Adsense

domingo, 19 de dezembro de 2021

É NATAL... sonhar com o impossível!


Então, D. Isabel, como vai? Olhe, como Deus quer que eu ande! Ela uma mulher que não perde uma Missa, agora pela televisão. São os joelhos que me atormentam e, pelas dores, já nem vou à fazenda. Pois, a idade, não é D. Isabel? Todos caminhamos para lá. E o seu Natal? O habitual. Disse-lhe, certamente com "Semilhas do Caculo"* na noite de Natal para as duas, depois da Missa, claro. Referia-me à irmã, mais velha, com vários problemas de saúde, o pior, o da visão. É isto e que Deus permita que para o ano aqui esteja - disse-me ainda ontem! 



Tenho pela D. Isabel, a minha vizinha na Atouguia, Calheta, uma enorme amizade. Gosto dela, da sua maneira de ser, da sua simplicidade e humildade, pela vida que teve emigrada em Aruba, a simpatia que irradia e o seu esforço para que a terra continue a dar o que a sobrevivência exige. Há tempos mostrou-me uma batata de tamanho anormal. Aprecio e gosto de gente assim. As suas queixas não vão além do desconforto das "juntas", como lhe digo para riso dela. Olho-a, como se estivesse a mergulhar nos seus pensamentos e antevejo-lhe a solidão, apenas atenuada pelo carinho do filho emigrado e dos familiares mais próximos que a visitam e mantêm laços de verdadeira família solidária. Mas a solidão está lá pela incapacidade de fazer o que outrora era possível. A televisão é o refúgio.

E dou comigo a reflectir nas muitas solidões, sobretudo entre os seniores da nossa sociedade. Porque também as há entre jovens. E que são muitas e preocupantes. Por estes dias, quando assisto e sinto tanta azáfama, apesar dos constrangimentos impostos pela pandemia, não deixo de ter um olhar de desassossego, de inquietação perturbadora do pensamento, relativamente aos mais vulneráveis, onde se incluem os sem-abrigo, os que se encontram nas margens e no labirinto das dificuldades, dos cêntimos contados, da saída que não encontram e da saúde precária que não permite a plena vivência deste período festivo. Fica-lhes, talvez, a Mensagem desse Homem, Jesus, onde cada página da Palavra apela ao amor, à partilha, à solidariedade entre os povos e à irmandade entre as nações. Convenhamos que é pouco. Se outro fosse o Mundo, se o exercício da política apontasse no sentido do esbatimento das graves assimetrias, se não houvesse mais direitos do que justiça social, se a incessante e desmesurada busca pelo lucro não conduzisse ao espezinhamento dos demais, se outra fosse a mentalidade humana construída por muitos, alguns que até capela em casa têm, talvez outro fosse o Homem que, circunstancialmente, habita o planeta. 

Mas isto é sonhar com o impossível, por melhores que sejam as mensagens "Urbi et Orbi" lançadas da cadeira de Pedro. As gritantes desigualdades estão para durar, os ódios e a violência contra a mulher andarão por aí, a guerra e o sangue continuará a manchar a nossa existência, a terrível história de morte dos migrantes persistirá, os crimes ambientais, idem, eu sei lá o rosário de dramas e de assimetrias consequentes da louca corrida por hegemonias e vitórias sem sentido. Sempre foi assim, dirão alguns! É verdade, mas vergonha deveriam ter na cara todos quantos a este beco sem saída conduziram e conduzem milhares de milhões de seres humanos. Desde que estejam bem, os outros que se desenrasquem!


O Natal traz-me tudo isto em memória activa. Vivo-o na tradição, nos princípios e valores herdados, mas fica-me o amargo, confesso, de olhar para o Mundo a partir de casa e questionar-me: se sou feliz, por que razão milhões não são. Uma análise que leva a tantos e complexos campos de observação e debate. 

Fico por aqui, apenas desejando a todos quantos por aqui passarem, aos meus Amigos e a todos os que não concordando comigo ajudam-me a reflectir, os mais sinceros votos que este Nascimento, independentemente da certeza da data, seja pontificado por uma Mensagem de Amor.  

                                                                    ****

* SEMILHAS DO CACULO - Receita recolhida na Calheta/Madeira. 

  • Um tacho com 1,5 l. de água
    • sal, massa de tomate, vinho, louro, alho, caril e outros a gosto.
    • Camada de cebola às rodelas e pimento cortado em tiras.
    • Carne vaca em bife com cerca de um centímetro
    • Nova camada: semilha vermelha pequena inteira.
    • Camada de cebola às rodelas com pimento.
    • Camada de carne de porco em bife.
    • Semilha vermelha pequena inteira.
    • Nova camada de cebola às rodelas com pimento.
    • Camada de frango partido em oito.
    • Termina com uma nova camada de cebola às rodelas com pimento.
Já experimentei e gostei.

Ilustração: Google Imagens.

Sem comentários: