Tenho a sensação que, neste mundo de contraditórios, só se pode escrever uma de duas coisas: ou banalidades que se escusam a ferir sensibilidades, ou textos mais técnicos, de preferência “nano especializados”, que só os da área podem concordar ou discordar, mas, mesmo assim, há sempre um ou outro que se arroga no direito de dizer qualquer coisa. Carregados de likes, machados e foices a sentença é executada na praça pública.
Não deixa de ser irónico que, numa altura em que tanto se apregoa a liberdade de se ser e de estar seja, também, o tempo em que se achincalha e se julga sumariamente no lugar sem espaço, onde uma espécie de liberdade de expressão não tem limites. Esta reflexão deve ser feita entre todos: até onde podemos ir? Haverá uma relação entre estarmos continuamente ligados e a sociedade espetáculo que construímos? Estará esta forma de se estar na vida ligada a algum tipo de tédio? De insatisfação impossível de satisfazer?
“Então, o que é que nos pode ainda perturbar? (...) Podemos porventura chamar tédio a isto. (...) Se uma civilização inteira for atingida pelo tédio, esta pode tornar-se uma coisa efectivamente séria (...). Se, obtido tudo o que razoavelmente se pode desejar, as pessoas ainda estão insatisfeitas e se todo o mundo partilha do mesmo sentimento de insatisfação, pode desencadear-se o recurso a coisas menos razoáveis.
Estamos todos de acordo num ponto, a saber: a violência é o único e verdadeiro passatempo (WEIL, E).” Os missionários do desenvolvimento deram-nos o que prometeram. Porquê esta insatisfação? Parece que nada nos preenche. Entediados, não encontramos uma vida que nos satisfaça. O tédio pode engendrar diversas espécies de violência: contra si, contra o outro e/ ou violência desinteressada que se espalha cada vez mais. E não há diploma que nos salve, já que não se pode instruir ninguém no uso da liberdade. Eu não sei para onde vamos. Sei que isto não vai acabar bem. Não é possível viver em comunidade sem o respeito pela universalidade dos direitos, dos deveres e valores. Sei que não é normal, no século da pós-verdade litigada em rede, que a responsabilidade da ação e do discurso só seja conseguida pelo castigo do tribunal dos homens. Entre o que pode ou não ser dito há uma foice sempre pronta a cortar em riste. Digas o que disseres.
Liliana Rodrigues - Professora Universitária.
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