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quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

MENOS HORAS NA ESCOLA E MAIS HORAS COM A FAMÍLIA

Eu que me sinto cada vez mais tolerante, li, saltei da cadeira e fui dar uma volta. Um tal Albino Almeida, da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), sugeriu ao Ministério da Educação que os estabelecimentos do 1º Ciclo do Ensino Básico estejam abertos, diariamente, entre as 07.30 e as 19.30, para dar resposta às necessidades das famílias. Exactamente o que por aqui já vai acontecendo com a escola a tempo inteiro. E o Secretário de Estado da Educação, segundo a notícia do PÚBLICO, "sinalizou a sua disponibilidade para avançar com o modelo". Em duas palavras: sou contra.
A organização social é que tem de ser repensada e mudada pois a escola não pode ser transformada, por mais actividades que se criem, num penoso armazém de crianças. A Escola, grosso modo, tem uma missão que é a de educar e formar mas não pode substituir-se à estrutura familiar. Há um tempo de aprendizagem de conhecimentos, de competências, de desenvolvimento global e harmonioso, de aprendizagem, também, da justiça social e da democracia; e há um tempo de estruturação daquilo que Pierre Bourdieu designou por "habitus", que está na escola mas também para além da escola, isto é, aquele conjunto de disposições duráveis que vão sendo interiorizadas, concretamente, as objectividades e as experiências vividas que ficam em nós e que a dada altura assumem a forma de matriz integradora de todas as experiências, com óbvios reflexos no futuro. Os dois momentos compaginam-se. Um não se substitui ao outro. Assumir que a escola apenas prepara para a vida, daí a necessidade de muitas horas de clausura, significa que na escola não se vive. Ora, é preciso aprender vivendo, pelo que a Escola constitui um espaço e tempo importantes na formação de aptidões para aprender, compreender, criar, formar cívica, moral, cultural e esteticamente, mas há uma outra formação, indispensável, se considerarmos que os grandes agentes socializadores são, numa primeira fase da vida, as famílias.
Dir-me-ão, alguns, que no quadro de algumas famílias, o melhor para a criança, afinal, é passar o maior número de horas na escola. Posso aceitar a defesa desse posicionamento pelos constrangimentos económicos, sociais e culturais. Conheço-os. Mas não é essa a questão de fundo que o presidente da Confederação de Pais assume. O problema é ter a escola como "guarda de crianças" enquanto os pais se subordinam a uma lógica de funcionamento da sociedade, que não permite esse tempo necessário ao acompanhamento dos filhos de que fala Bernstein no conceito de Código, isto é, no processo de sociabilização que se estrutura nos primeiros anos de vida, independentemente dos tipos de família serem de orientação posicional ou de orientação pessoal. Certo é que é ali, num primeiro momento, de forma inconsciente que se interiorizam conceitos duradouros.
O que, portanto, está em causa não são mais horas na escola, mas sim mais horas com a família, pelo que estão em causa as políticas de família. Só que hoje, os pais são obrigados e escravizados a trabalhar muitas horas e sem uma justa remuneração; muitos levam trabalho para casa; há quem não desista, na União Europeia, pelas 65 horas de trabalho semanais; muitos acabam por ter de fazer um part-time para suportar os encargos da vida, enfim, há aqui uma montanha de problemas por resolver que não podem ser solucionados deixando os filhos na Escola como se a vocação desta fosse a de remediadora social.
Para além do mais, é uma violência, uma criança de seis anos ser deixada na escola às 07.30 da manhã, o que significa levantar-se, provavelmente, em muitos casos, entre as 06 e as 06.30 H. Que raio de sociedade esta que nem protege a infância!

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