Deixa-me fora do sério quando oiço os políticos, de todos os quadrantes, dizerem: "à Política o que é da Política e à Justiça o que é da Justiça". Por maior esforço que faça, não os entendo. O erro deve ser meu! E bem fazem aqueles que não se calam e que contrariam aquele "princípio". Ainda ontem segui vários debates a este propósito. Ora, as leis são concebidas na Assembleia da República, logo são políticas. Existe, por outro lado, o Ministério da Justiça, logo, uma instituição política. E se sendo assim, pergunta-se, que razões substantivas existem para considerar a Justiça qualquer coisa do tipo "vaca sagrada"? Não admitir a sua discussão ou desviar-se dela, eu, cidadão leigo em matéria jurídica, mas sabendo ler e escrever, questiono-me sobre as razões de alguns não quererem discutir os actos da Justiça que têm uma raiz política? Não me estou a referir aos processos de investigação, às conclusões, à prova, à condenação ou absolvição, mas a um conjunto lato de situações que qualquer pessoa, defensora do rigor e da Lei, entende como provocatórias e susceptíveis de serem entendidas como arbitrárias, por trazerem no seu bojo a imagem do interesse translucidamente partidária. São estes desvios, a par da desorganização do sistema, que faz com que a Justiça funcione lentamente e com imagem desfocada. Tais desvios exigem a sua discussão política e pública. Porque ninguém está acima da Lei, nem Procuradores, nem Juízes, nem Ministros. Mas todos, a todo o momento, devem ser escrutinados.
Prender alguém para investigar, coarctar a liberdade de um cidadão, escondê-lo em uma cela sem culpa formada, deixá-lo meses e meses para ali porque existem "indícios", não se tratando de um qualquer crime de sangue ou outro que, pela sua natureza ou possibilidade de fuga obrigue a uma decisão de âmbito preventivo, não me parece adequado de um Estado de Direito Democrático. Enquanto cidadão, mesmo sem conhecer a profundidade dos processos, dou comigo perante tantos sinais em conflito, isto é, em permanente incoerência, que deveriam ser, repito, escrutinados, tal como em qualquer outro sector, área, domínio ou profissão. Não me parece correcto que os políticos de primeira linha evitem tocar na ferida. Onde dói deve ser tocado e corrigido, para que a Justiça funcione de forma livre, rápida e segura. Permitir a omnisciência, a intocabilidade e as torres de marfim, a par do silêncio, apenas conduz à falta de confiança, ao abuso de autoridade e ao despotismo. Portanto, discuta-se a Justiça.
Ilustração: Google Imagens.
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