Adsense

terça-feira, 4 de abril de 2023

O motor económico da Europa em risco de gripar


Por
02 Abril 2023

Estima-se que, em cada ano, deixam a Alemanha cerca de 180.000 altos quadros e empresários que ajudam a desqualificar a sociedade alemã pelos múltiplos efeitos no funcionamento da economia do país.



Um artigo de Rainer Zitelmann, publicado no “Contrepoint” (26/03/2023), é muito pouco abonatório da saúde da economia alemã, sob vários ângulos de análise.

Certamente, o nome do autor diz-nos pouco. Mas trata-se de um historiador alemão, politólogo, investigador, sociólogo e um conferencista de renome, participante e organizador de seminários sobretudo para empresários em todo o mundo, em países tão diferentes como a China, Vietname, EUA, Alemanha, Brasil, Chile, França …, pago com certeza a peso de ouro, autor de um livro recente a publicar para já em 30 países, que se intitula “Em Defesa do Capitalismo”.

O artigo alerta para um problema crítico, a Emigração de quadros empresários jovens, na sua maioria à volta dos 40 anos, experientes e bem-sucedidos na profissão.

Conta-nos o autor que a taxa de Emigração na Alemanha neste tipo de quadros empresariais é a terceira mais elevada das 38 principais nações mais industrializadas, pormenorizando ainda que 3/4 destes emigrantes têm diploma universitário.

Até os países mais avançados e de melhor nível de vida deixam “fugir” os seus quadros. Afinal, não é só Portugal que deixa escapar muitos quadros de que tanto precisa, sobretudo da área da saúde.

Um problema que dá que pensar

Este artigo reflecte, de forma ligeira embora, o sentir dos conferencistas de dois seminários por ele realizados em Berlim. No primeiro, os participantes eram na sua maioria empresários de diferentes sectores económicos onde destaca um comerciante de vinhos, um grande fabricante de brinquedos e um outro ainda a trabalhar na energia.

Face à pergunta de quem já tinha colocado a si próprio deixar o país para exercer a actividade num outro, diz que ficou chocado, quando quase todos levantaram o braço.

Dias depois, no outro seminário, também predominantemente de empresários e na sequência do anterior, “Plano B – e se a Alemanha bater contra o muro”?

Um agricultor declarou: “Os políticos não têm qualquer ideia do que é a agricultura”. Todos os dias nos aborrecem com regulamentos e mais regulamentos, cada um mais absurdo que o anterior. “Já os aturei o suficiente”. Agora estou a preparar-me para sair para outro sítio, onde possa trabalhar.

Desagrado e desencanto sem dúvida. Se se poderá generalizar, é uma outra questão! Mas, não deixa de ser um alarme de que algo anda mal. Mas, comenta, nem todos os empresários vão deixar o país, mesmo aqueles que têm muita vontade de o fazer.

Há muitas barreiras à saída, a complicar uma tomada de decisão. Há um “muro fiscal”, que coloca graves impedimentos. Os alemães têm bem mais experiência de outros muros, mais físicos, que se viam!

Segundo o autor do artigo, quando o empresário deixa o seu país é tratado, como se tivesse vendido a sua empresa ou as suas acções e realizado “um lucro” que, de facto, não existiu e sobre ele é taxado.

E ainda acentua. “Este imposto tornou-se mais rigoroso para os alemães que se mudam para países da UE”. Não queria acreditar. Fui à procura de informação e encontrei referências várias a este “muro fiscal” na imprensa europeia. Não aos procedimentos em pormenor.

Pergunto-me. Este procedimento é compatível com as normas comunitárias ou a Alemanha é tão dominante que se isenta a ela própria das regras comuns?!

Presentemente, cerca de 3,8 milhões de alemães vivem fora da Europa, correspondendo a uma taxa de emigração de 5,1%. Estima-se que, em cada ano, deixam a Alemanha cerca de 180.000 altos quadros e empresários que ajudam a desqualificar a sociedade alemã pelos múltiplos efeitos no funcionamento da economia do país.

Uma imigração muito menos qualificada ocorre em sentido inverso para postos de trabalho de base ou de nível intermédio, atraída muitas vezes sobretudo pela protecção social existente no país. Por outro lado, um estudo da OCDE indica que a Alemanha pratica a carga tributária e social, mais alta do mundo.

O autor defende que não são apenas as condições económicas que fazem os alemães deixarem o país e aponta um indicador deveras curioso, o da inveja social, em que, por acaso, a Alemanha se posiciona em segundo lugar, sendo a França o primeiro e em terceiro a China, entre os 30 que entram para o cálculo de comparação. Este indicador é determinado através do diferencial entre níveis de rendimentos.

As empresas

A situação a nível de empresas não é menos dramática. E neste quadro são tidos em conta múltiplos aspectos, com relevo para a burocracia do Estado, a elevada regulamentação e o custo dos factores de produção, onde a energia assume um peso determinante.

A BASF, a maior empresa química do Mundo, fez deslocalizar para a China, muito recentemente, parte de suas produções e justifica que o fez por excesso de regulamentação, demasiada burocracia e os elevados custos de energia que lhe retiram a competitividade e a todo o sector do ramo implantado na Alemanha.

O CEO da BASF argumenta que não foi a guerra da Ucrânia que afectou os custos da energia, pois os empresários alemães já a pagavam, muito antes da guerra, 50% mais elevada que nos EUA. Em seu entender, foi a errada política energética (EnergieWende) de responsabilidade de Merkel que começou a arrasar a indústria alemã.

O tipo de transição energética protagonizada pelo governo alemão, nos últimos doze meses, vem afundar ainda mais a indústria a prazo, porque não é tecnicamente credível para a descarbonização da sociedade e entende que o mecanismo de formação dos preços da electricidade tem de ser reformulado.

Concluindo, a energia é um tema basilar para a Europa, onde a Alemanha tem demasiadas culpas do caos em que se encontra. E insisto, sem um entendimento na mudança de rumo, não só o motor da economia europeia gripa bem como arrastará toda a União a uma situação crítica. E da Comissão nada a esperar para melhor, pois segue a voz do dono.

E sobre a energia, até o primeiro-ministro português se pronunciou sobre a ineficácia das medidas recentes avançadas pela Comissão Europeia.

Mas, se a UE continuar incapaz de resolver o problema da energia em profundidade, como até aqui, as eventuais medidas que se tomem ao nível de país ou por grupos de países-membros só poderão ampliar ainda mais a falta de coesão comunitária.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.

Sem comentários: