Manchete do DN-Madeira de hoje: "2,4 milhões de Euros vão ajudar os mais pobres a matar a fome". É o que se pode designar por título da verdade. Lamentavelmente, o digo. Passados 45 anos de Abril, segundo os últimos estudos, a Madeira apresenta 27,4% de pobres, o que significa, grosso modo, 67.000 pessoas em dificuldade, metade das quais em situação de pobreza extrema. Não quero com isto dizer que Abril deveria ter resolvido tudo ao nível das carências básicas, pois sabemos, infelizmente, que há sempre margens difíceis de atingir. O que me impressiona é a grandeza dos números, dos marginalizados, dos que têm de viver da terrível palavra caridade e de conviver com o estigma da pobreza. Dos que entraram nesse círculo vicioso e dela não saem, quando, em contraponto, tanto dinheiro público foi gasto em obras não prioritárias e tanta riqueza foi gerada apenas para alguns. Isso é que incomoda. Porque a fome não pode esperar!
Vem agora o governo, talvez porque se aproximam eleições regionais, difíceis para quem está há mais de 40 anos na liderança absoluta, atenuar com uns cabazes de alimentos as periferias da sociedade. Digamos que se trata de um suplemento, porque andaram à socapa, a tapar as fragilidades, beneficiando do exemplar trabalho de muitas instituições.
Olho para a pobreza em vários países, escuso-me de os referir, uns pela tirania, outros, pela ausência de visão política, a fazerem exactamente o mesmo. Aqui, não existem senhas para irem levantar o que o "Estado" oferece, mas contornam a situação por outros artifícios que, salvo as devidas proporções, vem dar quase ao mesmo.
E pasmo que este tipo de governo "duracel", sabendo que a fome existe(ia), nunca tivesse assumido a necessidade, primeiro, que a Autonomia deveria enveredar por uma economia sustentada e geradora de emprego duradouro; segundo, por um sistema educativo consistente e aberto ao futuro, contrariando as altíssimas taxas de abandono e de insucesso escolar; terceiro, por uma política de família exigente; quarto, a inevitabilidade de inscrever, no quadro da Autonomia, em sede de Orçamento Regional, tal como acontece nos Açores, um complemento mensal às magríssimas pensões pagas pelo Estado. Uma ajuda, por exemplo, de € 50,00 poderia significar um "carro de compras" mensal! Na Assembleia, as propostas da CDU, do PS, depois, de outros partidos políticos, foram sistematicamente chumbadas pela maioria.
Recordo que até para abrir o Banco Alimentar Contra a Fome, instituição independente do governo e da Igreja, foi uma carga de trabalhos. Encontrar um espaço para a instituição foi motivo de acesos debates na Assembleia, porque, no essencial, estava a negação da pobreza. Afinal, há fome!
Ilustração: DN/Madeira.
Sem comentários:
Enviar um comentário