Talvez seja por uma necessidade de protagonismo, de se manter com a cabeça fora de água, talvez! Há pessoas assim, que não têm noção que, tendo um percurso considerado meritório para alguns, absolutamente detestável para outros, não conseguem perceber que tudo tem o seu tempo e que eles já tiveram o seu. Continuam com aquele desejo de estar sentado na primeira fila, como se a sua presença e sobretudo a palavra tivessem um significativo peso na opinião pública. Falo do Professor Cavaco Silva. Pior, ainda, é que aparece sempre com um certo espírito destrutivo, com lições de moral que não pegam, quando o seu passado exigiria recato. Aos 86 anos, com uma vida de décadas preenchida pelo exercício da política, sempre que aparece, a memória traz-me o Rei Juan Carlos I de Espanha, quando se dirigiu ao ex-presidente venezuelano Hugo Chávez, durante a XVII Conferência Ibero-Americana, realizada na cidade de Santiago do Chile, em 10 de novembro de 2007: "Por qué no te callas?"
De Cavaco lembro-me de ter recusado uma pensão vitalícia ao Capitão de Abril Salgueiro Maia, mas ter concordado com uma pensão a dois ex-inspectores de PIDE; lembro-me, ainda, de ter dado um severo golpe nos sectores das pescas e da agricultura e, mais tarde, enquanto Presidente da República, ter dito que Portugal devia apostar nestas atividades, quando foi ele que as matou. E tenho presente o facto de não se ter curvado perante a morte do Nobel da Literatura José Saramago. E era Presidente da República.
A propósito desta figura que um dia disse que "nunca se enganava e raramente tinha dúvidas", regressei a um texto que publiquei a 10 de Outubro de 2013, na sequência de um notável trabalho do Jornalista Filipe Santos Costa, divulgado na revista do Expresso, de 18 de Maio de 2013, pág. 37/41, sob o título: Quando Paulo Portas escrevia que Cavaco "merecia um estalo". Guardei-o e ontem voltei a lê-lo. Deixo, com a devida vénia ao Expresso e ao jornalista, uma passagem onde se refere a Cavaco Silva: "Egocêntrico", "arrogante", "vaidoso", "teimoso", "ambicioso", mais dado a teimosias do que a convicções. Pensa que a direita tem de o venerar. Tem dias de imitação de ditador. É um homem ordinário".
E de Carlos Esperança, relembro, por outro lado, um seu texto: ele "remói ódios e cogita vinganças" (...) O homem que foi catedrático por decreto, benevolência do Prof. Alfredo de Sousa, PM por intriga dentro do PSD, e PR por arranjo, na vivenda de Ricardo Salgado, esqueceu o passado obscuro para dizer que há "deterioração da qualidade da nossa democracia" (...) "A democracia em Portugal está amordaçada", (...) aquele que um dia inventou escutas para combater o PM, que nunca lhe perdoou perder o vencimento de PR, quando o Governo decidiu a não acumulação de ordenados e pensões, e estas eram mais avultadas, tropeça na gramática, na ética e na cultura, mas não se esquece de bolçar o ódio à democracia. Para ele os adversários são inimigos. (...) Quem permutou a modesta vivenda Mariani por um terreno para construção, onde já se erigia a luxuosa vivenda Gaivota Azul, na praia da Coelha, recebeu mais valias de ações não cotadas da SLN/BPN, dava faltas injustificadas na universidade pública e aulas na privada, faltas que o ministro Deus Pinheiro relevou, esqueceu os negócios que fez, os meios de pagamento que usou e coisas essenciais que o deixaram sob suspeita de ser contemplado pela generosidade de Oliveira e Costa (...)".
Tudo isto que aqui trago tem a ver com um seu recente artigo sobre aquilo que considerou como a "Devassa da vida privada", relativamente aos negócios do candidato Luís Montenegro. A Tal Spinumviva. Cruzei a sua posição com o artigo de João Miguel Tavares, (Público) onde o articulista fez o contraponto:
"(...) Os negócios activos de um primeiro-ministro em funções não são vida privada. Isto é uma avaliação ridícula; é conversa de laranjinha fanático; e fica muito mal ao mesmo Cavaco Silva que em tempos achou Oliveira e Costa, Duarte Lima e Dias Loureiro políticos espectaculares, fazer esta defesa totalmente descabelada daquilo que foi um comportamento eticamente inadmissível por parte de Luís Montenegro no caso Spinumviva — mesmo que consideremos que esse comportamento não justifica a queda do Governo. Não é só André Ventura que desprestigia as instituições. O artigo de Cavaco fez o mesmo".
Em Setembro de 2023, o jornalista Luís Osório, referindo-se a Cavaco Silva, escreveu:
"É uma pessoa pouco recomendável (...) voltou a aparecer. Às vezes, um livro. Outras vezes, um ajuste de contas. Contra pessoas, contra a esquerda, contra a má moeda, contra qualquer política menos ele próprio – o homem não se cansa de ajustar contas com o seu ressentimento (…) Para diabolizar António Costa. Para espetar uma faca no pobre Rui Rio. Para dar prova de vida. (...) "O homem que beneficiou de alguns privilégios conhecidos, mas que continua a pairar como se lhe devêssemos alguma coisa, como se lhe tivéssemos de ir comer à mão. (…) O homem que não fez nenhuma declaração aquando da morte de José Saramago, nem uma palavra. Uma vergonha, uma canalhice. Porque Cavaco era Presidente da República"!
Finalmente, há uma carta do Economista Carlos Paz que caracteriza bem esta figura. Deixo aqui o endereço:
Ilustração: Google Imagens
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