Anda por aí um tornado de promessas. E as eleições legislativas ainda são lá para Outubro de 2019. São do tipo pescador que joga para o mar pão amassado com sardinha e qualquer coisa mais, qual engodo que visa os peixinhos, coitados, a "morderem" o anzol com melhor iguaria. O problema é que, passados tantos anos, muitos sabem que não existem almoços grátis. Não "picam" e passam ao lado. E os pescadores andam, dá-me a impressão, a perder a paciência e quanto mais a perdem mais engodo atiram. Por exagero, em alguns momentos, fazem-me lembrar a anedota de dois amigos que depois de escutarem tanta promessa, passam por um comício e ouvem o candidato a falar que, com ele, as pessoas trabalharão um mês por ano. Nem chegaram ao fim do discurso, porque um acabou por dizer ao outro: vamos embora que este nem de férias fala!
Em qualquer palco, e tudo serve de palco, face a plateias que começam a perceber a engrenagem, pressinto um certo desnorte, porque não têm em conta as prioridades estruturantes que possam garantir o desenvolvimento. O bem-estar, melhor dizendo. Andam a vender promessas avulsas tiradas do paupérrimo saco das finanças públicas, ora em consonância com os desabafos nas “cartas do leitor”, ora com aquilo que julgam ser do agrado de sectores previamente definidos. Eu diria que andam a tentar distribuir coisinhas, caricaturalmente, desde veneno para ratos até passes sociais. Não é perceptível no discurso político um pensamento global e estruturante da sociedade a todos os níveis; sobre o caminho a percorrer, enquanto sociedade, no plano económico, financeiro, social e cultural. Se, eventualmente, são portadores do diagnóstico do onde estão, não conseguem transmitir, a quem elege, onde desejam chegar e, por isso, tornam-se evidentes os sinais titubeantes e os ziguezagueantes passos que dão. Tudo muito desengonçado. Nada surge articulado que, no seu conjunto, tenha a forma de um consistente projecto de futuro. É sensível uma constante fuga ao estudo, à audição de quem sabe, à mudança e à coragem em operar uma ruptura, antes emerge a preferência pelo trabalho nas margens dos problemas, correndo atrás de "soluções" pontuais. Em um quadro destes, cronicamente, a proposta tende para uma natureza avulsa. Aliás, basta um simples olhar para a governação, seja ela qual for, para nos apercebermos da inexistência de preocupações que transportem um pensamento globalizante. A ideia que resta é a de cada um trabalhar para seu lado, no seu espaço, seguindo a sua própria e ambiciosa agenda política. Subsiste, por isso, a tendência sectorial e não a que assenta em uma perspectiva transversal e integrada de toda a estrutura social e associativa. O que seremos daqui a vinte anos parece pouco importar, pois viver o momento, tentar safar-se, através da conjugação de um conjunto de tarefas mediáticas, acabam por ter prevalência sobre a vitória da utopia, sobre esse caminhar sereno e constante que jamais termina.
Faltam-nos referências que espalhem e espelhem respeito e dignidade. Neste contexto, não consigo deixar que a minha memória de leituras apague, um deles Sttau Monteiro: "(...) O homem vende-se aos bocados, a prestações, dia a dia. Muitos, ao fim dum tempo, já nem sabem que se estão a vender. Atingem uma posição que os obriga a defender interesses contrários a tudo o que sempre sustentaram, e são comprados por essa posição. Continuam, em voz alta, a defender os mesmos princípios de sempre, mas secretamente guerreiam os ideais que dizem ter e fazem o que podem para evitar a sua concretização. A grande maioria dos homens, porém, vende-se por cobardia (…)". É essa cobardia que os impede de ver o óbvio, de pensar os vários sistemas de forma integrada, de ver o Homem no seu todo e não aos "bocados", de ver a felicidade do povo como objectivo. Leva muitos anos, pois leva! Mas alguém, que não me recordo, disse de forma assertiva "que quem caminha já está no futuro". O drama é que não se sente esse caminhar. Sente-se a existência de compromissos como ao jeito de Alice no País das Maravilhas: "se não sabes para onde vais, qualquer caminho serve".
Ilustração: Google Imagens.
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