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terça-feira, 21 de abril de 2009

UMA BOA RESPOSTA PARA UM PROBLEMA ERRADO

Esta manhã, a propósito de um diploma sobre os concursos para lugares de docência, aproveitei a oportunidade para enquadrar a minha intervenção sobre a teoria da Escola a Tempo Inteiro. É evidente que o PSD saltou logo a terreiro com pedidos de explicação. Infelizmente, não pude explicar porque tinha esgotado os meus míseros nove minutos de intervenção. Aliás, sobre esta história da Escola a Tempo Inteiro existem muitos trabalhos académicos. Ainda há dias, li um artigo da investigadora Doutora Arina Cosme, onde sublinhava:
"(...) O que afirmamos é que é um risco e um contra-senso que as escolas alarguem, de forma mais ou menos envergonhada, o tempo de escolarização dos seus alunos. Como já o defendemos anteriormente, as crianças portuguesas não precisam de mais escola. Necessitam de uma escola onde se possa aprender melhor, do mesmo modo que necessitam de um outro tempo educativo onde possam usufruir de experiências gratificantes que, mais do que promover aprendizagens de carácter escolar, estimulem, como seu objectivo prioritário, a exploração do mundo ou a produção de obras que se partilham e interpelam de forma solidária (...) o programa da «Escola a Tempo Inteiro» não é, por isso, um programa passível de ser reformado, porque constitui mais um dos equívocos de uma política educativa de cariz tão voluntarista quanto demagógica".
Ora bem, no mínimo, como salientei esta manhã, há necessidade de repensar o modelo. Daí que tivesse assumido uma intervenção da qual aqui fica uma passagem:
"(...) As Escolas a Tempo Inteiro têm muito que se lhe diga. Do nosso ponto de vista, está na hora de repensar esse modelo. A Escola a Tempo Inteiro surgiu não como uma necessidade de aprendizagem mas como uma forma de dar resposta à situação laboral dos pais e encarregados de educação. Aquilo que deveria ser uma excepção encontra-se hoje numa fase de expansão e de consolidação. Não é, senhores deputados, pelo facto de uma criança passar muitas horas na Escola que aprenderá mais. Muitos dos senhores deputados passaram pela escola de um só turno e hoje são deputados, portadores de habilitações académicas de nível superior, falam outras línguas, têm competências adquiridas no mundo das novas tecnologias e, certamente, até fazem desporto. A Escola a Tempo Inteiro veio para esbater a desorganização social, a desregulação do mundo laboral, enfim, as exigências acéfalas que esta sociedade criou. Não foi por necessidade pedagógica mas para responder à incapacidade do governo em matéria de organização social. E as crianças, por isso mesmo, são metidas na Escola de manhã ao fim da tarde, através da escolarização daquilo que deveria ser do domínio do lazer e da aprendizagem não obrigatória, acabando-se, agora, por abrir concurso para dar resposta a uma falsa necessidade educativa.
Pergunto, Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, neste quadro de uma certa clausura escolar nas primeiras idades, onde é importante tempo para o jogo, pergunto, onde está a família, onde estão os avós, onde pára a responsabilidade parental pela educação. Dir-me-ão, certamente, que para muitas crianças melhor será estar na escola do que em casa. Poderei concordar. Mas aí questiono, o que andou o governo a fazer todos estes anos para chegarmos a este ponto de nivelamento económico, social e cultural por baixo que conduz a opções daquela natureza. As respostas educativas, senhores deputados, têm de ser encontradas mas não como medida de recurso mas como medida estrutural que seja portadora de futuro. A Escola a Tempo Inteiro constitui hoje uma resposta certa para um problema errado".
Hoje, já se fala em escolas abertas doze horas por dia. Para quê? Apenas para dar resposta a uma claríssima desorganização social? E as crianças?
É evidente que este é um tema que nos conduz à análise de muitas variáveis. Desde logo porque, no actual quadro de organização social que vivemos, qualquer reajustamento do processo, sobretudo na área laboral, leva muitos anos a produzir efeitos. Só que, infelizmente, o PSD não entende isto, não percebe que há uma necessidade de olhar para a sociedade e vê-la com outros olhares. De procurar as causas e as consequências. De analisar os prós e contras. De escutar os especialistas. Tenho pena, pelas crianças e pelo futuro da nossa terra.

3 comentários:

Vilhão Burro disse...

Oh! Senhor Professor!

Alguma vez o poder instalado, há mais de três "gloriosas" décadas,fará o que quer que seja para inverter a desestruturação social e cultural desta terra?!
Do respectivo ponto de vista, só se,a oligarquia que "se governa", fosse mais burra que eu!
Vai-se apaparicando o pagode, com a denominação de Superior e está tudo feito.
Noutras condições, nem três meses se aguentavam no poleiro.
Assim, com a benção da "Santa Madre Igreja"...

João Boaventura disse...

Essa Escola a Tempo Inteiro que fala e sobre a qual perfraseia Arina Cosme é a ETI socialista. Não a madeirense...
A regional, como bem sabe, não prende ninguém e não funciona 12 horas...
Ocupa e coloca PROFESSORES (com a sua carreira salvaguardada) e não monitores pagos a pataco pelas Câmaras Municipais.
E, sendo "feita" por professores, com formação docente e devida, é uma escola à sua medida, libertando as crianças, mesmo que no edifício escolar, no período não curricular, para a tais actividades que tanto gosta e aponta. Tão desescolarizadas quanto for possível dentro do que são capazes esses professores (duvida deles?).
A alternativa (os avôs e outras externas à escola), se existe, deve ser aplicada pelas familias. Se não existe, é ali oferecida. A tal sociedade que fala, idealista, onde os meninos e os pais trabalham 5 horas e têm outras 5 para estarem juntos é... idealista. Desejável. Mas só isso...

André Escórcio disse...

Agradeço o seu comentário.
Ora bem, gostaria que soubesse que, na discussão do sistema educativo, as minhas vestes partidárias estão à porta. A Educação é um sector demasiado sério para esgrimir argumentos partidários. Não se trata pois de ETI's socialistas ou social-democratas, mas de uma análise mais profunda (política) à existência da Escola a Tempo Inteiro. A discussão situa-se aqui em função, por um lado, do que os investigadores dizem, por outro, da desestruturação social e familiar.
Tarde ou cedo acredito que a nossa organização social, onde se inclui a importante área laboral, sofrerá naturais reajustamentos. É o que se está a passar por todo o lado, mesmo em plena crise económica e financeira. Eu conheço várias sistemas educativos e sei como eles estão estruturados. E sei também que é muito difícil chegar à sociedade "desejável" que muito bem enunciou. Levará muitos anos mas o reajustamento terá de ser, inevitavelmente, concretizado.
Quanto aos professores, sendo eu docente mas aqui não por uma questão corporativa, entendo que são eles que dão qualidade ao sistema. Mas o problema continua a não ser esse. Tenho pena de não ter aqui colocado toda a minha intervenção no plenário da ALM. Talvez tivesse sido mais claro nas preocupações que assumo. Posição que é apenas uma entre outras posições tão válidas quanto a minha.
Nota final: muita gente congratulou-se com o Processo de Bolonha. Eu mantive reservas e assinei vários trabalhos contra. Hoje, um pouco por toda a Europa, assiste-se a uma condenação pelas mais variadas razões.