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domingo, 29 de setembro de 2019

Os pegadores


Por
DN - Madeira
28 SET 2019

Se de manhã tinha votado por dever mais do que por convicção, à noite só me apetecia vomitar.

Até agora não saí do pasmo! Há uma semana que ando às voltas para arrumar o assunto mas ainda não consegui, apesar de já ter idade para conhecer os meandros do caráter humano – ou, melhor, da falta dele – e deixar de lado a ingenuidade que persiste em me fazer crer no brio, na honra e, sobretudo, na dignidade do ser humano. Qualidades superiores que, sem dúvida, inspiram o respeito, mas que, na fome desesperada de poder, são letra morta como ficou mais do que claro no passado domingo, quando foram dados a conhecer os resultados eleitorais.
Confesso que se de manhã tinha votado por dever mais do que por convicção, à noite só me apetecia vomitar face à náusea que tomou conta de mim ao assistir em direto às reacções dos partidos, a maioria dos quais vencedores não sei bem de quê, perante os resultados. Ainda, aliás, ecoam na minha cabeça os gritos descontrolados na sede do PSD/Madeira, onde era traçado o panegírico a Miguel Albuquerque por figuras da nossa praça que, esquecendo-se do seu estatuto e do dever de guardar a sua imagem, só faziam lembrar, parafraseando um dos críticos mais acutilantes da atualidade, gente que (dignamente) não sabe estar. E se, do outro lado do charco, também havia quem aclamasse a vitória de Paulo Cafôfo e do PS/Madeira, que em termos práticos ficou rigorosamente igual (ou pior) a como estava antes das eleições, deste lado mais asco suscitou assistir a um quadro verdadeiramente surrealista pintado na sede do 

CDS/Madeira que, em vez de chorar a mais do que óbvia derrota enquanto partido, clamava uma vitória própria dos fracos e de quem não olha a meios para chegar ao poder. Sorrisos desbocados, rostos rosados e anafados, punhos cerrados vitoriosos, declarações inflamadas, chantagens anunciadas, tudo foi absolutamente absurdo na reação dos centristas, alguns dos quais com indignas histórias de bastidores para contar e que, salivando devido à possibilidade do poder, celebraram a suposta vitória de um partido, o PSD, que até há poucos dias era um alvo a abater. Haja vergonha, pelo menos!

A este propósito, lembrei-me de Vieira, não do Ricardo que liderou o CDS em tempos idos, mas do padre que, à semelhança de Santo António, pregou aos peixes, invocando entre eles os pegadores que, “sendo pequenos, não só se chegam aos outros maiores, mas de tal sorte se lhes pegam aos costados, que jamais os desferram”... Um “modo de vida”, política acrescento eu, que segundo o missionário seiscentista traduz uma forma de ser “mais astuta que generosa”, própria dos parasitas oportunistas que se “arrimam” aos mais fortes para que “lhe[s] matem a fome”. Grande Vieira, cuja intemporalidade quase assusta mais do que fascina!
Por isto tudo, desenganem-se aqueles que pensam que alguém ganhou as eleições. O único vencedor que houve foi o “tacho” e os vencidos fomos nós, contribuintes, que, ao longo de mais quatro anos, sustentaremos os “favores” e a vil ganância de pegadores e não só. Com maior ou menor pasmo, claro.

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