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sexta-feira, 25 de agosto de 2017

UM MONTE DE RAIVA


Um vazio pontiagudo com cheiro de morte e um rodopio que enche os ouvidos num barulho de desespero que silencia o resto de tudo. No instante seguinte, era muito pior que isto. Foram pessoas a estremecer de angústia, de dor, de desespero, de aflição. Era gente viva que num ápice, sem aviso, sem culpa, com fé em Nossa Senhora, foi apanhada num turbilhão onde nem o medo teve tempo de fugir! Esmagadas de dor pela árvore. Consumidas de sofrimento, nem os seus gritos eram audíveis, mas o barulho dos silêncios que invadiram o largo tornou-se a perturbação mais dura das famílias, dos amigos, dos fiéis, do povo, da nossa gente. Não há arrepios que suportem isto tudo.


O mundo acabou ali mas continuou de seguida. Um mundo diferente, vazio, como um poço fundo, escuro e áspero. Um poço que tem de ser preenchido pelo que foi perdido. Tem de ser alimentado de amor e carinho. O respeito por aquelas pessoas do Largo do Monte exige o empenho de quem tem responsabilidade de conter a dor, estancar a dúvida, sossegar a alma dos que ficam. Substituir o choque e o drama pelo amparo, o conforto das explicações que faltam.
O mundo das pessoas do Largo do Monte passou a ser de todos nós. É nosso dever deixarmos um bocadinho de cada um de nós ali, entregarmos as respostas todas, despidas de segundas intenções, para protegermos as pessoas. Não apenas as pessoas daquele largo, não apenas os familiares e os amigos das pessoas do Largo do Monte. Nada disso. É para todas as pessoas que precisamos ser grandes.
Mas nós, eu, tu o outro, todos os que ficaram distantes do Monte, não compreenderemos nunca o vazio que se abateu, que se agarrou à pele dos que sofrem duramente a cada minuto e a cada momento, por isso, como se faz isto tudo quando se recusa substituir o que ficou debaixo da árvore?!
Li por aí que isso resolve-se com luto, com a naturalidade das coisas banais, como o tempo para a recuperação face à perda, mas sabemos que, no contexto do Largo do Monte, há uma raiva furiosa e incontrolável de quem não aceita a banalidade de morrer assim. De perder assim, de sofrer assim, de ser esmagado assim.

NOTA
Artigo do Deputado na Assembleia da República e Presidente do PS-Madeira, Dr. Carlos Pereira, publicado na edição de  hoje do DN-Madeira.

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