Nota prévia
Sou apenas um cidadão. Tenho, obviamente, sentido de justiça, mas não a confundo com a Justiça, feita de normas e de códigos que aos Tribunais dizem respeito. Há um aspecto que tenho por adquirido: não me deixo levar pelo que a comunicação social apresenta. Leio, observo, compagino e formo uma opinião de acordo com as minhas sínteses, falíveis, porque não assentes em estudos que me permitam manifestar uma opinião. Não li uma única página das milhares que compulsam o "Processo Marquês", portanto, seria de todo leviano assumir a minha convicção sobre os comportamentos lícitos, ilícitos e/ou criminosos dos arguidos.
Ora, uma coisa é o que a comunicação social publica, outra a prova dos alegados factos; uma coisa é o que é publicado que reflecte os interesses editoriais e as convicções de quem escreve, outra o alinhamento e compaginação jurídica dos elementos de prova; enfim, uma coisa é o que julgo saber, outra a verdade. E assim sendo, porque não sei nem me compete, nem absolvo nem condeno. Aceito as decisões baseadas na desejável independência do Tribunal enquanto Órgão de Soberania. Certamente que sempre houve inocentes condenados e sempre existiram culpados que acabaram por se passear no princípio de "in dubio pro réu". Não posso e não devo é vestir uma beca e, desconhecendo, armar-me em um qualquer justiceiro de trazer por casa.
Um aspecto parece-me evidente: o Juiz Ivo Rosa estudou, cruzou elementos, olhou para a Lei e arrasou, este é o termo, quase toda a argumentação do Ministério Público. Será, por isso, que daí se pode extrair a convicção que também ele é um corrupto, por, pressupostamente, neste primeiro momento, "inocentar" os arguidos? Não. Ele fundamentou e colocou em causa a investigação realizada. Os patamares superiores da Justiça avaliarão o seu trabalho, validando ou não tudo quanto justificou. De qualquer forma, hoje, qualquer cidadão olha para o que Ministério Público "vendeu" durante sete longos anos e tem o dever de questionar-se: afinal, o que esteve ou está por detrás de toda a investigação?
A Justiça não se guia, julgo eu, por convicções ou pelo "acho que", mas sim por factos e provas. De José Sócrates e de todos os outros, reforçado agora pelo que ouvi do Juiz, não tenho por adquirido que cometeram insanáveis crimes. Se os perpetraram, então podemos estar face a um quadro de "crimes perfeitos". E em crimes perfeitos não acredito. Há sempre pontas soltas que acabam por gerar a prova que confima o acto ilícito ou criminoso.
Estranho no meio de tudo isto que, umas vezes, seja dito que a "justiça, embora tardia, funcionou"; em outros momentos, vá lá saber-se porquê, há quem se agarre às suas convições para determinar um veredicto que acaba por atingir o juiz que apreciou os tais milhares de páginas.
Como é óbvio eu e qualquer pessoa de bom senso sustentará que o lugar dos corruptos e criminosos é na cadeia. Mas julgo que ninguém aceita que uma qualquer condenação resulte de convicções não provadas. Hoje, quem está em causa não são os arguidos, mas o Ministério Público. Como sublinhou Miguel Sousa Tavares, se estivesse no lugar dos Procuradores do MP, demitia-se. A Justiça precisa de uma nova ordem. Os portugueses ficaram esbugalhados. Como é possível, questionarão.
A MONTANHA PARIU UM RATO
09/04/2021
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