Recebi, a propósito de um texto que aqui publiquei, um comentário, que agradeço, mas com o qual não estou de acordo face à respectiva argumentação. Escreveu o meu leitor:
"Li algures que o PS propõe no seu programa a obrigatoriedade do 12º ano. Não acreditei e fui confirmar. Não é que está lá mesmo isso escrito? Claro que é um erro de palmatória. Mas, não o sendo, como pretendem implementar esse absurdo? Recentemente (e bem) passou-se a obrigar todos a ficar 12 anos no sistema (dos 6 aos 18 anos). Assegurar que todos terão sucesso garantido, ano após ano, sem qualquer retenção até ao 12º ano é de uma impossibilidade total. Só mesmo quem não saiba o que é uma escola e não conheça os nossos alunos... O ridículo está instalado no Programa do PS, através desta medida. Quem não conseguir (só quem não conhece o assunto é poderá dizer que todos são - hoje - capazes) e quem não quiser continuar a estudar após alguns insucessos ficará eternamente obrigado a ficar na Escola até concluir o 12º ano? Esta medida só pode ser um equívoco. Mas como? Não há responsáveis conhecedores na execução do vosso programa?"
Ora bem, nunca se deve dizer "eu não tenho dúvidas", simplesmente porque há sempre dúvidas seja qual for a matéria em discussão. Então, no plano da investigação, constitui um erro grave ler um trabalho em que o seu autor escreva, "portanto, não há dúvida que...", repito, porque a dúvida deve acompanhar-nos a todo o momento. Sublinho este aspecto para dizer que é sempre muito complexo, mesmo quando politicamente nos perfilamos, enquadrar-se no campo que quase obriga a não vermos o óbvio. E eu, sinceramente, todos os dias, embora vinculado a um partido, faço tudo para que não me vendem os olhos. Não sou, por isso, uma pessoa de certezas absolutas.
Sabe, certamente, o meu Caro leitor que o problema do analfabetismo é uma das causas primeiras do fracasso das nações. Por isso olhamos, por exemplo, para os povos nórdicos, aqueles que na Europa de hoje nos servem de alguma ou muita referência, e o que constatamos é que acabaram com analfabetismo há mais de um século. Portugal, por exemplo, em 1974, tinha mais de metade da população analfabeta. E este aspecto (muito haveria a dizer sobre esta matéria) condicionou todo o nosso desenvolvimento económico e, obviamente, social e cultural. Ainda hoje andamos à procura do ritmo, do rigor, da disciplina e da mentalidade que nos leve a perceber que só através da Educação, desde a básica à universitária, poderemos ter um país próspero. Mas uma Educação, repito, de rigor, que saiba separar o essencial do acessório, exigente e de grande qualidade. Só por aí entendo que se possa substituir o Velho Portugal por um Portugal Novo.
É evidente que isto não pressupõe apenas estar na Escola, isto é, escolarizar, através de uma oferta educativa generalizada; implica, sobretudo, EDUCAR que é muito mais do que obrigar ou garantir o 12º ano como patamar mínimo. O nosso calcanhar de Aquiles está precisamente aqui, porque sempre se confundiu escolarizar com a missão de educar. Colocar crianças ou jovens na Escola é fácil, educá-las é muito mais complicado. Depreende-se do meu posicionamento que importará determinar o que fazer, para que valha a pena o esforço do país ou da região no sentido de ter uma população desperta para todos os dias acrescentar qualquer coisa ao conhecimento adquirido. Aqui reside o busílis da questão. E esses aspectos há muito que estão equacionados pelos investigadores e pelo próprio conhecimento que advém da prática.
Há três aspectos (entre outros) que considero determinantes:
Novas políticas de família, pois sem uma actuação a montante da Escola não é possível inverter a mentalidade existente. Ademais a Escola não pode nem deve ser remediadora social, nem a Acção Social Escolar deve constituir a mezinha que disfarce os males do sistema.
Uma nova concepção organizacional da Escola, tornando-a motivadora e aliciante. Isto implica uma ampla autonomia dos estabelecimentos de educação e de ensino, um baixo número de alunos por escola e por turma e uma formação inicial de professores mais condizente com os desígnios do sistema educativo.
Uma profunda revisão curricular e programática.
Ao lado destes três vectores muitos outros têm de ser considerados como fundamentais na construção do edifício educativo. Portanto, não posso e não devo ser redutor no processo de educação. Quanto mais melhor. Quanto mais gente formada e bem formada melhor, mais sucesso teremos. Olhemos para a Madeira e tenhamos consciência do alto grau de iliteracia, das taxas de abandono e de insucesso e quanto isso está a condicionar o nosso desenvolvimento! Não devemos, por isso, lamentar ou colocar reticências à obrigatoriedade do 12º ano, mas saber e exigir procedimentos políticos que conduzam ao sucesso. O drama está aqui e depende da maior ou menor visão dos políticos. Fico por aqui, neste assunto onde há tanto pano para mangas.
1 comentário:
Professor
Agradeço o desenvolvimento textual que fez e que é interessante mas a verdade é que não avaliou a medida concreta do seu programa PS: obrigatoriedade do 12º ano.
Se podemos concordar e aplaudir (já David Justino propunha isso na sua revisão - abortada por Jorge Sampaio - da Lei de Bases) o alargamento do período obrigatório de presença na escola (12 anos, até aos 18 de idade), o mesmo não se poderá dizer DESTA medida: 12º ano obrigatório.
Mas como? Ou é erro de palmatória, como referi, ou então, não o sendo, expliquem como será implementado.
Ou todos os alunos passam independentemente do que sabem e aos 18 anos lá estarão no 12º ano (fim ao rigor e qualidade, pois não haverá diferenças entre os alunos que trabalham e têm resultados ou não o fazem) ou então alguns (estimo 1/3 deles) se engasgarão no percurso e chegarão ao 12º ano já entradotes na idade. Mas, sendo obrigatório, lá ficarão, a lixar a vida dos professores com 20, 30 e 40 anos pois, quer queira quer não, num País onde ainda 20% não consegue completar o 9º ano, obrigar ao 12º ano é um tiro nos pés. Acho que se perguntar à MInistra ou alguém entendido na matéria, se vão engasgar e dizer que não foram eles que inseriram essa medida. Pois é um absurdo.
E não há volta a dar. Intenção sim, desejo, também, trabalho nesse sentido, ok. Obrigatório? Não brinquem...
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