Deixou de existir respeito pelos países e pelos povos que os compõem. É o domínio do dinheiro sobre o domínio das condutas sensatas e respeitosas. Catalogar de "lixo" o eventual (!) risco de cobrança em função das finanças públicas de um país, constitui uma afronta pelo significado que a própria palavra transporta: coisa que se deita fora, imprestável, escória, entulho, sujeira, imundície e por aí fora. A palavra "lixo" no contexto em que a aplicam é ofensiva da dignidade do país e do seu povo. No nosso caso, um povo a caminho dos novecentos anos de História. Essas agências de rating, que nasceram em função do serviço a prestar aos grandes interesses financeiros, se, para mim, nem deveriam existir, ao ser aceita a sua presença, redobrados cuidados deveriam ter na designação de tais classificações. "Lixo" é o que os grandes senhores do capital produzem, através das falcatruas que operacionalizam, não apenas nos paraísos fiscais, na atitude de esmagamento de uns visando o seu próprio crescimento, nas situações miseráveis que geram, deslocalizando empresas e criando desemprego e sofrimento, o seu entretenimento diário nos jogos especulativos, assente na informação privilegiada e na sua absoluta demarcação relativamente aos que sofrem as consequências do mundo de ganância em que vivem. Esse, sim, é "lixo" podre que cheira muito mal, porque, genericamente, não envolve uma palavra tão simples mas tão cheia de significado: humanismo. Esses fazem parte do "lixo" político, económico e financeiro, a quem se deve esta maldita crise fabricada por esses senhores sem escrúpulos.
Revolta-me quando oiço aquela miserável classificação. Como se nós, portugueses, não tivéssemos a nossa dignidade, como se nós, ao longo da História não dispuséssemos de exemplos que demonstram honestidade, seriedade, cumprimento dos contratos assumidos, como se nós fossemos qualquer coisa insignificante no contexto das nações. A palavra "lixo" é, por isso, humilhante. Mas é assim que classificam o esforço do povo trabalhador que, ao fim e ao cabo, acaba por servir os interesses daqueles que nos classificam de "lixo". Vendem-nos o dinheiro a preço proibitivo, especulam com as nossas debilidades, sofremos, pagamos e não têm pejo algum em considerarem-nos "lixo". É a tal máfia que Francisco Moita Flores sobre a qual escreveu. Por isso é tão mafioso quem esmaga quanto o Estado, integrado em uma comunidade europeia, que aceita aquela designação. Refiro-me a Portugal como a qualquer outro país.
Quem neste momento lê estas linhas é capaz de estar a dizer para dentro: "são os mercados, estúpido". Pois são, disso não tenho dúvidas. Mas é contra essa corja que me insurjo, cuja finalidade última da vida é somar riqueza à riqueza. Não que alguma coisa tenha contra os ricos. Quero lá saber! Não quero é que nos roubem. O bom povo costuma dizer: "que Deus lhes acrescente". O problema é o modo, o caminho, a engrenagem mafiosa, os interesses, as ligações perigosas, os conluios, a promiscuidade política, entre tantos e tantos aspectos difíceis de descortinar. Isso, sim, é LIXO!
Ilustração: Google Imagens.
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