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domingo, 26 de outubro de 2014

TPC OU "TORTURA PARA CRIANÇAS"


TPC ou “trabalho para casa”. Crianças há que lhe chamam “tortura para crianças”, “trabalho para camelos” e até “trabalho p’ra chatear”. Acrescento: para crianças e para os pais. Designam, também, por “deveres”, mas esquecem-se dos seus “direitos”. Depois de um dia passado na escola, em muitos casos nessa famigerada “escola a tempo inteiro”, clausura que apenas soluciona o tempo de trabalho dos pais, depois de aulas suplementares e obrigatórias de apoio nas disciplinas de Português, Matemática e Inglês, tudo por causa dos exames finais, para que pareçamos bem nos “ranking’s” dos resultados nacionais, depois de um infernal dia de preocupações de pais em luta pela manutenção do seu posto de trabalho, chegados a casa ainda levam com aquela “tortura”, entre a preparação do jantar, o banho e os apelativos jogos disponibilizados pela tecnologia. Quem decide essa “tortura”, ou se esqueceu da importância de ser criança, do incalculável valor do jogo infantil, da oferta educativa fora da escola (academias de línguas, desporto e outras áreas culturais) ou, então, não tem filhos. Quanto aos pais, esses, certamente, olharão para a escola e questionarão: afinal, em que tipo de organização está o meu filho envolvido, que não consegue transmitir o fundamental da aprendizagem, permitindo que ela tenha tempo para ser criança? Posto isto, digo eu… ai se elas tivessem “sindicato”!


Sublinha a académica e autora Maria José Araújo: “A psicologia da infância e da adolescência, assim como as ciências da educação e a sociologia, têm denunciado e reagido a este regime de trabalho escolar que continua não só a ser praticado como até desenvolvido, vulgarizado e disseminado” (…) quando “este tipo de trabalho, não parece contribuir para o bem-estar e auto-estima das crianças, nem sequer para o seu sucesso (…)”. Subsiste, portanto, uma visão conservadora e ultrapassada de ser Escola que acaba por transmitir a ideia da sua falência não só organizacional, mas também nos planos curricular, programático e pedagógico, pois se “o trabalho que se faz na escola não é suficiente para se ter êxito na escola, quer dizer que é a própria instituição escolar que reconhece o seu fracasso”(ib).
Há muitos países onde aquela “tortura” está regulamentada na perspectiva de não permitir a monopolização das crianças pelos adultos. Nas primeiras idades são proibidas tais tarefas. Isto não significa que não deva existir rigor, disciplina e que, progressivamente, as crianças desenvolvam a noção de esforço, o desejo em querer saber mais e que essa responsabilidade deva crescer à medida que atingem patamares superiores. Só que ninguém, muito menos o decisor político se pode esquecer que “brincar faz parte da cultura da infância e para as crianças é um acto muito sério” (ib). Ao invés de tudo isto, ainda por cima, de maneira oposta a uma avaliação contínua, ferram-lhes com exames no 4º e no 6º anos, com professores e alunos obcecados com esse objectivo. Isto é, nas idades em que elas, pela sua natureza, deveriam fazer perguntas, o sistema exige-lhes respostas. E o secretário regional vai nisto!
NOTA: Artigo de opinião, da minha autoria, publicado na edição de hoje do DN-Madeira.
Ilustração: Google Imagens.

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