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quarta-feira, 25 de novembro de 2015

FIM DOS EXAMES NO 4º ANO DE ESCOLARIDADE


Nuno Crato, outro de triste memória na política educativa nacional, nunca percebeu que a escola deve centrar a sua orientação no despertar para o conhecimento e não para a avaliação. Sempre foi um erro crasso preocupar-se, primeiro, com a avaliação e, só depois, com a atitude de fazer pensar! Já aqui escrevi que para os “cratos” que infernizam a nossa vida, os exames estão certos, os professores é que estão errados; a política social do governo está certa, os portugueses é que não querem trabalhar. Vivemos, assim, anos de uma ininteligível obsessão pelos exames como se eles constituíssem a peça fundamental do processo ensino-aprendizagem. Obrigaram os professores, mormente a partir de Janeiro, a centrar baterias para os exames de Maio, com o ano escolar a terminar em finais de Junho, repetindo até à exaustão, "resmas" de exercícios de Português e de Matemática, como se o despertar para o mundo do conhecimento aí começasse e terminasse. Conjugar o verbo avaliar tornou-se uma fixação, uma mania em detrimento do que deve ser o grande lastro sobre o qual, mais tarde, se edificam os pilares que suportam outros conhecimentos mais elaborados. 


A compulsão pelos exames, onde sempre estiveram nessa avaliação, não apenas os alunos, mas também os professores, destruíram aquilo que de mais essencial tem o ensino básico, a total abertura ao questionamento. A resposta tornou-se prioritária ao acto de questionar. A idade dos porquês, da leitura e da cultura foi, paulatinamente, substituída pela resposta certa concordante com o manual. O professor, esse construtor do conhecimento, que deveria avaliar de forma contínua e actuar na promoção do interesse pelo saber, foi empurrado para uma subjectiva escala de 0% a 100%, decomposta em variadíssimos e arrepiantes itens. Apesar de exaustivos relatórios, destinados, tarde ou cedo, ao arquivo morto, pouco ou mesmo nada tem vindo a interessar ao sistema, concretamente, as razões por que é "fraco", "insuficiente", "suficiente", "suficiente mais" e por aí fora, as causas eventualmente consideradas menos boas nas "atitudes e valores", inclusive, a resposta à pergunta "eu ensino… ele não aprende", pois o importante resume-se a poucas palavras: sabe ou não sabe! E assim surgem os "chumbos", o insucesso e o abandono.
Disse e bem o futuro primeiro-ministro, Dr. António Costa: "tal como um raio x não cura um doente também um exame não faz a aprendizagem dos alunos". O mais curioso, ou talvez não, é que há já algum tempo li a paradoxal posição de Hélder de Sousa, director do organismo responsável pelos exames nacionais (IAVE), que, em entrevista ao Público, assumiu que os exames não estão a gerar melhorias das aprendizagens. Isto é, o próprio responsável pela dinamização dos exames concluiu o que tantos investigadores já o sabiam e denunciaram. Porém, obediente a Crato (finalmente fora), manteve-os o que demonstra uma ausência de inteligência do decisor político, incapaz de se deixar fecundar pelo conhecimento trazido pelos investigadores e autores
Com regularidade diária vou buscar os meus netos à escola. Pergunta sacramental: então, que tal foi o dia? Eles sabem que não gosto que me digam: "foi uma seca, avô". Um dia, um deles disparou dessa maneira e eu contrapus dizendo que a escola é sempre um lugar de saudade diária. Dizem-no, agora, de outra maneira, mas descubro nas suas palavras que desejavam que tivesse sido outra coisa. Talvez porque com eles falo, sobretudo com o mais velho (7º ano), sobre a escola que tem e a escola que deveria ter. Sempre com o cuidado de lhe sublinhar, como contraponto, que é, infelizmente, nesta escola do século XIX, sendo ele do século XXI, que tem de viver, embora com sentido de análise crítica. Os dois mais novos andam por essas andanças dos exames do 4º ano de escolaridade. Estamos em Novembro e aquilo que designam por "trabalho escolar" (trabalho?) já começa a ser dirigido nesse sentido. Disse-lhes que não iriam realizar exames. Todos os dias questionam-me se já está aprovada a decisão. Obviamente que lhes incuto que o facto de não haver exames é exactamente para que tenham a possibilidade de saber mais. Para descobrir muitos outros temas, observá-los, questioná-los e percebê-los. Que um ambiente de cultura na escola, nas suas idades, é muito mais importante do que resolver uma determinada equação matemática com alguma complexidade, ou não tendo gosto pela leitura e pela escrita, todavia, tenham, na ponta da língua, os "quantificadores indefinidos" da nova terminologia gramatical. Digo-lhes muitas outras coisas, sempre naquele sentido que é preferível perceberem o porquê do que fazem, à situação de "come e cala-te". Mas fica-me sempre uma certa e compreensível angústia que, mesmo sem exames, não sinta que a velha escola venha a dar lugar a uma escola portadora de futuro. Uma escola de todo o ensino básico, onde não existam exames, mas sim uma avaliação contínua de base formativa rigorosa, inclusiva, não punitiva e de exclusão. Porque os meus netos, certamente, não vão ler este post, digo eu agora, em síntese, só para si, que desejo que a cultura, em sentido muito lato, invada a escola para que ela não seja "uma seca".
Ilustração: Google Imagens. 

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