MAS O QUE É ISSO DE VENCER COM GENEROSIDADE?

Recupero um preceito do bom filiado da ex-Mocidade Portuguesa: "o bom filiado sabe vencer com generosidade e manter o bom humor na derrota". Em tempos ideologicamente muito semelhantes, certos jovens que se atrevem a falar de 54-0 no próximo acto eleitoral autárquico, como prova de agradecimento ao seu "chefe", demonstram estar muito distantes da democracia e muito próximos dos tempos da ditadura. É pena. Nem bons "filiados" lutam por ser.

Eu, como toda a juventude do meu tempo que passou pelas fileiras daquela organização juvenil, consegui apagar o que de mau existia e consolidei alguns princípios e valores que me permitiram mais tarde relacionar, comparar e definir um caminho de seriedade, honestidade e respeito pelos outros. Falar de 54-0 nas Juntas de Freguesia, de 11-0 nas Câmaras Municipais ou de 47-0 nos Deputados à Assembleia Legislativa da Madeira é exactamente a mesma coisa. Nesse pressuposto está implícita a noção de ditadura e de falta de respeito pelos outros, pelos madeirenses e porto-santenses que pensam a sociedade de forma diferente. Eu sei que que muitos têm essa ambição e que se comportam nesse sentido, mas deveriam ter o decoro, o bom senso, até a decência de um comportamento generoso. Porque um dia virá, inevitavelmente, a derrota. E é preciso saber estar preparado para aceitá-la.

Depois, eu diria que fica muito feio aos olhos de todos os que pensam, este lambotismo saloio, esta forma de agradar ao chefe, esta subserviência sem sentido, este rastejar dependente. Pelo menos a mim enerva-me. Não consigo ser assim em nada na minha vida, talvez porque tudo o que consegui foi à custa do trabalho e de uma coluna herdada dos meus pais que nada tem de plasticina. Quando digo que me enerva é no sentido que tenho pena de quem, jovem ou não, ainda pauta a sua vida por caminhos fundamentalistas e de muito pouca liberdade na acção individual.

O problema é que quando se fala de esmagamento de toda a oposição, os tais 54-0, emerge, por outro lado, a noção ou a certeza do que estará a ser preparado ao nível partidário para triturar quem pense diferente. Pergunto: quanta vaca não será pendurada, sítio a sítio, quanto "seco" não escorregará garganta abaixo, quantos cabazes não chegarão a casa dos mais frágeis, quanta dádiva de cimento, areia, blocos e telhas aos que pedirem, quantos exemplares do Jornal da Madeira com cadernos específicos serão distribuídos, enfim, quanta subversão não estará a ser meticulosamente preparada.

Mas esta é a Região e os dirigentes que temos. Pessoalmente, lamento.

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