O Deputado Guilherme Silva (PSD), há dias, deu a entender que uma candidatura à Europa é uma "prateleira dourada". Lapsus linguae, dirão alguns. Politicamente incorrecto, dirão outros. Para mim, é o que lhe vai na cabeça. O facto de um candidato acabar por ser um entre seiscentos do parlamento europeu, a responsabilidade acaba por ser quase nula. Dir-se-á que lhe fugiu a língua para o pensamento que tem da Europa e do exercício político dos eleitos. Estar no Parlamento Europeu corresponderá a essa "prateleira dourada", isto é, a uns milhares de euros por mês que apenas tem o inconveniente de algumas horas de voo todas as semanas. Mas acaba por ser compensador. Paulo Rangel, o candidato do PSD, que o diga. Todas as semanas vejo-o na TVI, no programa "Prova dos Nove", da TVI 24, emitido à Quinta-feira. Assim, é fácil e corresponde, genericamente, à tal "prateleira dourada". Obviamente que não esse o entendimento que tenho da participação europeia. Ser deputado europeu, mesmo com todas as limitações, mesmo considerando a pequenez face a todas as pressões e lóbis, mesmo considerando os poderes instalados, os monumentais interesses em todos os sectores e áreas, a função não pode assimilar-se a uma "prateleira dourada". Tem de haver trabalho, tem de existir interesse e força interior para meter o "pauzinho na engrenagem", para dizer NÃO quando a evidência é a do interesse de alguns em detrimento da esmagadora maioria dos povos.
É difícil, pois é! Porque os deputados estão integrados em grupos de pensamento único ou quase único, obviamente que sim. Mas, ceder é que não. As cedências deram no que deram, numa Europa despedaçada, dividida, subjugada aos interesses dos mercados, ultrapassada que foi pelo poder económico e financeiro, que a transformaram em um mero instrumento.
É sensível que esta Europa se arrasta, deixou de ser o motor das políticas, antes assume o papel de "resposta" aos factos consumados. Os que optam pela "prateleira dourada", obviamente, nada têm a dizer; os que optam pela via do combate político, mesmo que poucas sejam as vozes, combate político esse sério, honesto, com inteligência e estratégia, acabam por servir causas e beneficiar do reconhecimento dos povos. Sempre repudiei o aforisma "maria vai com as outras", sempre contrariei a voz do pensamento único, a atitude de que não vale a pena, porque é assim, e o que é assim tem muita força. Não gosto de estar segundo o pensamento dos outros ou vergar-me aos interesses violando a consciência. O exercício da política não é isso. A política é, essencialmente, combate pelas convicções, é a arte de buscar a felicidade de todos, é a capacidade de encontros nos desencontros, é a luta permanente em defesa dos direitos do Homem. Não se faz política numa "prateleira dourada", onde o mais enfadonho é passar trinta dias à espera que caia mais um salário e outros subsídios na conta bancária. A opção pela política, seja a que nível for, muito mais no plano europeu, implica conhecimento, pensamento, capacidade intelectual, frontalidade e capacidade para quando é visível que o "rei vai nu", mesmo contra a corrente, levantar a voz e passar ao ataque, à desmistificação, à clarificação dos procedimentos, à exigência que os povos fazem relativamente aos mais elementares direitos. É claro que a Europa tem sido uma "prateleira dourada" para muitos, mas desses não rezará a História.
Ilustração: Google Imagens.
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