No JN (Jornal de Notícias) de Sábado passado, é destacado como "figura do dia", o Professor Eduardo Vítor Rodrigues, presidente da Câmara Municipal de Gaia. Motivo: "São 120 escolas que a partir de Setembro estarão abertas das 07:30 às 19:30. Uma ajuda aos pais que não têm onde deixar os filhos ou não têm dinheiro para pagar um ATL. Uma iniciativa da Câmara de Gaia que não se limita a manter as portas abertas. Oferece reforço alimentar e actividades extra-curriculares". Doze horas por dia. O mais interessante é que este presidente de Câmara é Professor, doutorado em Sociologia e considera a Educação "uma prioridade". Certamente que tem quem vá buscar os filhos (se os tem) para almoçar e lanchar, evitando o pesadelo de doze horas diárias na "prisão escola".
Dir-se-á que é a Escola a responder à escravização dos pais pela clara desregulação da organização social. E a Câmara que deveria encontrar soluções de (re)organização do mundo laboral, acaba por seguir a via mais fácil: torna a escola em um armazém de crianças, enquanto os pais trabalham.
Em Outubro de 2010 apresentei, em nome do grupo parlamentar do PS-M, um Projecto de Decreto Legislativo Regional (chumbado pela maioria PSD) que pode aqui ser lido:
Neste documento, fazendo parte da fundamentação, pode ler-se: "(...) É absolutamente inacreditável que uma creche, recentemente inaugurada na Madeira, disponibilize serviços até às 23 horas e temos presente a reivindicação da Confederação Nacional das Associações de Pais que sugeriu que as escolas estivessem abertas 12 horas por dia. Trata-se de uma resposta social à desorganização da sociedade, mas que reflecte a mais completa desumanização do processo educativo e responsabilidade dos pais e encarregados de educação. Não deixa de ser curioso que uma Dissertação de Mestrado concluiu, recentemente, “que a escola a tempo inteiro é a grande culpada do aumento de casos disciplinares. (...)"
Passaram-se quatro anos e não se assiste a um momento de lucidez para, no mínimo, fazerem um esforço de estudo do problema, quando são tantos os autores e investigadores a chamarem à atenção para este gravíssimo problema. E o drama é que não só não promovem o estudo, como seguem a via errada. Não me passava pela cabeça que um professor doutorado em Sociologia, investigador e, politicamente, socialista, pudesse ser autor de uma decisão daquelas. Ao invés de propor a necessidade de uma reestruturação do mundo laboral (e não só), permite que a anormalidade persista e que se entre no círculo vicioso da exploração e da degradação da vida familiar. Sabe-se que mais trabalho não significa melhor trabalho nem melhor produção. E se o presidente da Câmara quer ter uma política social, certamente que existem outras formas de a fazer. Daí que, ter filhos para não vivê-los na plenitude, obviamente que se torna questionável.
Uma nota final:
Carlos Slim, empresário mexicano e homem mais rico do mundo, recentemente, afirmou: "(...) Devíamos trabalhar, apenas, três dias por semana. Por seu turno, com quatro dias de descanso, seriam criadas novas formas de entretenimento e de ocupação de tempos livres" (...) "Já que estamos vivendo mais, em vez de trabalhar todos os dias e se aposentar com 50 ou 60 anos, por que não trabalhar menos e se aposentar mais tarde?" Segundo Slim, está na hora do mundo sofrer uma mudança radical na maneira como as empresas encaram seus funcionários e como esses levam a vida. "Teríamos mais tempo para relaxar, para ter qualidade de vida” e "Para as empresas, a grande recompensa (pelo mesmo salário que recebem) seria a de ter pessoas mais motivadas e criativas".
Ilustração: Google Imagens.
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