Tem mais de um ano que a Praia do Porto Santo foi eleita como uma das sete maravilhas na categoria de praias de dunas. Lembro-me da transmissão em directo pela televisão. Tal galardão foi motivo, nessa altura, da apresentação de um voto de louvor (deveria ter sido de congratulação). Um ano depois, esse voto acabou por ser apresentado, discutido e votado (por unanimidade) na sessão de ontem da Assembleia Legislativa da Madeira. Ora, esta situação demonstra o grau zero organizacional, regimental e de funcionamento da Assembleia. Um ano depois, veio o primeiro órgão de governo próprio da Madeira congratular-se com essa conquista de vital importância para o turismo sobretudo do Porto Santo. Mas este não é caso único: está para ser votado (ainda será?) um voto de protesto, apresentado pelo PCP, relativamente a umas declarações proferidas pelo Dr. António Borges que já faleceu; um voto de saudação pela greve geral de 14 de Novembro de 2012; um voto de louvor ao velejador João Rodrigues que participou e ganhou os campeonatos da Europa de 2012. Estes, no meio de 31 votos que andam ali a marinar! Isto, para além de mais de 100 diplomas que transitaram da sessão legislativa anterior. Este quadro traduz bem uma Assembleia Legislativa completamente decorativa e ineficaz. Não é para isto que a Madeira desfruta de órgãos de governo próprios.
Do ponto de vista do funcionamento político a Assembleia é um desastre e passível da maior crítica do povo da Região. Quando nos confrontamos com as altíssimas percentagens de abstenção nos actos eleitorais, tal acontece pelo descrédito das instituições. Há muitos factores, é certo, mas a distorção democrática na Assembleia é um dos mais determinantes. O povo olha e fica com razões de sobra para, infelizmente, alhear-se dos assuntos políticos que lhe dizem respeito. O povo não é estúpido, pode andar algum tempo adormecido, mas tal como um vulcão, um dia levanta-se, veste o fatinho, passa pela Missa domingueira, dirige-se à assembleia de voto e zás, pega lá o troco do que me andas a fazer! E depois, claro, ficam muito admirados com a intensidade do sismo de 7.4 na escala jardinista! O abalo chegou quase 40 anos depois, sete câmaras foram ao ar e as réplicas continuarão, porventura de intensidade superior. Qual metáfora, julgo mesmo que o povo tomou o freio nos dentes e não haverá regresso a um passado de atitudes ilegítimas, de bloqueio democrático, de utilização das instituições e de governamentalização da Assembleia. Caminhamos para isso, por mais voltas que o mentor desta monumental engrenagem ande de freguesia em freguesia, de sede em sede, sabe Deus a pedir o quê!
A Assembleia tem, obrigatoriamente, em defesa da democracia, do direito, da dignidade, da legitimidade de todas as vozes eleitas, sofrer um abalo tamanho que reponha a sua vocação, missão e respeitabilidade pública. Da forma como tem funcionado pouco ou nada vale. Apenas é motivo de crítica, de cenas pouco dignificantes, de ataques pessoalizados e de manifestações que colocam em causa a razão de ser da sua existência. Esta Assembleia é um simulacro! Torna-se necessário rever tudo, desde o seu regimento aos encargos de funcionamento. É essencial que esta maioria política "desampare a loja", que deixe de se sentir "dona" daquilo (e até dos funcionários) e que outros, com uma outra interpretação da democracia e do sistema parlamentar, assumam essa responsabilidade de devolver a dignidade a uma instituição que a perdeu.
Ilustração: Arquivo próprio.
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