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quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

UMA ANEDOTA POLÍTICA CHAMADA PAULO RANGEL E UMA OUTRA CHAMADA DAVID JUSTINO


Paulo Rangel, Eurodeputado do PSD, publicou, ontem, no Público, um artigo subordinado ao título "O grande desastre educativo". À medida que fui fazendo o esforço de leitura, lembrei-me do Filósofo Ortega y Gasset que defendia que um indivíduo só deveria permitir-se a uma opinião sobre um qualquer assunto, apenas depois de o estudar e de conjugar todas as variáveis. Não existindo esse esforço, as palavras tornam-se em paleio, digo eu. O que Rangel escreveu sobre o sistema educativo é, portanto, paleio "político" sem qualquer sustentabilidade, nem teórica, nem prática. É uma anedota! O seu artigo de opinião é um desastre conceptual quando cruzado com tantos que estudam e investigam o sistema educativo, entre outros que, no espaço próprio, na Escola, vivem, intensamente, novas e consistentes abordagens do ensino-aprendizagem.



Curiosamente, no dia anterior tinha folheado a A Página, edição de Inverno, a principal revista portuguesa sobre Educação. Quando me chega pelo correio confesso que a devoro. Centrei a minha atenção na entrevista ao Professor Manuel Rangel (1956/2015), a sua última entrevista já que faleceu semanas depois de dialogar com Maria João Leite. Na página 71, leio: "Nós estamos muito mais interessados nas perguntas dos miúdos do que nas respostas, e o ensino preocupa-se muito mais ao contrário: a resposta, o fechado, o tipificado, o estereotipado, o não questionar". Azar meu, ontem à noite, entra-me casa adentro, Medina Carreira e David Justino, qual deles Ortega y Gasset mandaria dar uma volta com a receita de uma tonelada de livros a propósito destas matérias! Foi um chorrilho de asneiras a propósito dos exames. Umas atrás das outras nem dando conta das sistemáticas contradições discursivas. 
Um dia que valeu pela entrevista ao falecido Professor Manuel Rangel responsável pelo projecto (privado) Escola Tangerina (Porto): "(...) nós não estamos aqui a trabalhar para o exame. A nossa preocupação vai muito mais longe (...) o que se tem dito nos últimos anos é que nas escolas onde os alunos estão contentes, alegres, felizes, não se aprende e os resultados baixam. Parece que para haver bons resultados é preciso ser tudo uma chatice". Depois desta entrevista, profunda e realista, foi a leitura de uma tristeza de conteúdo chamada Rangel. Destaco dessa verborreia: "(...) Pois bem, os alunos provindos de meios mais desfavorecidos, social e culturalmente, só têm uma oportunidade para aprender e para aprender a sério: a escola. Se esta for laxista e facilitista, eles não terão de se esforçar, não terão de competir e nunca superarão a diferença social e cultural com que arrancaram à partida. A escola facilitista, com a sua aparência de “inclusão”, com a sua recusa em graduar e avaliar, com o seu horror aos exames, é o maior meio de propagação e de reprodução das assimetrias sociais e culturais. É esse meio a que o Ministro e o Primeiro-Ministro acabam de prestar tributo". Terminei o dia com uma nova dose de ignorância altifalante com David Justino, que foi ministro da Educação ao tempo de Cavaco Silva (só lá esteve dois anos) a dizer disparates em catadupa. Até, em apologia dos exames, falou de um provérbio chinês que diz qualquer coisa como isto: "A educação tem raízes amargas, mas os seus frutos são doces". Frases, apenas frases. Que importa o contexto, a história individual, a história das famílias, o ambiente social, o desemprego, a emigração, as gritantes desigualdades, a falta de financiamento, a rede escolar transformada em armazém de crianças enquanto os pais são explorados até ao tutano, enfim, nada disso interessa, porque o exame, em síntese, resolve! E David fala, fala e nem apelo faz dos seus "conhecimentos" em Sociologia, sua área de formação. É uma versão de Rangel que nesse tal artigo, desanca no ministro dizendo que "não só não actuou em prol do interesse público da educação como acabou a deseducar. Alunos, pais e professores, escolas em geral, ficam a saber que não pode nem deve confiar-se no Estado. E que este pode caprichosa e intempestivamente mudar as regras do jogo. Um mau início, um péssimo começo". 
Ilustração: Google Imagens.

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