Por
João Abel de Freitas,
Economista
O verdadeiro motor dos últimos G7 pode sintetizar-se numa simples frase: como impedir a China de avançar como pólo dominante, a prazo, no Mundo.
1. Este o título de um cartaz que algumas centenas de japoneses empunharam numa manifestação no dia 14 deste mês de Maio, em Hiroshima, contra a realização da Cimeira do G7 naquela cidade, no fim de semana de 19 a 21 de maio.
As cidades de Hiroxima e Nagasáqui foram alvos de uma bomba atómica, cada uma e em dias diferentes, por parte dos EUA, nos finais da Segunda Guerra Mundial (6 e 9 de Agosto de 1945), sem qualquer justificação, que provocaram instantaneamente centenas de milhares de mortos. Um crime que ficou impune. Uma pura barbaridade, uma demonstração de dono e senhor do Mundo.
As centenas de pessoas presentes parecem um número reduzido, mas para o Japão, segundo a comunicação social europeia, é bem simbólico, pois não é país dado a grandes manifestações.
Os participantes condenavam a cimeira imperialista que se iria realizar ali, a guerra na Ucrânia e defendiam a abolição das armas nucleares. Presentes alguns dos poucos sobreviventes dos bombardeamentos (os hibakushas – termo japonês para designar quem sobreviveu à bomba atómica) e, sobretudo, descendentes e pacifistas que se pronunciavam contra o G7, porque vêem nele um agente promotor do armamento nuclear.
2. O G7 é constituído pelos sete países mais desenvolvidos, Canadá, França, Alemanha, Itália, Japão, Reino Unido e EUA e a União Europeia que não conta (diz alguma comunicação social, não sei se com alguma ironia!!), representada nesta Cimeira pelos Presidentes do Conselho Europeu Charles Michel e da Comissão Ursula von der Leyen.
O G7 convidou ainda uns quantos países como o Brasil, Índia, Indonésia. Os dois primeiros fizeram-se representar por Lula da Silva e Narendra Modi. É de pensar-se nas razões de um convite, sobretudo no caso do Brasil com Lula da Silva, distante em quase tudo das orientações e actuação do G7.
Houve ainda uma presença “star” com Zelensky. Mas, para este, a maior curiosidade é ter-se deslocado num avião oficial de França (pelo menos, era esta a pergunta que alguns jornais franceses faziam no domingo, dia 21/05), embora a sua presença seja bem o símbolo da perigosa escalada de guerra do Ocidente, tanto mais com a decisão de entrega do F-16. Onde irá parar esta escalada?!
Aprofundando um pouco a verdadeira agenda deste G7, em que a inteligência artificial era tema para “compor”, a guerra da Ucrânia também, embora com toda a encenação em torno da presença de Zelensky, o que se releva nesta Cimeira é a procura de um entendimento no G7 para enfrentar e deter a China na sua estratégia de influenciar, de forma persistente, a construção em andamento do Mundo.
A China não esconde os seus objectivos políticos de conquistar papel determinante, nas diferentes frentes e, definiu claramente essa estratégia em documentos aprovados pelos órgãos de governação. Este é o verdadeiro motor dos últimos G7, que se pode sintetizar numa simples frase: como impedir a China de avançar como pólo dominante, a prazo, no Mundo.
Sendo a China a segunda economia mundial, tendo o domínio de muitas cadeias de produção como se viu nos tempos de Covid-19 em que países tão desenvolvidos como os EUA e a Europa até para uma simples máscara tinham de recorrer à China, sendo detentora de terras raras, ou talvez mais correcto, de minérios críticos para a transição energética sobretudo nas energias renováveis, estando na vanguarda tecnológica de vários sectores, o entendimento EUA/Europa não anda fácil, pois a Europa tem um grau de dependência maior e os EUA estão apressados e pouco sensíveis aos interesses europeus.
Não duvido. Mais uma vez, os EUA vão impor os seus pontos de vista, como sempre acontece. Recordemos as sanções económicas à Rússia e os efeitos de ricochete sobre a própria Europa.
E com que Europa se desenrola “este negócio”?! Há cada vez mais dois blocos na UE. Ainda recentemente, o “clube dos países da energia nuclear”, por esta não estar a ser tida em plano de igualdade com as renováveis, bloqueou no Conselho Europeu uma decisão, aprovada antes em vários patamares. E este clube de países é menos dependente das terras raras que o das energias renováveis, comandado pela Alemanha.
3. Interessante referir que, neste mesmo fim de semana, também se realizou a Cimeira China-Ásia central, com uma agenda diferente: revitalização da economia e defesa dos países dessa zona. Uma agenda de cooperação entre países para o desenvolvimento e não de bloqueio ao desenvolvimento de países terceiros. E muitos serão os temas comuns de cooperação possível, onde certamente do lado da China não faltará a sua grande aposta na Nova Rota da Seda.
Interessante, também, referir que os cinco países participantes nesta primeira Cimeira China-Ásia central – que teve como anfitrião Xi Jinping – são antigas Repúblicas da ex-URSS (Cazaquistão, Quirguízia, Tajiquistão, Turquemenistão e Uzbequistão). E, neste contexto, esta iniciativa lá terá a sua leitura.
4. Bem longe da Ásia, aqui em Portugal, o mesmo fim de semana sediou uma Conferência do clube BILDERBERG de cujo teor pouco se sabe, dado o seu carácter secreto, mas que se cruza muito com os interesses do G7, onde também a Inteligência Artificial admito que, de forma mais aprofundada, foi tema, pois é fundamental no domínio do Mundo.
E os objectivos do clube Bilderberg, onde participaram os senhores da NATO, CIA e de grandes Tecnológicas, bem como ex- e Governantes de peso mundial, são bem rigorosos, pois debatem entre si os instrumentos de como aceder ao domínio das instituições mundiais de peso (ONU, FMI, Banco Mundial, etc. etc.) para gerir, a seu modo, os grandes problemas do Planeta.
Para escrever umas linhas mais sobre Bilderberg não resisti a reler algumas passagens do livro “O clube secreto dos PODEROSOS – os planos ocultos de Bilderberg” de Cristina Martín Jiménez (edição em português de 2015), um trabalho de investigação de muitos anos, de onde retirei duas, para mim muito definidoras, que cito: “Bilderberg é uma entidade que une o poder político e o poder económico, formada por pessoas com a capacidade suficiente para influenciar os acontecimentos históricos e converter a sua ideologia em leis parlamentares que mudam o destino da humanidade”.
“O que querem os bilderberg? O poder absoluto. Acabar com todas as liberdades e converter-nos em escravos do império Bilderberg. Os Senhores do poder reúnem-se às escondidas do mundo para alcançar três objectivos: a instauração de um único governo mundial, uma única moeda para um único mercado e uma só religião”. Conseguirão? Como diz a jornalista/autora do livro, há tanta coisa, de início, utopia como a criação da União Europeia (com influência Bilderberg) e ela aí está para o bem e para o mal. Estas cimeiras em simultâneo que todos defenderam um mero acaso devem-nos fazer pensar. Alguém está acossado!
Termino com a declaração de Narendra Modi que referiu ter vindo ao G7 para “amplificar as vozes e as preocupações dos países do Sul” e com uma informação: o peso económico dos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul) ultrapassou em Abril o do G7 – 31,5% do PIB mundial contra 30%.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.
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