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segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

EXACTAMENTE, SENHOR BISPO!

D. António Carrilho, Bispo do Funchal, referiu, ontem, que precisamos de uma "profunda renovação cultural" da humanidade" no sentido de "redescobrir aqueles valores que constituem o alicerce firme sobre o qual se pode construir um futuro melhor para todos". É verdade e é oportuno.
Como tenho vindo aqui a destacar com alguma regularidade, há uma absoluta necessidade de recuperar princípios e valores que foram literal e sucessivamente jogados fora, ultrapassados, espezinhados na voragem de uma onda liberal que tudo levou, destruindo direitos e sobrecarregando os deveres. D. António Carrilho, certamente, cheio de boa vontade e acreditando na concretização da utopia, segundo o DN, pediu aos fiéis para que levassem consigo a mensagem transmitida ontem para que cada um pudesse também ser anunciador e construtor da paz. Só que o problema, do meu ponto de vista, é muito mais vasto (o Senhor Bispo sabe e, por isso, dele falou embora não pormenorizando) e pergunto, desde logo, que paz pode existir, para além das palavras de circunstância da Igreja, quando toda a sociedade está organizacionalmente desestruturada, quando desregularam, completamente, os horários de trabalho que bloqueiam o tempo para a família, quando há desemprego crescente e pobreza a dominar, quando o sistema social está configurado para dar resposta aos interesses políticos de alguns que controlam todos os restantes? Como pode haver paz, ou de que paz fala o Senhor Bispo?
A "revolução cultural" que o Senhor Dom António Carrilho assume ser necessária terá de começar não pelo pobre povo mas pelas elites que governam. O povo, esse, coitado, carrega a Cruz, como sempre lhe disseram, e porque sobrevive nas teias da dependência onde o enclausuraram, obviamente que denuncia a tendência para se vergar não ao Senhor e à Sua Palavra, mas ao senhorio, matreiro, interesseiro e jogador neste enorme tabuleiro de xadrez. Há muito que está em xeque-mate! Trinta e tal anos depois de Abril, desse mês libertador, era para dispormos de uma população culta e capaz de lutar por um futuro melhor. A questão é determinarmos as razões, as causas, que conduziram ao estádio de menoridade cultural e de incapacidade para dizer NÃO ao caminho que, teimosamente, lhe querem impor e sobretudo capacidade para descobrir tudo quanto se esconde por detrás desse caminho. E neste aspecto, infelizmente, a Igreja tem a sua quota parte de responsabilidade, claramente, por omissão. Mas, enfim, oxalá as palavras de Dom António Carrilho despertem algum sentimento naqueles de quem o Povo depende.
Foto: Google Imagens.

6 comentários:

António Trancoso disse...

Meu Caro André Escórcio

"E,neste aspecto,infelizmente,a Igreja tem a sua quota parte de responsabilidade,claramente,por omissão."

Meu Caro Amigo:

Por omissão?! Por omissão?!!!!

Discordo,profundamente,com esta sua apreciação.

Permita-me que o "recorde" da acção determinante que o Bispo Santana e o seu Clero tiveram na manipulação e no activo encaminhamento político-partidário que alcandoraram ao Poder quem "se governa" desde Abril de 74 até aos dias de hoje.

Desde quando a Pastoral do Bispo Teodoro Faria se demarcou daquela orientação e do manifesto encosto àquele mesmo Poder?
Será preciso dar exemplos factuais? Não me parece que a memória seja tão curta...

Mais recentemente,para muita gente,o Bispo Carrilho,constituíu a Esperança de uma saudável e redentora mudança; mudança que as suas primeiras declarações sugeriam...
Porém,do melífluo e sugestivo discurso à actuação concreta,vai a distância de sempre.
"Dom" Carrilho,fazendo jus ao seu nome,afinal...encarrilhou.

Talvez daqui a cem anos,como é uso e costume,é muito natural que apareça um outro Alto Clérigo a penitenciar-se e a pedir o perdão, (a uma população gangrenada) pelos erros,sujeições e malfeitorias dos seus "ilustres" antecessores.

Quão longe de João XXIII, do "morto" João Paulo I e de tantos Bispos da América Latina,se encontra a "recuperada" Nomenklatura Eclesial...

Mas,quem quiser seguir ou carregar este andor...é livre de o fazer; depois,caridosamente,não se queixe!

André Escórcio disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
André Escórcio disse...

Obrigado pelo seu comentário.
Grosso modo estou de acordo consigo. Por essa mesma razão, quando este Bispo chegou ao Funchal, passados uns dias, escrevi um artigo que terminou dizendo: "Carrilhar é preciso".
Por isso e face à minha memória que não é, felizmente, tão curta quanto isso, o texto que escrevi, no essencial, diz, não dizendo, que o Senhor Bispo descarrilhou. Simplesmente porque não é possível pedir que cada um de nós seja construtor da paz sem que, simultaneamente, se "chame os bois pelo nome". Portanto, a "renovação cultural" parte, pela força que a Igreja tem, da necessidade de contextualizar a Palavra na realidade diária. E isso a Igreja não faz ou tem dificuldade em o fazer. Quando um ou outro se atreve muda de paróquia.
O Senhor Bispo chegou e, dias depois, almoçou no Apolo, no meio do Povo. Recebeu o Padre Martins Junior. Foram sinais de alguma esperança. Mas esse fulgor e essa imagem de um Bispo frontal (não partidário) converteu-se e hoje a música é a mesma. Meu Caríssimo Amigo, então eu não sei que é assim e quais as razões que sustentam esta atitude?
Construtores da Paz no sentido amplo da palavra tem sido toda a oposição política, quando chama a atenção para o caos social em que a maioria vive. Mas, enfim...

Dylans disse...

Ao fim de dezoito anos de dedicação pastoral, a diocese do Funchal transferiu o cónego Manuel Martins para outra paróquia da Madeira, alegadamente a pedido do próprio. Aparentemente, tratava-se de uma situação normal, no entanto, é bom recordar o passado do padre - crítico com o aumento da pobreza na ilha e, consequentemente, com o governo regional. De um simples pregador de valores cristãos, tornou-se numa voz incómoda e denunciadora de injustiças sociais. No fundo, é este amor ao próximo que o cristianismo não deveria menosprezar e, muito menos, imiscuir-se com governos déspotas, que fazem lembrar os tempos de concordatas político-religiosas entre o Estado Novo e a Igreja onde o cinismo ditava leis.

http://dylans.blogs.sapo.pt/

Vilhão Burro disse...

Senhor Professor

De facto, trinta e tal anos depois da recuperação da cidadania,era mais que tempo de dizer NÃO; NÃO, NÃO VAMOS POR AÍ!

O Direito à Indignação,porém,é incompatível com a macieza "politicamente correcta"(que,infelizmente,dá a sensação de transparecer na parte final do seu texto)e que, ao invés do necessário, pode induzir ao medíocre CONFORMISMO vigente.

Sei que as suas intenções são as melhores, mas, tal como na erradicação de um cancro,os processos curativos,por vezes, implicam frontais e dolorosos inconvenientes.

Não me leve a mal o desabafo.

André Escórcio disse...

Obrigado pelo seu comentário.
Não levo a mal e até concordo.
Só que é muito complexo levar as pessoas a dizerem NÃO! Precisamos da tal revolução cultural!