Para alguns, sobretudo quem vive do sistema ou anda próximo da mesa do orçamento, melhor dizendo, para quem, no meio da crise cresce e engorda, torna-se milionário, é evidente que as palavras do Dr. Mário Soares são excessivas, são impróprias para quem já exerceu a mais alta Magistratura da Nação. Para mim e, certamente, para milhões de portugueses e muitos outros milhões que sofrem nesta desgraçada Europa, Mário Soares está cada vez mais lúcido. As suas palavras e as de outros que se reuniram na Aula Magna da Universidade de Lisboa, constituem, apenas, a campainha de alarme de um quadro que pode descambar em violência. É a própria História que nos ensina e aconselha a saber interpretar os sinais. A situação vivida nas escadarias do Parlamento, a generalizada insatisfação de todos os grupos profissionais, o assustador desemprego, a galopante pobreza, o confisco de salários e de pensões, a insuportável carga de impostos, o cinismo e aldrabice discursiva dos governantes, do FMI à Europa, passando pela dupla Passos/Portas e Assembleia da República, por aí fora, coloca o País numa tensão muito próxima da explosão social. Será que há gente que ainda não percebeu isto? Que esta Europa de especuladores não nos interessa, que este governo está fora de prazo, que não podemos estar reféns dos mercados, que é o Euro que está em causa, que temos de lutar pela nossa independência e soberania? É difícil perceber que são exigidas saídas deste drama que espezinha e tritura povos e que a austeridade não é a solução?
Mário Soares, uma vida dedicada aos valores da Democracia e defesa do Estado Social |
Trata-se de um quadro que ninguém pode ignorar. O problema é que o próprio Presidente da República ignora-o ao agir partidariamente e não como a figura independente e de garantia do equilíbrio e busca de soluções. Mastiga, gagueja, assobia para o lado, sorri, talvez de si próprio, faz que anda mas não anda, não assume uma palavra em defesa do Tribunal Constitucional, toma por certo um único caminho quando, nesta encruzilhada, são várias as opções possíveis. É pois legítimo que se lhe aponte o dedo acusador, pela mais completa e notória ineficácia. Hoje, já não é apenas o governo que está em causa, é também o Presidente da República. E quando Mário Soares aponta para a demissão de ambos é pela pública existência de uma cumplicidade que nos está a arrastar para uma situação de difícil regresso. Ainda ontem o Presidente veio apelar à "serenidade" em "tempo que não é fácil". O que é que isto quer dizer e que importância prática têm estas palavras? Zero! Deveria, antes, mostrar-se preocupado com o Relatório Comissão Europeia que se junta ao FMI e ao Governo no sentido de, em uníssono, apertarem o cerco aos juízes do Palácio Ratton. Ele, Presidente, que jurou cumprir e fazer cumprir a Constituição da República, pede serenidade ao invés de defender a independência e a soberania nacional. Nem uma palavra relativamente a este grosseiro cerco e intromissão nos desígnios nacionais, tendo em consideração o quadro de desgraça que envolve milhões de portugueses. Ele, Economista, parece não ter presente que a dívida pública, abaixo dos 100%, só lá para 2025, e que este fardo se torna impossível de carregar pelos portugueses. Que uma situação destas equivale matar as esperanças, não dos que têm 60, 70 ou 80 anos, mas a esperança dos adolescentes e de todos aqueles que se encontram na força da idade para produzir e realizar sonhos.
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Mário Soares e muitos outros estão lúcidos, muito lúcidos. Não se trata, como escutei da boca de um comentador (onde estavas no 25 de Abril?), que Soares está a promover, subtilmente, a violência. Entendo as palavras de Soares exactamente de sentido contrário, como uma chamada de atenção para uma alteração dos comportamentos políticos susceptíveis de travarem qualquer espiral de violência que se encontra latente. Por isso, saúdo Mário Soares quando exprime quase em tom de grito: "Senhor Presidente, demita-se, uma vez que não cumpre a Constituição" (...) "É preciso ter a consciência que a violência está à porta", (...) "Não desgrace mais Portugal, senhor Presidente da República".
Ilustração: Google Imagens.
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