Este regime dispensa o manual de instruções pois todos já interiorizaram o modo como a centralina reage aos comportamentos. Digamos que há um comportamento esperado e qualquer objecção só deve ser feita no recato do lar. Os que deixam escapar pensamentos desapropriados, a centralina reconhece-os e remete-os, de imediato, para a listagem dos casos perdidos. O mostrador da implacável máquina indica uma só palavra: "abater".
Ontem escrevi um texto a que dei o título "Viva a Gordura na Região". Hoje, leio no DN-Madeira um trabalho absolutamente arrasador. Um médico que, em tempos, assumiu: "se os médicos começam a vir para a praça pública discutir como estão a discutir, era melhor pedir ao Governo que não faça um hospital mas que faça um bordel. A gente tem de discutir as coisas é dentro da nossa casa". Para além de tal declaração ter sido, no mínimo, infeliz, a pessoa em causa deveria constituir-se como referência, como exemplo, até pela filiação partidária ao PSD que governa a Região há 35 anos. Ora, três consultas em sete meses, seis operações em catorze meses e € 20.000,00 em horas extra, pode até estar tudo justificadinho, mas constitui um cartão de visita profissional nada abonatório.
E aqui há, desde logo, dois aspectos que ressaltam e dizem bem do quadro político regional: em primeiro lugar, um Conselho de Administração do SESARAM que não dá por nada, pelo menos parece, o que provoca uma leitura de algum proteccionismo, onde a cor e influência partidária acabam por determinar aquele quadro pressupostamente abusivo; em segundo lugar, por extensão, situações desta natureza acabam por classificar e bem o desnorte da política de saúde na Região. Numa altura que tanto se fala em produtividade, que o sistema de saúde está em falência financeira, que se limpam listas de espera para mascarar a situação, tornando normal a anormalidade, que a dívida às farmácias é assustadora, que a dívida aos prestadores de serviços privados colocam em risco as empresas, numa altura que há empresas a bloquear fornecimentos de material de uso corrente absolutamente necessário, pergunta-se, afinal, onde está a independência e o rigor do Conselho de Administração e por onde anda o Secretário Regional dos Assuntos Sociais e Saúde?
A peça assinada pela Jornalista Ana Luísa Correia deve ser lida e interpretada para além das palavras escritas. O facto em si mesmo vale por si só. Naturalmente que haverá desenvolvimentos esclarecedores. Espero bem que sim. Mas, para já, o mais importante é perceber as causas que se escondem para além daquela peça e daquele facto. É que, por aí, certamente, vamos encontrar as características deste regime político que, pela sua longevidade, se filia no princípio "para os amigos tudo, para os inimigos nada e para os restantes cumpra-se a lei". As grossas raízes deste regime, regadas durante trinta e tal anos por um "jardineiro" atento, estão a dar cabo de todas as outras espécies competidoras. É um regime cúmplice, tentacular, com traços mafiosos e, por isso mesmo, gerador de medo. É um regime que dispensa o manual de instruções pois todos já interiorizaram o modo como a centralina reage aos comportamentos. Digamos que há um comportamento esperado e qualquer objecção só deve ser feita no recato do lar. Os que deixam escapar pensamentos desapropriados, a centralina reconhece-os e remete-os, de imediato, para a listagem dos casos perdidos. O mostrador da implacável máquina indica uma só palavra: "abater". Portanto, o regime converte todos os apaniguados numa grande e grave doença de coluna (já que escrevo sobre questões hospitalares) onde o nariz se aproxima do joelho. Não há "operação" que resulte. Ou melhor, deixando as metáforas, há cura e essa pode ser feita através de uma consulta que terá lugar lá para a primeira semana de Outubro. O objectivo é, no plano político, destruir a centralina. Só por aí.
Ilustração: Google Imagens.
2 comentários:
"PARA OS AMIGOS TUDO, PARA OS INIMIGOS NADA E PARA OS RESTANTES... CUMPRA-SE A LEI"
Caro amigo
O pior que nem sequer há "os restantes", porque quem não for amigo é automaticamente despachado para o inimigo.
Já Salazar dizia: "quem não é por mim, é contra mim".
E, quanto ao "Cumpra-se a Lei", é puro sofisma. Lei é algo que aqui já não existe há muitos anos.
O que eu já tinha escrito a 17 de Maio. O serviço de ortopedia (em especial pq há mais exemplos muito tristes no hospital, a começa por cima) é das coisinhas mais tristes de se ver nesta região...
http://www.madeiracorrupta.com/post/5587071009/o-grupo-do-buscopan-ou-benuron
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