Ontem soube-se que Viriato Soromenho Marques, professor catedrático da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, responsável pela cadeira de Filosofia Social e Política, virá à Madeira proferir uma conferência no dia 25 de Abril, a qual decorrerá no Salão Nobre da Assembleia Legislativa da Madeira. Não será uma sessão solene, apenas uma evocação! Tenho por aquele Professor consideração, não apenas pelas suas posições públicas em diversos domínios, mas pelo seu extenso e respeitável currículo que atesta o seu valor. Mas uma coisa é tê-lo em consideração no plano científico e da intervenção social, outra é ter uma leitura sobre a sua adesão a um convite endereçado pela Assembleia Legislativa da Madeira. O Doutor Viriato Soromenho Marques, conhece, certamente, o registo político da Madeira ao longo de quase quarenta anos. Tem conhecimento dos constrangimentos, da ausência de liberdade e sensatez política, dos constrangimentos impostos no primeiro órgão de governo próprio da Madeira. Sabe que o Presidente do Governo nunca se expõe ao debate directo com os Deputados. E sabe, também, que as comemorações do dia 25 de Abril têm sido, na Região, intermitentes, umas vezes nada acontece, em outros momentos a data escolhida foi a de 24, e já comemoraram Abril a 26. E sabe que desde 2006 Abril foi posto a um canto. Mas o 25 de Novembro, todos os anos, tem uma sessão evocativa! Portanto, face a um partido, ainda maioritário, que não respeita a democracia e a memória, pergunto, o quem vem aqui fazer, Doutor Viriato S. Marques? Legitimar esta pouca-vergonha?
É que o 25 de Abril não é deste nem daquele partido. É de todos. E na Assembleia esses todos estão lá representados através dos partidos políticos. Naquele dia, seja por comemoração anual ou, neste caso, pelos 40 anos de Abril, devem ter a palavra os Deputados e não aqueles que são estranhos à Assembleia, sejam madeirenses ou não. Ali, a intervenção é de natureza política e não de natureza filosófica, pura e simples, por maiores que sejam os dotes oratórios do convidado! O Doutor Viriato Soromenho Marques acaba por aqui vir legitimar a vergonha, a ausência de princípios e de valores democráticos, esconder a verdade da Madeira em múltiplos patamares de natureza política, e isso parece-me inqualificável. Em outras circunstâncias, com um outro enquadramento, podia a Assembleia convidá-lo e abrir as portas do Salão Nobre à intervenção de um cidadão respeitado no País. Neste momento e nestas circunstâncias, NÃO, absolutamente NÃO.
O Doutor Soromenho Marques sabe ou deveria saber que até o Presidente da República, certamente pressionado, se esquivou a uma sessão de boas-vindas aquando da sua visita oficial à Região. Que o mais alto Magistrado da Nação, de forma também inqualificável, recebeu os representantes dos partidos numa sala de hotel. O Doutor Soromenho Marques sabe que é raro, muitíssimo raro, a aprovação pelo partido maioritário, por melhores que sejam os projectos de decreto legislativo regional apresentados pela oposição, Sabe que até os votos de pesar ou são negados ou emendados. Sabe que um voto de congratulação ao Nobel José Saramago foi negado. Sabe que, ainda há dias, um Deputado da oposição foi arrastado pelos funcionários da Assembleia. Sabe que o Presidente do Governo não presta contas à Assembleia em regular debate com os deputados. E conhece, também, os atentados ambientais aqui produzidos, uma vez que foi, entre 1992 a 1995, presidente da mais importante associação ambientalista nacional, a QUERCUS - Associação Nacional de Conservação da Natureza. Sabe, ainda, que por falta de fiscalização séria da Assembleia, os madeirenses e portosantenses carregam uma dupla austeridade devido a uma dívida que ultrapassa os seis mil milhões de euros, que torna a Região cada vez mais pobre, dependente e assimétrica. Estas são apenas umas breves continhas de um extenso rosário de quase quarenta anos de governação absoluta.
Estes sinais para quem está minimamente atento, deveriam resultar em um agradecimento pela lembrança do seu nome, mas um claro NÃO a quem não respeita os princípios basilares de um Estado Democrático. A questão que agora se coloca é a de saber se os partidos políticos representados na Assembleia vão aderir a esta nova palhaçada. Já basta o que se passa no dia 01 de Julho, Dia da Região, onde os assuntos políticos têm sido desviados para os domínios do faz-de-conta através da presença de um qualquer convidado. Há momentos que são determinantes na análise da postura política, isto é, se a coluna é de plasticina ou não. Até porque, considero esta encenação dos 40 anos de Abril, uma nova provocação por parte do PSD-Madeira, partido maioritário no hemiciclo, em relação aos restantes partidos ali representados. E alinhar na provocação parece-me, politicamente, menos acertado. Daí que espere uma atitude, porque Abril não é quando o PSD quer, mas sempre.
Ilustração: Google Imagens.
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