Nota prévia
Este é, apenas, um desabafo em um espaço de debate muito controverso, porque o futebol profissional está cheio de exacerbadas paixões. Espero que compreendam a minha posição, porque respeito todas as outras.
Este é, apenas, um desabafo em um espaço de debate muito controverso, porque o futebol profissional está cheio de exacerbadas paixões. Espero que compreendam a minha posição, porque respeito todas as outras.
Nunca entendi a necessidade dos dois principais clubes da Madeira disporem de estádios próprios para a prática do futebol profissional. Outra coisa são os espaços para treino das suas equipas. Dir-me-ão que é legítimo no quadro dos seus projectos, rivalidades e ambições. Pois, é verdade. Porém, em uma Região muita pequena, limitada, pobre, assimétrica e dependente, onde os sucessivos governos não foram capazes de reduzir a carga fiscal prevista no Estatuto (20/30%), se o bom senso prevalecesse e não as cumplicidades, digo eu, seria muito mais compreensível que os dois actuassem na mesma “sala de visitas”. Exemplos não faltam em outros países, por exemplo, em Itália, onde o Inter de Milão e o A. C. Milan, desde há 70 anos, utilizam o mesmo estádio (Giuseppe Meazza, 80.074 espectadores). Entretanto, recentemente, o Milan e o Inter chegaram a acordo para trabalharem juntos no projeto de um estádio "moderno e de vanguarda". O San Siro data de 1926. Apesar de rivais, li que estão juntos na repartição dos encargos.
Mas, por aqui, a pobreza tem destas coisas, os principais clubes já foram buscar às paupérrimas finanças regionais muitos e muitos milhões e soube-se, há dias, pela boca do secretário da Educação que o contrato-programa relativamente ao estádio dos Barreiros, obrigará a uma novas tranches até prefazer os 20.000.000,00 de Euros assumidos pelo governo. Questionado, o secretário engonhou, mediu as palavras ao jeito de “não me comprometa”, mas lá foi dizendo a verdade ou parte dela! Seja como for, muitos milhões a juntar a muitos outros milhões. E porquê? Porque, ao longo do tempo, por ausência de racionalidade nos investimentos, o governo cedeu às pressões e os dois acabaram por ter a sua casa, um terceiro também e até a Associação de Futebol foi contemplada. Depois, neste caso justificando-se, por toda a Região o que não faltam são os espaços para a prática do futebol.
Falo de racionalidade no investimento público, porque, sendo os clubes instituições privadas, ninguém lhes pode limitar o direito de construírem os seus estádios através de recursos próprios com apoios muito pontuais. É evidente que foi a febre inauguracionista e a ausência de planeamento que assim ditou. Nada a fazer, porque o mal está feito. Agora, é arcar com as consequências, porque só a manutenção das infraestruturas deve colocar com os cabelos em pé de qualquer direcção!
Falo de racionalidade no investimento público, porque, sendo os clubes instituições privadas, ninguém lhes pode limitar o direito de construírem os seus estádios através de recursos próprios com apoios muito pontuais. É evidente que foi a febre inauguracionista e a ausência de planeamento que assim ditou. Nada a fazer, porque o mal está feito. Agora, é arcar com as consequências, porque só a manutenção das infraestruturas deve colocar com os cabelos em pé de qualquer direcção!
Eu que raramente escrevo sobre desporto, muito menos sobre a utilização de uma modalidade desportiva utilizada no âmbito profissional (para muitos o desporto envolve um outro conceito) fico perplexo como é que, politicamente, se entrega(ou) de bandeja a empresas (as Sociedade Anónimas Desportivas, SAD’s, são empresas) tantos milhões em total desigualdade relativamente ao restante tecido empresarial. Só é inteligível por ausência de rigorosas prioridades políticas, económicas, financeiras e culturais, medo das clientelas partidárias e, sobretudo, porque a Região, embora condenando o que se passava (e ainda se passa) em alguns países, optou por ter um “desporto pertença do Estado”. Não há clube que não seja, coloco esta expressão entre aspas, “propriedade da Região”, tal é o grau de dependência financeira.
Projecto de um novo estádio nascido da iniciativa do Inter/Milan. |
A questão aqui, repito, é de racionalidade e bom senso no investimento. Também é de planeamento e de respeito pelos princípios do desenvolvimento. Um desses princípios é o da “prioridade estrutural”. Não faz sentido que o Sistema de Saúde ande com o credo na boca, tantas vezes a denunciar que corre a rapar o tacho, e o cidadão comum veja milhões a voar para satisfação de megalomanias. Da mesma forma que não faz sentido, o Sistema Educativo público andar à míngua e vermos 30 milhões serem entregues ao ensino privado, quando a obrigação de um governo é respeitar o direito constitucional à Educação pública. Da mesma forma que não faz sentido, olhar para vários exemplos de despesismo e sentir que falta dinheiro (ou má vontade) para um complemento de pensão a quem tem de viver com duzentos, trezentos euros mensais. O que acontece nos Açores! Da mesma forma que não faz sentido, estou a escrever sobre prioridades estruturais, gastar exorbitantes quantitativos, para gáudio de poucos, e não investir no desporto escolar, nessa prática que deveria ser entendida como bem cultural para a vida. Da mesma forma que não faz sentido, porque faz cair por terra a luta política, quase diária, contra “os malandros de Lisboa” (eles que paguem a factura) quando, por aqui, as opções são absolutamente discutíveis.
Finalmente, ao invés dos governos esconderem o que, na prática, entendem como prioritário, gostaria que tivessem a coragem política, no decorrer das campanhas eleitorais, dizerem, abertamente, aos eleitores, o que pretendem fazer com o dinheiro de todos, no caso concreto, na prática desportiva e nas “empresas desportivas”. Gostaria, por extensão, de ver a reação dos eleitores e o seu sentido de voto, se conhecessem, antecipadamente, o leque das suas prioridades.
Ilustração: Google Imagens.
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