Ao contrário do que Passos Coelho afirmou numa recente entrevista, ele sabia muito bem ao que vinha quando, em 2011, se candidatou a Primeiro-Ministro. Não passa pela cabeça de ninguém que não conhecesse a situação de crise económica e financeira, despoletada externamente, com gravosas consequências em muitos países, particularmente junto dos mais frágeis. Quem se candidata ao governo de um país, obvia e obrigatoriamente que transporta o domínio de muitos dossiês internos e externos. Só um imbecil é que se atreve a tal responsabilidade sem qualquer estudo que sustente o rumo a seguir. Ora, Passos Coelho disse o que disse em tempo de campanha eleitoral de 2011, chumbou o PEC IV acordado em Berlim (ao tempo, uma boa solução, semelhante à espanhola), foi um dos responsáveis pela presença da troika e tudo fez para que uma crise política acontecesse em Portugal. Portanto, ele sempre esteve consciente da “obrigação” de mentir aos eleitores para ganhar o poder. Mentiu, prometendo mundos e fundos, aldrabou a consciência colectiva e fez, durante estes quatro anos, exctamente o contrário das promessas eleitorais. Agora, arma-se em anjinho com o discurso que, em consciência, só lhe restava seguir o caminho que todos conhecemos. Isto só tem uma designação: cretina aldrabice política.
Ele sabia que se transmitisse a sua verdade não teria quaisquer hipóteses de ganhar o poder. Ele sabia que, para servir os desígnios do grande capital e construir o seu futuro político em outras instâncias, teria de mentir. Mas, pior, ainda. Chega a 2015 com um país derrotado como provam os indicadores económicos, financeiros, sociais e culturais, onde campeia a precariedade laboral, desemprego, pobreza e falência dos sistemas de saúde e de educação. Passos Coelho serviu quem não deveria ter servido, foi um aluno perversamente brilhante em obediência ao senhor Wolfgang Schaeuble, estendeu-se, ao jeito de uma passadeira vermelha, para que outros passeassem por cima, nada se ralando que ao lhe pisarem eram dez milhões que estavam a sofrer. E fez tudo certinho com o amém do Presidente da República e com o aplauso da direita europeia que se está nas tintas para a solidariedade entre os povos e a irmandade entre as nações. As suas recentes posições sobre a Grécia explicam muita coisa.
Em 2011 Passos Coelho mentiu. Em 2015 joga com a palavra MEDO, acenando, sistematicamente, com o discurso assente na ideia de, cuidado, não queiram regressar ao passado, olhem para o futuro! Pergunto: mas qual futuro com esta gente quando retiraram a esperança à juventude, quando esmifraram os aposentados, quando tornaram a vida difícil para a maioria dos portugueses através da carga fiscal, quando rebentaram com o sistema nacional de saúde, quando deixaram a educação em polvorosa, quando vêm com a treta de mais seiscentos milhões de austeridade em 2016, quando os direitos sociais são sucessivamente roubados e quando crescem as fortunas na mesma proporção que se multiplicam os novos pobres. Chega de aldrabice. Chega de vir agora falar de uma guerra sem quartel à pobreza e à exclusão social. Chega de discursos mentirosos e hipócritas que apontam para o sucesso, quando é facilmente demonstrável que, hoje, estamos piores do que estávamos, de nada tendo servido a penosa austeridade. O povo quer novas políticas, o povo precisa de gente politicamente honesta, que sirva e que não se sirva, o nosso país precisa de políticos que vivam, sintam e se interroguem sobre os dramas do povo que servem. Nós precisamos de políticos de coragem, que não se verguem aos ditames de uma teia europeia que caminha para o abismo. Neste contexto, Passos Coelho, Paulo Portas e outros que tais devem sair de cena, simplesmente porque o trabalhinho sujo está feito. Alguém tem de corrigir este azimute com verdade. Não com a verdade conveniente! Quanto antes.
Ilustração: Google Imagens.
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