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terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

Por estas e outras nunca haverá liberais em Portugal


Por estatuadesal
Francisco Louçã, 
in Expresso Diário, 
02/02/2021


(Não foi só o Mayan que veio com esta história, ó Francisco. Ontem também o Rui Rio pegou na dita, na entrevista à TVI, para provar o "preconceito ideológico" do Governo contra a iniciativa privada. Mas que raio de iniciativa privada querem estes tipos!? O Estado que pague aos médicos, que lhes mande os doentes, lhes pague as facturas dos internamentos que eles ficam com os lucros e, no fim do processo, não os taxe com muitos impostos?

Em suma, os que os liberais tugas pretendem e a que se habituaram durante décadas é ao chamado "Estado vaca-leiteira". Só que a teta da vaca está a secar e eles gritam que se fartam. Não, aos liberais e ao borracho não deve pôr o Estado a mão por baixo, parafraseando o provérbio.

Comentário da Estátua, 02/02/2021)

 

O Hospital Compaixão, em Miranda do Corvo, foi concluído há dois anos mas continua fechado. Não tem porteiro, nem telefonista, nem administrativos nem um único profissional de saúde. É um edifício vazio. E foi notícia nas eleições presidenciais, com um candidato, Tiago Mayan, a fazer do escândalo o tema de um dia de campanha, querem lá ver que o polvo do Estado recusa salvar os doentes por puro preconceito ideológico contra a iniciativa privada.

O hospital foi construído pela Fundação Assistência para o Desenvolvimento e Formação Profissional (ADFP), um nome curioso que se deve referir à sua função. Pois a Fundação especializou-se no negócio da saúde, gerindo várias unidades na região centro. O seu presidente é um dinossauro do PSD, Jaime Ramos, que foi deputado, vice-presidente da bancada, governador civil de Coimbra e presidente da Câmara de Miranda do Corvo em sucessivos mandatos. O Hospital Compaixão é o seu principal investimento mas, para surpresa dos inocentes, nunca abriu portas.

Em novembro, as autoridades de saúde contactaram todas as unidades privadas da região para programarem a cooperação na resposta à pandemia. Houve duas que não responderam, entre elas o hospital do dr. Ramos. Chegadas as eleições presidenciais e encontrado um porta-voz voluntarioso, o “escândalo” vem para a praça pública: temos aqui estas camas e salas cirúrgicas, tudo pronto, e o Estado recusa-se a enviar doentes. Perguntadas pela imprensa, as autoridades de saúde manifestaram perplexidade: como é que vamos mandar doentes Covid, ou outros, para um hospital que está fechado e não tem nem um enfermeiro nem uma médica? O dr. Ramos explicou então candidamente numa reportagem da Sic que o que queria, precisamente, era que o Estado lhe garantisse o pagamento dos profissionais que ainda não contratou e que lhe despachasse os clientes que ainda não tem. Ou seja, a iniciativa privada quer que o setor público lhe pague as despesas e lhe proteja o negócio. Não pretende convenções, quer uma garantia de cobertura dos custos e uma salvaguarda das receitas. Sem isso, continua amuado e não contrata ninguém. Só abre portas se o Estado lhe assegurar a tesouraria e os proveitos.

A mais atrevida das imaginações não conseguiria conceber um retrato tão fiel sobre o liberalismo português. Com direito a fanfarra eleitoral, um operador político estende o chapéu ao Estado, não para o ajudar a singrar ou para colaborar numa urgência sanitária, mas para lhe fazer a caixa. Como bem explicou recentemente outro destacado prosélito liberal, o dr. Mesquita Nunes, quem critica esta fé são os que “não percebem nada de economia”.

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