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sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

Inteligência Artificial: EUA vs. UE


Por
Economista

Persiste uma questão após a Cimeira Mundial de IA: estarão os Estados inclinados para apoiar uma IA onde contam e dominam os negócios das ‘Big Techs’, ou para uma IA entendida como valor público?



Quase sempre, cada um é levado a fazer aquilo em que se viciou. Só que, em muitos casos, não sair da rotina dominante em que se caiu, cria fortes obstáculos aos fins que se pretendem.

A União Europeia envereda insistentemente na regulamentação. É reconhecido esse seu pendor. Há quem afirme que, no seu ADN, funciona “a mente” de um chip “frenesim regulatório”, varrendo tudo em que toca para a burocratização. O melhor produto de Bruxelas é tóxico, burocratiza/emperra a vida de todos, empresas, estados, famílias. Tudo.

Ursula von der Leyen, na sua “bússola da competitividade”, parece ter despertado para esta malévola tendência do “frenesim regulatório”. Disse, então, que vai mesmo desburocratizar tudo e depressa, mas ao anunciá-lo caiu logo na armadilha, ao apontar caminhos ínvios, a criação de um leque de estruturas completamente inúteis para a finalidade de tornar uma União Europeia competitiva. Muito melhor seria, por exemplo, ter dito que iria pensar em como transformar a DG Concorrência numa entidade de apoio e não de bloqueio enviesado ao funcionamento eficaz da UE.

Está difícil à UE romper com esta teia em que se envolveu. Agora, inventou em parceria com Macron uma outra simulação para os problemas. “Retiros e Cimeiras” para tudo. E, daí, o que tem vindo ao mundo?! Conclusões úteis, poucas ou nenhumas, indefinições e divisões, muitas.

Inteligência Artificial

Na Inteligência Artificial (IA), os primeiros passos da União Europeia foram logo canalizados para a legislação, quando a União Europeia tinha ainda uma posição insignificante no Ecossistema da IA. Um ou outro país europeu, talvez com algum relevo a França, já ia aparecendo em alguns domínios da IA, mas em muito menor grau do que se passava nos EUA e na China, mas a União Europeia em si, pouco ou nada fizera e, quando “desperta”, empurra-se logo para a regulação que elegeu como sua prioridade.

Promover uma estratégia, pensar e implementar, de forma dinâmica, a cooperação entre laboratórios de investigação e empresas de diferentes países-membros pouco mereceu ou tem merecido a atenção da Comissão Europeia. Escusado é dizer que China e EUA discordam da UE nesta abordagem. E com razão dizem ser a legislação apertada, como defende a UE, um verdadeiro freio à evolução da IA.

Com Trump, sem dúvida, a situação acelera-se e o desígnio é dominar tecnologicamente o mundo da IA em que, de facto, os EUA estão na frente. Consolidar essa posição será o grande desígnio de Trump.

E, assim, em 21 de Janeiro, no dia seguinte à sua tomada de posse, lança o programa “Startgate”, a quatro anos, num montante de 500 mil milhões de dólares com o apoio de alguns grandes players do sector (OpenAI, Oracle, …) para disputar o mercado mundial que disputa 35% da capitalização bolsista, à frente de sectores como a energia e a banca.

Os EUA, com uma posição já confortável com Biden, querem consolidar e manter-se pioneiro como aconteceu com a OpenAI.

Só que a Start-up chinesa, DeepSeek, veio abalar o mercado, no final de Janeiro com o seu Chatbolt R1, provocando um tombo bolsista de gigantes tecnológicos americanos, como a Nvídia que, segundo alguns analistas, se encontra em situação complexa de sobrevivência.

A Start-up DeepSeek veio abalar a confiança dos grandes grupos tecnológicos americanos de IA pois com muito menos custos de investimento – seis milhões de dólares (contra cinco mil milhões da OpenAI/ano) – apresentou um produto similar aos existentes e com menos gastos de consumo de energia, outra área que está a exigir grandes cuidados e decisões, por exemplo, alguns grupos tecnológicos a fazer joint-ventures com produtores de energia nuclear para responder às necessidades previsíveis de consumo.

A dúvida está latente. Porque se gasta tanto, quando outros fazem igual ou parecido com muito menos Investimento e com menos consumo de energia?! Esta situação questiona a aposta no programa de Trump, (não será preciso repensar tudo?!) e aos grupos tecnológicos se não terão de corrigir os caminhos traçados.

Elon Musk até se mostrou perplexo com o programa anunciado e logo apareceram as vozes a clamar desentendimento! Pouco tempo depois, aparece com o Grok3, um software, última versão do seu robot conversacional, desenvolvido pela sua empresa de IA, para competir com o ChatGPT e o DeepSeek, anunciando que se trata da “IA mais inteligente da Terra”.

A Europa tenta algo…

A Europa tinha de responder e então Macron, agora numa roda-viva de promotor de “Cimeiras e Retiros”, nem sempre se percebendo como se substitui ou sobrepõe tão facilmente à UE, promoveu, em Paris, nos dias 10 e 11 de Janeiro, no Grand Palais, a II Cimeira Mundial de IA, com a presença de Chefes de Estado, Dirigentes de organizações internacionais, Peritos e Representantes da sociedade civil.

A Cimeira, coordenada pela França e Índia, apontou uma série de princípios genéricos interessantes. Para Macron, a Cimeira vai servir para “ressincronizar” a Europa com a China e EUA, garantindo que a regulação não vai sufocar o crescimento do sector na Europa. Parece ter percebido a mensagem dos adversários.

A Comissão Europeia, pela voz de Ursula von der Leyen, aproveita para anunciar no segundo dia da Cimeira que a União Europeia vai investir 200 mil milhões de euros de Investimentos em IA, saindo 50 mil milhões de fundos comunitários e sendo 20 000 milhões aplicados em centros de dados com equipamento mais avançado que os actuais, que, segundo a Comissão, é necessário para permitir o “desenvolvimento colaborativo” dos modelos de IA mais complexos.

Este anúncio segundo a comunicação social que cobriu o evento vem na sequência do de Macron que, no Domingo antes, apresentara um “plano de investimentos de 109 mil milhões de euros para projetos de IA em França, nos próximos anos”.

A Cimeira foi bem participada, Ursula von der Leyen passou a sua mensagem tentando “rivalizar” com Trump, mas sem um programa muito objectivo. A Cimeira culmina com uma declaração, assinada por 60 países, entre eles a China, mas sem a concordância dos EUA e Reino Unido.

Seis são as principais conclusões da Declaração: reduzir as divisões digitais; garantir a acessibilidade; impulsionar o desenvolvimento sustentável; fomentar a inovação; reforçar a governação global; assegurar que a IA contribua positivamente para o futuro do trabalho. Cada conclusão é um mundo com muitas leituras, algumas contraditórias.

Mas, de cada um desses “mundos”, não consegui retirar resposta clara para a grande questão: os participantes na Cimeira e, sobretudo os Estados, estão inclinados para apoiar uma IA onde contam e dominam os negócios das Big Techs, ou para uma IA entendida como valor público, orientada para o desenvolvimento tecnológico ao serviço da economia e da governação dos países.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

Com eleições à porta...

 

Nos 50 anos de Abril, depois de uma árdua luta pela Democracia e pela Autonomia, infelizmente, tropeço a cada passo com situações causadoras de espanto pelo ridículo político que transportam. Nos últimos dias dei conta de dois momentos, do meu ponto de vista, absolutamente infelizes. Refiro-me ao Senhor Presidente do Governo, de binóculo, orientado para a frente marítima de Santa Cruz, a tentar ver as casas construídas pela respectiva Câmara; depois, aquela historieta do "Spaghetti alla puttanesca" (como diria o Herman: que mal que isto me soa), com jaleca de chefe, desenquadrada de um passado ao jeito, entre outros, do hobby da jornalista Clara de Sousa. 

 


Das duas uma: em termos políticos, sendo este um momento muito sério e delicado da vida de todos nós, ou há uma total ausência de criatividade no sentido de dizer aos eleitores, de uma forma frontal e explícita, o porquê da sua candidatura, ou está a partir do pressuposto que esta campanha "para quem é bacalhau basta", isto é, qualquer coisa serve, não sendo necessária qualquer qualidade na proposta política.

Aliás, em toda a intervenção política (ou não) quem a faz tem de ter presente as várias leituras possíveis, como quem vê o outro lado das coisas. Aquela dos binóculos possibilita um vasto leque de interpretações contra o próprio. Independentemente das palavras ditas e do contexto, sem precisar de fechar os olhos, passaram-me pela frente tantas situações, umas mais sérias, outras com tendencial humor corrosivo que dispenso aqui referir. Quanto ao "spaghetti", com toda a certeza muitos eleitores terão pensado na "puttanesca" de vida que levam e que as estatísticas oficiais confirmam. 

A minha perplexidade e tristeza advém do facto de, 50 anos depois, ainda andarmos a conviver com situações que exprimem ausência de qualidade e rigor que nada ajudam na emancipação e consolidação da Democracia e da própria Autonomia. 

"Chef" Miguel o exercício da política exige "olhares" muito para além da "massa".

Ilustração: Google Imagens.

domingo, 16 de fevereiro de 2025

A Comissão Europeia sob o fogo de mais um escândalo

 

Por


Falta à Bússola da Comissão Europeia um novo modelo de desenvolvimento da economia e consensos em domínios-base como na energia e aprofundamento das componentes do mercado único.



Dia 29 de Janeiro 2025, Ursula von der Leyen apresentou, em Bruxelas, aquilo a que chamou de “Bússola para a Competitividade” da economia europeia. Desconhece-se, contudo, se “a bússola” terá sido sujeita a calibração e passado no crivo das normas de certificação, ou seja, se reúne as condições mínimas para ter impacto futuro! Disso, falaremos adiante.

Passou foi ao lado de tema escaldante: a denúncia, em jornais europeus de vários países, pelo menos desde 23 do mês de Janeiro, de desvios de fundos comunitários para lóbis ambientais, ONG, com a finalidade de influenciar decisões e apoios a favor do “pacto verde europeu”, apresentado em Julho 2021 pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.

O caso foi desencadeado pelas questões colocadas por Dirk Gotink, eurodeputado dos Países Baixos, membro do PPE. Até uma lista de “Membros a influenciar” foi encontrada, onde se mencionavam entidades a contactar para “tão nobres” missões lobistas!

Sobre esta investigação em curso, o novo Comissário para o Orçamento, o polaco Piotr Serafin, reconheceu os factos perante o PE.

Segundo o jornal mais lido dos Países Baixos, “DeTelegraaf”, a Comissão Europeia financiou, indiretamente, lóbis ligados ao ambiente para promover as suas políticas verdes, sendo muito activo nessas funções o ex-comissário Frans Timmermans.

O jornal francês “Le Point” denuncia que a Comissão atribuiu, a ONG do ambiente, fundos comunitários para promover junto de instituições e deputados o seu “pacto verde”, o programa europeu para a transição ecológica. Na Comissão de Controlo de Orçamento da UE terão soado campainhas de alarme que a levaram a divulgar documentos sobre o assunto.

Mas muitos outros meios de comunicação europeus, a que não ficou alheia a vizinha Espanha, abordaram o tema dos referidos desvios de fundos públicos, com títulos deveras escaldantes: novo escândalo de corrupção em Bruxelas; ingerências ideológicas verdes; Bruxelas sob o fogo de acusações de lobbying e ingerência; fundos comunitários desviados para influenciar o Acordo Verde da Comissão Europeia.

Todos os gostos têm o seu título.

Também é mencionado na comunicação social europeia que só, no ano 2024, foram consumidos 15 milhões de euros nesta promoção, tendo a ONG “Friends of the Earth Europe” recebido cerca de 1,5 milhões de euros da Comissão para desenvolver esse trabalho de convencimento sobre a “bondade” do pacto. Trata-se de uma ONG claramente antinuclear, um lóbi ao serviço das renováveis.

As consequências deste novo escândalo só vêm contribuir para o desprestígio da Comissão em políticas importantes, designadamente as relacionadas com o mundo agrícola que tanto tem contestado o pacto verde, um dos eixos centrais do programa da anterior Comissão.

A “Bússola” de von der Leyen

Para Ursula von der Leyen, Presidente da Comissão, “chegou o momento de agir” para elevar e tornar competitiva a economia europeia, sobretudo através de um “choque de simplificação” administrativa da máquina da União Europeia. Falou da necessidade de simplificar e reduzir a carga administrativa para um conjunto de directivas e regulamentos, mas as estratégias e as ferramentas de comando pecaram por ausência. Por outro lado, repetiu um rol de boas intenções, diminuir custos da energia, promover projectos de interesse europeu e investimentos em tecnologias avançadas e inovação.

A Bússola para a Competitividade, embora aproveitando recomendações positivas do relatório Draghi, dando muita ênfase às palavras e frases que empregou, soou a instrumento algo empanado. Há quem refira que se trata de um roteiro. Mas não passou dum roteiro de finalidades vagas, sem apontar os meios e os caminhos de as atingir.

Falta à Bússola da Comissão Europeia um novo modelo de desenvolvimento da economia e consensos em domínios-base como na energia e aprofundamento das componentes do mercado único lançado por Jacques Delors e uma leitura rigorosa do pouco progresso ou talvez fosse mais adequado falar de abandono desse caminho pelos sucessivos responsáveis da União Europeia. Sem um conhecimento do que se falhou e do porquê, não se avança, não se constrói estratégia sólida.

Draghi, no relatório, é muito claro sobre os montantes de financiamento/ano para montar a sua estratégia de competitividade e as potenciais fontes da sua obtenção. Von der Leyen, ao contrário, confirma apenas que vai avançar com a criação de um Fundo para a Competitividade. Sobre as fontes de financiamento diz pouco, apenas irá desviar fundos de outros departamentos dos planos comunitários e mobilizar investimentos privados, um trabalho a desenvolver pela Comissária portuguesa.

A grande mudança a este nível dependerá então da criação desse Fundo. Mais um. Não estará a contradizer-se, acrescentando apenas mais burocracia? A bússola empenada resolve-se com tão “poucochinho” dinheiro?!

Depois, em domínios como a energia, sem dúvida, um buraco negro, a nível da UE, nada é dito sobre como proceder à redução dos custos energéticos ao nível da União, embora haja uma passagem onde refere que é preciso “agir com rapidez e unidade”.

O que tem feito a Comissão para gerar a unidade necessária, por exemplo, para construir uma política energética, quando estamos perante a Comissão Europeia mais sectária, neste domínio, com uma vice-presidente antinuclear, um comissário da energia, pior ainda, que já criou conflitos em reuniões do Conselho da Energia com representantes da França, defensor da energia nuclear e uma presidente pendente da posição da Alemanha. Onde está a unidade de acção? O mercado interno lançado por Delors, como antes se referiu e como diz Enrico Letta e, Draghi retoma, nunca foi completado e era fundamental para que o modelo europeu tivesse tido sucesso.

[Nota: defender a nuclear como fonte de energia limpa, bater-se para que a União Europeia pratique com esta fonte as regras praticadas com as outras, no mínimo em plano de igualdade, o que não tem sido seguido até à data, não implica ter de investir na energia nuclear. Implica não criar obstáculos a quem decida seguir esse caminho, hoje reconhecido como idóneo].

Como se pode avançar, então, com uma Bússola da Competitividade, digna desse nome, sem consenso em áreas fundamentais como energia, automóvel, mercado único e sem financiamento escalonado à altura que, a prazo, coloque a União Europeia no patamar Internacional que lhe interessa?

Falta tudo ou quase: modelo económico, vontade política, consensos e dirigentes à altura para tão importante tarefa. Mais uma vez, uma oportunidade adiada e nas condições actuais, a UE acossada por Trump pode vir a enfrentar uma situação difícil.

Termino a pensar em duas ideias criativas avançadas por Enrico Letta, em resposta a Trump: por que não a Europa aproximar-se de Pequim neste contexto?! E porque não hiper-tributar as grandes multinacionais americanas na Europa?

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.