Bem gostaria que não existisse, no Natal, qualquer tipo de refeição, para novos e anciãos, para pobres e excluídos e para todos os que lá aparecem porque desempenham funções políticas. Seria sinal que a sociedade, mesmo com as suas margens, tinha muitos dos seus dramas solucionados. Ficaria, apenas, o convívio, a Festa! Infelizmente, a sopa e o pratinho são servidos para matar por um dia as carências sentidas nos outros dias do ano. É claro que existem o Banco Alimentar, a Cáritas, a Cruz Vermelha, as paróquias e tantas instituições que vão colmatando a pobreza sentida em uma região que é a segunda mais pobre do país. O que me leva a este desabafo é o sentimento de quadros ridículos e enervantes, porque ofende a dignidade das pessoas, ao oferecerem um convívio com uma mão e aproveitá-lo para saltar para o palco e realizar um comício político. Repugna-me.
Na Calheta/Madeira, como habitualmente, a Câmara Municipal reuniu 1200 idosos e a páginas tantas ouve-se uma voz a falar em nome dos presentes: "(...) Não vamos atrás de ilusões, não vamos atrás de fotografias e imagens bonitas, queremos pessoas sérias, competentes, responsáveis, que façam aquilo que se comprometeram com a população”. Pegando nas palavras, o presidente do governo, não perdeu a oportunidade: "temos alguma folga orçamental" em 2019, por isso, em Janeiro ou Fevereiro "vamos anunciar medidas de apoio à população mais idosa, seja a nível dos apoios para medicamentos e para óculos seja para o suplemento às reformas". Repugna-me.
E porquê? Pela proximidade de eleições. Fico pelos medicamentos e pelo complemento de reforma ou pensão. Há que anos, mais de vinte, que o PCP na Assembleia Legislativa e, muito mais tarde, o PS, apresentam propostas no sentido de contemplar as pensões mais baixas e todos os mais vulneráveis, com um complemento regional. No início do século começou, salvo erro, por € 50,00. Todas essas propostas, sucessivamente apresentadas, de orçamento em orçamento, foram chumbadas pelo PSD-Madeira. Porque não havia necessidade e porque o governo, a Segurança Social e tantas instituições colmatavam algumas situações precárias. Pela oposição chegou a ser apresentado o exemplo da Região Autónoma dos Açores, não apenas relativamente ao complemento de pensão, mas também o COMPAMID (Complemento para a Aquisição de Medicamentos pelos Idosos), proposta de 2008, julgo do CDS, aprovada nos Açores, por unanimidade, e que garante "50% da retribuição mínima mensal garantida em vigor na Região".
Isto é, o governo da Madeira levou mais de vinte anos para aceitar a pobreza na Região e a necessidade de esbater as necessidades sentidas por mais de 70.000 pessoas. E agora, com os calos a doer face ao descrédito em que anda, resolveu abrir os cordões à bolsa e prometer, prometer e prometer, até óculos, talvez, para que não se enganem no quadradinho da seta! Repugna-me.
A política não é isto. Cumpram o dever para com os mais vulneráveis, ofereçam, comemorem o Natal, mas não utilizem o palco para promoção pessoal e de grupo. Distribuam os cabazes com discrição, sem fanfarronices. Fica feio. Evitem a presença física como quem dá uma esmola a troco de um voto. Deixem a hipocrisia sentada a um canto da porta, entrem com dignidade e saiam ligeiros distantes dos holofotes, porque não lhes fica bem. Lembrem-se que a solidariedade não tem dias nem épocas, é todo o ano, através de actos e não de atitudes caritativas. Fujam do Banco Alimentar, instituição que, durante anos, nunca aceitaram como uma necessidade, mas também porque se trata de uma instituição independente da Igreja e dos partidos.
A partidarite desmiolada é tal que, na mesma semana que apelam à participação (regresso) de Alberto João Jardim, o presidente da Câmara da Calheta falou da "grave crise" que este governo herdou, mas que o presidente do Governo, Miguel Albuquerque "recuperou financeiramente a nossa Região, encetando um programa de governo e uma série de compromissos para com população", pedindo, por isso, um aplauso aos 1.200 idosos que estiveram no pavilhão dos Prazeres - Fonte DN-Madeira.
Ora, perante tanta hipocrisia, repugna-me!
Ilustração: DN/Madeira.
Sem comentários:
Enviar um comentário