No plano político, cada vez mais, qualquer personagem com responsabilidades, mesmo os menos bem preparados, quando falam, devem ter noção do ricochete das palavras. É básico. No essencial, devem questionar-se, que fragilidades apresento susceptíveis de ser vítima das palavras ditas. É sinal de vulnerabilidade política, não sei se por uma angústia acumulada devido à pressão, não ter noção do escrutínio que a todo o momento é feito. Em circunstância alguma, por exemplo, um político deve dizer que estamos "preparados" para o Leslie ou outro qualquer furacão, antes ser, apenas, porta-voz dos relatórios fornecidos pelos especialistas da protecção civil. Por mais que seja feito, basta um olhar atento para as imagens devastadoras, ninguém está "preparado" para a violência de um furacão mesmo que o seu grau seja dos mais baixos. Da mesma forma, um político com responsabilidades de governo, sob pena de cair no ridículo, a propósito da recente remodelação ministerial na República, sobre a Saúde, diga que o País estava em uma "situação insustentável". É um tiro que vai, bate e faz um ricochete de morte.
Das duas, uma, ou se trata de palavreado insensato ou julga que as pessoas são parvas, ou, ainda, estão no tempo que o povo engolia tudo o que vinha dos senhores e dos vários púlpitos! Passaram-se mais de quarenta anos, a comunicação social tornou-se mais profissional, as redes sociais multiplicaram a informação que cai em catadupa nos suportes tecnológicos a uma velocidade estonteante, mas ainda há quem pense que se a estratégia de ontem resultou no plano político, ela continuará a proporcionar os resultados eleitorais que desejam. Infantilidade.
Deixo o Leslie, porque já passou sem deixar marcas preocupantes, e fixo-me no sistema de saúde que não nos larga da mão. A "situação insustentável", com o dedo acusador à República, corresponde, mais ou menos, ao "roto a rir-se do esfarrapado". Não está aqui em causa o que de muito bom se faz, cá e lá, na concretização do direito constitucional à saúde, não está em causa, muitas vezes, o trabalho notável de todos os seus agentes que, com escassos recursos, respondem de forma eficaz. Está em causa, sim, a história do cobertor, que se mostra sempre curto quando abafa o pescoço e destapa os pés ou vice-versa! E aí, independentemente, da inversão de prioridades que, historicamente, o governo regional tem como marca de governação e, ainda, ser bem diferente, as necessidades para dez milhões comparativamente a uma população de 250.000 pessoas, mandaria a prudência, o respeito e sobretudo o saber-se olhar ao espelho, que se há sectores onde o governo regional AUTÓNOMO deveria estar caladinho, um deles é, exactamente, o da saúde. Em termos organizacionais e de prioridades a Madeira não é exemplo. E tanto assim é que, lá, mudaram um ministro, aqui, em três anos, mudaram três vezes de titular da pasta da saúde. E apesar disso os problemas continuam. A história do novo hospital, de lamentáveis avanços e recuos, tem dezoito anos e não é a questão central. Há muito e muito mais no interior do sistema. Ainda hoje o DN-Madeira dá conta que a "farmácia do hospital regista 37% da lista de artigos/medicamentos em falta. Isto é, faltam cerca de 900 em um universo de que se aproxima dos 2.500". Esta é uma fragilidade, quando se observa uma vaga gigantesca de subsídios e de obras em claro desrespeito pelas prioridades estruturais. E lá é que a "situação é insustentável". Sinceramente, já não há pachorra para suportar este tipo de política, como se o povo fosse uma cambada de mentecaptos. É o dizer mal por dizer, sem olhar às consequências das palavras.
Ilustração: DN-Madeira - 1ª página da edição de hoje.
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