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sábado, 8 de janeiro de 2011

"P'ONDE TIVESTES ATÉ AGORA?"


Então vistes a entrevista d'ontem? De quem? Daquele político do carro dos mortes. vi. Não? gostei duma parte que ele disse que na Madeira havia muitos alfabetos".

Hoje, como habitualmente, tive de passar pelo supermercado, essa inevitável catedral do consumo. Chegado à caixa, não sei se dando pela minha presença (pelo menos achei estranho) a jovem, bem anafada, iniciou uma despropositada conversa com uma sua colega, enquanto passava os códigos de barras pela máquina: "então vistes a entrevista d'ontem? De quem? Daquele político do carro dos mortes. Nã vi. Não? Nã gostei duma parte que ele disse que na Madeira havia muitos alfabetos". Peguei no saco de compras e puz-me a andar. A andar e a reflectir no que tinha escutado. Confesso que a primeira imagem que me assaltou foi esta: o voto dela vale exactamente o mesmo que o meu! Já na escada rolante, reflectindo melhor, sobrou uma certa sobranceria da minha parte, pois, afinal, não a conheço, não sei o que quis dizer com aquilo e uma frase solta pode não significar nada. Fiquei, então, a matutar  na oralidade, no vistes, nos mortes e nos alfabetos. E vim no meu Modus a congeminar no porquê de uma Escola que assim produz. Trinta e tal anos depois, uma jovem, que anda aí pelos seus vinte anos, não conseguir acertar no verbo e nos substantivos. Como se isto não bastasse, vinha eu, pacientemente, atrás de um autocarro dos Horários do Funchal e pimba: "P'onde tivestes até agora? Oh hôme vai la ter...". Exactamente isto, em um autocolante publicitário.
É evidente que respeito o nosso sotaque característico, o ritmo com que falamos, a nossa prosódia, mas isso não significa que pronunciemos de forma errada e que não saibamos, desde a idade jovem-adulta, utilizar de forma minimamente correcta a Língua Portuguesa. Erros, tê-los-emos sempre face à complexidade da Língua, todavia, atenuados pela capacidade transmitida e trabalhada que nos deve conduzir ao aperfeiçoamento. Quantas vezes vou ao dicionário movido pelas dúvidas que me assaltam! Este texto é natural que tenha erros de construção frásica. Não sou especialista...
O problema é que a Escola anda, por aí, distraída com o acessório, enquanto o essencial passa ao largo; o problema é que os autocarros transmitem o erro; o problema é que damos de frente com letreiros de empresas com designações de arrepiar, como aquele que há dias li, numa movimentada rua da cidade (...) Kabelo tipo (...)! ´
Tudo isto despertou-me para a necessidade de um Projecto de Decreto Legislativo Regional que, brevemente, apresentarei.
Ilustração: Foto através do meu telemóvel.

5 comentários:

Espaço do João disse...

Meu caro André.
Aproveito para desejar as melhoras rápidas do sr. Jardim.
Realmente também esse senhor, é um dos culpados do analfabetismo na Madeira. Basta ouvi-lo quando dos seus discursos inflamados. Quantas vezes digo para mim próprio:- Como pode um povo com um governante deste calibre ser alfabetizado e educado?
Um Abraço.
João Susa

Fernando Vouga disse...

«Confesso que a primeira imagem que me assaltou foi esta: o voto dela vale exactamente o mesmo que o meu!»

Caro amigo.
Pois essa é uma das questões que se coloca à democracia. Para seu descanso, não vejo como dar volta ao problema. É óbvio que não se pode tirar o voto (e a opinião) àqueles que, pelas mais diversas razões, não tiveram acesso ao saber.
Já agora, e como contraponto, passo a citar Thomas Carlyle que disse: "Não acredito na sabedoria colectiva da ignorância individual"

André Escórcio disse...

Obrigado pelos vossos comentários.
Há um longo caminho a percorrer. Vamos a isso!

Pica-Miolos II disse...

Oh! Senhor Professor André Escórcio
O senhor está,desactualizado!
Neste nosso país, o que está a dar é ser bronco!
Bronco,embora bem vestido e engravatado à moda...
Quer melhor exemplo daquele que o que "nunca se engana e raramente tem dúvidas" nos oferece?!
O "doutor honoris causa", em Literatura, pela Universidade de Goa, até descobriu que os Lusíadas,em vez de 10, tem 12 Cânticos !!!
(Se calhar os "dois" últimos foram acrescentados em seu único e exclusivo louvor...).

André Escórcio disse...

Obrigado pelo seu comentário.
Se há aspectos que me preocupam é do conhecimento básico e o da cultura básica. Obviamente que nada tem a ver com o Ensino Básico.
Gostaria de ver um Povo educado e culto, pois isso significaria que a Escola seria outra, a sociedade seria outra, a pobreza estaria atenuada e a família seria olhada por outro diapasão. Tudo está interligado. O problema é que para além dos túneis físicos andam a fazer túneis na cabeça das pessoas...