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quinta-feira, 18 de janeiro de 2024

Os silêncios e os deveres de cidadania

 

Tem muitos anos quando adquiri um equipamento de áudio da marca "Marantz". O slogan cativou-me: "Só o silêncio é mais puro". De facto, hoje, mais do que nunca, gosto do silêncio porque nele descubro a ordem das coisas por onde o pensamento navega e, assim sendo, sinto-o terapêutico nesta absurda loucura na qual vivemos, sem que a possamos travar. O silêncio é puro e, para mim, introspectivo. No silêncio encontro o som do pensamento!



É esse silêncio que me faz reflectir, analisar e decompor aquilo que se passa debaixo dos meus olhos de cidadão actor/espectador. Nesse vaivém dos pensamentos, questiono e descubro as respostas que deixo a maturar. Nunca publico de supetão seja o que for. O impulso raramente traz adequados retornos.

Mas há outros tipos de silêncio com os quais não consigo conviver. Marinado um determinado assunto, nunca me resguardo no silêncio, embora sempre de acordo com um antigo provérbio chinês que enuncia: "a palavra é prata, o silêncio é ouro." Por isso, quando escrevo, tomo por princípio que não se trata de uma verdade (única, a minha), mas que estou a ser honesto com a minha verdade. Porque há verdades e a minha é apenas uma! Não aprecio, no quadro de uma cidadania activa, o silêncio interesseiro e manobrador, por razões diversas e porque, entre tantas colateralidades, pode fazer melindrar este ou aquele, esta ou aquela instituição. O respeito pelos outros é uma coisa; bem diferente é deixar-se ficar pelas águas mornas ou nos pântanos de conveniência.

Ora bem, ao escrever sobre o Deputado Dr. Carlos Pereira e o assassinato político que lhe foi feito em directo, posicionei-me em defesa da qualidade técnica e política de quem sinto que, cabalmente, me representa. Não o fiz no quadro da Amizade pessoal que é elevadíssima. Eu sei distinguir entre o que são os valores narrados na "Carta de Princípios", neste caso do partido socialista, o trabalho realizado pelo Deputado e a amizade pessoal relativamente ao protagonista político em causa. Num dos pratos da balança coloco essa "carta de princípios" com a qual me identifico; no outro, a prática política obviamente sujeita a múltiplos olhares e interpretações. Este posicionamento constitui, para mim, o fermento da democracia. A existência de opiniões divergentes, não significa que elas sejam contra, por exemplo, uma sustentada alternativa à governação, tampouco à intenção de gerar fracturas partidárias internas com repercussões mediáticas. Se assim não se interpreta é porque, infelizmente, alguns passam ao lado dos direitos de cidadania, como se vivêssemos numa democratura. E daí os saneamentos.


São estes tipos de silêncio que me incomodam. Eu diria que existe e persiste um bloqueio de natureza cultural na vida e vivência democráticas. São sensíveis a teoria do rebanho e a da exclusão compulsiva de quem não entra, atempadamente e de cabeça baixa, no curral. A democracia não se funda nesse princípio de "quem não está comigo contra mim está". Isso é próprio de mentes pouco sadias, eu diria, perversamente oportunistas. E eu sinto-me um cidadão não militante partidário, mas que transporta uma "carta de princípios" políticos da qual não abdico. Assistir à violação desses princípios e aos assassinatos políticos apenas porque não se gosta, embrulham-me a tolerância do meu estômago provocando uma acidez cujo refluxo é a escrita. 

Há, portanto, silêncios que me são extraordinariamente úteis e outros que repudio. Ademais, sou um cidadão de pensamento livre. Quem não gosta de gente assim, que ponha na roda do prato e continue o banquete das aparências. Mas não se esqueça que quem está a pagar a factura somos todos nós.

Ilustração: Google Imagens.

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