Sobretudo as organizações de natureza política são muito sensíveis às análises que lhes são feitas. Sempre que alguém tece um comentário, referencia uma visão sobre um qualquer assunto ou projecto, abespinham-se e tratam logo de menosprezar fechando-se no seu casulo. Mor das vezes atacam sem serenidade, arrastando consigo alguma comunicação social que tanto aprecia "fazer sangue". Existe uma cultura nesse sentido que peca por uma ausência de pensamento sobre as dinâmicas organizacionais.
Há um livro de Spencer Johnson, "Quem mexeu no meu queijo", que narra uma fantástica parábola, labiríntica, sobre a analogia entre os ratos em busca dos deliciosos queijos, com a vida real, mormente a corrida ao emprego, ao dinheiro, a afirmação pessoal, enfim tudo o que é desejável. Em síntese, tal como os ratos na busca do queijo, as pessoas também correm atrás dos "queijos" da vida! Há, claramente, uma semelhança com a baixa política.
Ninguém se atreva a mexer no seu queijo. Quando isso acontece o caldo entorna-se. No exercício da política muitos são aqueles que andam atrás do seu pedaço de queijo. Por diversas razões, não importa enunciá-las. E tudo começa muito antes da eleição, através da "contagem das espingardas" (os meus apoiantes e os outros), movendo influências e prometendo bons queijos para todos. Uma vez instalados no seu habitat, a serenidade tendencialmente apaga-se, o espírito organizacional de mudança emudece e guardar o seu espaço e o seu queijo tornam-se objectivos fundamentais. Facilmente se esquecem do dia que, solenemente, assumiram ser "homem de consensos e de diálogo".
Não devia ser assim, mas é o que é! Temos de surfar nas ondas da realidade. Trago também em memória a metáfora de Arthur Schopenhauer (1788/1860) sobre o dilema dos porcos-espinhos, que se "empurravam uns contra os outros para se defenderem do frio e do medo". Magoando-se, claro, pelos espinhos de uns com os outros, o que levou Alfredo Carneiro, editor do netmundi.org (2018), a narrar que "as necessidades sociais (...) impulsionam os "homens porcos-espinhos" a se reunirem, apenas para se repelirem devido às inúmeras características espinhosas e desagradáveis de suas naturezas. A distância moderada que os homens finalmente descobrem é a condição necessária para que a convivência seja tolerada (...)". Acentuo: "distância moderada" ou, melhor sublinhando, distância tolerada!
Numa aproximação ao exercício da política, eu diria que a prática tem muito de comparável com a história dos ratos e porcos-espinhos. Seria sensato, bom para as comunidades, para a sã convivência dos membros e o cumprimento da finalidade e missão das organizações, atender às características e diferenças dos membros, percebendo que em todas elas, as de natureza política, as empresariais e outras, vivem e afirmam-se pela importância do conflito.
Desde que o conflito tenha uma natureza funcional, ele acaba por ser determinante na evolução das organizações. O pensamento único, a subjugação ou o medo da própria sombra, esses não. Discordar, dentro da organização ou fora dela é, portanto, saudavelmente necessário quando a dissonância é gizada numa dimensão inteligente. Muito diferente é o conflito disfuncional, aquele que percorre qualquer um dos sentidos: do topo da pirâmide organizacional (o vértice estratégico) para os membros de base, ou desta para o topo. É desgastante e ruinoso quando o topo assume ou imagina que outros estão a tentar roubar-lhes o queijo. Por aí demonstram a sua própria fragilidade; da mesma forma, que se torna nefasto quando o centro operacional (os membros de base) geram desajustadas e complexas situações que vão corroendo, intencionalmente, a finalidade e a missão de uma dada organização. É por isso que são necessários líderes e não chefes!
Não esqueçamos que vivemos numa era de conflitos em todas as áreas da vida. Nas organizações também. Onde existem pessoas existem conflitos de ideias, de valores, de convicções, de estilos e de padrões. São aspectos que não podem ser evitados sob pena de anularem as ideias e a própria criatividade. Evitar pode significar gerar uma atmosfera de insegurança. Portanto, só resta saber gerir os conflitos, transformando os desacordos em oportunidades visando a melhoria do desempenho. E isso significa criar um clima adequadamente aberto, o que faz com que se utilizem os talentos e os recursos de cada pessoa. Negá-los, apenas porque sim, porque não existe empatia, constitui um grave erro estratégico.
Isto é conceptualmente básico. Na política ter-se a sensação que alguém deseja roubar o queijo, e que, por isso, necessário se torna proceder à morte do rato, eu diria que tal coloca em causa o êxito organizacional. O topo da hierarquia deve sobretudo procurar a homeostasia, isto é, um equilíbrio dinâmico entre as partes do sistema. É um problema de escuta e não de tentar saber quem anda a querer mexer no seu queijo.
Ilustração: Google Imagens
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