta lei, mais de uma dezena de locais encontram-se já identificados ao longo do país e vários modelos de SMR têm recebido ajudas significativas. A título de exemplo, o Departamento de Energia dos EUA atribuiu à TerraPower, uma empresa fundada em 2006 por Bill Gates, um subsídio de cerca de dois mil milhões de dólares para a construção de um reator “rápido de neutrões refrigerado a sódio” e um outro subsídio de 1,2 mil milhões à X-energy para o seu reactor “a alta temperatura, refrigerado a gás”, (ler in “La relance du nucléaire dans le monde, édition 2023”).

O apoio aos múltiplos projectos de pequenos reatores modulares (SMR/AMR) no programa IRA presta-se, sobretudo, a incentivar a inovação rápida.

Os SMR têm a vantagem de alimentar os Centros de Dados com energia limpa, emissões de CO2 a tender para zero e, assim, as empresas conseguem com esta opção de investimento cumprir também os seus compromissos no carbono. Desta forma, a IA que é muito mais intensiva em consumo de energia que outros usos digitais veria o problema resolvido com uma pegada de carbono muito reduzida.

Mas a Microsoft anda interessada em tecnologias avançadas de reatores de forma mais ampla e decidiu mesmo avançar para a fusão nuclear. Em Maio de 2023, anunciou a assinatura de um contrato com a Helion Energy (uma Startup da fusão nuclear) para a construção de um SMR com a capacidade de 50MW, a operar a partir de 2028.

A resultar, concretizar-se-á um sonho tão ambicionado por se tratar de um SMR de Fusão. O Programa IRA também aponta para SMR em 2028, mas ainda da nuclear clássica (fissão).

Face a alguma descrença acerca deste projecto, a Helion Energy afirma que se trata de uma “assinatura” para vingar e que já em 2024 vai dar provas da sua capacidade tecnológica de concretização. Sobre este contrato, há quem o apelide de anúncio louco da Microsoft e da Helión (ver SFEN, 13 Outubro 2023).

Para além dos elevados consumos de energia, a IA também é uma forte consumidora de água para manter os seus supercomputadores refrigerados. No seu relatório de sustentabilidade 2023 a Microsoft refere que está a gastar mais 30% de água que antes e “investiu milhares de milhões de dólares numa parceria com a OpenAI, criadora do ChatGPT, e agora está sendo forçada a alimentar e a resfriar as crescentes necessidades de energia de seu parceiro para treinar os modelos mais recentes da OpenAI”.

É bem notório do que se disse antes que, entre o Estado americano e as grandes tecnológicas, existe uma grande sintonia para se posicionarem na linha da frente em duas áreas tão importantes de futuro como a Energia Nuclear e a Inteligência Artificial. E é nessa base que a Lei de Redução da Inflação está a operar criando muitos problemas à União Europeia (UE), através do desvio de investimentos para o território americano e até a deslocalização de empresas sedeadas na União.

A UE tentou responder com o programa “Green Deal Industrial Plan”, the road to net.zero (há quem acrescente). De facto, há sempre um “mas”, e os impactos na reindustrialização europeia tendem para zero ou quase.

Os desentendimentos em áreas tão sensíveis como a Energia, em que é mais correcto falar-se de duas Uniões, pois a Aliança Nuclear europeia é uma realidade já maioritária, em termos de países aderentes no seio da UE, embora não reconhecida pela máquina burocrática que continua a emperrar a sua influência e a não referir a nuclear como energia de baixo carbono nos seus documentos.

Evidentemente, os EUA não estão sós, estão dinâmicos, inclusivamente avançaram recentemente com uma unidade de tratamento de urânio enriquecido para reactores nucleares inovadores (SFEN 13/10/2023), tendo fechado a sua última unidade tecnicamente obsoleta em 2013 e abasteciam-se na Rússia através da Rosatom.

E como os EUA não estão sós e esta é uma área sensível e de grande competição agora e no futuro a nível do Planeta vamos tentar trazer aqui o que se está a passar, nestas áreas, nomeadamente na China, principal concorrente.

Infelizmente, enquanto a China e os EUA estão a implantar “meios de circulação” que lhes permitem circular nestes domínios a alta velocidade, a Europa circula a baixa rotação. Com desentendimentos, desnorteamentos e sem metas concretas de longo prazo, a situação é paralisante e desanimadora. A União Europeia, assim, está a perder o comboio e não se encontra numa política energética a sério.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.