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domingo, 16 de julho de 2023

Peçam desculpa ao Dr. Rui Rio

 

"Isto já não é um problema de justiça. É um problema da política de Justiça", sublinhou o Dr. Francisco Assis, presidente do Conselho Económico e Social.



O que se passou com o Dr. Rui Rio, que eu tenha memória, só tem algum paralelo (político) nos tempos da ditadura. Nesse tenebroso período do Estado Novo, à socapa, invadiam, prendiam, cassavam documentação e, depois, seguia-se, em muitos casos, o calvário da prisão, a tortura selvagem e a deportação. Hoje não é assim. O processo é mais refinado. Com um aparato que bastas vezes não faz sentido, elaboram mandatos de detenção, confiscam equipamentos e enjaulam as pessoas durante alguns dias e, por vezes meses, apenas para serem ouvidos ou investigados. 

Dir-me-ão que há casos e casos! Certamente que sim. Não foi, pelo que se sabe, o caso do "assalto" à residência do Dr. Rui Rio e à sede do PSD. Um aparato que mobilizou uma centena de agentes para o esclarecimento de uma matéria, onde ninguém roubou ou colocou em causa receitas do Estado. Em síntese, o que ali está em causa foi e é o esclarecimento da Lei. Que, de todo, não compete ao Ministério Público. O mesmo já se passou na Madeira na relação entre os grupos parlamentares e os respectivos partidos. Isso deu lugar a um longo processo através das dúvidas levantadas pelo Tribunal de Contas. Quando desempenhei as funções de líder do grupo parlamentar do PS, lembro-me de ter mandado encerrar as contas abertas no Montepio, porque entendia que as receitas pertenciam ao partido e porque a contabilidade regional integrava a contabilidade nacional do PS.

Ora bem, os grupos parlamentares pertencem aos partidos. No nosso regime, sem os partidos eles não existem. As verbas destinadas a um partido e ao seu grupo parlamentar devem ser vistas sempre no pressuposto da actividade política. Se se destinam a assessores ou ao funcionamento partidário, no essencial, ao Estado, apenas o deve preocupar como é que foram aplicadas. Os desvios, as dúvidas ou mesmo os roubos é que devem estar sob a alçada da Lei. Para mim não existem zonas cinzentas, como sublinhou o Senhor Presidente da República, até porque o número fiscal é o do partido. Os grupos parlamentares não possuem NIF. Sendo assim, quanto muito, reequacionem o valor a transferir para os partidos, que deve incluir o funcionamento parlamentar, e transfiram as verbas com total transparência. Acabem com esta treta de suspeições infundadas, que fazem mergulhar na lama pessoas impolutas. Até porque não aceito, enquanto cidadão, julgamentos na praça pública.

Portanto, o espectáculo mediático que se tornou normal, com a própria comunicação social a chegar primeiro que os inspectores a casa de alguém, tem, obviamente, uma intenção que está muito para além do trabalho de investigação e de esclarecimento. O que assisti no caso do Dr. Rui Rio foi uma vergonha. As próprias declarações da Senhora Procuradora Geral da República (existem ali laivos de abuso de poder) tiveram o condão de me deixarem pasmado. Como é possível que a 10ª figura protocolar do Estado fale e nada reste! 

Finalmente, uma coisa é a independência do poder judicial; outra, as situações que transmitem a ideia de ser um poder em roda livre, de livre-arbítrio, com um estatuto intocável onde existe receio de travar ímpetos de "super juízes" que se manifestam contra a própria vivência democrática. Por outro lado é uma treta essa história "de à política o que é da política e à Justiça o que é da Justiça". Estamos numa Democracia representativa, a Lei é para todos, mas quem a define são os representantes de todos os portugueses em sede de Assembleia da República. Detesto viver numa democracia onde sobressaiam os poderes absolutos. A independência do poder judicial faz-se de forma séria, profunda, isenta, distante, rápida, acessível, discreta, de olhos vendados e com uma balança. 

No caso do Dr. Rui Rio (entre outros casos) o mínimo que lhe podem fazer é pedir desculpa face àquele modo de actuação absolutamente desproporcional e sem sentido. E bem fez gozar o espectáculo à varanda do seu apartamento, guardando para uma entrevista toda a sua repulsa.

Ilustração: Google imagens.

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