Por
Henrique Sampaio
Funchal Notícias
1.Tendo em conta as duas sondagens que foram conhecidas a escassos dias do acto eleitoral, percebeu-se logo que a grande questão, a incógnita, era saber se o partido mexicano local obteria ou não maioria absoluta.
Numa terra com as características da Região, nada já constitui surpresa. A rede tentacular montada há 49 longos anos e uma sociedade marcadamente conservadora e subserviente, só ruirá quando ocorrer um cataclismo. Foi isso que sucedeu em 2013, quando, nas eleições autárquicas desse ano, o polvo laranja só resistiu em 4 das 11 câmaras municipais. Tudo porque, na sequência da aplicação do famigerado PAEF (Plano de Ajustamento Económico e Financeiro), os madeirenses e portosantenses viram as suas condições de vida e de trabalho serem fortemente degradadas. Foi, de resto, essa conjuntura que levou o auto-intitulado “único importante” a sair de cena. Consciente de que, a manter-se no poder, nas eleições desse ano de 2915, muito provavelmente, e na melhor das hipóteses, não garantiria a maioria absoluta e teria de negociar, o que como é sabido não faz parte do seu adn político caudilhista.
Entretanto, nas eleições regionais seguintes, de 2019, o maior partido da oposição, o PS, convenceu-se de que chegara a sua hora. À pressa, substituiu o então líder, Carlos Pereira, e foi buscar à autarquia funchalense, o seu messias, Paulo Cafôfo. O desfecho é por demais conhecido: não só não ganhou essas eleições como, dois anos depois, perdeu a principal autarquia local. E, de seguida, Cafôfo foi de ziguezague em ziguezague. Demitiu-se da liderança partidária e anunciou o regresso ao ensino, para, escassos meses volvidos, embarcar para o palácio das Necessidades, e daí, de novo, para a chefia do partido. Um autêntico saltimbanco.
E, se dúvidas houvesse, sobre a existência de um eventual efeito Cafôfo, os resultados das eleições de Maio passado revelaram que o mesmo já se desfizera. Daí que insistir na sua candidatura (passados dez meses) e esperar por um desfecho diferente, por uma espécie de milagre das rosas, era, como se veio a comprovar, manifestamente utópico e suicidário. Com efeito, conseguiu a proeza de ser ultrapassado pelo JPP, como 2ª força política com representação parlamentar. Repetiu-se, aliás, o que já sucedera nas referidas eleições de 2015, na ocasião com o CDS, numa candidatura protagonizada, registe-se, pelo “apparatchik” que reclama o mérito de ter sido o patrono de Paulo Cafôfo.
Devo confessar que não sei se o PS-M tem conserto (lá diz o ditado, o que nasce torto, tarde ou nunca se endireita). Agora, não tenho dúvidas que para ganhar credibilidade política urge romper com a clique instalada em redor da actual liderança. Ou seja, são precisos novos protagonistas, o que significa deixar de dar palco a gentinha há demasiado tempo instalada, até porque também fazem parte dos perdedores, para já não falar de personagens inenarráveis, como o ex-autarca de Água de Pena que continua como par(a)lamentar! Uma urgência que não pode esperar, na medida em que a actual liderança não dispõe de quaisquer condições políticas para conduzir os processos eleitorais que se avizinham. Tornou-se, aliás, factor de chacota. Ontem mesmo, no seu blogue (“Duas ou três coisas”), o embaixador Francisco Seixas da Costa escrevia: “O cabeça de lista do PS pela Madeira teve a sua 10ª derrota. Perder 10 vezes não é uma coisa por aí além; bem pior seria 20 vezes, não é? E assim até pode entrar no Guiness! Mas ao PS nunca ocorreu tentar outro nome? É uma ideia «fora da caixa», eu sei!, mas pensem nela!”.
Por outro lado, e ao contrário do que muita gente alega, também não me surpreendo por Miguel Albuquerque, apesar de constituído arguido, ter voltado a ganhar as eleições, ficando à beira da maioria absoluta. Para os mais distraídos ou esquecidos, recordo que, em 2010, Isaltino Morais foi condenado a dois anos de prisão por fraude fiscal e branqueamento de capitais (a célebre conta na Suíça), e, liberto da prisão, candidatou-se de novo à Câmara Municipal de Oeiras, tendo voltado a ganhar as eleições, com maioria absoluta. No entendimento da denominada vox populi, a explicação sustentar-se-á numa espécie de argumento: “rouba, mas faz”. E não deixa de ser sintomático que, tendo o líder nacional do PSD à época, Marques Mendes, lhe retirado a confiança política, o mesmo se prepare para recandidatar-se à referida autarquia, contando desta feita com o apoio do mesmo PSD.
Voltando à temática regional, não restem dúvidas de que, tal como no passado, o CDS disponibilizar-se-á para garantir as condições de estabilidade governativa, muito provavelmente com a moeda de troca já conhecida: a presidência do parlamento. Por muitas declarações solenes que faça o seu líder é esse o objectivo que o move, pouco se importando em saber se no futuro próximo o CDS desaparecerá do mapa eleitoral. E, já agora, que também não subsistam quaisquer dúvidas: um partido, como o PPD/PSD, em que, para evitar a perda do poder, todos os meios são lícitos, se o resultado eleitoral tivesse sido outro, seria, se necessário, encontrada uma solução, nem que fosse preciso afastar o actual líder, se, entretanto, falhassem as possibilidades de entendimento com outros partidos, com base na presente liderança. No plano nacional, a avaliar pela mais recente sondagem divulgada pelo semanário Expresso (edição da passada sexta-feira, dia 20 do mês em curso), as questões de natureza ética que envolvem o primeiro-ministro, Luís Montenegro poderão não ser determinantes no desfecho do resultado das eleições legislativas nacionais antecipadas de 18 de Maio próximo.
Umas eleições que, ao contrário das regionais, foram precipitadas pelo próprio Luís Montenegro que preferiu submeter-se a novo sufrágio, em lugar de dar explicações em sede parlamentar.
Desengane-se, porém, quem pense que a questão ética se resolve nas urnas. Quem assim procede está a ajudar a disseminar ainda mais o populismo que se foi instalando, também, entre nós.
O que, certamente, estará a deixar deveras satisfeito o novo D. Sebastião, o almirante Henrique Gouveia e Melo. Que vem sendo apresentado como uma espécie de regenerador da Pátria. E, ou muito me engano, ou mais tarde ou mais cedo, haveremos de o ver a abençoar a criação de um novo partido, tentando reeditar o que Ramalho Eanes não conseguiu com o PRD, esperançado naturalmente noutro resultado.
Em todo o caso, em nada favorecerá esse desiderato, ver pela enésima vez a gritar contra o sistema, uma figura como AJJ que personifica ele próprio esse mesmo sistema, a que, de resto, atribuiu a designação de “máfia no bom sentido”!
Num ano, em que o calendário já contemplava eleições autárquicas e presidenciais no início do próximo, impor aos portugueses uma outra ida às urnas não abona a favor da tão reclamada estabilidade governativa, até porque nada garante que o actual cenário parlamentar se venha a alterar significativamente. Montenegro e o PSD devem ter concluído que fazê-lo agora configura menos riscos eleitorais do que tal suceder no próximo ano, na sequência de uma provável rejeição do Orçamento de Estado. Entenderão que o dinheiro que foram distribuindo por diferentes sectores profissionais (professores, médicos, forças policiais, oficiais de justiça, etc.) terá um efeito favorável no eleitorado. Poderão é estar simultaneamente a desvalorizar os graves problemas, por exemplo, no acesso à saúde que prometeram solucionar em dois meses e que, longe de melhorar, se agravaram, e a bomba relógio que constitui o sector da habitação com os dramas subjacentes que comporta. Sem esquecer todo o noticiário que, como se tem constatado, irá continuar a vir a público em torno da empresa Spinumviva.
*por opção, o presente texto foi escrito de acordo com a antiga ortografia.
Post-Scriptum:
1) Esclarecimento: Em 2015, no rescaldo das eleições regionais desse ano, comuniquei ao secretário-geral do PS, António Costa, as razões que me levavam a abandonar a filiação partidária. Poderia tê-lo feito publicamente, mas remeti-me ao silêncio. A leitura que expresso no presente texto, está amadurecida há largo tempo. Se não a transmiti antes, fui apenas para não ser acusado de ter contribuído para o descalabro eleitoral de domingo passado.
2) Gaza: Israel continua impunemente a praticar em território palestiniano crimes de guerra, que configuram comportamentos próprios de um estado pária. É preciso pôr fim a esta barbárie!
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