A escola do meu tempo não pode servir de referência em múltiplos aspetos, mas a verdade é que entrávamos a 7 de Outubro, a 7 de Janeiro e as férias ditas grandes eram mesmo grandes. Havia tempo para o jogo em um sentido lato, tempo para brincar de forma muito séria. Como sublinhou Jean Chateau (1961), "se o jogo desenvolve as funções latentes, compreende-se que o ser mais bem dotado é aquele que mais joga" (...) "para ela quese toda a atividade é jogo, e é pelo jogo que ela descobre e antecipa as condutas superiores". Para Claparède, in Psychologie de l'enfant e pédagogie expérimentale, "o jogo é o trabalho, o bem, o dever, o ideal de vida. É a única atmosfera em que o seu ser psicológico pode respirar, e, consequentemente, pode agir" (...) Perguntar por que joga a criança, é perguntar por que é criança".
Há poucos dias, numa iniciativa do Laboratório de Ideias do PS-Madeira, atentamente ouvi e participei num debate sobre a "Escola a Tempo Inteiro" - ETI. Eu que sou visceralmente contra a "Escola a Tempo Inteiro, porque entendo que devemos ter apenas ESCOLA, e que essa escola esteja configurada com uma nova organização social que garanta tempo para ser criança e tempo para a família, num dos últimos dias, a propósito, ouvi a síntese de um estudo muito interessante, que vou procurar lê-lo, e que vem ao encontro do que tenho vindo a sustentar. Assume tal estudo europeu que as crianças portuguesas, do primeiro ciclo de estudos, são as que mais tempo passam na escola. Em Portugal são 936 horas por ano; em Espanha 875; em Inglaterra 798 e, na Finlândia, apenas 569 horas. Isto é, a Finlândia, que tem servido de paradigma (pelo menos em alguns aspetos) no debate político sobre o sistema educativo, as crianças passam na escola, em média, menos 367 horas por ano. Apesar disso, sabe-se que, em Portugal, os resultados da aprendizagem não são os melhores, isto é, mais escola não significa melhor escola.
É evidente que se trata de um problema muito complexo, com imensas variáveis, e que, tal como já o referi em um outro texto aqui publicado, a sua correção levará, no mínimo, quatro a cinco legislaturas. Ora, a ETI surge como uma boa resposta para um problema errado. A organização social é que está errada, a organização do mundo do trabalho é que deve ser corrigida tendo em atenção, inclusive, a entrada e consolidação da mulher no mundo laboral, as políticas de família é que são frágeis e quase inexistentes, a qualificação profissional das pessoas é que é baixíssima, nos titulares das empresas também, e, por isso, a ETI surge para responder a esta desestruturação global. Dir-se-á que umas coisas não se encaixam nas outras, daí que a escola esteja transformada, na palavra do Psiquiátra Daniel Sampaio, em um "armazém de crianças". Depois, andam, por aí, a escolarizar o que deve ser do domínio do lazer e da opção individual, enchendo a escola com horas e mais horas disciplinas não nucleares.
A escola do meu tempo não pode servir de referência em múltiplos aspetos, mas a verdade é que entrávamos a 7 de Outubro, a 7 de Janeiro e as férias ditas grandes eram mesmo grandes. Havia tempo para o jogo em um sentido lato, tempo para brincar de forma muito séria. Como sublinhou Jean Chateau (1961), "se o jogo desenvolve as funções latentes, compreende-se que o ser mais bem dotado é aquele que mais joga" (...) "para ela quase toda a atividade é jogo, e é pelo jogo que ela descobre e antecipa as condutas superiores". Para Claparède, in Psychologie de l'enfant e pédagogie expérimentale (não tinha eu ainda nascido), "o jogo é o trabalho, o bem, o dever, o ideal de vida. É a única atmosfera em que o seu ser psicológico pode respirar, e, consequentemente, pode agir" (...) Perguntar por que joga a criança, é perguntar por que é criança".
Ora, é aquela desestruturação social que conduz a uma certa escravização do mundo da criança, levando-a a passar horas a mais num mundo que não deve ser o seu. Os adultos (políticos) não perceberam que "o jogo é a fonte comum de todas as atividades superiores". Daí escolarizarem tudo, o que é contranatura para a criança, porque os pais estão, também, sujeitos à escravização do mundo do trabalho. Temos, assim, pais a meio tempo e escola a tempo inteiro. Um absurdo. Mas o debate só agora começou, embora, as mudanças a operar só sejam possíveis com outros atores políticos. Estes já demonstraram que não sabem pela via do conhecimento científico, quer pela via do pensamento político.
Ilustração: Google Imagens.
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